“Desinteressar-se
pelos irmãos constitui, já, uma falta grave; é, certamente, incorrer no extremo
castigo e numa punição inelutável.
Prova de que assim é realmente, é o homem que enterrou o talento que lhe foi
confiado. Nada havia de repreensível no seu modo de proceder, ele não tinha
errado na conservação do depósito, visto que o devolveu integralmente. Mas se
ele não errou pelo abuso, errou pelo uso, pois não duplicou o que lhe fora
confiado; e, por isso, foi punido. Pelo que se vê que, para que sejamos
salvos, não basta que sejamos fervorosos, instruídos, cheios do desejo de ouvir as Santas Escrituras; precisamos duplicar o depósito que recebemos; e fazemos isto todas as vezes em que, realizando nossa própria salvação, impomos a nós
mesmos a obrigação de cuidar do próximo…
Examinai comigo
quão leves são as ordens do Senhor. Aqueles que, entre os homens, emprestam
dinheiro do seu senhor, são considerados responsáveis pela sua recuperação. A
eles é dito: empregastes capital; cabe-vos agora tê-lo de volta; quanto a mim,
nada tenho a ver com aquele que o recebeu. Deus, todavia, não age assim: Ele,
simplesmente, nos manda empregar; quanto à recuperação, Ele não nos considera
responsáveis. Pois o conselho depende de quem tem a palavra, mas não o
persuadir. Eis porque Deus vos diz: é vossa obrigação empregar, mas não
recuperar. Que há de mais fácil? Empreguemos a doutrina entre nossos irmãos,
quer eles nos escutem ou não. Se nos escutarem, haverá proveito para ambas as
partes. Se não nos escutarem, atrairão sobre si inexorável castigo, mas não
poderão causar-nos o menor prejuízo. Fizemos a nossa obrigação aconselhando-os;
se eles se mostrarem indiferentes, isto em nada nos afetará. A falta não consiste
em não persuadir, mas em não aconselhar. Depois que tivermos advertido e aconselhado
com perseverança e continuidade, já não somos nós, mas eles que terão de
prestar contas a Deus.
Nós devemos
ser úteis, não apenas a nós, mas também ao próximo. O Cristo assim nos ensinou,
comparando-nos ao sal, ao fermento, à lâmpada, todas as coisas que são úteis e
proveitosas aos outros. A lâmpada não brilha para si mesma, mas para os que se
acham nas trevas; vós sois uma lâmpada, não para desfrutardes da luz sozinhos,
mas para reconduzirdes aquele que estava perdido; de que serve uma lâmpada,
se não brilha para aquele que está nas trevas? De que serve um cristão, se
ele não ganha ninguém, se não reconduz ninguém à virtude? A função do sal
não consiste em manter-se unicamente a si mesmo, mas em conservar as matérias
que se corrompem, impedindo-as de se decomporem e se estragarem; assim vós,
de quem Deus fez um sal espiritual, deveis manter, conservar os membros que se
corrompem, isto é, aqueles entre vossos irmãos que são indolentes e
descuidados, libertá-los da negligência, que é uma espécie de corrupção,
reuni-los ao resto do Corpo da Igreja. Por um motivo semelhante, o Senhor
vos chamou de fermento; o fermento não se fermenta a si mesmo; ele fermenta,
apesar de sua exiguidade e de seu pequeno volume, a massa enorme do resto da
pasta; vós também, se vosso número é restrito, multiplicai-vos, sedes
fortes pela fé e pelo zelo divino; assim como o fermento é poderoso apesar
de seu pequeno volume, assim como ele faz crescer a massa por causa do calor
que está nele e de sua qualidade superior, vós também, se o quiserdes,
podereis converter ao zelo que vos anima um número muito maior de pessoas”.[1]
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Fonte: São João Crisóstomo, Sermão Contra os que não vão à Assembleia…, 1, 2.
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