Blog Católico, para os Católicos

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"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

domingo, 24 de dezembro de 2017

VERBUM CARO FACTUM EST, ET HABITAVIT IN NOBIS.


Sobre a Festividade do Natal

Para o Dia 25 de Dezembro


Verbum caro factum est,
et habitavit in nobis.

O Divino Verbo tomou nossa carne,
e veio habitar entre nós.
(S. João 1, 14)


Que prodígio, que maravilha é esta, que hoje nasce com o dia? Que noite tão alegre, que aurora tão brilhante, que dia tão venturoso? Que novidade é esta, que hoje nos é anunciada? Ah! É que o único Filho de Deus tomou nossa carne, e veio nascer entre nós Verbum caro factum est, et habitavit in nobis. Nova esta, na verdade, que deve encher-nos de alegria e consolação, porque o mesmo Deus humanado vem fazer a nossa Redenção, libertar-nos do poder do Demônio, abrir-nos à custa de Seus padecimentos as portas do Céu, e ensinar-nos com Seus exemplos e lições, o caminho por onde devemos conduzir-nos; vem, finalmente, fazer toda a nossa felicidade. Consolai-vos, consolai-vos, povo meu; tinha já dito o mesmo Deus pelo seu Profeta Isaías, falando deste dia; adorna-te com os vestidos de alegria; desata as cadeias com que te prendeu o Demônio, teu vencedor; porque de graça ou por engano do mesmo Demônio fostes vendidos, mas sem prata, nem algum dinheiro sereis resgatados.


Alegremo-nos, diz por isso também o grande Leão Papa, alegremo-nos, porque hoje é nascido o nosso Divino Salvador – Salvator noster, dilectissimi, hodie natus est: gaudeamus. Não há lugar de tristeza quando se celebra o Nascimento do Autor da nossa felicidade. Todos devemos exultar de prazer, vai ele dizendo, porque assim como ninguém é isento do pecado, também Ele vem para resgatar a todos. Exulte o Santo, diz mais, porque está perto de receber o prêmio das suas virtudes; alegre-se o pecador, porque é convidado ao perdão; anime-se o gentio, porque é chamado à vida da Religião Santa; consolemo-nos todos, porque, enfim, o Filho de Deus, tomando nossa carne e aparecendo hoje entre nós, vem acudir a todo o Gênero Humano perdido pelo pecado. Eis aqui o motivo da nossa alegria; eis o que hoje nos quer fazer ver a Santa Igreja, nossa cara Mãe; e eis o que eu mesmo hoje quero expor-vos. O venturoso Mistério desta festividade natalícia, o benefício que com ela nos vem, é o que tenho a mostrar-vos. – Eu principio.

Estando todo o gênero humano cativo do Demônio, e inteiramente desgraçado pelo pecado de nossos primeiros pais Adão e Eva, todo ele esperava o seu Libertador, qual era o Divino Messias, o verdadeiro Filho de Deus, Aquele mesmo que tinha sido anunciado e predito pelos Profetas. As orações dos mesmos Profetas e Patriarcas se multiplicavam, os seus suspiros e gemidos aumentavam, implorando a vinda do mesmo Salvador. E quando Ele se comoveu por tantos clamores, e quis usar da Sua grande misericórdia, depois de Encarnar no ventre de Maria, passados os nove meses, e chegado o tempo d’Ele vir à luz, nasce do seguinte modo: Tendo César Augusto, imperador dos romanos, decretado que todas as pessoas sujeitas ao seu império dessem seus nomes nas capitais do seu distrito, por isso, José e Maria partem de Nazaré para Belém, onde deviam comparecer para darem seus nomes.


Ainda que a Senhora andasse já no fim do tempo da sua gravidez, e tinha, além do mais, de sofrer uma jornada não menos de trinta léguas, Ela obedece prontamente aos decretos do imperador de Roma, e muito melhor aos destinos do Altíssimo, que assim dispõe as coisas para certos fins que ireis vendo. Depois de tantas fadigas do caminho, chega José com Maria à cidade de Belém; mas chegando tarde, procuram dormida ou agasalho, e não acham aonde; as estalagens estavam já todas ocupadas pelas muitas pessoas que aí concorriam; e das casas particulares nem uma só abre as portas da caridade para hospedar estas duas melhores Criaturas do mundo. Deste modo, a Rainha dos Céus e da terra, a Mãe de um Deus, e juntamente José, seu Esposo, não acham onde se recolher; não tem remédio senão retirar-se aos arredores da cidade para ver se encontram algum abrigo. Acham um presépio, isto é, um pobre lugar, onde se abrigavam os animais do frio da noite, e onde não tem mais do que um pouco de feno ou palha. Mas é esse o lugar pobre que Deus tem destinado nos Seus decretos para nascer, e começar a dar-nos as provas mais claras do Seu amor por nós.

Chegada a hora da meia-noite, de vinte e quatro para vinte e cinco de Dezembro, o Filho do Eterno, revestido do glorioso dote de sutileza que lhe é próprio, bem como os raios do sol que entram e saem pelo vidro sem o ofenderem, assim Ele saiu do ventre puríssimo de Maria, nascendo sem o menor detrimento da Virgindade da Senhora. Esta porém, depois de O tomar em seus ternos braços, depois de O abraçar com o maior carinho, toda abrasada no seu Divino amor, O enfaixa em pobres paninhos, e depois O deita em duras palhas no mesmo presépio – Pannis eum involvit, et reclinavit eum in praesepio. Os habitantes de Belém O desprezam, mas os pastores das montanhas O vem adorar. Um Anjo baixou do Céu, apareceu a esses pobres pastores, que vigiavam, guardando seu gado; eles vendo tão brilhante luz celeste, se assustam; mas o mesmo Anjo os anima, dizendo: “Não temais; eu vos trago uma feliz novidade, a qual vos encherá de alegria e a todo o povo que quiser acreditar; sabei, lhe disse o Anjo, que é nascido o Salvador do mundo, que é Cristo Divino Senhor, Deus feito homem, em Belém, cidade de Davi; correi pois a vê-lO e adorá-lO; eu vos dou um sinal certo por onde O conhecereis; vós achareis um Menino, não em dourados berços, ainda que seja o Rei dos Céus e da terra, mas sim envolto em pobres panos; não O achareis em algum magnífico palácio, mas sim reclinado num humilde presépio; não O encontrareis acompanhado dos grandes do mundo, mas sim cercado de brutos animais, que lhe fazem companhia”.


E apenas isto acaba de lhes dizer, uma grande multidão de outros Anjos se lhes deixa ver, e todos juntos entoam hinos ou cânticos de louvores, dizendo: “Glória a Deus nas alturas, e na terra paz aos homens, que de mui boa vontade lhes é dada – Gloria in excelsis Deo, et in terra pax hominibus bonae voluntatis”. À vista disto os mesmos pastores não se demoram, deixam seus gados, deixam seu repouso, e todos animados apressadamente correm a Belém; chegam à cabana, entram, e veem a José e a Maria ajoelhados com a maior reverência; e diante destas tão Santas Criaturas o Menino Deus, deitado nas ásperas palhas, e enfaixado em pobres panos, gemendo e chorando com frio. Eles O adoram também prostrados por terra, sendo os primeiros que tem esta dita; tributam-lhe as suas homenagens, e não cessam depois de publicar por toda a parte esta grande e feliz novidade.

Aqui tendes uma simples narração do grande e admirável Mistério deste dia. Mas ah! Quantos benefícios e lições as mais proveitosas para nós se encerram neste Mistério? Todo o mundo estava desgraçado pelo pecado. Apenas Adão e Eva desobedeceram ao Preceito que Deus lhes tinha imposto, logo sobre eles e sobre toda a sua descendência caiu o raio da indignação Divina; os trabalhos, as enfermidades, as tribulações, as calamidades, as mais terríveis tentações, as criminosas paixões, a maior inclinação para o pecado, e finalmente, a morte, e a lamentável sorte de jamais ver e gozar a Deus no Céu, eis aqui o que veio sobre todo o gênero humano. Nenhuma criatura humana, por mais justa ou santa que parecesse, podia dar remédio a tantos males; nem os zelosos Elias, nem os ternos Jeremias, nem os fervorosos Moisés, nem estes, nem outros eram capazes por suas virtudes de abrandar a ira de Deus contra o mundo, nem comovê-lO ao perdão das ofensas que lhe tinham feito.


A sua justiça pedia vingança, e só a sua grande misericórdia podia valer-nos. Para satisfazer, porém, a pena merecida pelo pecado, e acudir aos miseráveis pecadores, lançou mão da Sua bondade, veio tomar nossa carne, nascer do ventre de Maria, e padecer frio, necessidades e dores; veio pagar em Si mesmo o castigo, que nós e todo o gênero humano tinha merecido. Um Deus eterno se faz Menino no tempo, o Onipotente se faz fraco; o Imortal e Impassível se faz mortal e passível; o Senhor dos Céus e da terra se faz servo; e tudo isto é só para dar remédio aos nossos males, abrir-nos as portas do Céu, as quais estavam fechadas, e mostrar-nos o verdadeiro caminho para lá, pelos Seus exemplos e lições.

Na verdade, irmãos meus, este bom Deus, nascendo em nossa carne, não veio só remir-nos do pecado, veio também ensinar-nos a combater nossas criminosas paixões e o maldito mundo, para depois gozarmos o mesmo Deus no Céu: veio sim logo, desde Menino ensinar-nos a guerrear o amor desordenado das riquezas, o amor desordenado dos gostos, e o amor desordenado das honras. Sim, imensas pessoas julgam possuir todo o bem nas riquezas temporais; para adquirirem estas, empregam quase todo o tempo, esquecidos do bem das suas almas. Mas o Filho de Deus baixa dos Céus para arrancar de nossos corações esta maldita cobiça das coisas do mundo, nascendo na maior pobreza. Podia muito bem nascer com pompa e comodidades, escolher um palácio magnífico, jazer num preciosíssimo berço, e envolver-se em finíssimos panos; e com isto mesmo nos mostraria grande amor, porque tudo era pouco ou nada, devido a tão Soberana Majestade. Mas Ele logo no seu Nascimento escolheu um presépio por palácio, uma manjedoura por berço, umas duras palhas por leito, e uns brutos animais por companheiros.


Em tão pobre estado quis nascer, que permitiu não achar quem O recolhesse em casa na cidade de Belém, nem ser recebido ou hospedado de alguém de seu povo. Ó avarentos, que não desejais senão riquezas, trabalhando tanto por estas, e pouco ou nada pela vossa salvação, ponde aqui os olhos, e envergonhai-vos: ou Jesus Cristo engana, ou vós ides errados – Aut Christus fallitur, aut mundus errat. Mas Cristo não engana, nem pode enganar; enganai-vos vós. Ele logo no seu Nascimento veio também ensinar-nos com a Sua mortificação a guerrear o amor desordenado dos gostos. Imensas pessoas julgam que não há outros gostos mais do que os dos sentidos, e por isso correm sempre a buscá-lo; deleites para a sua carne, delícias para o seu corpo, teatros, assembleias, bailes, banquetes, tudo buscam, e se isto podem achar, se cevam continuamente com esses prazeres, fugindo sempre a tudo quanto é mortificação. Deus porém, compadecido desta cegueira de tantos pecadores, vem logo desde Menino remediar tão grande mal, mortificando-se tão cedo por nosso respeito.

Ele não quis esperar pelo fim da vida, em que havia de ser submergido num mar de dores e agonias; o excessivo amor, que nos professava, não lhe permitia esperar tanto; mas quis logo no princípio começar a sofrer. Por isso, escolheu para nascer no inverno, que é a parte mais incômoda do ano; do inverno, escolheu o mais rigoroso; e do mês, a hora mais áspera, qual é a meia-noite. Nesta hora saiu o Menino Jesus das puríssimas entranhas de Maria; teve logo por primeira cama, a dura terra, apenas coberta com umas poucas palhinhas, por casa uma pobre cabana aberta à inclemência do tempo. Aí começou logo a tremer de frio, a gemer e chorar no meio de tantos incômodos. Mas vós, ó pecadores sensuais, que fazeis? Vós pelo contrário não buscais senão regalos para o vosso corpo; quereis passar uma vida toda cheia de delícias, quantas podeis encontrar. Porém, aí de vós, diz o Senhor por São Lucas, ai de vós, que tendes neste mundo tantos contentamentos – Vae vobis, qui habetis hic consolationem vaestram![1] Ou Cristo engana, ou vós errais, ainda repito – Aut Christus fallitur, aut mundus errat.


O mesmo Deus Menino além de nos ensinar tão cedo a combater as riquezas e os prazeres, nos ensina também a combater as honras. Podendo Ele nascer em majestosos palácios, à vista de muita gente, servido e assistido dos grandes da terra, e fazer brilhantes milagres logo desde a sua infância, pelo contrário, escolhe para nascer o lugar mais humilde, o silêncio da noite, onde não é visto de mais alguém do que de sua Mãe e de São José, e onde não tem quem lhe assista senão brutos animais; e sendo Rei dos Céus e da terra, é reputado pelo povo por nada, ou quase nada. Que lições estas de humildade e desprezo para nós! Muitas pessoas, porém, ambiciosas da glória deste mundo; não buscam senão honras, não desejam senão ser estimadas, respeitadas e servidas, e não querem senão mandar, e nunca obedecer senão à força. Cristo tanto se humilha logo desde Menino, e vós, miseráveis pecadores, tanto vos exaltais! Que contradição esta, entre o Mestre e os discípulos! Ou Cristo nos engana, ou vós errais, ainda torno a dizer – Aut Christus fallitur, aut mundus errat. Deus, desde o seu Nascimento empenhando-se em nos dar tão santas e importantes lições para nosso bem e salvação, e tanta gente seguindo o contrário, em tudo e por tudo! Oh! Que miséria, e que cegueira a mais pasmosa!

Causa pasmo ou admiração, ver um Deus por nosso amor, nascendo tão pobre, tão mortificado e tão abatido; mas também, causa pasmo ou grande admiração ver tão pouco quem O siga e imite, ver pelo contrário, tanta ingratidão para com Ele. Ah! Já não me admiro, dizia São Cipriano, e digo eu com ele, já não me admiro de ver a terra firmada sobre seus eixos, e no meio de um grande vazio que a cerca; já não me admiro de ver sobre nós tantas e tão brilhantes estrelas; de ver o sol sempre da mesma grandeza e calor, e de ver a lua com suas mudanças, e todos estes astros fazerem sempre o seu curso sem a menor interrupção; já não me admiro de ver a variedade dos tempos, e que estes fazem renascer, e reflorescer na primavera o que parecia estar seco; admiro-me, sim, diz ele e digo eu, admiro-me de que Deus se fizesse homem e fosse Menino no tempo – Miror Deum hominum, miror Deum in cunabulis. Admiro-me de ver um Deus imenso, a quem os Céus não podem compreender, metido numa cabana; o que adorna os mesmos Céus de estrelas, os campos de flores, e O que tudo sustenta, deitado num tosco presépio, enfaixado em pobres panos; O que consola os aflitos, chorar; O que inflama os Serafins, tremer de frio; e O que dá todos os bens, padecer suma pobreza – Miror Deum hominum, miror Deum in cunabulis. Admiro-me ainda mais, digo, de ver a par de tantas lições de amor, tanta cegueira, tanta maldade, tanta ingratidão da nossa parte.


Deus assim quis nascer, porque por este modo quer ser amado, diz São Pedro Crisólogo – Sic voluit nasci voluit amari. Porém, muitos cristãos nem assim O amam. Se viesse como Grande Deus, com pompa e majestade, mostrando-nos a sua grandeza, nos aterraria; mas Ele veio como Menino pequenino, manso, pobre e humilde, gemendo e chorando para desterrar dos nossos corações o temor, e estampar neles a suave lei do Seu amor; veio como Menino, diz mais São Bernardo, porque um Menino rouba muitos afetos: mas este Deus Menino não rouba os afetos de muitos corações para O amar e servir; antes, se lhe corresponde com tantos pecados e ingratidões. Ó verdadeira e pasmosa cegueira! Como não sai fora de si o coração humano, considerando estes tão grandes excessos? Deus em uma cabana, e deitado em duras palhas! Deus enfaixado em pobres panos, tremendo de frio, gemendo, chorando! Deus cercado e assistido de brutos animais! Quem fez estes inauditos prodígios, senão o excesso do Seu amor por nós? Quem obrou estas maravilhas, senão o desejo que Ele tem de nos ensinar a Sua Lei, e de nos conduzir ao Céu?

Mas desgraçadamente, de nada disto se admiram os miseráveis pecadores; nada disto os obriga a servir e amar tão bom Deus. O Nascimento de Jesus Cristo é a morte dos vícios e a vida das virtudes, diz São Leão Magno – Nativitas Christi mors est vitiorum, et vita virtutum. Este Divino Mestre e Médico celestial, conhecendo que os nossos males eram os desordenados apetites das riquezas, dos prazeres ou gostos sensuais, e das honras, veio assim aplicar os remédios contrários para dar saúde às nossas almas enfermas: porém nem assim mesmo muitos cristãos aprendem, nem assim mesmo se emendam de seus vícios, e abraçam a virtude. Ele contrapôs à avareza a maior pobreza, aos gostos a mortificação, e à soberba a humildade. Porque, como Deus, bem sabia que os exemplos são mais eficazes do que os conselhos, e as obras mais do que as palavras; logo, desde a sua entrada no mundo começou a praticar o que mais tarde nos havia de ensinar pela Sua divina boca. Que causa, diz São Bernardo no seu primeiro Sermão do Natal, que causa, que necessidade tinha o Senhor da Glória de se humilhar, e padecer tanto, logo desde o seu Nascimento, senão a fim de que nós façamos o que Ele tão cedo começou a fazer? Prega já com o seu exemplo o mesmo que mais tarde há de pregar com palavras. “Aprendei de Mim, diz Ele, que Sou manso e humilde de coração”.


Ah! Tudo nestes dias está clamando, e ensinando o modo como devemos adorar e amar o nosso Deus nascido. O mesmo pobre presépio nos clama, que aprendamos a amar a Deus: clamam também os pobres panos em que foi enfaixado, as duras palhas em que foi deitado – Clamant stabulum, clamor panni, clamant paleae, discite; tudo, finalmente, nestes dias primeiros da nossa Redenção nos está clamando e ensinando como devemos adorar, servir e amar tão bom Senhor; tudo nos está ensinando a desprezar o mundo, as suas riquezas, ao menos no afeto, os seus divertimentos, as suas modas e as suas máximas: tudo nos está ensinando a mortificar as nossas paixões desordenadas e a nossa soberba.

Aprendei pois, homens e mulheres, que só trabalhais para o corpo, que só cuidais em riquezas, em aumentar cabedais, e pouco ou nada em servir a Deus e em salvar as vossas almas, aprendei sim hoje em Jesus Menino o desapego das riquezas. Aprendei, homens e mulheres, que viveis com o mundo, que andais nos seus divertimentos, nos teatros, nos bailes, nas assembleias, no jogo e na taberna, e que andais com luxo, com modas e mais modas, aprendei sim em Deus Menino como Ele reprova tudo isso logo com o seu Nascimento, e como deveis viver de hoje em diante. Aprendei, criaturas desonestas; vós que não procurais senão gostos para a vossa carne, pecando já convosco, já com outras criaturas, aprendei sim em Jesus, que logo desde Menino tanto mortifica o Seu corpinho numas palhinhas, gemendo de frio; aprendei, digo, a mortificar essa maldita carne, a não lhe fazerdes a vontade com esses gostos torpes e abomináveis. Aprendei, soberbos, que só quereis governais, ser respeitados e temidos, aprendei sim em Deus Menino, tão abatido e humilhado, como haveis de humilhar-vos também, e sofrer com paciência e humildade qualquer ação, palavra ou desprezo que vos façam. Enfim, aprendamos todos no Nascimento do nosso Deus Salvador, como devemos viver para bem O adorar, servir e amar; tomemos todos as importantes lições que começa a dar-nos logo desde que nasceu; acabemos todos de abrir os olhos à luz da verdade; determinemos não querer outra vida contrária aquela que o nosso Redentor vem ensinar-nos, para nos aproveitarmos de tão copiosa Redenção.


Mas, se até agora nos temos afastado, de seguir os exemplos que tão bom Mestre nos deu, desde o seu Nascimento, arrependamo-nos de coração, choremos nossos males passados, e voltemo-nos a Deus com um vivo desejo e sincero propósito de O servirmos e amarmos de hoje em diante; vamos pois aos seus pés adorá-lO e pedir-lhe que nos perdoe as nossas ingratidões para com Ele; digamos-lhe: Ó meu Deus Menino, ainda que nascido em tanto desprezo, pobreza e mortificação, eu vos reconheço como Rei dos Céus e da terra, e como verdadeiro Deus e Senhor; eu vos adoro como meu único Redentor e Salvador; eu vos amo por isso, como meu único bem, e muito me pesa de não vos ter amado até agora; muito me pesa de não ter seguido tão santas lições, que desde o presépio me tendes dado, e de vos ter correspondido com tantos pecados e ingratidões. Ajudai-me agora, meu Jesus Menino; ajudai-me com a vossa graça a servir-Vos e amar-Vos para me aproveitar o benefício da Redenção, que neste dia trouxestes à terra. Ajudai-me também, Maria, Mãe de Deus; Vós que fostes a mesma que O trouxestes no Vosso casto ventre, e que O destes à luz e adorastes com tanto amor, ajudai-me também a adorá-lO e servi-lO; alcançai-me hoje e sempre graças para isto mesmo; mostrai também que Sois minha Mãe, e eu mostrarei igualmente que sou vosso filho. Amém.



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Fonte: Rev. Pe. Fr. Manoel da Madre de Deus, O.C.D., “Práticas Mandamentais ou Reflexões Morais, sobre os Mandamentos da Lei de Deus e os Abusos que lhes são Opostos”, Outras Práticas e Missões, Prática 16ª, pp. 618-627; 3ª Edição; Em Casa de Cruz Coutinho – Editor, Porto, 1871.



Desejo a Todos, 
um Santo e Feliz Natal
e um Abençoado Ano Novo,
Cheio de Realizações
para Honra e Glória de Deus.




[1]     Luc., 6, 24-26.

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