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"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

Místico Diálogo da Criatura com o Criador. 1ª Parte.


"Deixai os meninos, e não queirais impedi-los de vir a Mim,
porque destes tais é o reino dos Céus.
E, tendo-lhes imposto as mãos, partiu dali"
(Mat., 19, 14-15).


Diálogo do homem que é concebido no ventre materno

e por infortúnio não nasce à luz do dia e,

sem receber o Sacramento do Batismo,

vai sua alma para o Limbo,

casa de sua eternidade”

(Fr. Antônio do Sacramento).



Que aos 40 dias, pouco mais ou menos, sendo varão, ou aos 80, sendo fêmea, é criada a alma imediatamente por Deus e infundida no corpo organizado no ventre materno, e ficam os dois, corpo e alma, uma criatura humana vivente. No mesmo instante, ao nosso modo de explicar, fala a alma com Deus, que a criou do nada, à Sua semelhança, e lhe rende as graças por tão grande benefício, submergida no profundo conhecimento do seu nada e no claro conhecimento do imenso mar do Ser Divino.


Alma: Senhor de infinita grandeza, (diz a alma falando com Deus), que a tudo o que tem ser criastes do nada, para glória Vossa: rendo-Vos as graças pelo incomparável benefício de me criardes do nada, e de me fazerdes a Vossa semelhança. Donde mereci, meu infinito bem, gozar de tão grande benefício? Neste instante próximo passado era nada, se é que o nada tem ser: e agora sou um espírito perfeito, mui semelhante aos espíritos angélicos na sua criação. Já sei, pelo conhecimento que me dais, que sou criada para Vos gozar por toda a eternidade, e para Vos honrar, por serdes digno de toda a honra e glória. Mas ai de mim, Senhor, que visto ser preciso unir-me com este corpo, organizado por virtude da natureza no ventre materno, com especial concurso da Vossa providência, receio muito, que me seja contrário nos progressos da vida, e que venha, por causa de seus apetites, a perder-Vos por toda a eternidade! É possível, meu Deus, que, sendo criada em vosso agrado, tão pouco tempo hei de lograr este bem! Que no instante, que me unir a este corpo, imundo pelas imperfeições da natureza corrupta e horroroso pelas máculas da culpa, hei de ficar asquerosa aos Vossos Divinos olhos! Que sem remédio hei de contrair o reato da culpa de Adão e Eva, só com me unir a este corpo, que deles traz sua origem! Que hei de ficar exposta a tantos trabalhos da vida humana, em perigo de vos perder por toda a eternidade! Com tudo, Senhor, rendo-me de boa vontade às Vossas divinas determinações; pois conheço que são inescrutáveis Vossos juízos (Apoc. 16, 7).


Levado da Sua infinita bondade, fala Deus à alma e a consola, para que entre a informar o corpo, por ser isto muito do Seu divino agrado.


Deus: Filha Minha, a quem do nada criei à Minha semelhança, e a quem tenho um amor infinito. Bem vejo que és mais escolhida que o sol, mais formosa que a lua e mais resplandecente que a estrela d’Alva (Cânt. 6, 9); e que, com a união que estás para fazer com este corpo, imundo pelo pecado, hás de ficar asquerosa como lepra, e horrorosa como a noite escura; porém, atendendo à Lei que pus a Adão e Eva, como eles transgrediram o Meu Preceito, não há remédio senão que informes esse corpo amaldiçoado, e que fiques contraindo a culpa de Adão. Executa com submisso rendimento esta Minha determinação, que te darei meios, como dei aos primeiros pais, para que chegues a lograr a Minha Bem-aventurada vista, com mais realce da Minha graça. Dou-te a vontade livre, para que, chegando tu e o corpo, teu companheiro, à luz do dia e à luz da razão, escolhas o que melhor te estiver a gosto, ou salvação ou condenação eterna. Para te segurares no melhor partido: na Minha Igreja tens uma Lei e um Batismo, os quais, juntos com boas obras, são porta franca para a Minha glória (S. Jo. 3, 5). Entra já, e não temas.


Novamente falando a alma com Deus, lhe expressa seus temores, para entrar à união do corpo.


Alma: Muito me agradará, Senhor e Deus meu, o dar cumprimento à Vossa divina Vontade, que devo antepor a todo o meu desejo; porém, oh, quanto temo que a entrada neste corpo hediondo seja para minha perdição eterna! Este corpo sempre será contrário ao espírito; e só por milagre da Vossa Divina Onipotência se sujeitará às leis da razão. De certo teremos uma guerra contínua toda à vida (Jó 7, 1), ainda que espere na Vossa infinita bondade o subjugarei, quanto for possível, para que siga as leis da razão, e não as do apetite, em termos que se siga a Vossa glória, e eu chegue a lograr a Vossa vista. Mas ai, que não sei se este corpo, que me mandais informar, para que tenha espírito de vida, é gerado de pais gentios, ou de maometanos, ou de hebreus, ou de hereges, ou de cismáticos, que não Vos conheçam ou não Vos amem! E, neste lance, dificultosa será a minha salvação; porque, pela criação, que nos hajam de dar, ficarei instruída em erros, sem o Vosso santo temor, sem conhecimento de Vosso Santo Nome e sem Batismo e quando não seja condenada a penas eternas, por não ter cometido pecados atuais em matéria grave, ficarei sem gozar para sempre da Vossa vista! Ó Senhor, a quem adoro submergida na profundeza do meu nada: que é isto, a que me expõe Vossa ciência infinita?


Responde Deus à alma e lhe diz: que não esquadrinhe os inescrutáveis segredos da Sua Providência!


Deus: Não te compete, Minha filha, saber os segredos da Minha Providência. Sou Senhor Onipotente; e na Minha poderosa mão está o fazer vasos de escolha ou de injúria: sem fazer injustiça aos vasos, não obstante serem todos fabricados do mesmo barro (Rom. 9, 21). Determino-te que informes este corpo, e com tua união fique em estado de vivente; e assim como receias que seja oriundo de pais que, pelos seus maus costumes, te desviem da Minha Lei e da Minha Graça, e que sejam causa motiva da tua condenação eterna: também podes informar um corpo oriundo de pais virtuosos, que te dirijam pelos caminhos da santidade, e gozes para sempre da Minha gloriosa vista. O certo é que, ou os pais deste corpo que informas sejam bons ou maus, se morreres sem Batismo, será a tua sorte a de ires ser habitante do lugar do Limbo, nas profundezas da terra, até o dia Juízo; e se chegares a sair à luz do dia e à luz da razão, na tua vontade fica escolher boa ou má sorte, ou de salvação ou de condenação: pois não hei de faltar em te assistir com todos os meios para te salvar. Ainda que em Minhas mãos poderosas estejam todas as boas sortes, na vontade, que te deixo livre, está o poderes escolher da Minha mão uma sorte boa. Entra já a informar este corpo, e não inquiras mais os segredos da Minha Providência; porque estes não estão subordinados à vontade das criaturas e só saem à luz, quando são executados pelas Minhas determinações soberanas.


Fala a alma ao corpo, antes de o informar; expressando o grande horror que lhe tem.


Alma: Irmão corpo, a quem vejo, como sepultado, no apertado túmulo do ventre materno, cheio de fealdades, tendo mais demonstrações de monstro, do que de homem: a quem tua mãe, pouco tempo há, concebeu em pecados, elevada em seus apetites: Dou-te parte, que és, e não outro, aquele a quem, por determinação da Divina Vontade, venho informar com espírito de vida. Comigo hás de viver unido, e inseparável, em todo o tempo que formos peregrinos no mundo. Por esta união ficarei (oh desgraça maior) contraindo o Pecado Original, que tu e teus ascendentes contraíram em Adão (Rom. 5, 12). Uniformemente seremos participantes dos trabalhos e dos gostos da vida: e depois da morte, a que ficamos sujeitos, seremos participantes, a seu tempo, ou da salvação ou da condenação, por séculos sem fim. Hás de entender, irmão corpo, que sou um espírito nobilíssimo, criado imediatamente por Deus, e que tu és vil, oriundo da terra, vaso de barro e frágil. Se, pelo benefício de te dar alentos de vida e te associar a mim com estreita união, me fores fiel companheiro, conseguiremos uma boa sorte, que é, na vida mortal, amar a Deus e depois na vida, que esperamos, o goza-Lo para sempre. No meu domínio e na tua obediência, estará a nossa dita.


Responde o corpo à alma, agradecendo-lhe o benefício de o fazer vivente e de admiti-lo à sua companhia.


Corpo: Nobilíssimo espírito, imediatamente criado por Deus, com evidentes demonstrações de Sua imagem: Seja em boa hora a tua vinda a informar-me com espíritos de vivente. Faço-te saber que sou tão miserável, que, tendo minha origem da terra, e neste cárcere materno, onde me vês, tenho aparências de monstro. Tão hediondo estou, que, se desta sorte, que me queres informar, fosse visto do mundo, a todos causaria espanto. Porém, rogo-te, alma, que me infundas os espíritos de vivente; que espero no Senhor, que te criou, de te ser fiel em tudo. Advirto-te, que não te fies nas minhas promessas; porque, como sou barro (Gên. 5, 19), sou quebradiço, e como sou pó, qualquer vento me leva, e tudo depois acaba em ruína. Bem conheço a diferença que há entre mim e ti: que eu sou corpo caduco, e tu és espírito perfeito; eu sou criado, e tu és senhora; eu sou vil, e tu és nobilíssima; imortal, à tua parte compete o mando, e à minha, a obediência. Se me tratares com rigor, serei fiel servo; e se me lisonjeares com amor, ser-te-ei ingrato. Usa alma, do teu direito, se queres ter em mim domínio: eu estou pronto para te obedecer; porém, não faltes em me subjugar. Havendo entre nós esta economia, haverá em nós vida, graça e glória.



Informa a alma ao corpo, e ficam um composto vivente, companheiros inseparáveis por toda a vida.


Alma: Sem demora, irmão corpo, te dou alentos de vida; porque assim o determina o Autor da Natureza e da Graça. Recebe em boa paz este íntimo abraço que te dou. É tão íntimo e apertado este abraço, que durará em perfeita união por toda a vida caduca, e depois do Juízo Final durará, com nova reunião, por toda a eternidade. Oh, praza à Majestade Divina, que esta nossa união seja para glória eterna, e não para eterna pena! Irmão corpo: Enquanto estivermos encerrados neste cárcere materno, me sujeito a todos os teus movimentos; porque me acho em estado de não poder usar de minhas potências. Estou adormecida, mais com aparências de morta, do que com realidades de viva: porém, se sairmos à luz do mundo, usarei a seu tempo do meu direito. Espero que me reconheças por senhora, e a ti por servo, para que, em tudo, trabalhemos com acerto, e Deus seja em nós glorificado.


Alma e corpo agradecem a Deus o estado de viventes, em que se acham no ventre materno: lamentando-se da sua prisão e do perigo, em que existem, de não saírem à luz do dia, pelo nascimento, e à luz da Graça, pelo Batismo.


Alma e Corpo: Altíssimo Deus, Criador de tudo e Salvador nosso: Infinitas graças Vos sejam dadas pelo incomparável benefício de nos tirardes do nada para o ser, e de nos dardes alentos de vida. Aqui estamos em perfeita união neste cárcere materno, rendidos às determinações de Vossa Santíssima Vontade; e intimamente desejamos que se cumpra em tudo que for de glória Vossa. Pedimo-Vos, porém, se não encontra Vossas Divinas determinações, que nos livreis de perigos de vida nesta escura prisão; pois são sem número os que nos acometem: e será grande desgraça nossa não chegar pelo nascimento à luz do dia, para conseguirmos pelo Batismo a luz da Graça e ficarmos em via de merecer a Vossa glória. Senhor valha-nos a Vossa poderosa mão, para que saiamos deste miserável mar às praias do mundo, e que não aconteça que, por descuido de nossa mãe, ou por algum infortúnio, passemos deste escuro cárcere para as regiões da eternidade, sem esperança de lograr o bem de Vossa Bem-aventurada vista.


Consola Deus aos dois companheiros, alma e corpo, animando-os, para que estejam conformes com Sua Santíssima Vontade em todo o infortúnio, que lhes possa acometer no ventre materno.


Deus: Criaturas Minhas, a quem fiz à Minha semelhança, e a quem dei o ser e a vida, por altos fins da Minha Providência: Chegam a Meus ouvidos vossas vozes, e ferem Meu Coração vossas misérias. Tende paciência nos trabalhos e confortai-vos nos infortúnios. Ide continuando os movimentos de viventes nesses apertos do útero e nessas escuridades do ventre, para que a seu tempo chegueis a sair à região dos peregrinos. A natureza, de quem Sou Autor, também concorrerá com o que lhe toca à sua parte; causados pela negligência dos pais e pela malícia das criaturas. Com minha mão poderosa poderia desviar tudo; porém, como deixo obrar as causas segundas, por não revogar as Minhas determinações primeiras, daí se segue ficarem algumas vezes frustradas muitas coisas, que determinava em bem de Minhas almas. Dou-Vos a Minha Santa Bênção, e continuai com o movimento de viventes neste lugar em que vos achais.


Por descuido da mãe, ou por indisposição da natureza, ou por industriosa malícia de alguma criatura, morre no útero o feto animado; e em tal infortúnio se aparta a alma do corpo, caminhando um e outro para o seu lugar determinado, e lamentando sua infelicidade.


Alma: Irmão corpo (lamenta a alma), com quem, poucas horas, ou poucos dias, ou poucos meses há, me uni tão estreitamente: É possível que, entre tantas almas e corpos que, ao depois de criados, tiveram a felicidade de sair à luz do dia, de receberem a luz da Graça, de terem a luz do da razão, de possuírem a luz da Fé e de gozarem a luz da glória, só nós não havíamos de ter esta alegria! Deste escuro cárcere do ventre materno, onde estamos com prisões tão apertadas, havemos de ir, tu para um monturo, a converter-te em terra, e eu para o Limbo, para estar na companhia de outras almas, pouco afortunadas, a esperar em obscuridade a vinda do Senhor a Juízo Final, para sermos outra vez reunidos, sem esperanças de ver a Divindade do Altíssimo por toda a eternidade! Vai, irmão corpo, seguindo o teu caminho para este monturo: converte-te em terra (Gên. 3, 19), e nela descansa até o Juízo Último; que então virei informar-te outra vez, para sermos inseparáveis companheiros no lugar, à que Deus nos mandar ter nossa habitação por toda a eternidade.


Despede-se também o corpo da alma, lamentando sua desgraça em não chegar à luz do dia e em perder o direito da glória.


Corpo: Alma minha e muito amada senhora: Oh, quanto glorioso estava, por me teres dado alentos de vida, e por possuir a esperança de merecer no mundo com boas obras a Bem-aventurança eterna! E agora quão triste me afasto da tua sociedade! Vou ser lançado na terra, como se fosse terra; e a mesma mãe, que me concebeu, é a primeira que aborrece minha presença. Serei lançado em um monturo com nojo, e quando falarem em mim será com espanto. Serei desprezado, como se não chegasse ao ser da vida, e minha lembrança ficará sepultada na mesma terra, onde me derem o jazigo. Vou esperar nesse monturo a Ressurreição dos Mortos; e então virás com virtude superior informar esta pouca terra, que de mim se conservará, e ressurgirei melhorado; porque por virtude Divina crescerei a estatura perfeita, sem estas imperfeições, que agora tenho. Esse será o dia, em que nos ajuntaremos com união tão inseparável, que jamais nos dividiremos por séculos sem fim. É verdade que seremos sempre acompanhados da pena de não podermos ver a Deus na glória, ainda que, com todos os mais filhos de Adão, teremos a alegria de ver no dia do Juízo ao Redentor do Mundo, Jesus Cristo Nosso Rei (S. Mat. 24, 30), não quanto ao Ser Divino, senão quanto ao ser Humano. Depois de assistirmos ao Juízo Universal e de vermos a Cristo, triunfante de Seus inimigos, subir com Glória e Majestade para a Bem-aventurança, com todos os Anjos e Justos na Sua Companhia; e depois de vermos submergidos nas entranhas da terra aos condenados e ficarem nos Infernos penando por toda a eternidade (S. Mat. 25, 41): ficaremos no nosso competente lugar para sempre, com todos os mais corpos e almas, a quem coube esta nossa sorte. Vai com Deus, alma, para esse cárcere do Limbo, louvar aos altos juízos do Senhor; que eu cá te espero para a ressurreição geral, e serás para sempre minha inseparável companheira.



Parte a alma para o Limbo, lugar no centro da terra, e mutuamente se saúda com as almas, que estão naquele lugar, consolando-se com a sua sorte.


Alma: Almas, que estais encerradas neste estreito lugar do centro da terra: Aqui sou chegada a vossa companhia, para vos fazer perpétua sociedade na vossa pena. A vossa sorte em tudo foi como a minha: disposições foram do Altíssimo, cujos segredos são incompreensíveis ao entendimento criado. Consolemo-nos umas com as outras, e rendamos contínuos louvores ao Senhor, que assim foi servido. Esta consideração nos alentará neste lugar; porque suposto não seja bastante para nos aliviar a saudade, procedida da certeza de não podermos ver a Face de Deus, sempre nos consolará na nossa pena; e porque estamos livres da mágoa, que tem os que ofenderam ao nosso Criador com alguma culpa atual. Não nos seja pesada esta prisão, até a Segunda Vinda do Senhor, a julgar ao mundo; pois os Santos Padres antigos também experimentaram aqui semelhante prisão, até a Primeira Vinda do mesmo Senhor a remir com Sua Morte aos homens do cativeiro do pecado. Algum dia há de ter fim esta nossa prisão, e dizem que será para o dia do Juízo Final, quando cada um de nós for informar, por virtude Divina, o corpo, seu antigo companheiro, para viver com ele de sociedade para sempre. Iremos naquele tremendo dia com os mais filhos de Adão a juízo, unidas aos nossos corpos (S. Mat. 25, 32): e então teremos a consolação de ver ao nosso Criador, a Maria Santíssima, Sua Mãe e nossa Irmã, aos Anjos, aos Bem-aventurados, e aos nossos pais, parentes e irmãos, dos quais pode ser que uns subam em triunfo com o Redentor para a Glória, e outros desçam em confusão com Lúcifer para o Inferno. Então, segundo se afirma, ficaremos povoando o mundo reformado e vivendo em contentamento e alegria, como haviam de viver os nossos primeiros Pais no Paraíso, se não decaíssem da Graça Original. Também, segundo a mais pia opinião, veremos daquele lugar onde habitarmos, a Humanidade de Cristo Senhor Nosso na Bem-aventurança, a presença de Maria Santíssima e a dos Bem-aventurados. Porém (ó saudade sem limite), não veremos a Divindade e Glória de Deus; porque não tivemos a fortuna de entrar na Igreja Militante pela porta do Batismo e pela luz da Fé, que são as portas, por onde o Senhor franqueia a entrada para a Bem-aventurança. Consolemo-nos, caríssimas irmãs, pois assim o dispôs o Altíssimo; e como esta é a nossa fortuna, determinada pela Sua Divina Vontade, devemos conformar-nos com ela e fazer ao mesmo Senhor contínuas canções de louvor e glória.


Correspondem as almas do Limbo à alma, sua nova companheira, com semelhantes consolações.


Almas do Limbo: Nossa irmã caríssima: Bem-vinda sejais para a nossa sociedade. Agradecemos muito a consolação, que nos dais nas vossas palavras, fundadas em tanta razão e em tão bons princípios. Muitas de nós aqui estão encarceradas há muitas centenas de anos, e sempre temos estado conformes com a Vontade Divina. Serve-nos de grande consolação considerarmos que isto foram disposições do Altíssimo para glória Sua. De certo entendemos que o Senhor nos fez uma incomparável mercê em nos criar do nada à Sua semelhança e que, suposto não esperemos gozar da Sua Divindade, sempre temos a confiança, que havemos de gozar para sempre da Sua Bênção e do Seu Amor. Depois que informarmos os nossos corpos na Ressurreição Geral, teremos os dotes naturais em grau perfeito, e gozaremos neste lugar, que Deus nos permitir, que dizem será o mundo reformado, todas as delícias castas e divertimentos honestos. Serão tais estes regozijos, que nunca haverá no mundo semelhantes, enquanto for habitado dos mortais; e segundo já nos insinuastes, teremos, conforme a opinião de alguns autores, grandes consolações com a vista da Santíssima Humanidade de Cristo, de Maria Santíssima, dos Anjos e dos Bem-aventurados. Os astros e planetas, que sempre seguiram seu curso, nos darão benignas influências, e os elementos nos serão em extremos saudáveis. Veremos desta nossa habitação estes horrendos calabouços, principalmente o lugar e os tormentos dos condenados, sem termos da sua desgraça alguma pena, porque eles assim o mereceram pelas suas culpas. Com muitas danças honestas e canções devotas, louvaremos ao Senhor em alegria e, desta sorte, aliviaremos a saudade de não ver a Sua Divina Face. Passarão as continuadas rodas dos séculos e voltarão a principiar, sem nunca terem fim; e em disposição perfeita, com notável agilidade, e com grande contentamento, viveremos enquanto Deus for Deus. Esta é a sorte, que nos espera depois de sairmos deste cárcere subterrâneo, e dela gozaremos, nós que somos milhões de almas que aqui estamos: sendo a causa desta nossa sorte, em umas, o não chegarem a ver a luz do dia; porque expiraram no ventre de suas mães; em outras, porque nasceram ao mundo e morreram sem Batismo; e, em outras, porque sendo filhas de gentios, maometanos, hebreus e de hereges, acabaram a vida sem Batismo e sem cometerem culpa mortal”.



Fonte: Fr. Antônio do Sacramento, da Sagrada Religião dos Observantes da Província de Portugal, “Ventura do Homem Predestinado e Desgraça do Homem Precito”, Diálogo I, pp. 15-29, 1ª Edição Brasileira, Ed. Vozes, 1938.


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