Blog Católico, para os Católicos

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"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

domingo, 5 de janeiro de 2020

NÃO PODEMOS IR PARA O CÉU SEM SOFRER.


Pensamentos Escolhidos do Cura d’Ars


Quer se queira quer não, é preciso sofrer. Há pessoas que sofrem como o bom ladrão, e outras como o mau. Ambos sofriam igualmente. Mas um soube tornar meritórios os seus sofrimentos; e o outro expirou no desespero mais horrendo.

Há duas maneiras de sofrer: sofrer amando e sofrer sem amar. Os Santos sofriam tudo com paciência, alegria e perseverança, porque amavam. Nós sofremos com cólera, despeito e lassidão, porque não amamos. Se amássemos a Deus, sentir-nos-íamos felizes de poder sofrer por amor d’Aquele que se dignou de sofrer por nós.

No caminho da cruz, vede, meus filhos, só o primeiro passo é que custa. O temor das cruzes é que, é a nossa maior cruz…

Não temos a coragem de carregar a nossa cruz, e bem errados andamos; porquanto, façamos o que fizermos, a cruz nos alcança, não podemos escapar-lhe.

Que temos a perder? Por que não amarmos as nossas cruzes e não nos servirmos delas para irmos para o Céu?… Mas, ao contrário, a maioria dos homens voltam as costas às cruzes, e fogem diante delas. Quanto mais eles correm, tanto mais a cruz os persegue, tanto mais os fere e os esmaga de pesos…

Se Deus Nosso Senhor nos envia cruzes, nós nos agastamos, nos queixamos, murmuramos; somos tão inimigos de tudo o que nos contraria, que quereríamos estar sempre numa caixa de algodão; mas numa caixa de espinhos é que deveríamos nos meter.

É pela cruz que se vai para o Céu. As doenças, as tentações, as penas são outras tantas cruzes que nos conduzem ao Céu. Tudo isso em breve terá passado… Vede os Santos que lá chegaram antes de nós… Deus Nosso Senhor não pede de nós o martírio do corpo, pede-nos somente o martírio do coração e da vontade… Nosso Senhor é o nosso modelo; tomemos a nossa cruz e sigamo-lO. Façamos ainda como os soldados de Napoleão. Era preciso atravessar uma ponte sobre a qual caia incessante metralha; ninguém ousava passar. Napoleão pegou a bandeira e marchou em primeiro.

Façamos assim também; sigamos Nosso Senhor, que marchou em primeiro.

A cruz é a escada do Céu. Como é consolador sofrer sob os olhos de Deus, e poder dizer a si mesmo, à noite, por ocasião do exame de consciência: “Ela, minha alma! Tiveste hoje duas ou três horas de semelhança com Jesus Cristo: foste flagelada, coroada de espinhos, crucificada com Ele?...” Oh! Que tesouro para a morte! Como é bom morrer quando se viveu na cruz!

Se alguém vos dissesse: “Eu quereria ficar rico; que devo fazer?”, de certo lhe responderíeis: “Deveis trabalhar”. Pois bem! Para ir para o Céu é preciso sofrer.

Sofrer! Que importa? É só um momento. Se pudéssemos ir passar oito dias no Céu, compreenderíamos o preço desse momento de sofrimento. Então já não acharíamos cruz bastante pesada, provação bastante amarga…


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Fonte: Rev. Pe. Alfredo Monnin, “Florinhas de Ars”, Cap. XXIII, pp. 76-78. Coleção Popular de Formação Espiritual, Editora Vozes Ltda., Petrópolis/RJ, 1952.

O CORAÇÃO DE MARIA, É UM ESPELHO SEM MÁCULA.



Suma Pureza devida a Virgem,
como a Filha do Eterno Pai.


1. Considera que o primeiro título, e mui sublime, do Coração de Maria é ser um espelho sem mácula. Duas espécies de pureza se podem distinguir quanto ao nosso intuito: uma positiva, que consiste na caridade e nas outras virtudes; a outra negativa, que consiste na isenção de todo pecado. Ora, na Mãe de Deus a primeira espécie de pureza não foi suprema, visto que a santidade criada que n’Ela se achava, podia sempre ir crescendo; mas suprema, realmente, foi a pureza negativa, porque sumamente se apartou de todo pecado: Potest aliquid creatum inveniri, quo nihil purius esse poterit in rebus creatis, si nulla contagione peccati inquinatum sit.1 Por isto, Ela é chamada bela como a lua e eleita como o sol, pulchra ut luna, electa ut sol, para significar que a Virgem na santidade positiva se distinguia de seu Filho como a lua do sol; isto é, que a sua beleza, conquanto inefável, era n’Ela incomparavelmente menor de que o era em Jesus Cristo, Sol de Justiça: e, outrossim, que não era uma beleza inata, mas estranha e que lhe fora comunicada pelo seu Divino Sol, quia respexit. Mas, ao contrário, na pureza negativa a Virgem é bela como o sol, electa ut sol, porque, preservada de toda culpa, imitou exatamente seu Filho na inocência, possuindo como Ele possuía uma total isenção de qualquer mácula, posto que de modo diverso, e por diversa razão. Assim se verifica o oráculo de Isaías, que no Céu da Igreja a luz da lua será semelhante à luz do sol: Erit lux lunae sicut lux solis,2 porque igualmente não teve parte o pecado nem em Jesus Cristo, nem em sua Mãe, à imitação d’Ele: não teve parte o Pecado Original, não o Pecado Atual; nem tampouco neles houve parte nenhum dos péssimos efeitos ou causas do pecado. Ela preservada da dívida de contrair culpa, como não compreendida no pacto que de princípio se fez com o primeiro Pai; Ela livre do poder de pecar, porquanto a impecabilidade que Cristo houve por natureza, a Virgem a teve por graça; Ela sem o fermento do pecado, porque jamais experimentou o menor impulso para o mal, nem jamais lhe entrou no espírito imagem, figura, pensamento algum de impureza; Ela sem paixões desordenadas, porque onde não havia a raiz da culpa, também não podiam existir os ramos; Ela de todo incapaz de intrínsecas sugestões, porquanto o domínio que tinha sobre as suas faculdades, não estava subordinado a rebelião; e se o Demônio extrinsecamente ousou tentá-lA, apenas logrou ser mais fortemente esmagado na venenosa cabeça: Ipsa conteret caput tuum; Ela mais pura do que os Anjos, os quais se já não pecaram, contudo podiam pecar; e, se foram puros, sua limpidez provém da natureza por necessidade, e não da graça por mérito como em Maria;3 Ela, finalmente, não só puríssima em si mesma, mas pura até nos outros; porque só com a sua presença produzia a pureza nos que a contemplavam, da mesma sorte que a neve, a qual parece que vista de perto nos refrigera.

Mas como diversamente poderá ser, se Maria devia ser digna Filha do Pai Eterno, como em verdade Ele a chama por Davi: Audi, filia, et vide, et obliviscere populum tuum; et concupiscet rex decorem tuum.4 É certo que esta filiação ultrapassa os limites da filiação adotiva; mas como ela se faz em nós pela graça, e a graça da Virgem foi tão superior à de todos os Santos, e Ela a ninguém foi mais semelhante do que ao seu Filho divino, disto ainda se segue que a sua adoção seja superior à de todos os Santos, e semelhante à filiação natural do Cristo. Posto isto, se a Virgem é Filha do Eterno Pai, por uma razão mais forte do que aquela pela qual são filhos todos os eleitos, convém que pela mesma razão, seja Ela mais semelhante ao Pai do que o possam ser todos os outros justos; e, por consequência, que mais do que todos seja apartada de qualquer mácula de pecado. Certamente, se a maternidade de Maria tanto na terra se devia assemelhar à paternidade divina, por necessidade convinha, diz S. Anselmo, que Ela fosse tão pura que mais puro do que Ela não pudesse haver outrem senão Deus: – Decens erat, ut ea puritate qua major sub Deo nequit intelligi, Virgo illa niteret, cui Deus Pater unicum filium suum dare disponebat.5

Um espelho, que esteja ainda que de leve, embaciando, já não pode fielmente reproduzir a imagem: Imaginem maculosa non reddunt; pelo que, quem não recusa à Virgem o privilégio de ser a primogênita do Eterno Pai na ordem da graça, tampouco lhe pode recusar o privilégio de ser em tudo semelhante ao Pai na isenção de toda espécie de culpa, visto que de um lado a semelhança é a primeira razão da dita filiação, e, por outro lado, não há maior dissemelhança de Deus do que o pecado.


Como a Mãe de Deus Filho


2. Considerai que esta suma pureza é também devida a Maria como à Mãe do Deus Filho. O ser Mãe do Santo dos Santos e não ser de todo Santa é uma proposição monstruosa, diz S. Anselmo, e, para disto bem nos persuadirmos, discorremos assim: – Ou Jesus Cristo queria atender à sua própria honra, ou queria atender, a de sua Mãe; e quer num quer noutro caso convinha que desse à Virgem uma pureza sem igual.

Se queria atender à Santa Mãe, como à sua Mãe lhe devia três coisas: honra, obediência e amor. Mas que amor teria havido para com Ela, se podendo isentá-lA de qualquer culpa, não a tivera isentado, ao passo que Ela mais abominava todo pecado que qualquer pena, e de boa vontade antes quisera não existir do que ser pecadora? Como poderá com isto conciliar-se que Jesus Cristo contempla sua Mãe com mais amorosos olhares que os que dispensa a toda a corte celestial? Sim, porque destarte lá o diz S. Bernadino: Christi filialis aspectus ad Matrem transcendentissimus esse debet, ita ut totam curiam coelestem simul sumptam non debet aspicere sub tali ordine amoris.6 Se assim não fosse, não teria Jesus concedido a sua Mãe aquele privilégio que concedeu aos seus servos, que são os Anjos, em cuja formação concordes reuniu a natureza e a graça: Erat Deus condens simul naturam, et infundens gratiam.7 A primeira pecadora, que foi Eva, teria tido esse privilégio de sair perfeitamente pura das mãos do Criador, e não o houvesse tido Maria, que é a mulher escolhida para restaurar a desobediência e os danos da primeira. Em verdade à rainha não convém os mesmos tratamentos dos servos: Non debet eodem modo gubernari servus, et regina; nec ae qualiter tractari.8 E, se assim é, onde estaria a honra devida por Cristo à sua Mãe, se tivesse permitido que Ela fosse, um só instante, manchada de qualquer pecado, mesmo na sua primeira origem? Em tal estado seria a Virgem digna de despreso, ou talvez de maldição, por ser culpada; e, por outra parte, como jamais podia ser amaldiçoada por Deus Aquela criatura que um dia lhe devia ser Mãe? Qui maledixerit Patri, vel Matri, morte moriatur. Finalmente, se devia Cristo obediência à Mãe divina, como podia suceder que essa Mãe alguma vez tivesse sido escrava de Lúcifer? Abimelech, rei de Gesara, restituindo a liberdade a Sara, lhe disse no fim: Memento te deprehensam.9 Recorda-te que já estiveste em meu poder. Ora, com quanto maior razão se teria podido gloriar Lúcifer, se debaixo do seu poderio tivesse tido Maria? Certo é que das mãos de Abimelech saiu Sara intacta, sem receber ultraje algum; mas a Virgem teria recebido afronta e mácula; e por isto, quando das mãos do Demônio saísse a Virgem, teria ele podido dizer-lhe: Estás livre, mas lembra-te que já te prendi nos meus laços; hás de esmagar-me a cabeça, mas não te esqueças que meu foi o princípio da tua vida; tenha Deus os restos, minhas foram as primícias: Memento te deprehensam. E a uma tal Mãe acaso convinha que tão longamente se subordinasse o Verbo Encarnado? Se as leis não toleram que uma mãe se possa tornar escrava de um filho, terá consentido a divina Sabedoria que a sua Mãe se tornasse escrava do Demônio, podendo tão facilmente isentá-lA dessa escravidão? Se não a tivesse preservado, não poderia disto dar outra razão que não fosse a de não ter querido preservá-lA; mas o não ter querido fazer-lhe esse grande benefício como poderia escusar-se em quem tudo podia, como Deus, e, como Homem, tudo devia a sua Mãe, causa segunda de todo o seu bem? Nem vale o dizer-se que Ele depois a santificou: o perdão cura a chaga, mas não tira a cicatriz: Ildulgentia, quos liberat, notat.10

E, mesmo quando fosse crível que Jesus Cristo houvesse descurado esta honra de vida à sua Mãe, como poderia descurar a que devia a Si próprio? Aqui podemos dizer o que em análogo assunto disse Santo Agostinho: Si Mariae non congruit, congruit Filio, quem genuit.11 Não há privilégio que exceda a dignidade da Mãe de Deus; mas, se houvesse, não poderia jamais transcender a dignidade daquele divino Filho que se encarnou no seio virginal. E quem não sabe que a desonra dos pais reverte em desonra da prole? Dedecus filii pater sine honore.12 Assim como aquelas águas que passam por uma ignóbil mina, tomam desta as qualidades, assim das qualidades maternas se embebem os filhos que dela nascem, partus sequitur ventrem. Um aluvião, portanto, de tantas desordens, e de tamanhos impossíveis por vir, impossível nos torna acreditarmos que no Coração de Maria por um instante sequer se alojasse o pecado, e não só o Atual como o Original, de sorte que Ela não fosse formada com o mais santo, com o mais excelente, com o mais admirável de todos os dons celestes por Aquele Senhor que A formava para ser sua digna Mãe: Usque adeo desipiendum est, ut homo videat melius aliquid fieri debuisse et Deum credat facere noluisse?13


Como a Esposa do Espírito Santo


3. Considerai o terceiro título mui sublime pelo qual se deve a Maria uma suma pureza, e é ser Ela a Esposa do Espírito Santo. Todas as almas que se acham em graça tem por privilégio este celestial esponsalício; Sponsabo te mihi in fide.14 Mas o vínculo entre o Espírito Santo e a Virgem é de ordem incomparavelmente mais excelsa, por isso que Ela lhe pertence com um título especialíssimo, isto é, pelo consentimento que lhe foi pedido pelo Arcanjo S. Gabriel, e que por meio deste Ela deu ao Espírito divino, para que lhe interviesse na alma e no corpo tornando-A Mãe, e d’Ela se valendo para formar com o seu sangue virginal os membros do Verbo Encarnado: Ipse Spiritus Dei, ipse amor Omnipotentis Patris et Filii, corporaliter venit in eam: et regniam coeli et terrae fecit sponsam suam.15 Pela mesma razão ainda o Arcanjo não apareceu a Maria em sonho como a S. José, mas em vigília, porque o sono não teria sido um tempo próprio para impetrar e dar tal consentimento para as pretendidas núpcias.16 E, assentado isto, quem acreditará que o Espírito divino não quisesse escolher uma esposa inteiramente nobre, e sob todos os aspectos? Mas por todos os aspectos nobre não seria Ela, se uma vez tivesse sido pecadora, conquanto depois santificada. Isto seria ter a nobreza por graça, e não por nascimento. Muito importa o bom começo, e bem difícil é obliterar as máculas que se hajam contraído em prejuízo da honra: Infamia semel imposita perpetuo durat.17 Que homens haverá que, podendo escolher uma esposa à sua vontade, a escolheria maculada? Como, porém, a teria escolhido quem a podia fazer desde o seu princípio, conforme lhe aprouvesse? Quando uma suma pureza não se devesse a Maria por outros motivos, certo que lhe era devida por esta grandíssima dignidade de ser esposa do Altíssimo. Augusta licet legibus non sit soluta, tamen princeps eadem illi privilegia tribuit, quae habet ipse.18 Nem vale dizer-se que na sua Conceição e nos seus primeiros anos ainda não se achava concluído o divino esponsalício que depois se concluiu na Encarnação do Verbo Eterno: que importa isto? Basta que desde o princípio fosse Ela destinada a essas bem-aventuradas núpcias, para que desde então se lhe devesse, e como dádiva antecipada, toda espécie de graça, e também por isto a graça original. Coelestis sponsa ante nuptialium munerum nomine Spiritum Sanctum accepit, diz S. Epifânio; e de outro modo não se acharia própria para concorrer com o Espírito Santo à concepção do Verbo Encarnado, sem uma pureza tal que por esta houvesse a devida correspondência de semelhança com a humanidade do Redentor.

Tanto mais assim houvesse de ser quanto ao sublimíssimo grau de esposa se aliava a função de Mediadora entre Deus e os pecadores: e como poderia a Virgem dignamente exercer esse cargo, se alguma vez tivesse pecado? Não é justo que seja medianeiro de reconciliação quem uma vez participou do delito, causa única da discórdia. A vara de Moisés, conquanto fosse tão prodigiosa, todavia não foi escolhida para florescer e frutificar em mãos de Aarão, porque já uma vez se transmutara em serpente. Duvida, pois, não padeça que a Virgem foi sempre toda bela e imaculada: Tota pulchra es, et macula non est in te: Tota pulchra, diz S. Boaventura, per omnis boni praesentiam, sine macula per omnis mali absentiam. O Eterno Pai sempre a quis santa, porque Ela é a sua Filha e o amor aqui baixa do alto; o Filho a quis sempre santa, porque Ela é sua Mãe, e o amor deve aqui subir; o Espírito Santo a quis sempre santa, porque Ela é sua Esposa, e o amor deve ter aqui perfeitamente o seu efeito, que é a união dos corações. Nesta Esposa divina, devia o divino Espírito Santo como que expandir-se a Si mesmo, diz S. Ildefonso, comunicando-lhe tantas graças, tantas prerrogativas, tantos dons, tanta dignidade, quantos caber podiam em uma criatura, e quantos convinha que tivesse Aquela alma felicíssima, que depois do Cristo devia ser o instrumento primário do mesmo Espírito divino para santificar todo o gênero humano. Portanto, à Virgem se atribui a glória do Líbano como Ela o merece: Gloria Libani data est ei;19 porque, assim como no Líbano jamais faltou a neve: nunquid deficiet nix Libani?,20 assim também na Virgem jamais faleceu a inocência, nem por culpa alguma atual, posto que mínima, nem muito menos pela culpa original que imensamente é mais criminosa de que qualquer culpa mínima: Nihil inquinatum in eam incurrit.21 Ela é aquela luz que das mãos do seu Criador saiu completamente límpida; e tal sempre se manteve. Ela foi aquele bálsamo jamais adulterado: Quasi balsamum non mixtum odor meus.22 Ao seu imaculado seio serviam de trincheiras os lírios: Venter tuus vallatus liliis,23 porque se impedisse o acesso a tudo o que respirasse impureza. De outra sorte não fosse Ela assaz pura perante o Senhor. E visto que não são puros os Anjos perante Deus, Stellae non sunt mundae in conspectu ejus, porque podiam pecar, quando não hajam pecado, deduzi vós agora como digno tálamo do Altíssimo seria aquele coração que só se poderá manchar, mas também já se houvesse maculado?




Oração à Santíssima Virgem
em Obséquio do seu Sagrado Coração

Ó grande Rainha do Céu e da terra, suma e perpetuamente imaculada, eu me inclino profundissimamente em obséquio do vosso ditosíssimo Coração, espelho sem mácula, e que jamais foi conspurcado nem mesmo por sombra de qualquer espécie de pecado, quer Original, quer Atual. Por isto, convosco me regozijo por ser o mérito que sobre todos estimais: quisera concentrar no meu peito todo o jubilo que por este motivo tem experimentado os vossos verdadeiros devotos; e se tal mérito Vos pudesse faltar, preferiria eu ser aniquilado para vo-lo manter. Mas, contudo, um pecador, abjeto lodo, qual me reconheço, com que vergonha deve comparecer em Vossa presença! Bem vedes que inúmeras são as minhas iniquidades, passadas e presentes, mas acaso poderão elas sobrepujar a Vossa caridade, para que de mim não se compadeça e não me queira ajudar? Não: e bem que não o mereça, ainda assim o espero alcançar, pois que tanto maior será a glória da Vossa misericórdia, quanto maior é a minha miséria. Baixai, pois, um dos Vossos olhares para mim, desgraçado, nem o desvieis sem que me tenhais disposto a transmutar-me em outro. O meu coração, eu vo-lo apresento todo nodoado para que Vos digneis de o santificar. Imundo como está, Vós o podeis purificar com a Vossa intercessão junto de Deus; e, se está cheio de pecados, tantas lágrimas de contrição me podeis obter que com elas se lavem todas as manchas. Grandes favores em verdade Vos peço; mas a Vós os peço, que sois rica e poderosa sobre todas as criaturas, e que para opulentar este mísero pecador só tendes que despender as Vossas preces. Estas me asseguram a graça, esperando eu, por Vossa mediação, o perdão de todos os meus pecados, e o viver para o futuro tão longe de novamente cometê-los que depois possa, morrendo, agradecer-Vos para sempre no Céu. Amém.


________________________

Fonte: O Sagrado Coração de Maria Virgem, proposto à Devoção dos Fiéis, pelo Padre João Pedro Pinamonti, S.J., Consideração I, pp. 21-34. Duprat & Comp., São Paulo/SP, 1904.

1.  S. Thom. Dist. 44, 3, 3.

2.  C. 30, 26.

3.  Alber. M. de laud. B. V. c. 182.

4.  Psal. 44.

5.  l. de Concept. A. V.

6.  Serm. 21, a. 2, c. 7.

7.  August. l, 12, de Civit. c. 9.

8.  Justin. De publ. Judic.

9.  Gên. 20, 16.

10.  l. si de gener. Abolit.

11.  Serm. De Assum.

12.  Eccl. 3, 13.

13.  August. I, contra Adver. Legis c. 24.

14.  Osae. 2, 20.

15.  S. Anselmo, De excellen. B. V., c. 4.

16.  Vide Moldoratum in cap. 2. Luc.

17.  l. 3. C. De his, qui notantur infamia.

18.  l. Princeps ff. de leg.

19.  Is. 35, 2.

20.  Hier. 10, 14.

21.  Sap. 7, 25.

22.  Eccl. 14, 21.

23.  Cânt. 7, 2.

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