Por Mailson Lopes, Terceiro Carmelita | FratresInUnum.com
– Em 1515, portanto, há 500 anos, o gênero humano era honrado pelo
nascimento de um portento, de uma maravilha das Mãos Sapienciais da
Divina Majestade: Teresa de Cepeda y Ahumada, a grande Santa Teresa de
Jesus. Mil e um atributos e qualificativos, cada um mais refulgente que o
outro, resplandeceram em sua vida de monja, mística, escritora,
reformadora, fundadora, poetisa, santa… e profetisa. Sim, profetisa!
Discorramos um pouco sobre essa última faceta da Nossa Santa Madre,
sobre seus dons proféticos e a sua projeção para os tempos hodiernos.
Os
dons místicos com os quais Santa Teresa, o diadema da Ordem do Carmo,
foi cumulada em sua vida são incontáveis e maravilham a quem se debruça a
conhecer a sua vida. Êxtases, visões, revelações, levitações,
arroubamentos, voos de espírito, feridas místicas, clarividência,
quietude, transverberação… Dons verdadeiros e extraordinários enviados
por Deus para poucas almas de escol e de alto grau de santidade. Um
exemplo retumbante dessas graças sobrenaturais foi Santa Teresa haver
tido em tempo real a visão do martírio do Beato Inácio de
Azevedo S.J. e companheiros, os denominados 40 mártires do Brasil,
assassinados por calvinistas franceses em pleno mar, em 15 de julho de
1570, quando se dirigiam à nossa pátria. Nessa visão ela os via subir
triunfalmente ao céu e serem coroados, após receberem a palma do
martírio. Dentre os mártires, estava um sobrinho da santa, o noviço
jesuíta Francisco Pérez de Godoy.
Por ser tão grande santa, não causa
estranheza que dentre os seus dons místicos tenha sido galardoada pelo
Espírito Santo com o dom da profecia. Sejam relacionadas ao futuro
próximo ou longínquo, foram diversas as profecias de Santa Teresa, que,
curiosamente, passam despercebidas para muitos de seus devotos e
leitores. Assim, apenas para ilustrar, podemos citar os numerosos
anúncios proféticos que teve de Nosso Senhor sobre a fundação do Carmelo
de São José de Ávila (anos antes de sua concretização), a predição da
morte de seu mestre e amigo espiritual São Pedro de Alcântara, a morte
de uma de suas irmãs, Maria de Cepeda, a morte do jovem Rei de Portugal
Dom Sebastião. Todas as profecias teresianas se cumpriam rigorosamente e
foram uma das provas a favor de sua beatificação.
A leitura do Camino de Perfección,
da pena de Santa Teresa, leva-nos a considerar mais detidamente alguns
excertos dessa obra. Ao longo do capítulo III, voltando-se a Deus Padre,
exclama a aludida santa: “Ó, Pai Eterno, vede que não se podem olvidar
tantos açoites e injúrias e tão gravíssimos tormentos [infligidos a N.S.
Jesus Cristo]. Pois, Criador meu, como podem entranhas tão amorosas
como as vossas sofrer que seja tido em tão pouca conta como hoje por
estes hereges o Santíssimo Sacramento, a Quem lhe usurpam a sua morada,
desmantelando as igrejas? Pai Eterno, Aquele que não teve onde reclinar a
cabeça enquanto vivia, e sempre em tantos trabalhos, mas que agora tem
um lugar para convidar seus amigos, será agora dele apartado? Já não
pagou Ele superabundantemente pelo pecado de Adão? […] Ai que dor,
Senhor! Olhai, Deus meu, os meus desejos e as lágrimas com que Vos
suplico: tende piedade de tantas almas que se perdem e favorecei a vossa
Igreja. Não permitais mais danos à Cristandade, Senhor. Dai já luz a
estas trevas.” E em outros capítulos, ainda discorre sobre a queda de
tantos sacerdotes, o desmantelamento das igrejas, os desacatos contra o
Santíssimo Sacramento, a perda de tantas almas, o afã em se querer
abolir os Sacramentos…
Há de se concordar que duas são as
leituras possíveis para esses fragmentos teresianos. A primeira, a de
uma prece pelos pecados de seus conterrâneos e coetâneos, sobretudo
pelos males feitos pelos huguenotes. Essa é uma leitura válida e a mais
corrente. Porém, as palavras de Santa Teresa, impregnadas de ênfase e de
fulgor, podem ser interpretadas― pensamos nós em nossa humilde
percepção ― como uma súplica profética, um prenúncio dos dias de hoje,
das vagas que sacodem como nunca dantes a Barca de São Pedro. Ou algum
católico de juízo sensato discordaria de que estamos presenciando nesses
dias ondas tempestuosas de confusão e impiedade atingirem a nau da
Igreja?
Nesse ponto, percebe-se uma clara
sintonia espiritual entre as vivas palavras de Santa Teresa e a oração
abrasada de São Luís Maria Grignion de Montfort, presente em seu
famosíssimo tratado mariano. Mutatis mutandis, o que se diz de
um pode aplicar-se ao outro quanto a esse eco profético. Retinem e
causam admiração pela sua aplicabilidade aos nossos tempos as palavras
ígneas deste santo: “Vossa divina lei é transgredida; vosso Evangelho,
desprezado; abandonada, vossa religião; torrentes de iniquidade inundam
toda a terra, e arrastam até os vossos servos; a terra toda está
desolada: Desolatione desolata est omnis terra; a impiedade
está sobre o trono; vosso santuário é profanado, e a abominação entrou
até no lugar santo”. Porventura não é esse o quadro que se mostra a
nossos olhos em relação à Igreja de Deus nesses últimos tempos, com
tantas novidades vãs, estranhas ou até mesmo contrárias à doutrina ou
práxis perenes do Catolicismo?
Mas, ainda que se pense que as
supramencionadas palavras teresianas e monfortinas aplicam-se apenas à
época destes dois baluartes da fé, a questão persiste ainda mais
incisivamente. Se as súplicas elevadas de Santa Teresa eram dirigidas
para as nações europeias quinhentistas, plasmadas, em geral, num fervor
religioso e numa catolicidade atestáveis, o que essa santa não
exprimiria pela Igreja de hoje? Se a oração ardente de São Luís de
Montfort referia-se a uma época em que a França dava à Igreja centenas
de novos sacerdotes a cada ano, inúmeros missionários, uma infinidade de
monjas, em sua maioria esmagadora defensores da sã doutrina, o que não
exclamaria esse Apóstolo da Virgem sobre os tempos de hoje, sobre os
homens e mulheres da Igreja contemporânea? Há dúvida de que não seriam,
em ambos os casos, brados elevados aos céus, petições de misericórdia ao
Altíssimo, por tantos pecados e perversidades que voltam a crucificar
novamente o Divino Redentor e a cravejá-lo de humilhação, indiferença e
desprezo?
E o que fazemos nós? Além da vigilância
constante, da observância do que nos foi transmitido apostólica e
ininterruptamente, afastados de toda inovação suspeita e perniciosa,
devemos suplicar a intercessão gloriosa da Santa Madre Teresa de Jesus,
entregando ao Altíssimo nossas lágrimas e gemidos pela calamitosa
situação em que se encontra a Igreja de Deus, suplicando a Ele, tal como
a grande Reformadora do Carmelo: “Senhor, dai já luz a estas trevas.
Já, Senhor! […] Fazei que sossegue este mar; não ande sempre em tanta
tempestade esta nave da Igreja. E salvai-nos, Senhor meu, que
perecemos.” (Camino de Perfección, Cap. III e XXXV).
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