Coração de Jesus
Afligido por Causa dos
Escândalos do Mundo.
Uma das principais fontes da aflição do Coração de Jesus, no Jardim de Getsêmani, foi a previsão dos escândalos que não cessariam de roubar-Lhe as almas até o fim do mundo. Sem dificuldade o compreendereis, caro leitor, se considerais quanto as almas Lhe são caras.
Deus criou a alma à Sua imagem e semelhança. As outras criaturas foram criadas por um fiat, um sinal de Sua vontade, mas a alma, é como emanada de Seu sopro divino.1 Deus a amou desde toda a eternidade,2 Ele a destinou a reinar no Céu e a participar de Sua glória divina: Eu mesmo, diz Ele a toda alma, pedindo-lhe o amor, Eu mesmo serei tua recompensa infinitamente grande.3
Mas o que melhor demonstra quanto o Coração de Jesus estima as almas, é o que Ele fez para resgatá-las, para retirá-las do abismo da perdição em que o pecado as tinha precipitado.
Uma coisa, com efeito, é estimada pelo preço que um homem prudente quer dar por ela: se então Jesus Cristo derramou Seu Sangue pelas almas, devemos dizer que as almas valem o Sangue de um Deus. O que mais comovia a São Paulo e o abrasava no amor para com Jesus, era o pensamento de que Ele tinha querido morrer não somente por todos os homens em geral, mas ainda por ele em particular: Ele amou-me, dizia São Paulo todo arrebatado, e entregou-Se por mim!4 Esta palavra, cada um de nós pode repeti-la depois dele, porque São João Crisóstomo afirma, que Deus ama tanto cada homem em particular como o mundo inteiro. Assim, cada um de nós não têm menos obrigação para com Jesus Cristo, por ter padecido por todos do que se Ele houvesse padecido somente por um de nós. E quem poderá jamais, pergunta São Lourenço Justiniano, explicar o amor que o Coração de Jesus tem a cada um de nós? Este amor excede o de um filhinho para com sua mãe, e desta para com seu filho: é tal que, segundo uma revelação feita à Santa Brígida, o Senhor estaria pronto a morrer tantas vezes como há de almas condenadas, se elas ainda fossem capazes de Redenção.
Eis aí como Jesus Cristo ama as almas! Julgai por aí, que profunda aflição Ele sentiu no Jardim das Oliveiras, vendo os males que os homens escandalosos não cessariam de fazer, até o fim do mundo, a tantas almas pelas quais Ele ia sacrificar Sua vida. São Leão Magno não temia chamar homicida aquele que dá escândalo; sim, é um homicida mais cruel e ímpio que outro qualquer, porque arranca a vida, não ao corpo, mas à alma, que é infinitamente mais preciosa que o corpo; e por este meio, faz perder ao Salvador todas as lágrimas, todos os padecimentos, todos os trabalhos, que Lhe custaram para resgatá-la. Também São Paulo dizia que aquele que faz cair seu irmão no pecado pelo mau exemplo, peca contra Jesus Cristo mesmo.5 Aí, exclama gemendo Santo Ambrósio, aquele que ocasiona a perda de uma alma, rouba ao Salvador o fruto de trinta e três anos de penas e fadigas!
Isto é o que tornou tão dolorosa a agonia de Jesus no jardim, isto o que Lhe arrancou do Coração esta angustiosa queixa: que me aproveita ir derramar meu sangue, pois que tantos homens, por seus escândalos, tornarão minha Paixão inútil para eles e para os outros? Em resumo, o que os algozes fizeram ao Corpo Sagrado do Salvador padecer quando O crucificaram, os escandalosos O fazem sofrer no Sagrado Coração, arrancando-Lhe as almas mais preciosas para Ele que Sua vida mesma. Sim, diz São Bernardo, os escandalosos fazem a Jesus uma perseguição mais cruel do que aqueles que O crucificaram.
Ah, não aumentemos o número desses assassinos de almas, destes ímpios perseguidores do Coração de Jesus. Evitemos com cuidado, não somente as ações más em si, mas ainda, como quer São Paulo, o que não tem senão a aparência do mal.6 Desenvolvendo a mesma doutrina, o Apóstolo nos ensina, noutro lugar, que devemos algumas vezes abster-nos de certas coisas permitidas, com medo de que sejam pedra de escândalo para as almas fracas.7 Deve-se também velar com muita atenção para não repetir certas máximas do mundo, como sejam: é preciso gozar da vida presente; – feliz aquele que tem riquezas, etc. … Que escândalo ainda não seria, louvar a quem faz o mal, por exemplo, a um homem que se vinga, que entretém relações criminosas, que faz leituras levianas e pouco cristã? Enfim, se um teve a desgraça de dar, no passado, algum escândalo, saiba que tem obrigação grave de reparar pelos bons exemplos o mal que fez. Isto é uma satisfação que exige o Coração amargurado de Jesus.
Prática
Eu quero, durante a Hora Santa, chorar com Jesus Cristo os escândalos que causam a ruína de tantas almas, e buscar em mim mesmo os meios eficazes para os remediar, quanto puder.
Afetos e Súplicas
Ah, meu Jesus, eu mesmo sou um dos desgraçados cujos maus exemplos tem saturado de amarguras vosso Sagrado Coração. Dizei-me, como pudestes sofrer tanto por mim, prevendo as injúrias que eu Vos havia de fazer? Mas, já que me suportastes até agora, não cessando de querer minha salvação, dai-me agora grande dor de meus pecados, dor igual à minha ingratidão. Senhor, detesto do íntimo do coração os desgostos que Vos causei: se, no passado, desprezei vossa graça, no presente a estimo mais que todos os reinos da terra. Eu Vos amo de toda a minha alma, ó Deus digno de amor infinito, e não desejo viver senão para Vos amar; dai-me, Jesus, mais amor; recordai-me sempre o amor que me tendes, a fim de que, meu coração arda sem cessar por Vós, como o vosso Coração arde por mim. Amém.
Oração Jaculatória
Coração de Jesus, ardente de amor para com as almas, dai-me a graça de reparar o mal que fiz.
Exemplo
“Para a reparação é que eu fui posto no mundo, e morro por ela”. Estas palavras são da irmã Maria de São Pedro, e nos revelam sua vida e sua missão. Sua infância foi toda angélica. No dia de sua Primeira Comunhão, ela fez a Jesus Cristo, de seu coração e de todo o seu ser, doação eterna. Poucos anos depois, o Divino Mestre lhe disse: “Eu te quero no Carmo de Tours”. Sua morada espiritual era o Sagrado Coração de Jesus: nesta Fornalha ardente é que ela recebeu tantas luzes para si e para os outros. Jesus lhe comunicou muitas vezes os mais íntimos segredos de seu adorável Coração.
Desde o ano de 1843, Deus lhe concedeu favores extraordinários, e lhe anunciou que Sua justiça estava irritada por causa dos pecados dos homens. Estimulada pela graça, ela se ofereceu a Deus para aplacar Sua ira; então o Senhor lhe inspirou, como poderoso meio de a desarmar, a fundação de uma Associação Reparadora. Ela viu no Sagrado Coração de Jesus o desejo que Ele tem de fazer misericórdia, não pondo como condição senão a reparação dos ultrajes feitos a Seu Divino Pai, e recebeu vivas luzes a respeito da Santa Face do Salvador, que devia ser o objeto sensível da reparação, como o Coração de Jesus é o objeto material de seu amor para com os homens. “Eu vos darei Minha Face, tinha lhe dito Jesus, e quando A puserdes ante os olhos de meu Pai, Minha boca se abrirá para pleitear vossa causa”. Jesus lhe fez então esta promessa: Porque tendes honrado Minha Face coberta de Chagas pelos pecadores, renovarei em vós, na hora da morte, a Imagem de Deus, e todos aqueles que contemplarem sobre a terra as Chagas da Minha Face, ve-la-ão um dia raiando de glória no Céu. Certo dia, depois da Missa, ela correu a lançar-se aos pés de sua Superiora, e disse-lhe: “Nosso Senhor acaba de me dar ordem de dizer e fazer dizer as mais vezes que puder, a invocação seguinte referente ao grande crime de blasfêmia: Louvado, bendito, amado, adorado, glorificado seja sempre o Santíssimo, Sacramentíssimo, adorabilíssimo, desconhecido, inefável Nome de Deus, no Céu, na terra, nos Infernos, por todas as criaturas saídas das mãos de Deus, e pelo Sagrado Coração de Jesus, no Santíssimo Sacramento do Altar”. Pouco depois, a irmã Dubouchet, tornada Madre Maria Teresa, fundou em Paris a Obra Reparadora, dia e noite. O berço da Obra foi a Capela dos Carmelitas, rua Saint-Jacques. Foi nesta época que alguns cristãos animados de fé viva, testemunhas do que se praticava na Capela dos Carmelitas, conceberam o pensamento de se reunirem para dar homenagem a Nosso Senhor durante a noite, no Sacramento de Seu amor. Assim a Obra Reparadora gerou a Adoração Noturna.
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Fonte: O Sagrado Coração de Jesus, segundo Santo Afonso de Ligório, ou, Meditações para o Mês do Sagrado Coração, a Hora Santa e a Primeira Sexta-feira do Mês; coligidas das Obras do Santo Doutor pelo Padre Saint-Omer, C.Ss.R., “Hora Santa” de Julho, pp. 244-249. 5ª Edição Portuguesa, Tipografia de Frederico Pustet, Impressores da Santa Sé. Ratisbona/Alemanha, 1926.
1. Gên. 2, 7.
2. Jer. 31, 3.
3. Gên. 15, 1.
4. Gál. 2, 20.
5. I Cor. 8, 12.
6. I Tes. 5, 22.
7. I Cor. 8, 9.
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