Blog Católico, para os Católicos

BLOG CATÓLICO, PARA OS CATÓLICOS.

"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

segunda-feira, 28 de outubro de 2024

O DIVÓRCIO DIANTE DA CONSCIÊNCIA CATÓLICA.


A IGREJA E O DIVÓRCIO1


Ao lado do aspecto jurídico e social, o divórcio apresenta inquestionavelmente um aspecto religioso.

Jurídica e socialmente, a possibilidade de ruptura do Matrimônio é um mal, um grande mal. É o princípio de instabilidade e dissolução progressiva da família, que, de dia para dia, vai se tornando menos idônea ao exercício de sua elevada missão criadora e educadora da sociedade. A lei que sanciona a firmeza definitiva da vida conjugal, não faz senão declarar um dos artigos da constituição natural da família e proteger contra a força corrosiva das paixões, a integridade perfeita da célula social.

É o que parecem esquecer os divorcistas que reclamam a reforma do nosso direito de família, como corolário da separação entre a Igreja e o Estado. Como se a indissolubilidade fosse uma simples prescrição de direito positivo eclesiástico, sem nenhuma relação com as finalidades imanentes, naturais da sociedade conjugal e com as exigências superiores do bem comum! Cristo, proscrevendo o divórcio, não deu um Preceito novo; reintegrou a família na sua dignidade primitiva: ab initio non fuit sic. É, portanto, a própria natureza das instituições conjugais, são os interesses superiores da sociedade, a verdadeira e comum base jurídica das leis que impõem a monogamia indissolúvel, indiscriminadamente, a todos os cidadãos. Para os católicos, respeitá-las é um duplo dever: de consciência religiosa e de consciência civil. Os acatólicos não terão nas próprias ideias religiosas um estímulo e uma força para os ajudar no desempenho deste dever social. Mas, nem por isso, deixa o dever de subsistir. Também o furto, o homicídio, o adultério, são, para a consciência cristã, proibições de ordem religiosa. Seguir-se-á, porventura, que um Estado “leigo” não os possa e deva interdizer, em nome do bem coletivo, a todos os cidadãos, ainda aos que já não veem no Decálogo a expressão dos Mandamentos divinos? Se ainda uma vez, aqui como lá, a Doutrina e a Moral Católica coincidem com os verdadeiros e mais elevados interesses da sociedade, saudemos nesta coincidência mais um penhor de sua verdade inexaurivelmente fecunda.

Foi sob este aspecto puramente jurídico e social que até aqui viemos considerando o divórcio. Ao combatê-lo, não nos socorremos senão de provas racionais, tiradas à Moral, à Psicologia, à Sociologia e ao Direito. Para admiti-las não é necessário crer, basta raciocinar; elas não se dirigem ao cristão, falam a todo homem. Não lançamos mão, uma só vez, de argumentos teológicos e exegéticos. A Escritura, a voz dos Padres da Igreja, a autoridade do Concílios, muito de caso pensado, não as invocamos no debate. Discutimos, sempre, em nome da razão e dos fatos, a fim de que, as nossas conclusões se impusessem à universalidade dos leitores.

Mas o divórcio apresenta outrossim, um aspecto religioso. Para toda a humanidade a constituição de um novo lar foi sempre um ato sagrado. Para a grande maioria da Cristandade, constitui um Sacramento. É tão nobre a missão da família, são tão íntimos os deveres domésticos, que só na religião se podem atingir as energias profundas, indispensáveis à fidelidade do seu desempenho.

A santidade da família, só às inteligências superficiais, poderá soar como uma frase feita e vazia. As famílias na medida que se vão laicizando, vão cessando de ser famílias. Lar sem Deus, é frágil construção, de que a primeira rajada de paixões violentas, fará um montão de ruínas.

Nos países católicos, mais ainda que nos outros, é funesta a legalização do divórcio. Entre protestantes e cismáticos, a deformação da moral foi precedida por uma alteração da doutrina. A cisão do vínculo, não contrasta com a consciência religiosa do povo. Os divorciados poderão ainda se beneficiar dos auxílios espirituais que lhes pode subministrar um cristianismo diminuído pela heresia ou pelo cisma. A família não será uma vítima infeliz da irreligião.

O Catolicismo conserva, em toda a sua integridade, o tesouro divino dos ensinamentos morais do Evangelho. Com a sua consciência, é incompatível o divórcio. Sancioná-lo por lei num país de maioria católica é introduzir um antagonismo, denso de males incalculáveis, entre a consciência religiosa e a consciência jurídica e civil da nação. Para os cidadãos fiéis ao seu credo, a leis, que permite um ato imoral, é uma lei sem prestígio e a desconsideração da lei é princípio de desorganização social. Para os outros, de convicções religiosas menos esclarecidas ou de vida espiritual remissa, a lei civil transforma-se num fermento ativo de irreligião. O divórcio pedido e aceito por um filho da Igreja, segrega-o da participação aos Sacramentos, que nutrem a sua atividade religiosa e moral. Casal de divorciados católicos, é casal para o qual se estancaram as fontes de energias espirituais, indispensáveis à paz de consciência e à prática do bem.1

1. Se um católico num momento de paixão (os católicos não são impecáveis), dissolve a sua família para constituir outra, a lei sancionaria a segunda união como legítima e lhe imporia todos os deveres respectivos. Amanhã, serenados os atos apaixonados, a voz de Deus no fundo da alma, entra a falar-lhe mais alto que os gritos do amor humano; a consciência cristã acaba por triunfar no desejo sincero de voltar à paz interior. Os deveres que, nesta emergência, se lhe impõem em nome da religião, estão em antagonismo com as obrigações civis. Ele não poderá ser católico sem menosprezar as leis do seu país; não poderá ser fiel aos empenhos civis sem sacrificar as exigências superiores de sua consciência religiosa. Situação infinitamente angustiosa, fonte de amarguras internas indescritíveis, que, num país católico, multiplicaria uma lei insensata em contraste com a liberdade de consciência da maioria dos cidadãos.

Desta maneira, a lei do divórcio, num país tradicionalmente católico, tende a difundir a indiferença religiosa e a subtrair à família estes fundamentos espirituais que, em todos os tempos e entre todos os povos, condicionaram a sua estabilidade e conservação. Com o mecanismo frio dos códigos, o Estado é incapaz de gerar as grandes energias da vida moral, mas ai dele, se pela imprudência de leis corruptoras, vai secar os mananciais misteriosos onde se alimenta o espírito de sacrifício, dedicação, fidelidade e desinteresse, que conservam a vitalidade do organismo social.

Eis porque, na realidade, o divórcio é um instrumento de propaganda irreligiosa nas mãos da impiedade. A lei que dissolve os lares, é um dos pontos do programa do sectarismo anti-católico. Para combater a Igreja e popularizar a irreligião, o anti-clericalismo atira-se contra a família.

Quando se discutia na Itália o projeto Marangoni, um escritor francês, absolutamente insuspeito, G. Sorel, entrevistado por um jornal italiano, Resto del Carlino, depois de afirmar que o divórcio em França pervertera o senso moral, acrescentou: “O divórcio, é quase universalmente considerado como uma medida contra a Igreja; os esposos que se divorciarem, são destinados a separar-se da Igreja Católica e a passar por livres pensadores aos olhos dos seus filhos… É por este motivo que a MAÇONARIA é partidária do divórcio, que pode alienar do Catolicismo um número considerável de famílias ricas, nas quais houve escândalos”.

Da afirmação de Sorel, temos documentos explícitos. Na Rivista della Massoneria italiana,2 o grão mestre Ernesto Nathan, adverte os seus irmãos “de não deixar adormecer na opinião pública a iniciativa maçônica de opor à indissolubilidade dogmática do vínculo conjugal a sua caducidade, quando uma culpa individual a justifique”.2

2. Pouco depois, apresentado um projeto de lei, Nathan, em circular de 5 de maio de 1901 escrevia: “Hoje… quando já se apresentou uma lei sobre o divórcio… dever nosso e vosso é agitar a opinião pública, iluminá-la, realizar conferências, comícios e outras reuniões, votar nelas ordens do dia a serem transmitidas aos vossos representantes na Câmara e ao ministro de Graça e Justiça. Não sendo isto possível, estender requerimentos e petições firmadas pela porção mais escolhida dos cidadãos e enviar-lhes cópias aos deputados do Colégio a fim de que, tomem conhecimento e sejam seus porta-vozes na Câmara. Numa palavra, é preciso mover-se, mas mover-se no mundo profano sem que a loja apareça: mover-se para abalar quem hesita, convidar quem tarda, confortar quem trabalha”. – Entre nós é a mesma coisa. Nas lojas maçônicas fazem-se conferências pró-divórcio; dos prelos maçônicos saem os opúsculos de propaganda, que se distribuem pelas famílias.

Na Itália, a “iniciativa” das lojas não logrou resultado. Mas foi a Maçonaria quem implantou a lei fatal na França, na Hungria, em Portugal3 e em Cuba, onde foi preconizada como meio de “de-romanizar” o país. A virulência com que, em algumas destas nações, o divórcio tem desorganizado a família e descristianizado as massas, bem deixa ver que não se enganou a clarividência dos nossos adversários.

3. Um advogado português escreve, sem excessiva delicadeza: O divórcio não teve em Portugal oposição violenta. ...Foi um estilhaço benéfico da Revolução. ...Não houve um protesto válido. Nem mesmo as feras da reação puderam rosnar embaraçadas com a expulsão dos tolos e congregações”.3 Processos legislativos e estilos literários dizem bem a uma democracia livre e finamente educada! Da lei do divórcio promulgada pela Revolução francesa, afirma L. Michon: “Cette loi sur le divorce est nettement aggressive, dirigée contre les croyantes catholiques”, Le maintient et la défense de la famille par le droit. Paris, 1930, p. 70

Há, portanto, indiscutivelmente um aspecto religioso e antirreligioso na questão do divórcio. Impossível evitá-lo. Tanto mais que os próprios divorcistas não o esquecem e o tratam com uma incompetência dolorosa. Abro o livro de Sampaio e Melo, já outras vezes mencionado, e leio, no capítulo consagrado ao Divórcio e à Religião: “Cristo… não legislou sobre o divórcio… Os Santos Padres, discutindo a doutrina, divergem radicalmente… Nos primeiros séculos se praticava entre os cristãos e sem oposição dela [da Igreja] o divórcio… Só o Concílio de Trento, em 1563, a [a indissolubilidade] estabeleceu definitivamente, resolvendo ao mesmo tempo elevar a Sacramento o contrato do Matrimônio”.4

E estas afirmações são entrelaçadas de fatos imaginários, adulterados, interpretados sem nenhuma crítica. Ao terminar a leitura desta mistura de ideias e acontecimentos, o leitor despreparado ficará com a impressão geral, que o divórcio, não o proibiu Cristo; foi a Cúria Romana (e a este nome se associa tudo o que há de pejorativo), com a sua costumada intolerância, que o foi pouco a pouco impondo aos povos, até elevá-lo arbitrariamente a Sacramento no Concílio de Trento. Os outros cristãos, revoltados contra o Papa, conservaram as suas legítimas liberdades evangélicas; e a própria Roma, quando lho aconselham os seus interesses ou o exigem as paixões coroadas, transige venalmente com o princípio de indissolubilidade.

Este esquema é o lugar-comum, pisado e repisado por todos os paladinos improvisados do divórcio, que lhe tentam a apologia no campo religioso. Dir-se-ia que, em se tratando de hostilizar a Igreja, cessam, com as regras da metodologia científica, os preceitos mais rudimentares da probidade intelectual.

Doutrina, exegese, história, estudemo-las com mais honestidade.



§ 1º – O Divórcio no Novo Testamento

Naturalmente a questão, sobre todas, importante e que domina decisivamente o debate, é a da existência de uma palavra de Cristo contra o divórcio. Há quase vinte séculos (hoje 21 séculos) que a Cristandade inteira, todo o mundo civilizado, O chama, o Divino Mestre. Para os que somos cristãos, sua palavra é infalível; seus Preceitos, são divinos; o que Ele proscreveu não pode ser lícito; e para o gênero humano não haverá grandeza, progresso, bem-aventurança fora dos ensinamentos d’Aquele que é a Verdade e a Vida. Os que, sob pretexto de diminuir desventuras, pregam o que Ele condenou, enganam-se pretensiosamente nas ilusões de um sentimentalismo estéril. Nenhum coração palpitou de amor mais vivo e desinteressado à humanidade, nem de compaixão mais sincera e eficaz pelos seus sofrimentos, do que o Coração de Cristo. Sua lei não é só, no campo intelectual das doutrinas, a expressão inerrável da Verdade; é ainda, no domínio prático das realidades da vida, um jugo suave. Só ela assegura com incomparável eficácia a paz às consciências e a felicidade aos corações.

E não perde o seu interesse esta investigação exegética para os que tiveram a imensa desdita de perder a fé na transcendência divina da mensagem evangélica. Ainda os que tentaram eclipsar da fronte de Cristo a auréola da Divindade reconhecem-Lhe uma autoridade sem par. À eminência isolada de sua sublimidade não se eleva nenhum outro homem; nenhum falou ao gênero humano as palavras de verdade e de vida, que Ele falou. “O Cristo, escreveu Strauss, não poderá ser seguido por ninguém que o exceda ou mesmo, depois d’Ele e por Ele, possa atingir o mesmo grau absoluto de vida religiosa. Nunca, em tempo algum, será possível elevar-se acima d’Ele ou conceber quem Lhe seja igual”.5

Jesus não será excedido… todos os séculos proclamarão que entre os filhos dos homens não nasceu maior; Jesus é a mais alta destas colunas, que mostram ao homem donde vem e para onde deve tender… Tudo o que se fizer fora desta grande e boa tradição cristã será estéril”.6

O valor do seu Cristianismo, afirma por sua vez o reitor da Universidade de Berlim, Harnack, não é condicionado por nenhuma época; para todas é criador de energias… A aparição de Cristo permanece o fundamento único de qualquer civilização moral e na medida que esta aparição se aviva ou empalidece, sobe ou desce a civilização moral de nossas nações”.7

Manifestamente, nas grandes questões essenciais à vida moral da humanidade, não se pode invocar autoridade mais alta.



Ora, sobre a constituição da família, Cristo proferiu palavras que não passam. Então, como hoje, o divórcio, que minava a existência dos povos, estava na ordem do dia. Ao seu tribunal levaram os fariseus um debate que interessava e dividia os ânimos. Foi a oportunidade para ouvirmos uma resposta formal e explícita de Cristo. Abramos o Evangelho:

E chegando os fariseus, lhe perguntavam: É lícito ao marido repudiar a sua mulher? Isto para o tentarem. Mas Ele respondendo-lhes disse: Que é o que vos mandou Moisés? Responderam eles: Moisés permitiu escrever libelo de divórcio e repudiar. Aos quais respondendo, Jesus disse: Por causa da dureza do vosso coração vos deixou escrito este mandamento. Porém, desde o princípio da criação Deus os fez macho e fêmea. Por causa disto deixará o homem a seu pai e mãe e se unirá à sua mulher. E serão dois numa só carne. Assim eles já não são dois, mas uma só carne. O que Deus, pois, ajuntou, o homem não separe. E em casa os seus discípulos O interrogaram de novo sobre o mesmo assunto. E lhes disse: Qualquer que repudiar a sua mulher e se casar com outra comete adultério contra a sua primeira mulher. E se a mulher repudiar a seu marido e se casar com outro, comete adultério”.8

O texto é de uma clareza insofismável: a unidade e indissolubilidade do Matrimônio são afirmadas com uma universalidade que não comporta restrições: Todo aquele, que deixar a sua mulher e se casar com outra é réu de adultério. E a moral impõe a ambos os cônjuges a igualdade dos mesmos deveres e lhes confere a igualdade dos mesmos direitos. Não há privilégios para o marido nem para a mulher.

Ouvimos São Marcos. Passemos a São Lucas. “Todo o que larga a sua mulher e casa com outra, comete adultério; e o que desposar aquela que foi deixada pelo marido comete adultério”.9 Aqui também o teor da lei é universal e não admite exceção. Toda a união contraída pelos cônjuges, depois de separados, é estigmatizada com o ferrete infamante de adultério.



A mesma perícope encontra-se em São Mateus quase com os mesmos termos que em São Marcos. Há, porém, um pequeno inciso que é próprio ao primeiro Evangelista. “Todo aquele que repudiar sua mulher, a não ser em caso de adultério, e casar com outra, comete adultério; e o que se casar com a repudiada, também adultera”.10 Alguns capítulos antes, no Sermão da Montanha, lê-se analogamente: “Também se disse: qualquer que deixar a sua mulher, salvo o caso de infidelidade, a faz ser adúltera, e aquele que tomar a repudiada adultera”.11

Inútil é acrescentar que divorcistas de antiga e nova fama quiseram na frase incidente nisi fornicationis causa, salvo o caso de adultério, uma frincha aberta na inflexibilidade da lei. Cristo no texto evangélico autorizaria o divórcio verdadeiro, com direito a segundas núpcias, no caso de infidelidade conjugal.

Nada, entretanto, menos verdadeiro. Em exegese rigorosamente científica o versículo de São Mateus não pode ser interpretado senão como uma simples separação de corpos sem ruptura vincular. Em entrincheiramentos sucessivos apertemos o assédio até tomar a fortaleza à escala vista.

Colocando o texto de São Mateus em todo o ambiente do Novo Testamento, para logo ressalta que a lei da indissolubilidade foi por Cristo proclamada de um modo absoluto. Em frases que não admitem exceção alguma, como tal a promulgam São Marcos, São Lucas e São Paulo em textos que examinaremos logo. Se houvesse alguma ambiguidade em São Mateus, todas as regras de hermenêutica mandam interpretar os textos obscuros pelos claros e não vice-versa. É o que ensina o simples bom-senso.

Mais. O trecho de São Mateus (XIX, 9) é rigorosamente paralelo dos de São Marcos e São Lucas. Sanciona-se Cristo a possibilidade do verdadeiro divórcio, como explicar o silêncio dos outros Evangelistas, que escreviam para os pagãos recém-convertidos ao Cristianismo em Roma e Grécia? Porventura não devia o Evangelho anunciar-se em toda a sua integridade a judeus e gentios, gregos e bárbaros?

O ambiente histórico do Novo Testamento e o paralelismo dos outros sinóticos não se conciliam com a interpretação divorcista. Mas não é necessário ir tão longe. Repele-a inexoravelmente o contexto imediato do próprio São Mateus. É ler com atenção. Chegam-se a Cristo os fariseus e perguntam-lhe: “é porventura lícito a um homem repudiar a sua mulher por qualquer causa?”.12 Era a questão candente do dia. Moisés havia tolerado o divórcio já existente e para obviar abusos, regulamentara-o com a formalidade do “libelo de repúdio”, imposta ao marido que quisesse deixar a sua mulher, “por alguma coisa de vergonhoso, propter aliquam foeditatem”. Sobre a natureza desta “erváh”, motivo legal de repúdio, a casuística dos rabinos havia multiplicado as controvérsias. A escola mais severa de Schammai restringia-lhe a interpretação ao caso de infidelidade conjugal. Hillel, mais complacente, ampliava a elasticidade do termo a toda e qualquer causa.4

4. Na Mischna, (parte do Talmude, que encerra as leis tradicionais das escolas farisaicas), no tratado sobre o divórcio Gittin IX, 10, lê-se que rabbi Hillel permitira o repúdio por um prato mal preparado; rabbi Akiba, quando o marido encontrava uma mulher mais bela que a sua. Josefo Flávio, Ant. Jud. IV, VIII, 23 admite-o por qualquer causa, ( ) (é a mesma expressão que encontramos nos lábios dos fariseus do Evangelho), e acrescenta ingenuamente: causas de divórcio, os homens as encontram à vontade. Ele próprio despedira sua mulher, mãe de 3 filhos, só porque tinha modos que não lhe agradavam. Vit. 76. – Aí temos, mais uma prova da ação específica do divórcio. Em todas as latitudes e em as raças, seu efeito natural é desagregar lentamente a família, tirando-lhe toda seriedade e respeito para reduzi-la às frivolidades de uma farsa. – Mais tarde os judeus voltaram às tradições puras dos belos tempos. Os repúdios tornaram-se cada vez menos frequentes. Praticamente ao contato dos povos cristãos a indissolubilidade veio elevar a família israelita ao nível de uma civilização superior. A Napoleão, que buscava adeptos aos seus planos divorcistas, respondeu em 1806 a Assembleia dos Notáveis hebreus, por ele convocada: “Antes de os judeus gozarem em França dos direitos dos outros cidadãos, quando viviam ainda sob uma legislação particular que lhes permitia governarem-se em conformidade com os seus usos religiosos, tinham a faculdade de repúdio; mas os casos, em que a usavam eram extremamente raros”. O mesmo se diga dos que viviam na Itália. O senador Vitório Polacco, israelita, quando se agitou a questão do divórcio, afirmou que a pretendida reforma, longe de reivindicar os direitos da consciência hebreia, “prestaria um desserviço à religião dos nossos pais, sob o pretexto de restaurar ideias que só convinham ao tempo deles”. – A palavra de Cristo não havia soado em vão.



Cristo responde: “Não tendes lido que quem criou o homem desde o princípio, fê-los macho e fêmea? E disse: Por esta causa deixará o homem pai e mãe e se unirá à sua mulher e serão dois em uma carne. E assim já não são dois, mas uma só carne. Aquilo pois que Deus uniu, o homem não separe”.13 Com esta resposta, Cristo eleva-se imensamente acima das altercações em que se debatiam as escolas farisaicas. É à instituição primitiva do Matrimônio que Ele vai pedir a lei profunda e definitiva da família. Os sexos são de origem divina. Criou-os Deus para se completarem numa unidade perfeita, destinada à conservação da espécie. A união dos esposos, que constituem uma “só carne”, é tão indissolúvel como o vínculo da paternidade ou da maternidade, indestrutivelmente constituído pela identidade do sangue. A indissolubilidade conjugal é, pois, uma lei da natureza, expressão da vontade criadora. E o que Deus uniu, o homem não pode separar.

Não podia proclamar-se de modo mais enérgico a impossibilidade de qualquer divórcio. E assim o entenderam os fariseus, mas não desarmaram. A lei mosaica oferecia-lhes uma réplica fácil. “E eles replicaram: Então porque mandou Moisés dar carta de repúdio e deixá-la?”14 O grande legislador, de fato, não instituíra o divórcio; encontrara-o preexistente e, para evitar abusos maiores de ódios homicidas, regulamentou-o,15 submetendo-o a várias formalidades. E os Profetas, pelos tempos adiante não cessaram de conservar vivo, entre o povo, o ideal da família. Malaquias, depois da volta do cativeiro, reprova a frequência dos divórcios: “O Senhor é testemunha entre ti e a esposa da tua juventude que desprezaste… Tomai cuidado e não sejais pérfido com a esposa da vossa juventude; eu odeio o que repudia, diz o Senhor Deus de Israel”.16 Na Mischna, no tratado Gittin 10 b, alguns rabinos chegaram a dizer: “O altar chora sobre aquele que repudia a sua mulher”.

À instância dos seus ouvintes, Cristo não cedeu um ponto: “Por causa da dureza dos vossos corações é que Moisés vos permitiu repudiardes vossas mulheres; mas, de princípio não foi assim. Por isso, eu vos declaro que todo aquele que repudiar sua mulher, a não ser em caso de adultério, e casar com outra comete adultério”, etc.17 A autoridade de Moisés, portanto, não é pertinente; foi uma exceção, um regime temporário tolerado à falta de amor (esclerocardia) de um povo de dura cerviz. A lei primitiva do Matrimônio, a lei divina foi outra e a esta cumpre voltar. A oposição entre a economia excepcional, imperfeita e provisória da lei antiga e a constituição normal da família que Cristo veio estabelecer ressalta ainda com mais vivo relevo no Sermão da Montanha: “Também se disse (aos antigos): Qualquer que deixar a sua mulher, dê-lhe carta de repúdio, eu porém vos digo, que todo aquele…”, etc.18 Ora, já o leitor, por si terá visto, como a interpretação divorcista é, de todo ponto, incompatível com todo este contexto imediato, moldura do inciso que vamos estudando. Suponha-se, um instante, que Cristo admitisse a legitimidade do divórcio perfeito, em caso de adultério, e todo o passo de São Mateus se torna incompreensível. A resposta de Cristo coincidira com a exegese mais rigorosa de Schammai, e não se saía da lei comum, nem das opiniões correntes nas escolas da Sinagoga. A evocação da lei primitiva do Matrimônio, a oposição da lei mosaica invocada pelos fariseus, a explicação do seu caráter excepcional dada por Cristo – tudo isto seria um contrassenso. Mais. O Salvador não só não aperfeiçoaria a lei mosaica, mas lhe ficaria muito abaixo. Moisés proibira o adultério sob pena de morte, Cristo tê-lo-ia transformado num título de direito a novas núpcias. Aquele vínculo, que pouco antes se afirmara estreitado pelas mãos divinas e superior a qualquer jurisdição humana, parte-se agora pela vontade criminosa de qualquer dos consortes. Já não é verdade que o homem não pode separar o que Deus uniu: sobre a Onipotência divina, prevalece a malícia humana.

Evidentemente, ver no v. 9 uma autorização do divórcio, é pô-lo em contradição flagrante com tudo o que precede. Não só; mas também com o que se lhe segue. Depois do diálogo com os fariseus, voltaram em casa ao mesmo assunto os íntimos do Mestre. “E disseram-lhe seus discípulos: Se tal é a condição de um homem para com a sua mulher, não convém casar.19 Esta admiração dos Apóstolos seria inexplicável, se a nova doutrina exposta não rompesse com os quadros da mentalidade popular. A indissolubilidade, proclamada em todo o seu rigor universal, pareceu-lhes dura. Ora, à vista da dificuldade, atenua porventura Cristo a inflexibilidade do princípio? De modo algum. Passa a fazer-lhe o elogio da castidade. Como quem diz: o Matrimônio impõe deveres sérios, e não há de evitá-los senão pela continência.



Por último, tomemos o texto entre mãos e o submetamos a uma análise lógica direta. A exceção nisi ob fornicationis causam, como o leitor já terá advertido, vem depois do primeiro membro: todo aquele que repudiar a sua mulher, a não ser em caso, etc. Ora, para inferir o direito a outro casamento, característica essencial do divórcio perfeito, seria necessário subentender ou repetir a restrição também depois do segundo membro. O versículo ficaria então assim construído: todo aquele que repudiar a sua mulher, a não ser em caso de adultério (em que é permitido o repúdio), e casar com outra, (fora deste mesmo caso) comete adultério. Ora, quem não vê que outra deveria ter sido a construção do período, se tal fosse a intenção do autor? Bastaria, nesta hipótese, colocar naturalmente a cláusula restritiva depois dos dois verbos – repudiar e casar. Estava dito tudo, e a frase teria sido uma expressão nítida da ideia. O Hagiógrafo, porém, seguiu outro caminho. Tendo de exprimir duas vezes o seu pensamento, em ambas, com uma disposição algum tanto arrevesada, colocou a exceção exclusivamente depois do primeiro membro em que se fala da separação, legitimando-a em caso de infidelidade. O subentendê-la também depois do segundo membro, seria, portanto, pelo menos, arbitrário. Já não seria ler simplesmente o texto, mas dobrá-lo à violência de uma exegese preconcebida.

Arbitrário só? Não; de todo inconciliável com a última frase do período: “o que se casar com a repudiada, também adultera”. A afirmação aqui é absolutamente universal; a repudiada, de qualquer modo que se tenha separado do seu marido, por adultério ou não, está ainda presa por um laço que não se partiu; quem a ela se unir, adultera. Em nenhuma hipótese, há direito a novas núpcias, divórcio quoad vinculum. É uma questão de simples sinceridade gramatical. Que o diga um protestante, que nos seus lazeres de grande estadista, se dedicava com amor a estudos bíblicos e teológicos. Gladstone, no artigo escrito em 1857 e por nós já citado, escreve: “As palavras dos três evangelistas condenam o segundo casamento da mulher divorciada, eu condenam universalmente em termos que não admitem gramaticalmente outra construção”. Louvando-se, pouco depois, na autoridade do Bispo Midleton “que estudou o uso do artigo no grego helenístico do Novo Testamento, à luz da crítica moderna”, observa como a ausência do artigo no particípio (…), “repudiada” em S. Mateus, como em S. Marcos e S. Lucas, tira toda a possibilidade de equívoco. Só é admissível um significado; não “a” mulher divorciada mas “uma”, “qualquer” mulher divorciada.20 Quem casa, pois, com qualquer mulher divorciada, em qualquer hipótese, adultera. O vínculo conjugal é indestrutível, subsiste por toda a vida dos que se uniram em Matrimônio. É o que já ficara dito acima: o homem não pode separar o que Deus uniu.

Qual, portanto, a única exegese aceitável? Evidentemente a que não vê no texto senão o que nele pôs o seu autor. Parafraseando, o versículo de São Mateus, significa: “O marido que repudiar a sua mulher sem causa, peca, é responsável moralmente pelas faltas que ela poderá vir a cometer: facit eam moechari; no caso, porém, de adultério, é lícita a separação; o marido não deverá responder pelos desmandos de quem já havia quebrado a fidelidade conjugal. Num e noutro caso, o vínculo perdura; os esposos não readquirem a sua liberdade; o homem, se casar com outra, comete adultério e o que se casar com a repudiada também adultera”. Só esta interpretação condiz com a letra do trecho, com o seu contexto mediato e imediato; exige-a o paralelismo dos outros sinóticos e a solidariedade doutrinal de todo o Novo Testamento.

A outra exegese é muito tardia e interessada para ser verdadeira.5

5. Em algumas igrejas orientais, o costume mais antigo de dissolver os casamentos por adultério insinuou-se a princípio como um abuso prático; só mais tarde é que se lhe procurou uma justificação doutrinal, no texto de São Mateus.

Não é na fermentação revolucionária da Reforma (Protestante), quando o ódio a Roma inspirava uma hostilidade sistemática a todas as doutrinas católicas, quando os costumes se desmandavam nas mais abjetas depravações da sensualidade e os chefes protestantes tudo justificavam com a Escritura, desde a violação dos votos religiosos até a poligamia ostensivamente escandalosa,6

6. É sabido como Lutero, num famoso ou infame sermão em Wittemberg, defendeu o adultério e aconselhou a Henrique VIII não a divorciar, mas a tomar uma segunda esposa. – Em documento escrito e assinado por Lutero, Melanchton, Bucero e cinco outros “teólogos evangélicos”, foi permitido a Filipe, landgrave de Hasse, acrescentar à primeira, uma segunda consorte volante. Este “casamento” foi realizado na presença de dois dos signatários da edificante autorização.

que encontramos a atmosfera de serenidade intelectual e moral necessária à investigação desapaixonada da Lei Evangélica que rege a família cristã. Serenados os primeiros estos (ímpetos), não obstante, preconceitos de educação e a influência da mentalidade geral criada por hábitos seculares, hoje, os mais notáveis dentre os próprios exegetas protestantes, voltam à hermenêutica tradicional do Catolicismo. Basta lembrar, entre outros de menor peso, Harnack, B. Weiss, Holtzmann, Th. Zahn, Keil, Alford, Mansel, Thiersch, etc., etc. Os que não são de todo leigos em estudos bíblicos já terão reconhecido, nestes nomes, as primeiras autoridades da exegese protestante e racionalista dos nossos tempos.7

7. Para Harnack, Spruche und Reden Jesu, Leipzig, p. 43, 101: a verdadeira doutrina de Cristo encontra-se em S. Marcos; o texto de S. Mateus deve ler-se sem a cláusula exceptiva cuja origem é por ele atribuída a uma interpolação (introdução) tardia. Holtzmann, Hand-Kommentar zum neun Testament, Tubingen u. Leipzig, 1901, p. 201, afirma que a interpretação da cláusula, nisi etc. no sentido de uma ruptura do vínculo, altera (durchkreunt) todo o ensinamento de Cristo. B. Weiss, Das Matthaeus Evangelium, Gottingen 1898, p. 118, demonstra que a proibição de um segundo casamento, qui dimissam duxerit adulterat, deve entender-se de modo absoluto. Qualquer outra interpretação é arbitrária. Idêntico é o opinar de K.F. Keil, Kommentar über das Evangelium des Mattháus, Leipzig. 1877, p. 167, e de Th. Zahn, Das Evangelium des Matthaeus, Leipzig 1910, p. 243. Mansel, The Speakers Commentary, Matthew, London, 1878-80, p. 102: “the Church of England has never authoritatively sanctioned any other separation than that a mensa et toro; and this with an express prohibition of remarriage, (canon 107)”. De fato, várias igrejas protestantes, como a Anglicana, na Inglaterra e Irlanda, a Episcopal na Escócia e nos Estados Unidos, se na prática nem sempre têm a força para se opor às leis civis ou à degradação dos costumes, em teoria, pelo menos, nos seus livros litúrgicos oficiais, prestam homenagem à verdade da doutrina evangélica. A Conferência de Lambeth que reuniu em 1920 numerosos bispos anglicanos da Inglaterra, Canadá, Estados Unidos e Austrália, aprovou a seguinte resolução: “The Conference affirms as our Lord’s principle and standard of marriage a life-long and indissoluble union, for better, for worse, of one man with one woman, to the exclusion of all others on either side and calls on all Christian people to maintain and beat witness to this standard”. Resolution 67 of 1920, p. 44. Na Revisão do seu Prayer Book, feita em 1915 e 1927, a igreja do Canadá proíbe a assistência religiosa ao casamento de divorciados, com esta rubrica acrescentada ao ofício de solenização do matrimônio: “That no clergyman within the jurisdiction of the Church of England in Canada shall solemnize a marriage between persons either of whom shall have been divorced from one who is living at the time”.Por motivos religiosos e exegéticos foram levados estes protestantes à afirmação da perpetuidade do vínculo. Por motivos de ordem puramente filosófica e social foram anti-divorcistas as mais insignes inteligências nascidas no protestantismo: Leibniz, Hume, Kant, Hegel, Trendelenburg, etc.



Não há, porém, melhor comentador de S. Mateus do que São Paulo. Pregando a Boa Nova, de um a outro extremo do império romano, ao Apóstolo das Gentes se ofereceram inúmeras ocasiões de expor, em toda a sua integridade e clareza, a constituição da família cristã. Destes ensinamentos conservaram-nos as suas Epístolas mais de um testemunho. Aos Romanos escreve o Apóstolo: A mulher que está sujeita ao marido, enquanto vive o marido, ligada está à lei; mas se morrer o marido, solta fica da lei do marido. Portanto, se, vivendo o marido for achada com outro homem, será considerada adúltera; mas se morrer seu marido, livre fica da lei do marido, de maneira que não é adúltera se estiver com outro homem”.21 Evidentemente: o vínculo conjugal, só o dissolve a morte. Mais declaradamente ainda na sua I aos Coríntios, VII, 10: “Quanto àqueles que estão unidos em Matrimônio, ordeno, não eu, mas o Senhor, que a mulher não se separe do marido; que, se está separada fique sem casar ou se reconcilie com seu marido. E o marido não deixe a mulher”. Aqui São Paulo adverte explicitamente: 1º) que a lei da família por ele promulgada não é humana, nem emana da sua autoridade apostólica; vem de mais alto, é Preceito do Senhor, de quem ele é simples porta-voz; 2º) que, de regra, não é permitido aos cônjuges a separação; 3º) havendo, porém, justo motivo de se separarem (S. Mateus apontara o caso de adultério, específico à união matrimonial; há outros, comuns a toda espécie de convivência), aos separados não assiste o direito de se recasarem, mas impõe-se a alternativa da reconciliação ou da continência. Eis ainda uma vez, proclamada em toda a sua esplêndida simplicidade, a lei salvadora da natureza e da honra da família.

Não é, pois, ao Concílio de Trento, que remonta a origem da indissolubilidade do vínculo, como por aí tantas vezes afirmam os teólogos improvisados do divórcio. Há nesta insinuação uma tática desleal. É fácil esquecer que um Concílio Ecumênico representa, nas suas definições dogmáticas, a interpretação infalível dos ensinamentos do Evangelho; é fácil, desfigurando-o, aos olhos de leitores menos ponderados, reduzi-lo a uma assembleia como as outras sujeita às contingências da falibilidade e ao jogo exclusivo das paixões humanas. Combater assim o divórcio, que não tem em sua defesa mais que um grupo de teólogos reunidos em Trento, é menos odioso e tem mais probabilidades de não despertar a reação espontânea da consciência cristã.

Mas o que se ganha em eficácia de propaganda, perde-se em nobreza de sinceridade. Houvesse menos hipocrisia em confessar francamente: nós trabalhamos contra o Evangelho; nós pretendemos legislar mais sabiamente que Cristo; nós amamos mais o homem e zelamos pela sua felicidade com mais desinteresse que o Coração do Divino Crucificado; a civilização do futuro, nós aspiramos construí-la sobre as ruínas da família cristã.

Se a alguma divorcista causar horror a visão clara destas consequências, nem por isso deixam elas de ser a expressão real da verdade. A condenação inapelável do divórcio não partiu de um Parlamento humano, proferiu-a uma Voz mais alta, à qual, sem decair, não pode a humanidade ser infiel.



§ 2º – O Divórcio na História do Cristianismo

Desta Voz divina, cujos acentos vibram uníssonos nos livros inspirados do Novo Testamento, nos Evangelhos Sinóticos como nas Epístolas paulinas, encontramos os primeiros ecos fiéis na pregação e nos ensinamentos da Igreja primitiva. Em todo o império romano, cuja família, minada pelo divórcio, se dissolvia na mais vergonhosa corrupção, a lei da indissolubilidade, promulgada pelo Cristianismo, soa na sua novidade regeneradora, como uma promessa de esperança.

Colhamos um ou outro destes testemunhos preciosos. No Pastor de Hermas, escritor do 2º século, que ainda pertence ao ciclo dos Padres Apostólicos, lê-se a solução do caso de S. Mateus: “Que fará, senhor, o marido, se a mulher permanecer (impenitente) no adultério? Deixe-a, e o homem fique só; e se, despedida a mulher, casar com outra, também ele adultera”.22 São Justino mártir (c. 150): “Quem casa com uma repudiada por outro, comete adultério… Como também os que, em virtude da lei humana, celebram duplo Matrimônio, são pecadores aos olhos do nosso Mestre”.23 Clemente (c. 150 – 211-16), um dos primeiros luminares da célebre escola de Alexandria lembra como, segundo a Escritura, “é adultério, unir-se em Matrimônio enquanto vive o outro dos separados”.24 Orígenes (185-254), o mais ilustre dos seus discípulos: “Como é adúltera a esposa, ainda que pareça casada com outro, vivendo o primeiro, assim também o homem, que aparentemente esposou uma repudiada, de fato não casou, mas perpetuou um adultério. É o que ensinou o nosso Salvador”.25 Tertuliano frisa a oposição entre a nova moral e a corrupção corrente: os pagãos, “ainda quando não repudiam, cometem adultério; a nós, ainda quando repudiamos, não é permitido casar”.26

Se aos testemunhos individuais desta primeira época quiséssemos acrescentar as disposições legislativas dos Concílios, lembramos o cânon 9, do Concílio de Elvira (Espanha), convocado lá pelo ano 306: “A mulher cristã que se separar de seu marido cristão, adúltero, e que casa com outro, deve proibir-se que o faça. E se o fizer não pode ser admitida à Comunhão enquanto viver o marido que ela deixou; em caso, porém, de doença grave se lhe pode dar (a Comunhão)”.

Poucos anos depois, em 314, o Concílio de Arles, formulava uma doutrina análoga para as Gálias.27

Nos três primeiros séculos da Igreja, quando ainda o Cisma não lhe havia dilacerado a Unidade e a pregação apostólica soava mais viva aos ouvidos dos fiéis, é unânime a condenação do divórcio. O que o Evangelho ensinara, as gerações cristãs transmitem com fidelidade. Edg. Löning, que ninguém poderá suspeitar de parcialidade em favor do Catolicismo, confessa-o sem hesitações: “Nos três primeiros séculos não se encontra nenhum testemunho de que a Igreja tenha considerado conforme à Escritura o recasamento de um cônjuge separado, em vida do outro”.8

8. E. Löning, Geschichte des deutschen Kirchenrechts, t. II, p. 697. Com o historiador alemão concorda um scholar anglicano, dos mais abalizados, Oscar Watkins, no seu tratado clássico, Holy Matrimony, Macmillan, 1895, p. 22, 225: “It is most significant that the testimony of the first three centuries affords no single instance of a writer who approves remarriage after divorce in any case during the life the separated partnes, while there are repeated and most decided assertion of the principle that surch marriages are unlawful. No writer is found to advocate or admit the remarriage of the innocent husband. If the voice of the earliest Church is to be heard Christian marriage is altogether indissoluble”. Firmação idêntica já se encontra em Gladstone, Gleanings of past years, t. VI, página 81.



Com o edito de Milão (313), mudaram radicalmente as condições de vida da Igreja. O Cristianismo deixava de ser perseguido ou tolerado, para ver, sancionados pelas leis, os seus direitos a uma existência livre. Sua influência poderosa na reforma dos costumes passava a exercer-se também na esfera das leis.

Desconhecera, porém, de todo a situação real do império, pagão ainda em grande parte, quem esperara ver no dia seguinte ao da liberdade cristã riscado o divórcio da legislação romana. O primeiro esforço dos imperadores cristãos foi restringir a facilidade antiga com que se desfaziam as famílias e estabelecer penas severas contra os transgressores das novas disposições. Já em Constantino, a legislação começa a ressentir as influências renovadoras do lar. A dignidade e emancipação jurídica da mulher, a limitação dos despotismos desumanos da patria potestas, a tutela dos direitos da prole, a estima da virgindade, o respeito à modéstia e pudor feminino, a limitação das causas de divórcio, assinalam na legislação do primeiro imperador batizado, um progresso notável. Os seus sucessores continuaram a legislar sobre a família, mais ou menos sob a influência do Cristianismo.9

9. Dizemos mais ou menos, porque fora injustiça responsabilizar a Igreja pelos atos de imperadores cristãos, que não a consultavam e muitas vezes procediam contra as suas doutrinas. Assim a lei civil, desejando inconsideradamente favorecer as vocações religiosas, declarava dissolvido o casamento em que um dos cônjuges, mesmo sem o consentimento do outro, se recolhia a um convento. Cfr. Justiniano, Novellas, CXXIII; ML, 72, 1057, Gregório Magno, mais de uma vez, reivindicou a indissolubilidade do Matrimônio contra esta disposição injusta. A lei humana, escreve o Pontífice à patrícia Teoctista, pode permiti-lo, a lei divina proíbe-o. Quem sustentasse este erro, deixaria de ser cristão: “quia christiani non sunt, dubium non est. Eosque et ego et omnes catholici episcopi atque universa Ecclesia anathematizamus, quia veritati contraria sentiunt, contraria loquuntur”. ML, 77, 1161. E aplicando a doutrina à prática, no caso particular de uma tal Agatosa, que se queixara de a ter deixado o marido para fazer-se religioso, manda o Papa abrir um inquérito, e se for justa a acusação, restituir o marido ao seu lar, ainda que já tivesse recebido a tonsura monástica: quia, etsi mundana lex praecipit, conversionis gratia, utrolibet invito, posse solvi conjugium, divina hoc tamen lex fieri non permittit”. ML, 77, 1169.

Neste ínterim, começa a irrupção bárbara, que havia de mudar a face da Europa. As novas raças que iam sucessivamente anexando as províncias só Império, fundiam com as próprias leis e costumes as leis vigentes entre os romanos. Assim é que o divórcio se encontra em quase todas estas legislações bárbaro-romanas: Lex Rmana Curiensis, Lex alamannorum, Edictum Theodorici, Lex Bajunwariorum, etc., etc.”.

Pode agora avaliar-se a dificuldade imensa da missão renovadora da Igreja. Era necessário reformar costumes e leis consagradas por uma tradição secular; era necessário pregar a beleza da fecundidade casta, a dignidade da mulher, o valor da criança, a excelência moral do dever sobre o prazer, a um mundo esfacelado pela decadência imperial e sacudido pela invasão de povos rudes, egoístas, sensuais, volúveis e caprichosos. E, esta regeneração profunda devia operar-se no caos de crises sociais e políticas, quais não se encontram em nenhuma outra época da história. Era uma tarefa longa, eriçada de mil dificuldades, superior às forças de qualquer instituição humana. Só a Igreja poderia levá-la a termo. Só Ela possui esta eficácia moralizadora, que desce às profundezas da consciência, para aí sobrepor o dever absoluto às revoltas das paixões; só Ela, nas suas promessas de imortalidade, pode contar serenamente com a colaboração dos séculos; só Ela, na sua fidelidade indefectível aos ensinamentos do divino Mestre pode agir com esta continuidade incansável e coerente, que vence todas as resistências.



E a Igreja não foi infiel à sua missão. O ideal da monogamia indissolúvel tornou-se uma realidade consoladora. Leis e costumes elevaram-se à altura do Evangelho.

Não nos é possível acompanhar todas as peripécias desta luta épica. Se aqui e ali se podem citar nomes de bispos menos esclarecidos ou mais cortesãos, que fraquejaram no combate descendo a transações culpadas, a Igreja, no movimento geral de sua ação moralizadora, conservou sempre a orientação ascensional de quem não desfita os olhos das eminências puras nem perde o ânimo de as atingir.

São primeiro as vozes dos seus grandes Pastores e Mestres a repetir com infatigável insistência os ensinamentos do Evangelho, que os costumes inveterados e as leis conjuravam em proscrever. No Oriente, São Basílio e São Crisóstomo; no Ocidente, Santo Agostinho, São Jerônimo, Santo Ambrósio frisam o contraste entre as tolerâncias legais e as exigências absolutas do Cristianismo. Uma ou outra citação apenas. São João Crisóstomo, depois de comentar a doutrina de São Paulo, conclui: “Nem me cites leis feitas por estranhos, que mandam das libelo de repúdio e separar. No grande dia não te julgará Deus por essas leis, mas pelas que Ele estatuiu”.28 Santo Ambrósio: “Deixas a tua mulher, como que por direito, sem crime, e julgas que assim te é lícito, porque não o proíbe a lei humana; proíbe-o, porém, a divina. Teme a Deus, tu que comprazes aos homens. Ouve a lei do Senhor a quem obedecem também os que fazem as leis: quae Deus conjunxit, homo non separet”.29 Com mais energia São Jerônimo: “Uma é a lei dos Césares, outra a de Cristo; uma coisa prescreve Papiniano, outra São Paulo… Entre nós o que às mulheres não é permitido, tampouco aos homens se permite… Cortando cerce todo e qualquer pretexto, o Apóstolo definiu com a maior clareza que, em vida do marido, é adúltera a mulher que com outro se casar”.30

O que os doutores inculcavam pregando, as autoridades eclesiásticas urgiam legislando. É uma série densa de Concílios particulares e Sínodos regionais, que lembram continuamente as suas obrigações aos fiéis ainda mal impregnados do espírito cristão. O segundo Concílio de Milévio (416), ao qual assistiu Santo Agostinho, declara no seu cânon 17 que: “Segundo a disciplina evangélica e apostólica, nem o que se separou da mulher nem a que se separou do marido podem se casar novamente, mas fiquem assim ou se reconciliem; os que desprezarem sejam reduzidos à penitência. Nesta matéria deve pedir-se a promulgação de uma lei imperial”.31 Este cânon notável mostra-nos, não só como a disciplina da indissolubilidade remonta ao Evangelho e aos ensinamentos Apostólicos, mas ainda os esforços da Igreja para tutelar com as leis civis a consciência religiosa dos fiéis. Condenação explícita do divórcio e proibição de segundas núpcias em vida de um dos cônjuges encontram-se também nos Concílios de Orleans (533), Nantes (650), Hereford (673), Toledo (681), Soissons (744), Friule (791), Roma (826), Paris (829), Worms (829), Nantes (895), Tribur (895). Como se vê durante estes séculos de fermentação intensa, a Igreja urge a observância da perpetuidade conjugal, por toda a parte, na Inglaterra como na Itália, na França e na Espanha como na Alemanha.10

10. Os cânones destes Concílios podem ler-se na Coleção de Mansi ou de Hardouin. Não há um só texto de uma Assembleia verdadeiramente sinodal e puramente eclesiástica que autorize o divórcio vincular. Os divorcistas costumam fazer grande alarde de algumas decisões dos Concílios de Verberia e Compiègne, da época carlovíngia. Realmente, parecem elas outorgar a faculdade de segundas núpcias em alguns casos bem determinados. Lembramos, porém, que estas Assembleias foram ao mesmo tempo Dietas e Sínodos. Os seus decretos eram cânones e capitulares. Ao lado dos eclesiásticos se achavam os representantes do poder civil; o próprio rei Pepino presidia às sessões. Nestes dois Sínodos, como observa Esmein “o poder real tinha por fim atenuar quanto possível as divergências entre a disciplina eclesiástica e a legislação civil”.32 Os decretos então emanados provinham principalmente dos poderes civis. Prova-o a anotação que segue a capitular 18 de Verberia: Hoc Ecclesia non recipit, inexplicável numa lei oriunda da autoridade religiosa. Não temos, portanto, nenhuma certeza que as capitulares divorcistas partissem do elemento eclesiástico ou mesmo fossem por ele homologadas. A muito conceder, poderíamos talvez afirmar que num intuito de conciliação, não houvessem os Prelados oposto uma resistência irredutível. Os decretos de Verberia e Compiègne provam apenas que as autoridades civis ainda conservavam o divórcio, mas, sob a influência crescente da Igreja, já se iam aproximando da legislação canônica. Mais alguns anos, e das leis da França desaparecerá, por quase um milênio, este vergonhoso vestígio do paganismo decadente. – Nenhum outro Concílio da catolicidade fez suas as decisões condenáveis das assembleias francas.

Por seu lado, com mais alta autoridade, intervinham os Papas todas as vezes que as circunstâncias lhes proporcionavam a oportunidade. Inocêncio I, responde em 405 a Exsupério, Bispo de Tolosa, que se devem privar da Comunhão como adúlteros, o homem ou a mulher, que depois de separados houverem contraído segunda núpcias.33 Gregório II por volta do ano 721 nas instruções aos legados da Baviera; o Papa Zacarias ad Pippinum et proceres Francorum (747); Estêvão III que se reporta à carta de Inocêncio I; João VIII numa Epístola escrita em 878 a Ederede, Arcebispo inglês, não cessaram de reafirmar a doutrina católica.

À insistência em promulgar as leis, aliaram os Papas a energia em lhes exigir a execução. Aqui encontravam a prepotência das paixões coroadas. O direito comum dos povos do Norte permitia a poligamia aos seus chefes. Batizados, os reis não quiseram tão facilmente abrir mão deste triste privilégio. Daí conflitos memoráveis. Um dos primeiros foi entre Nicolau I e Lotário II de Lorena. O filho do imperador Lotário I repudiara Teutberga, sua esposa legítima, para casar-se com Waldrada. Não faltaram Prelados cortesãos para aprovar a injustiça real. Nicolau I, convencido da inocência de Teutberga, que para ele apelara, avoca o processo ao seu tribunal, depõe os Bispos mais culpados e cassa a sentença precipitada do Concílio de Metz. O imperador Luiz II, irmão de Lotário, tenta amedrontar o Pontífice e chega mesmo a assediar Roma. O Papa não cede, excomunga Waldrada, ameaça a Lotário de excomunhão e alcança que o rei retome a desditosa rainha. Na França, em contraste frisante com o aulicismo de Mitrados menos dignos, Hincmar, Arcebispo de Reims presta à intervenção papal o prestígio de seu apoio: “defendam-se como quiserem, escrevia ele, se são cristãos saibam, que no dia do juízo, não é pelas leis romanas, sálicas ou gundobadas que hão de ser julgado, mas segundo as leis divinas e apostólicas”.34

Lições de coisas, vigorosas e eloquentes como estas, repetiram-se numerosas vezes na história. Gregório VII (1075-1085) contra Henrique IV; Urbano II (1088-99) e Pasqual II (1099-1118) contra Filipe de França; Celestino III (1191-98) contra Afonso de Leon; Inocêncio III (1198-1226) contra Filipe Augusto de França; Clemente IV (1265-68) contra Jaime de Aragão, mostraram que às leis vitais do casamento a Igreja soube dobrar os mais altos potentados da terra, ou, pelo menos, não lhes deixar a consciência tranquila. Clemente VII resignou-se dolorosamente ao cisma da Inglaterra antes que assinar o ato de adultério de Henrique VIII. Aos seus olhos vale menos um reino que o princípio conservador da família humana.11



11. Os advogados do divórcio costumam muito honestamente passar em discreto silêncio todos estes fatos. Citam, porém, os casos de declaração de nulidade em Matrimônios principescos como exemplos de transação da Igreja quando o exigem os seus interesses. A verdade simples é que a Igreja declara nulos os casamentos que o são, de príncipes ou de plebeus. Se as cabeças coroadas emergem na história, não é culpa dela como não o é tampouco se os seus adversários aproveitam nesta circunstância a possibilidade de uma encenação escandalosa a explorar. – Quanto a ver na declaração de nulidade um disfarce ou uma equivalente do divórcio, é equívoco que não se tolera em foliculários sem responsabilidade, quanto mais em juristas diplomados. Como todo o contrato, o casamento requer umas tantas condições indispensáveis aos seu valor, umas comuns a qualquer contrato (liberdade das partes, etc.) outra, naturais ou positivas ao contrato conjugal (validez, ausência de parentesco próximo, de compromisso anterior, etc.). Em havendo um destes impedimentos dirimentes, o contrato originariamente viciado, não existe. Se o conhecimento de alguma destas circunstâncias é posterior à celebração pública do casamento, é ainda possível, com o processo de investigação da sua existência, uma sentença subsequente que separa os pseudo-cônjuges. Daí ao divórcio vai um abismo. O divórcio cinde (quebra, separa, etc.) um contrato preexistente: a declaração de nulidade verifica a inexistência do contrato. Os motivos invocados para o divórcio são posteriores ao casamento; os que fundamentam a nulidade lhe são anteriores. Estamos em presença de coisas essencialmente diversas. Os Papas declararam nulos alguns casamentos de príncipes; as suas tentativas de divórcio, porém, não as ratificaram nunca.

Esta ação perseverante da Igreja acabou triunfando de todos os obstáculos. “Em princípio, no fim da época carlovíngia a vitória da doutrina ortodoxa da Igreja romana se achava assegurada no império franco ainda que em prática não se tivessem superado ainda todas as correntes contrárias”.12

12. Fahrner, Geschichte der Ehescheidung in Kanonischen Recht, Freiburg i. B. 1903, t. I, p. 92. Mais recentemente, um autor espanhol favorável ao divórcio: “Em presença das disposições contidas nas legislações bárbaras como das acima expostas relativas ao direito ateniense e romano, é possível avaliar quão longa e difícil foi a empresa, que a Igreja investiu e levou a termo”. E. Tarragato, El divorcio en las legislaciones comparadas, Madrid, 1925, p. 33. – “Esta influência da Igreja [para eliminar o divórcio] é visível nas Capitulares, na lei dos Visigodos, nas adições feitas por Carlos Magno à lei lombarda e é impossível negar que é à sabedoria e perseverança do Clero das Gálias que devemos esta legislação tão pura do casamento, ainda hoje glória e superioridade das uniões católicas”. E. Laboulaye, Recherches sur la condition civile et politique des femmes, Paris 1843, p. 157. – “Foi pela Igreja cristã que a família foi mantida, defendida… O direito canônico tomou nitidamente a ofensiva contra os elementos e tendências hostis à família, elementos de dissociação que existiram em todos os tempos. E sob a sua ação e influência, a família foi transformada, fortificada, quase poderia dizer-se, criada. É com efeito, o direito canônico, o verdadeiro criador da concepção moderna da família legítima e do casamento que lhe constitui a base”. Maurice Kroeli, em Le maintien et la défense de la famille par le droit, Paris. Recueil Sirey, 1930, p. 29.

Um pouco mais cedo, um pouco mais tarde, a mesma vitória era um fato em toda a Cristandade Ocidental. E os costumes acabaram pautando-se pelas leis. A monogamia indissolúvel, que, mesmo no sentir dos divorcistas radicais, constitui o ideal mais elevado da família humana, a Igreja transformara-o numa realidade. As dificuldades ingentes que a doutrina evangélica encontrara nos costumes dissolutos do império decrépito ou na rudeza das raças novas, umas após outras cederam à tenacidade eficaz de sua influência moralizadora. Romanos e francos, celtas e normandos, lombardos e visigodos, magiares e alnglo-saxões haviam elevado o padrão da vida conjugal, preparando com a reabilitação da família, a estabilidade e o progresso da vida social. A Igreja acabava de conquistar os títulos de uma das maiores benemerências na história da civilização.

Homenagem a esta verdade folgamos em colhê-la dos lábios insuspeitos de adversários do mais alto valor intelectual. Laurent, o célebre jurisconsulto belga que tantas vezes e tão injustamente agrediu o Catolicismo: “É um título de glória para a Igreja o haver difundido nos ânimos esta ideia da perpetuidade na família, e, não o esqueçamos, a moralidade é uma condição de existência para as sociedades”.35 O Catolicismo, dizia Ruggero Bonghi, escreveu aqui a sua mais bela página; reconheçamo-lo porque o diz toda a história, porque o dizem todos os escritores que sabem o que escrevem”.13

13. No Congresso jurídico de Florença de 1891, cfr. G. B. Biavaschi, La moderna concezione filosofica dello Stato moderno, Milano, s.d. p. 361. Troplong, primeiro presidente da corte de Cassação em França: “A Igreja lutou… e o Matrimônio saiu vitorioso e elevou-se à verdadeira altura em que o havia colocado o Cristianismo. Graças a esta restauração ficou sendo um Sacramento na ordem espiritual e um laço indissolúvel na lei. E este é um dos maiores serviços que a Igreja prestou à civilização moderna”. Le Droit civil expliqué, Du contrat de mariage, t. I, 2, Paris, 1851, Préface, p. VI. “O casamento indissolúvel que o direito canônico propagou, foi, na realidade um dos maiores benefícios prestados à sociedade humana, que, com ele ganhou momentos de segurança, como nunca os teve enquanto houve e reinou a dissolubilidade do vínculo matrimonial”. Almáchio Dinis, Tratado do divórcio, Rio, 1916, p. 60.



Mas as paixões não desarmam contra as exigências superiores da moral. O Protestantismo achou-lhes a oportunidade do desafogo. Quando os reis da Inglaterra queriam ter 7 mulheres sucessivamente substituídas ao sabor da lascívia infrene; quando os príncipes da Alemanha sancionavam do alto, com o exemplo de segundas núpcias oficiais, o escândalo da poligamia; quando os pregadores do “novo Evangelho” permutavam entre si as esposas desonradas, reapareceu o divórcio na história da civilização.14 Esta atmosfera de relaxamento, degenerescência e, dissolução dos costumes, em que se lhe embalou o berço do renascimento infausto, bem deixa ver a natureza dos fatores morais que o inspiraram.

14. Staphylus escrevia em 1562: “Relativamente ao Matrimônio há quase mais honestidade e dignidade na Turquia que entre os nossos evangélicos da Germânia”. Nachdruck sur Verfechtung etc., Ingolstadt, 1562, fol. 2026. Sobre a decadência da ética conjugal, o desprezo da mulher, a dissolução geral dos costumes no tempo da Reforma, cfr. Leonel Franca, A Igreja, a Reforma e a Civilização, Rio, 1928, pp. 439-458.

Como em tantos outros pontos, também aqui a Revolução religioso-social do século XVI assinala um retrocesso na marcha da evolução humana. Desassombradamente censura Aug. Comte esta “grave alteração que por toda a parte sancionou o Protestantismo na instituição do casamento, primeira base fundamental da ordem doméstica, e, portanto, da ordem social”. Só a “poderosa influência” dos costumes “neutralizou os seus efeitos deletérios”.36 Hoje, o fundador do Positivismo já não acrescentaria esta restrição. Um germe patogênico pode incubar por muito tempo num organismo aparentemente sadio e só depois manifestar, em toda a intensidade, a sua virulência específica. São assim os desacertos cometidos na constituição da sociedade conjugal; produzem os seus “efeitos deletérios” a longo prazo.

Ante esta nova tentativa social de reconduzir a família à decadência das eras pagãs, a Igreja não mentiu à sua missão civilizadora. No campo da prática intensificou a eficácia de sua ação espiritual para regenerar os costumes que haviam sensivelmente decaído com o neo-paganismo da Renascença. Na esfera superior dos princípios, afirmou do modo mais solene, a onímoda indissolubilidade do vínculo conjugal de um Matrimônio consumado. Tal é a significação do Concílio de Trento, tanto na elevação moral de suas disposições disciplinares como na clareza irreformável de suas definições dogmáticas.

O cânon 5 da sessão XXIV explicitamente declara oposto à doutrina católica: “si quis dixerit propter haeresim, aut molestam cohabitationem aut affectatam absentiam a conjuge dissolvi posse matrimonii vinculum”. É a condenação incondicionada do divórcio por deserção voluntária (affectatam absentiam), por excessos, sevícias e injúrias graves (molestam cohabitationem).

Restava ainda o caso do adultério, em favor do qual se invocava o texto, já estudado de São Mateus. O Concílio consagra-lhe um cânon inteiro, o 7º, em que se define a infalibilidade da Igreja na interpretação da doutrina autêntica de Cristo: Cessaria de ser católico quem afirmasse “errar a Igreja quando ensina, conforme a doutrina dos Evangelhos e dos Apóstolos, que, por adultério de um dos cônjuges não se pode dissolver o vínculo do Matrimônio, e que ambos os cônjuges, ou só o inocente que não deu motivo ao adultério, não podem contrair novas núpcias em vida do outro, e que é adúltero o que, deixada a adúltera, se casa e a que, deixada o adúltero, se une a outro marido”.

Contra as inovações protestantes a Igreja defende, em toda a sua integridade, a doutrina de Cristo. A definição conciliar não cria o dogma da indissolubilidade; opõe a verdade antiga ao erro que nasce. Os Padres tridentinos invocam no século XVI evangelicam et apostolicam doctrinam, como mais de mil anos antes para ela apelavam na igreja africana os membros do Concílio de Milévio. Numa continuidade ininterrupta, a Igreja vai repetindo às gerações, os ensinamentos eternos da Verdade que não passa.15

15. Não nos é possível expor aqui em toda a sua amplitude a doutrina católica do Matrimônio. Para quem desejar empreender este estudo, damos a seguir algumas indicações bibliográficas. Entre os grande teólogos post-tridentinos que trataram largamente do assunto, merecem serem lembrados: Ledesma, De magno matrimonii sacramento, Salamanca, 1592; Sanchez, De sancti matrimonii sacramento, Genova, 1592; Bellarminus, De controversiis, t. III. Entre os teólogos modernos e contemporâneos mencionados: J. Carrére, De matrimonio, 2 vols., Paris 1837; A. De Rokovány, Das Eherecht der kath. Kirche nack seiner Theorie und Praxis, 5 vols., Viena, 1856-1857; Palmieri, De matrimonio christiano, Roma, 1880; Rosset, De sacramento matrimonii, 6 vols., Roma, 1895-96; Van de Burgt-Shaepman, De matrimonio, 3ª ed., 1908; A. Knecht, Grundriss des Eherechts, Freiburg i. B. 1919; Leitner, Lehrbuch des kath. Eherechts. Paderborn, 1920; F. Schönsteiner, Grundriss des hirchlichen Eherechts, Wien 1924; J. Linneborn, Grundriss des Eherechts nach dem Codex juris canonici, Paderbon, 1933; G. Joyce, Christian marriage: a doctrinal and historical Study, London, 1933. Podem consultar-se ainda as obras teológicas e canônico-morais de Wernz-Vidal, Cerato, Cappello, Schäfer, De Smet, Vermeersch, Gasparri, Aichner, Schern, etc., etc.



§ 3º – A Concepção Cristã da Família

O Matrimônio, portanto, é, no Magistério infalível de Cristo, indissolúvel. Esta indissolubilidade não é um Preceito positivo do Evangelho, mas uma propriedade inerente à própria natureza da sociedade conjugal. O Cristianismo elevou à sua dignidade primitiva e à altura de sua missão social, a instituição da família que as paixões humanas haviam deformado e corrompido. Para esta reabilitação era necessário incutir eficazmente nas consciências a noção e o respeito da personalidade humana. Orientar o homem para Deus era dar-lhe e garantir-lhe toda a grandeza de seu valor.

* * *

Dentro do pequeno âmbito da sociedade doméstica, o primeiro beneficiário desta profunda revolução foi a criança. No paganismo, o filho era uma coisa, um meio de que se servia discricionariamente a cidade ou a família para os seus fins egoístas. A patria potestas exorbitava no mais ilimitado despotismo. A existência e a liberdade dos nascidos dependiam de um aceno do pai, que a um podia enjeitar, a outro vender, a outro ainda tirar a vida. A Igreja começou proclamando a dignidade da criança, pessoa humana com direitos inalienáveis e imprescritíveis, alma imortal destinada à felicidade da visão divina. Aos direitos na prole, corresponderam deveres nos pais. Deveres de respeito absoluto à vida que procriaram; deveres de subministrar todos os meios indispensáveis ao desenvolvimento físico, moral e intelectual das novas existências em flor. O aborto e o infanticídio apareceram em toda a hediondez de sua gravidade.

Ao lar impôs-se a urgência de um saneamento moral, para que a sua atmosfera não fosse mortífera às novas consciências que se deviam formar para o bem. Desde as cenas de sensualidade degradante dos gineceus até as altercações escandalosas o respeito à personalidade da criança. O maxima debetur puero reverentia, que nos lábios pagãos, não passara de uma bela frase, transformou-se, entre cristãos, numa realidade viva. Os pais entraram a sentir toda a grandeza de sua missão. O esforço contínuo para o próprio aperfeiçoamento afigurou-se-lhes uma das suas mais altas exigências. Garantir ao filho um lar, conservar-lhe, com a prática cotidiana das virtudes domésticas, toda a sua eficácia educativa não era um dever correspondente a um dos mais fundamentais entre os direitos da prole? Restituída assim a família à integridade da sua constituição original, ditada pelos seus objetivos essenciais, eliminou-se naturalmente o divórcio, como expressão autêntica do egoísmo conjugal.

* * *

Com a do filho reintegrou-se ao mesmo tempo a dignidade da mãe. O pagão desejava a mulher, não a amava; sentia-lhe os atrativos, mas desprezava-lhe a fraqueza, via nela um instrumento de prazer, não a respeitabilidade de uma consciência. Exceto em Roma, onde nos melhores tempos se cercou a matrona de certa consideração, por toda a parte, a metade mais forte do gênero reduziu a mais fraca à triste condição de escrava. O eros, sentimento que aproximava os sexos, não passava da sensualidade na sua pura expressão animal.16

16. Notou-o Chateaubriand: “O que nós chamamos propriamente amor, é um sentimento de que a antiguidade ignorou até o nome. Foi só nos séculos modernos que se formou este misto dos sentidos e da alma, esta espécie de amor de que a amizade é a parte moral. É ainda ao Cristianismo que se deve este sentimento aperfeiçoado; é ele, que tendendo sempre a purificar o coração, conseguia envolver de espiritualidade a tendência que dela menos parecia suscetível”. (Génie du Christianisme, II, P. 1, III, c. 2)



Do Cristianismo é que nasceu o verdadeiro amor humano, ágape, que, começando na esfera inferior dos sentidos remata na espiritualidade mais elevada. O pudor, o desejo de sacrifício, o respeito, a dedicação constituem-lhe os elementos morais. A mulher voltou a ser o que Deus a fizera, a companheira semelhante ao homem, adjutorium simile; diferente nas funções que lhe são atribuídas, igual na dignidade do valor. Antes de tudo, nada de precário, de incerto, de provisório. A sua sorte não depende dos caprichos da sensualidade masculina, nem da caducidade das graças exteriores. O Matrimônio estável, duradouro, oferece-lhe, como uma garantia moral, o tempo e a oportunidade de desenvolver todas as virtudes de longanimidade, constância no afeto, generosidade incansável na dedicação, tão próprias da psicologia feminina. Na medida que se consolidam e moralizam as famílias, eleva-se em nobreza, respeito, honra e grandeza a condição da mulher. Se a hierarquia ordem, essencial à unidade da vida doméstica lhe exige a submissão ao marido, a este, a consciência cristã impõe como deveres fundamentais o amor, a dedicação, a preocupação constante de assegurar a felicidade de sua companheira, imolando-se por ela a exemplo de Cristo, que todo se sacrificou pela sua Igreja.17

17. “As mulheres sejam sujeitas aos seus maridos, como ao Senhor… Maridos, amai as vossas mulheres, como também Cristo amou a Igreja e se entregou a Si mesmo por Ela, a fim de santificá-La, purificando-A no Batismo da água pelo Verbo da vida”. Ad Ephesios, V, 22-26. Que perspectivas sublimes rasgam à família cristã, estas palavras de Paulo, a destoarem, num magnífico contraste de pureza e elevação, com a degenerescência contemporânea da família pagã!

Nem subserviências degradantes nem tiranias opressivas, mas um ambiente de ordem, de paz, de harmonia das vontades, de respeito mútuo, alimentada pelo amor vivo e sobrenatural, que enlaça para sempre as almas na presença de Deus.18

18. Para que se veja, na prática, a elevação e nobreza de sentimentos com que se unem os esposos cristãos, transcrevemos para aqui estas notas íntimas de uma memória de família: “A doce e simpática fisionomia da minha Gina já me havia impressionado a primeira vez que entrei naquela casa. Isso se deu poucos dias depois que, saindo uma tarde de S. Alexandre, onde havia pedido a Deus que me concedesse uma companheira segundo o seu Coração, senti indistintamente em mim, que a encontraria na casa Buccellati, onde, aliás, ainda não havia posto os pés… De então para cá pus-me a estudar-lhe atentamente o caráter e o espírito cristão, sem o deixar transparecer, pedindo todos os dias ao Senhor que me iluminasse. A educação extremadamente moral da família, a virtude serena dos pais, as próprias estreitezas materiais em que se achavam pareciam indicar-me que aquela era a família feita para mim… Esta união, tenho fé, foi querida e determinada por Deus e por Ele abençoada. Que até ao último dos nossos dias nos conceda educar para Ele os nossos filhos, melhorar-nos reciprocamente e não visar outro prêmio senão Ele só!” C. Pellegrini, Vita di Contardo Ferrini, Torino, 1928, pp. 1-2. Assim se uniram os que tiveram a glória de serem pais de Contardo Ferrini, o maior romanista italiano dos tempos modernos, e um santo que talvez brevemente iremos venerar nos nossos altares. Que distância entre esta atmosfera de pureza e elevação de sentimentos e a precipitação de certos casamentos norte-americanos contraídos hoje para se desfazerem amanhã ao primeiro atrito dos egoísmos intratáveis! Com a diferença, a família não ganhou em dignidade moral nem em felicidade!

Para a realização deste ideal, proposto às inteligências em toda a nitidez do seu esplendor, o Cristianismo robusteceu as vontades com o auxílio de graças especiais. O contrato natural que funda uma família humana, foi por Cristo elevado à dignidade de Sacramento da Nova Lei. Entre os cristãos, contrato e Sacramento são inseparáveis, porque o Sacramento não é uma adição acidental, mas o próprio contrato, que, por instituição divina, confere aos contratantes as graças indispensáveis ao desempenho de seus deveres conjugais. Ministro, portanto, deste Sacramento, não é o Sacerdote, que assiste ao Rito como testemunha oficial da Igreja, são os próprios nubentes que o realizam com a reciprocidade do seu consentimento.

Com esta dupla ação sobre as inteligências e as vontades, iluminando e fortalecendo, promulgando a lei e subministrando estímulos eficazes à sua execução, conseguiu a Igreja regenerar a família e transformá-la na instituição mais benemérita do progresso humano. Na família cristã tudo se organiza em vista do futuro. “Não devem os filhos entesourar para os pais, mas os pais para os filhos”. 2 Cor. XII, 14. A palavra de São Paulo ultrapassa, na universalidade de suas aplicações, o domínio estreito das preocupações materiais. O egoísmo pagão sacrificava os filhos aos pais, o futuro ao passado. O Cristianismo restabelece a verdadeira hierarquia dos valores domésticos. Para a prole, para a sua existência, conservação e desenvolvimento devem os pais ordenar a convergência das suas solicitações. Depositários do imenso patrimônio de civilização material e moral, acumulado pelo trabalho dos séculos, eles num esforço que lhes dura quanto a vida, o transmitirem, íntegro, aos que os hão de continuar, como o mais precioso dom da geração que passa à geração que surge. Assim nas grandes ascensões alpinas cada elevação que se galga hoje será amanhã o ponto de partida, donde em novas arrancadas se conquistarão eminências mais excelsas. Na marcha das gerações humanas através da história esta é a fórmula autêntica do seu contínuo progresso, e a família, a condição essencial da sua realização.19

19. Nada mais ridículo que ouvir a certos panegiristas do divórcio recomendarem-no em nome do progresso! Como se progredir fosse levantar-se para tomar assento um pouco mais à esquerda! Progride o apologista do divórcio em relação ao defensor da indissolubilidade. Para os protagonistas da união livre, que é uma queda abaixo da animalidade, o divorcista não passa de um retardatário tímido e incoerente, que não se atreve a tirar as derradeiras consequências dos seus princípios. – Fator do progresso, uma alteração da família que a desadapta ao exercício das suas funções essenciais! Fator de progresso uma consagração legal do individualismo destruidor da solidariedade que condiciona a existência e o desenvolvimento da vida civil! Progresso, o divórcio! E tão depressa se esqueceram as lições da história! Revolvam-na com diligência e lá o encontrarão, costumes muito antigos, contemporâneo de todas as civilizações decadentes.

Subordinando assim o que passa ao que vem, prepara-se um porvir melhor e não se lhe sacrifica a felicidade do presente. Quando vivem todos para os filhos é que melhor atingem os pais a plenitude de sua expansão vital. As solicitudes materiais da educação estimulam nobremente o trabalho, ensinam a economia, desenvolvem a previdência, cerceiam as demasias do luxo e impedem o desbarato das riquezas em dilapidações suntuárias e estéreis. Os cuidados da formação espiritual dos caracteres novos são o mais forte incentivo ao próprio aperfeiçoamento moral dos adultos. Espelhos onde se miram os pequenos, modelos pelos quais se vão aperfeiçoando as suas alminhas, plásticas e instintivamente imitadoras, os pais encontram na responsabilidade contínua de suas funções, o segredo de uma força espiritual, eficazmente preservadora de quedas e inexaurivelmente inspiradora de virtudes. No lar, como em tudo o mais, dando-se com generosidade é que o homem se realiza em toda a sua perfeição. No egoísmo, isolador, a atrofia, a esterilidade, a morte. Na doação de si mesmo, levada com magnanimidade até aos sacrifícios exigidos pela ordem universal, a expansão completa do ser, o desenvolvimento das mais belas virtualidades humanas, as alegrias íntimas e serenas de colaborar para um bem mais alto, sincronizando o palpitar efêmero da própria vida com o ritmo das harmonias divinas da criação.

Eis, em toda a sua grandeza, a família cristã. Da esfera dos sentidos em que se iniciara, eleva-se até as regiões mais espirituais e às finalidades mais nobres da vida. Conservadora e propagadora da espécie é o elo de união entre o presente e o futuro. Une os sexos com os vínculos dos afetos mais sólidos e duradouros; relaciona as idades nos elos ininterruptos de um amor dedicado que ampara os cansaços da velhice e protege as fraquezas da infância. É a escola onde se aprende a subordinação da força ao direito, o primado da razão sobre os instintos, o sacrifício do egoísmo aos interesses superiores do bem comum.

Sem esta família, não é possível uma civilização digna do homem e sem o Cristianismo, não é possível defender longamente a dignidade da família contra os assaltos violentos das paixões. Cristo não falou em vão. Depois que na plenitude da história soou a Sua voz, feita toda de Verdade e de Vida, a humanidade não pode sem cair, ser infiel aos Seus ensinamentos. Para os que têm fé, esta afirmação tem a evidência de um axioma; para os que não a têm, representa a certeza de uma conclusão histórica. Desta lição de fatos, podem todos colher o que da história francesa colheu Taine:20

20. “A fé, é o grande par de asas indispensável para sustentar o homem acima de si mesmo… Quando estas asas desfalecem, ou se quebram, degradam-se os costumes públicos e privados… Só o Cristianismo é capaz de nos deter no pendor fatal de travar o declínio insensível, com que continuamente e de todo o seu peso original, a nossa raça retrograda para os abismos”37

E é principalmente pela sua ação sobre a família que se exerce esta influência preservadora. Com admirável perspicácia viu-o Gladstone, quando uma vez disse a E. R. Russell:21

21. “Após longas reflexões, estou convencido que, em torno da santidade do Matrimônio travará o Cristianismo a sua grande batalha”. “Só o Cristianismo, acrescentava o grande estadista, pode salvar a sociedade”.38 “Todas as vezes, continua um filósofo francês mais recente, todas as vezes que marchamos nas suas direções, caminhamos para a justiça, para uma civilização melhor; todas as vezes que nos afastamos das vias por Ele traçadas e sob pretexto de progresso invertemos a ordem dos fins que nos assinalou, assistimos a um recuo da moralidade e da verdadeira civilização”.39

Indivíduos e povos que pretendem corrigir a Lei de Deus, trabalham para a própria infelicidade.


Divórcio de Napoleão I e Josefina, em 1809.

CONCLUSÃO

A questão do divórcio põe, uma em face da outra, duas concepções antagonistas da vida. Ou a razão é a reguladora da atividade humana, impondo-lhe os seus ditamos objetivos e universais como deveres absolutos – e o casamento é indissolúvel; ou a arte de viver não reconhecer outro critério senão a regra instável e contingente das conveniências ou satisfações individuais – e o divórcio se justifica. Opta por uma destas alternativas, é decidir a própria existência da moral.

Não há, com efeito, um só dos princípios invocados em favor do divórcio que, nas suas consequências, não comprometa todo o valor da consciência. Liberdade individual, direito à felicidade, emancipação do amor, todos eles resumem-se em última análise, num só: quando não se sentem bem, podem os cônjuges separar-se para constituir novas famílias. A esposa que está desgostosa com o marido, o marido a quem não agrada a esposa, quebrem os laços de uma união que já ou não faz felizes e recomecem as suas aventuras conjugais. O homem a quem não se lhe dá da ausência da consorte, não pedirá divórcio por deserção voluntária do lar; a mulher que não sofrer da solidão, não irá desfazer-se do marido internado numa penitenciária ou num hospício. O critério único e decisivo na ruptura do casamento é o mal-estar dos casados. Ante este motivo supremo cedem as exigências essenciais da instituição conjugal, os interesses inegáveis da prole, as vantagens superiores do bem social. A todas estas vozes que reclamam um sacrifício do seu orgulho ou da sua sensualidade ou ainda dos seus mais legítimos interesses não prestam ouvidos os beneficiários do divórcio, entrincheirados na intratabilidade do seu egoísmo feroz. Consagração suprema do egoísmo é, pois, inquestionavelmente, o divórcio.

Ora, o egoísmo é a negação mesma da moral. O dever que incomoda não obriga. A lei, penosa, já não é lei. A fidelidade à consciência não vai alm das fronteiras do sacrifício. A honestidade de uma ação confunde-se praticamente com a soma de vantagens imediatas, que dela se podem auferir. Dever, lei, consciência, honestidade não têm valor absoluto; vergam, prescrevem, emudecem, capitulam, todas as vezes que o reclamarem os interesses individuais. A norma do bem agir já não é a razão, são as paixões; já não é a virtude, são os prazeres. Ante as usurpações do egoísmo entronizado, abdica a moral o seu cetro inútil e sem autoridade.

Mas não é possível limitar arbitrariamente as consequências lógicas de um princípio. A evolução interna das ideias obedece a um dinamismo incompreensível. Introduzida no domínio dos deveres domésticos, a consagração suprema do egoísmo, que a tese do divórcio envolve, irá bem cedo repercutir em toda a vasta esfera da ética individual e social. Em nome da própria felicidade podem os cônjuges descontentes pisar todos os direitos e faltar à fidelidade de compromissos. Por que, quando se acham em jogo os seus interesses pessoais, não será também lícito ao magistrado conculcar a justiça, ao negociante quebrar a lealdade dos seus pactos, ao soldado atraiçoar a sua pátria? Assim, o germe dissolvente irá contaminando aos poucos todos os costumes públicos e privados e preparando a desagregação completa da sociedade.

E aqui temos a razão profunda do sincronismo, tantas vezes assinalado, entre o aumento dos divórcios e a decadência das nações. O povo que já não suporta a indissolubilidade, é um povo moralmente fraco, escravizado à tirania dos instintos e incapaz de governar as suas paixões pelas normas superiores do espírito.

Se o princípio do divórcio é sancionado pela lei agrava-se sobremaneira a intensidade do mal. Os desmandos dos indivíduos, ainda que se multipliquem, conservam sempre um caráter episódico, constituem uma anomalia que, na sua oposição aos princípios consagrados pela autoridade social, traz a sua própria condenação. É uma desordem de fato, não é uma perversão do direito. Mas se o desregramento passa dos costumes para a lei, a depravação torna-se imensamente mais profunda. A uma crise da moralidade sucede a crise da moral. Já não nos achamos diante de vontades que acidentalmente capitulam ante as paixões, mas da razão social desgarrada oficialmente da verdade que salva. “Se basta uma só ideia falsa para depravar um homem, que seria para uma nação o efeito de um princípio absurdo de que ela fizesse a base de sua legislação”.40 Nas leis puras, os costumes corrompidos podem encontrar sempre o seu princípio de regeneração. É sempre possível voltar de extravios quando a estrada real fica assinalada pela visibilidade dos seus marcos luminosos. Mas, se se corrompem as leis, de onde esperar a energia salvadora? Quando se extinguem os faróis, como evitar o naufrágio?

A introdução do divórcio na história de um povo já habituado a uma vida conjugal indissolúvel, marca inegavelmente uma decadência. A lei que tão de perto interessa a constituição da família não é uma lei como as outras leis que hoje se votam e amanhã se ab-rogam. Ela vai alterar a intimidade dos afetos domésticos, comprometer a formação das novas gerações, criar um antagonismo entre a consciência religiosa e a legislação civil, consagrar um princípio dissolvente da moralidade. Os efeitos produzidos nos costumes pela sua ação nefasta não se anulam depois com uma simples revogação parlamentar. Na rampa escorregadia que vai da boa educação à licença, resvalar insensivelmente é fácil: reacender, quase impossível. Os desacertos de governantes inconsultos podem romper os diques da disciplina social à impetuosidade das paixões sempre inclinadas ao mal. Mas a remoralização de um povo decadente, quando ainda realizável, só a pode levar a termo uma destas profundas revoluções de almas, de que a esterilidade dos mecanismos legislativos não possui o segredo fecundo. “Alterar, escreveu profundamente o nosso Rui Barbosa, alterar, como pelo divórcio se altera, a substância do casamento, a maior das instituições civis, sagrada matriz da família, e, pela família, matriz da sociedade, é operar uma revolução orgânica na estrutura moral de um povo, e, portanto, deitar a barra muito além das revoluções políticas, fatos superficiais que apenas modificam a forma exterior dos governos”.41



A data fúnebre em que uma nação cristã renuncia a realizar nos seus costumes o ideal da família, data, que Gladstone queria enegrecida na história britânica com uma tarja de luto, seria para o Brasil particularmente ominosa.42 Mais do que outros povos, nós precisamos defender a estabilidade dos nossos lares; mais do que a outros povos ser-nos-ia o divórcio uma envenenada fons malorum.

Os países do velho Continente puderam opor à eficácia dissolvente do vírus divorcista, uma resistência orgânica consolidada por uma tradição muitas vezes secular. A família europeia, foi afeiçoada pela ação íntima e contínua do Cristianismo, que se encarnou profundamente em todos os seus costumes. Cada cidade, cada aldeia, com uma história quase sempre mais que milenária, vive destes costumes consubstanciados nas suas lendas, nas suas poesias populares, nas suas tradições familiares, em toda a atmosfera moral que respira. Transmitido de geração em geração, por uma continuidade ininterrupta de elos vivos nas memórias locais, este patrimônio espiritual constitui uma defesa poderosa da moralidade doméstica e um obstáculo tenaz à difusão de novos hábitos.

Outra seria a condição em que o divórcio, viria surpreender a evolução da nossa nacionalidade. A família brasileira pode, quanto à duração de sua existência no país, dividir-se em dois grupos: um remonta às eras coloniais, outro é de formação recente. No primeiro, ao lado de nomes respeitáveis que para aqui trouxeram as boas tradições cristãs da família portuguesa, encontramos também, de um lado, nas camadas superiores, os vestígios de costumes menos corretos dos reinóis43 aventureiros, contra os quais estão cheios de invectivas as nossas crônicas coloniais, de outro, nos estratos mais humildes da sociedade, a escravidão com todas as suas vergonhas e misérias a constituir um ambiente de moralidade inferior em que se foi formando quase toda a família popular. Neste grupo, a indissolubilidade conserva o que há de bom e regenera o que decaíra.

O grupo de formação recente é devido às aluviões sucessivas depositadas pelas correntes imigratórias, para aqui canalizadas pelo progresso febril dos últimos decênios. As cidades pululam da noite para o dia e povoam-se com as levas de colonos e estrangeiros profissionais que, entre nós, vêm tentar melhor fortuna. Aos esforços de seu trabalho honesto, ao concurso de seus capitais, devemos boa parte do nosso desenvolvimento. Não lhes regateamos a homenagem da nossa gratidão. Mas, nem por isso, devemos esquecer os perigos que à estabilidade e ao futuro da nação podem advir deste crescimento exterior por justaposição acelerada elementos estranhos. Desenraizados do seu clima tradicional e transplantados para um novo meio, com a preocupação absorvente de um mercantilismo rapidamente remunerador, os imigrantes encontram-se, psicologicamente, numa situação menos favorável ao desenvolvimento da vida moral. É necessário fixá-los à terra adotiva, dar-lhes preocupações superiores, desenvolver-lhes o senso das novas responsabilidades no país que os acolheu, interessá-los na grandeza futura da pátria comum. Eis a função providencial da família, sólida e irrevogavelmente constituída. Para os adventícios, a monogamia perfeita oferece-lhes, na segurança do porvir, na tranquilidade dos afetos íntimos, na estabilização definitiva da vida, o lastro indispensável ao equilíbrio espiritual ameaçado pela agitação exterior das forças centrífugas próprias à sua nova condição. Para os nacionais, especialmente para as mulheres, a indissolubilidade é uma tutela necessária aos seus interesses mais vitais. Aumenta de dia para dia, o número de brasileiros que se casam com estrangeiras.44 Estas uniões, que podem ser, com o cruzamento, um benefício social, transformar-se-iam em perigo se viessem a ser abalados os fundamentos da estabilidade familiar. Onde houvesse a possibilidade de uma ruptura completa, a lei armaria a quantos quisessem especular com o casamento solúvel de todos os meios para a exploração da mulher. Espontânea apresentar-se-ia as consciências menos escrupulosas a tentação sedutora de contrair núpcias calculadamente temporárias em que, após uma dilapidação real ou aparente dos bens da esposa, se voltasse o marido livre para a sua pátria. Mais do que em outros países seria a mulher brasileira a vítima lastimável do divórcio.

Para toda a nação, enfim, onde se vão forjando tantos elementos heterogêneos na formação da unidade da pátria, a estabilidade da família acha-se entranhadamente vinculada aos problemas sociais mais importantes da nossa nacionalidade. Veículo natural de todas as nossas tradições, elo de união ininterrupta entre as gerações que se sucedem, vínculo de concórdia e aproximação entre os cidadãos, a família é entre nós o grande fator de coesão nacional. Feri-la de morte, inoculando-lhe o germe dissolvente do divórcio, acrescentando-lhe o imenso dano de todas as outras nossas instabilidades sociais – formação recente, regime democrático, população etnicamente diversa e em grande parte adventícia – com a instabilidade da família, seria lançar o Brasil no declive de uma decrepitude precoce. A desagregação atômica do individualismo nas relações domésticas agravar-se-ia rapidamente com a delinquência moral, precursora da completa decomposição nas sociedades que transgrediram as leis da vida.

Foi este instinto conservador da nossa nacionalidade que inspirou até agora os representantes mais altos do direito pátrio. Nas constelações das nossas letras jurídicas apontemos apenas estrelas de primeira grandeza: Rui Barbosa, Lima Drummond, Carvalho de Mendonça, Clóvis Beviláqua.45 Todos estes grandes mestres, ainda que inspirados em diferentes ideias filosóficas e religiosas, compreenderam que a indissolubilidade da família constituía uma das vigas mestras na arquitetura do nosso edifício social. Robustecê-la era assegurar-lhe a solidez e coesão. Defendê-la contra enxertias de elementos estranhos, equivalia a uma afirmação de virilidade soberana. Os povos sem individualidade autônoma gravitam em torno de outros como satélites, na vassalagem de uma dependência sem nobreza. Toda mudança que se autoriza de um exemplo de fora parece-lhes um progresso. Na inconsciência das próprias vantagens, julgam triunfar quando transplantaram para o próprio solo alguma ervilhazinha exótica e nociva. É um mimetismo de leis e costumes não menos deprimente que o psitacismo46 das palavras.

A outras leis obedece a evolução jurídica de uma nação, cônscia de sua grandeza. Aqui as instituições consultam os interesses verdadeiros da pátria, a continuidade homogênea das suas tradições, as exigências de estabilidade e progresso do seu porvir. Enquanto os nossos legisladores, surdos às reclamações dos egoísmos indisciplinados, ouvirem os conselhos destas grandes vozes, respeitarão a integridade dos nossos lares e “por não haver atirado o país no despenhadeiro [do divórcio] merecerão os aplausos das melhores consciências”.47

A família indissolúvel é a família histórica brasileira; não devemos rebaixar o ideal doméstico que não foi demasiado alto para os nossos ascendentes; é a família que, no entrechoque de tantas forças dispersivas de instabilidade num país novo, constitui o melhor penhor de união, de força e de defesa da nacionalidade; é a família que corresponde, sem ressalvas, às elevadas exigências da nossa vida moral e às mais profundas convicções da nossa vida religiosa. O divórcio abriria, no Brasil, um destes conflitos insanáveis entre as leis do país e todas as forças psicológicas que alimentam, desenvolvem e regeneram a sua vitalidade.

Para nós, mais talvez do que para outros povos, a Lei de Deus, é, ainda e sempre, a melhor lei da nossa felicidade individual e social. Quod Deus conjunxit, homo non separet.


Pe. Leonel Franca, S.J.


_______________________________

1.  Obras Completas do Pe. Leonel Franca, S.J., Tomo IV, O DIVÓRCIO, 8ª Edição, 1955, pp. 255-295. Livraria e Editora AGIR, Rio de Janeiro.

2.  Ano XXX, fasc. 3-5, ano XXXI, fasc. 9, 1899-1900.

3.  Vaz Ferreira, “Comentário à lei do divórcio”, Lisboa, s. d., pp. 6-7.

4.  Sampaio e Melo, Família e divórcio, pp. 350, 353, 358, 342.

5.  Strauss, Du passager et du permanent dans le Christianisme, Altona, 1839, p. 137.

6.  E. Renan, Vie de Jesus, pp. 475, 462.

7.  A. Harnack, Das Wesen des Christentums, 1908, pp. 11, 78. Mais recentemente um norte-americano: “Jesus de Nazaré foi o homem mais sábio, mais valoroso, portanto, o maior homem que viveu na terra”, J. Middleton Murry, Jesus Man of Genius, New York and London, 1926, p. X.

8.  S. Marcos, X, 2-12.

9.  S. Lucas, XVI, 18.

10.  S. Mateus, XIX, 9.

11.  S. Mateus, V, 31-32.

12.  S. Mateus, XIX, 3.

13.  S. Mateus XIX, 4-6.

14.  S. Mateus XIX, 7.

15.  Deuteronômio XXIV, 1-4.

16.  Malaquias II, 14-16.

17.  S. Mateus XIX, 8-9.

18.  S. Mateus V, 32.

19.  S. Mateus XIX, 10.

20.  Gladstone, na Quarterly Review, July 1857, pp. 262-3, em Gleanings of past years, t. VI, pp. 65-66. Com razão, pois, pode Gladstone ver no texto de São Mateus “a magna carta do casamento”, p. 79.

21.  Romanos VII, 2-3.

22.  Hermae, Pastor, Mand. IV, I, 6, Funk, Patres Apostolici, Tubinga, 1901, I, 474.

23.  Apologia, I, 15; M.G. (Migne, Patrologia Graeca), 6, 349-350.

24.  Stromata, II, XXIII, 145, 3; M.G. 8, 1906.

25.  Comment. In Math., XIV, 24; M.G. 13, 1249.

26.  De monogamia, c. 9, ML (Migne, Patrologia latina) 2, 242.

27.  Mansi, Conciliarum Collectio, Florença 1759, t. II, col. 9 e 472.

28.  Hom. in quosdam locos Novi Test., MG, 51, 218.

29.  Expositio Evang. sec. Lucam, 8, 5; ML, 15, 1767.

30.  Epistulae ad Oceanum; ad Amandum; ML, 22, 562.

31.  Mansi, Collectio Conciliorum, t. IV, 351.

32.  Le mariage em droit canonique, t. II, p. 64.

33.  Epístula, VI; ML, 20, 478.

34.  De divortio regis et Thetbertae reginae, ML, 125, 658.

35.  Laurent, Principes de droit civil français, I, nº 6.

36.  A Comte, Cours de Philosophie positive, leçon LV, t. V, p. 481.

37.  Taine, Origines de la France Contemporaine, Paris, 1907, t. XI, pp. 146-7. E o nosso Rui Barbosa: “A esses [povos que não creem] em vão procuramos dar com o aparato dos códigos humanos a lei, a ordem, a liberdade. Sua sorte é extinguirem-se, porque não tiveram fé, e não sentem a Religião do Ressurgido, que não é só o Evangelho das almas regeneradas, mas a Boa Nova das nações fortes”. Coletânea literária, organizada por Batista Pereira, São Paulo, 1928, p. 193.

38.  Cit. Por W. Gwynne, Divorce in America, p. 117.

39.  George Fonsecrive, Mariage et union libre, Paris, 1914, p. 89.

40.  De Bonald, Du divorce, Paris, 1839, p. 334. E. Luciano Brun: “Os erros fundamentais não invadem os espíritos sem se apoiam na legislação sem perigo moral. Contra estas influências não lutam os sentimentos por largo tempo, e ainda quando a olharem pouco atentos a superfície da sociedade apresenta a aparência da ordem, uma observação mais exata descobre a chaga interior e os estragos causados pelo erro”. Revue catholique des Institutions et du Droit, t. VIII, p. 163.

41.  Artigo editorial d’A Imprensa, de 6 de agosto de 1900.

42.  Abominável, odioso, repugnante, execrável, repulsivo,, ruim, abjeto, vil.

43.  Indivíduo natural do reino.

44.  Segundo o Anuário estatístico do Brasil, t. I, Rio, 1916, p. 404, em 1912, os casamentos de estrangeiros com brasileiras representavam em Porto Alegre, aproximadamente 10% dos casamentos entre nacionais; em Belo Horizonte, cerca de 18%; em Curitiba, 20%; no Rio, 23%, em São Paulo, 57%. Não encontramos dados gerais para todo o país.

45.  Ao lado destes nomes aureolados poderíamos citar uma plêiade inumerável de juristas, médicos e sociólogos que defenderam a integridade das nossas tradições familiares contra os assaltos inconsiderados de alguns raros divorcistas. Lembro apenas os que me ocorrem de momento: Tristão de Ataíde, Américo M. de Oliveira Castro, Esmeraldino Bandeira, Taciano Basílio, Jônatas Serrano, Sabóia Lima, Fernando Magalhães, Afrânio Peixoto, Belisário Pena, Agripino Grieco, Viveiros de Castro, Porto Carreiro, Almáquio Dinis, Rui Sodré, Vasco de Andrade.

46.  Perturbação psíquica que consiste em repetir as palavras sem ter em mente as ideias por elas representadas...

47.  Clóvis Beviláqua, Código Civil etc. Rio, Alves, 1922, t. II, p. 263.


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