Blog Católico, para os Católicos

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"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

SERMÃO DE NATAL.


(P.L. 52, 585-588)1


Seríamos levados antes a adiar nosso sermão, tal a sublimidade e o Mistério do Nascimento de Cristo. A Virgem deu à luz; quem o explicará? O Verbo se fez carne; quem explanará este Mistério? Se o Verbo de Deus vagiu na boca de uma criança, como poderá falar dele o homem cheio de imperfeição? Mas como a estrela iluminou os Magos em busca da Luz, assim a palavra do pregador deve dar a conhecer a seus ouvintes o Nascimento de Deus, a fim de se regozijarem com o encontro de Cristo e, mais que perscrutarem seus divinos segredos, honrarem com dádivas o Menino-Deus. Orai, irmãos meus, para que se digne crescer, pouco a pouco, em minha palavra, Àquele que aceitou crescer num corpo como o nosso.

O evangelista diz ter o Anjo falado assim: “Não temas, Maria, pois achaste graça diante de Deus”. Não temas, Maria. E por quê? Porque achaste graça. Temer não é próprio de quem recebe, é próprio de quem perde. Recebeste, concebendo, a graça do divino germe, e não perdeste o brilho de tua virgindade, ao entregá-lo à luz. “Não temas, Maria”. Que pode temer a que concebe a segurança do mundo, a alegria dos séculos? Temor não existe, onde se trata de algo divino, não humano; onde há consciência de virtude, não de impureza. Que pode temer a Mãe Daquele a quem temem até os que infundem temor? Que pode temer Àquela cujo Assessor é o juiz da própria causa, e que tem sua integridade como testemunho de sua inocência? “Não temas, Maria, pois achaste graça diante de Deus”.

A Virgem acolheu em seu seio o Verbo divino, o qual, desde a eternidade, coexistia com Deus. Fez-se grandioso templo da Divindade, Ela, morada humilde e humana. Aquele que não podia ser contido na pequenez do corpo humano, ei-Lo na estreiteza do ventre virginal. “Eis que conceberás no ventre”. Bastaria ter dito: “conceberás”,; por que acrescentou: “no ventre”? Para indicar ser real a concepção, não aparente; para atestar que o Nascimento seria real, não fictício; para demonstrar que assim como Cristo, enquanto Deus, procede do verdadeiro Deus, enquanto homem tem um corpo que é fruto bendito de verdadeira concepção. É, pois, herético afirmar que Cristo tomou um corpo etéreo e apenas tenha aparentado a forma de homem. “Eis que conceberás no ventre e darás à luz um filho, ao qual chamarás Jesus”.

Em hebraico, “Jesus” significa “Salvador”. Com razão, pois, tudo está salvo na Virgem, quando Ela gerou o Salvador de tudo. “Chamá-lo-ás Jesus”. Porque com este Nome é adorada a Majestade Augusta da Divindade; todos os que habitam os Céus, os que povoam a terra, os que gemem nas profundezas do Inferno prosternam-se ante esse Nome e O adoram. Ouvi as palavras do Apóstolo: “Ao nome de Jesus se dobrará todo joelho, no Céu, na terra e nos Infernos”.2 É o Nome que deu vista aos cegos, ouvido aos surdos, curou os coxos, deu fala aos mudos, vida aos mortos, libertou os possessos do Demônio. Mas se o Nome é tão sublime, quanto não o será o poder de seu dono? O mesmo Anjo diz quem seja Aquele que detém esse Nome: “Ele será chamado Filho do Altíssimo”. Vede: o que a Virgem concebe não é germe da terra, mas do Céu. A Virgem deu à luz e seu Filho é o Filho de Deus! Portanto, os que pretendem encontrar algo de apenas humano nesse Nascimento estão injuriando ao Altíssimo!

E o Senhor lhe dará o trono de Davi, seu pai, e reinará eternamente na casa de Jacó, e seu reino não terá fim”. São palavras que o herege procura toldar em favor de seu erro. “Eis, diz aqui, é o Anjo quem fala: o Senhor Deus lhe dará… Então, não é maior Aquele que dá do que aquele que recebe? E o que recebe, acaso já possuía o que recebe?”

Nós, porém, irmãos, escutemos tais palavras do Anjo, não como os pérfidos hereges, mas como verdadeiros fiéis; sejam-nos fundamento para a fé, não pretexto para o erro. “O Senhor Deus lhe dará”. Que Deus? O próprio Verbo, que era, no princípio, Deus.3 A quem dará? Ao que se fez carne e habitou entre nós. Ouçamos ao Apóstolo, que diz: “Deus estava em Cristo, reconciliando o mundo conSigo”.4 Consigo, não com outro. Portanto, Deus, que estava em Cristo, se dava a Si mesmo o reino, em Cristo, conferindo ao corpo assumido o que desde sempre possuía na Divindade.

Dar-lhe-á o Senhor Deus a sede de Davi, seu pai”. Veja-se: quando recebe, chama-se filho de Davi; quando dá, Filho de Deus. Ele mesmo disse: “tudo o que o Pai tem é meu”.5 De onde, pois, vem essa necessidade de receber, se existe a posse de tal poder? “Tudo o que o Pai tem é meu”. Quem recebe o que já é seu? Porventura é graça de um doador aquilo que o receptor já possui? Confessemos que houve um receptor, mas foi o que nasceu, o que assumiu a carne e a infância, o que sofreu o presépio e os trabalhos da vida, o que sentiu fome e sede, o que não fugiu às injúrias, o que subiu à Cruz e padeceu a morte, o que ingressou no sepulcro; a este atribui, ó herege, a recepção de algo! Por que pensas que Deus despreza receber a honra, se recebeu injúrias? Pensas que lhe aborrece receber do Pai um reino, Ele que dos inimigos recebeu afrontas e até a morte? Herege, tudo o que é injúria, temporal, recebido, tudo o que importa diminuição e inclui a morte, entende não dizer respeito à Divindade e sim ao corpo! Assim não farás injúria ao Filho, não colocarás distâncias na Trindade.

Mas voltemos ao nosso tema: “Dar-lhe-á o trono de Davi, seu pai”. Aquele, pois, que no Céu se assenta junto do Pai, na terra recebe o trono de Davi. Aquele que reinou sempre, reina com relação a nós, na herança de Davi, que assume para sempre. Alegremo-nos, amados irmãos, pois quem é, em Si, o Rei, se digna reinar em nós. Regozigemo-nos, pois, vem reinar na terra a fim de que nós possamos reinar no Céu. Sim, escutai o Apóstolo: “se com Ele sofrermos, com Ele reinaremos”.6 Nasceu para nós e vem a nós precisamente para isso: para nos dar um reino! Ele mesmo o prometeu, com as palavras: “Vinde, benditos de meu Pai, tomai posse do reino que vos está preparado desde a origem do mundo”.7 Preparado para vós, disse Ele, não para mim. Virá para ficar sempre entre nós, para estar sempre ante nossos olhos Aquele que agora só está em nosso coração. Virá trazer a confiança de sua familiaridade aos que participarão de seu reino. “E seu reino não terá fim!”

Alegrai-vos os que credes em sua vinda, porque vos prometeu um reino, onde os cargos são irremovíveis e as dignidades perpétuas. Quem não ambiciona o infinito? Quem prefere o perecível? Quem, comprando por ouro as honrarias passageiras, não deseja receber gratuitamente as eternas?

Irmão meus, trata-se aí de cargos, de postos, de dignidades, sim, mas se não se der crédito à verdade do Evangelho não se obterão tais prêmios eternos. Se nos agrada o serviço de Cristo, se aspiramos militar sempre sob as suas ordens, armemo-nos com as armas de Cristo, vigiemos, sejamos sóbrios, vençamos o Demônio, detestemos os vícios. Para podermos alcançar os prêmios e coroas de Jesus Cristo Nosso Senhor, que com o Pai reina agora e sempre, pelos séculos dos séculos. Amém.


_________________

1.  São Pedro Crisólogo, Bispo de Ravena e Doutor da Igreja.

2.  Fil. 2, 11.

3.  Jo. 1, 1s.

4.  2 Cor. 5, 19.

5.  Jo. 17, 10.

6.  2 Tim. 2, 12.

7.  S. Mat. 25, 34.

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