Reflexões
“O
Senhor possuiu-me desde o princípio de seus caminhos”.
Quem senão esta filha favorecida do Céu, a quem a Igreja aplica
estas palavras, é que pode gloriar-se de não haver estado nunca
debaixo da escravidão do Demônio? É uma pura criatura que Deus
escolheu por Mãe desde a eternidade. Admiraremos à vista disso que
o Senhor haja sido tão zeloso da posse de seu Coração, e que se
haja reservado as suas primeiras homenagens? É um Templo, onde deve
residir toda a plenitude da Divindade.
É
necessário que Maria seja isenta do Pecado Original, por que o Filho
de Deus deve nascer em seu seio como em seu Templo; e o primeiro
emprego e a sua primeira função merece o privilégio dessa
santidade.
Aprendamos
da
Igreja a reverenciar em Maria uma prerrogativa tão singular, sem
querer aprofundar este Mistério com uma curiosidade infiel. Mas, que
instrução devemos tirar nós daqui, sendo filhos da ira? Podemos
acaso evitar a triste desgraça em que fomos envolvidos desde o
primeiro momento da nossa origem? Por certo que não; mas, podemos
inferir desta prerrogativa a ideia que é preciso formar da graça
santificante, vendo a distinção que Deus faz de Maria, dando-lhe
desde o primeiro instante de sua origem; e outrossim o horror que
Deus tem ao pecado, e o que nós devemos ter, visto que Deus isenta
Maria da Lei Comum para não se unir a uma carne inclinada pelo
funesto hálito do pecado.
Meditações
Primeiro Ponto:
Considera que pela Imaculada Conceição da Santíssima Virgem se
entende aquele insigne privilégio, pelo qual preservou Deus a esta
ditosa criatura da mácula do Pecado Original, que infeccionou toda a
posteridade de Adão. Todos sabem que o privilégio é uma lei
particular, que exime as
pessoas, objeto dele, de uma Lei Comum, a que todos os outros estão
sujeitos. O privilégio pois
é tanto mais apreciável, quanto a lei, de que exime, é mais
universal e mais dura. Maria em sua Conceição foi subtraída à lei
que sujeitava os homens ao pecado. E houve jamais lei mais dura e
mais comum? Imagina, se é possível, o preço, a grandeza, a
excelência do privilégio da Imaculada Conceição de Maria. É tal
este privilégio, dizem os Doutores e os Santos Padres, que se se
houvesse deixado à escolha
de Maria, ou o ser Mãe de Deus, ou o ser concebida sem pecado,
haveria preferido a Imaculada Conceição a todas as preeminências,
e à própria Maternidade divina. Conhecendo a Deus, e amando-O
naquele grau, em que O conhecia, nenhuma prerrogativa, nenhuma graça,
nenhuma dignidade a haveria indenizado da desgraça do ter estado um
só momento na inimizade de Deus. Aprendamos daqui a ideia que
devemos formar do pecado. Na verdade, se a Augusta dignidade de Mãe
de Deus pedia que fosse isenta de toda a corrupção depois da sua
morte, e de toda a mancha de Pecado Venial durante sua vida; quanto
mais não pedia esta incompreensível dignidade, que fosse isenta do
Pecado Original?
Suposta
esta verdade, a Virgem Santíssima foi cumulada dos maiores favores
neste primeiro momento, e neste primeiro momento foi cheia de graça:
“Vós sozinha possuís,
diz São Bernardo, todas
as virtudes e méritos de todos os Santos juntos”.
Com que devoção, pois, e com que culto não se deve honrar e
celebrar o primeiro momento da mais Santa vida?! “Assim
como todos os rios, diz
São Boaventura, entram
no mar, assim todas as torrentes de graças e bênçãos, que saem do
Seio de Deus, e se repartem por todos os Santos, se reuniram no
Coração de Maria no primeiro momento de sua vida, no qual foi
santificada. Quão
devido e justo é celebrar este ditoso momento
com todas as demonstrações de regozijo e da mais acabada
solenidade! Um filho bem criado considera como a mais natural e justa
obrigação tomar toda a parte possível nas prosperidades e glórias
de sua mãe. A natureza, a razão, o reconhecimento, inspiram estes
sentimentos a todos os filhos. Tem-se visto, e veem-se todos os dias
soberanos que decretam a suas mães as honras do triunfo, que eles
mesmos recusaram para si, desejando que os povos festejem suas mães.
Qual não deve ser pois o gozo, a veneração, a alegria de todos os
verdadeiros fiéis neste dia? Com que devoção, com que gosto, com
que fervor não devemos celebrar a Festa da Imaculada Conceição da
Mãe de Deus? De todas as festas, instituídas em sua honra, que
outra lhe será mais agradável, e em que outra se comprazerá mais?
A nossa tibieza e indiferença nesta ocasião não seria uma prova do
nosso pouco reconhecimento, da nossa pouca confiança e do nosso
pouco amor? O não ter senão uma devoção medíocre à Imaculada
Conceição da Mãe de Deus poderia ser uma prova sensível da nossa
veneração e ternura?
Segundo Ponto:
Considera que nesta admirável santificação há três prerrogativas
singulares, três notas que jamais se encontraram juntas na
santificação de outra pura criatura: a santificação da
Virgem foi original, inalterável, e sempre em aumento.
Os Anjos, Adão e Eva foram criados na graça santificante, mas
podiam perdê-la; e de fato, Adão e Eva a perderam como também os
Anjos rebeldes. Porém, Maria em sua Conceição Imaculada foi cheia
de uma graça, que jamais perdeu, e que era incapaz de perder, não
por natureza, mas por privilégio.
Os
Apóstolos foram confirmados na graça depois da vinda do Espírito
Santo; mas além de terem sido pecadores, não estavam isentos de
faltas leves; ao passo que Maria desde o primeiro instante de sua
existência, foi imutavelmente unida com Deus, e por um particular
favor, isenta toda a sua vida de faltas, ainda mesmo leves. Os
Bem-aventurados no Céu estão livres de toda a imperfeição; mas
esta santidade não pode crescer, nem ser mais perfeita; porém, a de
Maria sempre foi crescendo, multiplicando-se todo o tempo que esteve
sobre a terra. Esta primeira graça foi acompanhada dos Dons do
Espírito, dos Hábitos infusos, de Virtudes Morais e Intelectuais,
dos Dons de Profecia, de Milagres, de Inteligência das Sagradas
Escrituras, no mais alto grau de perfeição. As névoas que ofuscam
o entendimento das outras crianças, não escureciam as luzes do
entendimento de Maria. O seu Coração não se ocupou desde então,
senão em amar ardentemente aquele Divino Esposo, de quem havia de
vir a ser Mãe; e o tempo que é perdido para o resto dos homens, foi
para Ela um tempo de mérito e de bênçãos.
Que
graça, que glória a de Maria neste primeiro momento! Não é
possível dizer, nem se pode compreender o que valeu este privilégio.
Pois, que progressos não faria na santidade uma alma que tinha mais
graça que todos os Serafins, e que não sentia nenhuma das
imperfeições da natureza corrompida. A que grau de contemplação
não deveu elevar-se a que não sentia o peso do seu corpo, e a que
tinha um espírito tão ilustrado? Qual não deveu ser o excesso de
amor a Deus, pois longe de que lho entibiassem as outras paixões,
podia fazer servir todas as suas paixões para mais e mais se
inflamar a cada instante? Qual não deve ser, Deus meu, a nossa
admiração, a nossa ternura, a nossa veneração para com vossa Mãe
neste primeiro instante de sua Conceição! E com que devoção
devemos celebrar esta festividade!
Oração
Virgem
Santa, Virgem Imaculada, eu creio firmemente que Deus vos possuiu
desde o princípio; creio que não só a vossa Conceição, mas toda
a vossa vida passou sem mancha, e que amastes a
Deus sem interrupção alguma até ao último instante de vossa vida.
Fazei, Virgem Santa, que por esta confiança que tenho em vossa
bondade, entre na amizade do vosso Filho, para a não perder jamais;
e que, honrando toda a minha vida a vossa Imaculada Conceição, o
melhor que me seja possível, alcance por vossa intercessão a graça
de uma santa morte. Amém.
Todos os que celebram, ó
Virgem Santa,
vossa Conceição
Imaculada,
experimentem os efeitos de
vossa proteção.
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