Nas
suas viagens apostólicas, Santo Antônio chegou também à cidade de
Rimini, foco famoso de perniciosas heresias.
Grandes
foram a confusão e a consternação, que se apoderaram dos hereges
pertinazes, ao espalhar-se a notícia da chegada do celebrado
pregador Antônio, justamente denominado “o Martelo dos
Hereges”, e cuja irresistível
eloquência se unia a tão eminente santidade.
Amando
mais as trevas do erro, do que as luzes da verdade, vítimas
infelizes da sua própria malícia, os Riminenses resolveram não
comparecer à pregação do enviado de Deus, frustrando deste modo o
seu apostolado.
Realmente
foi ali, que, pela primeira vez, o insigne pregador se achou sem
auditório algum, sendo assim inutilizados os seus trabalhos,
esgotados os seus esforços, desvanecidas as suas esperanças e
naufragados os seus projetos.
Sentindo,
profundamente, não dar ganho de causa à verdade sobre a mentira, o
Santo retirou-se da cidade, escondendo-se numa pequena gruta, situada
em lugar bem silencioso.
Ali
derramou lágrimas copiosas pela desgraça dos pobres pecadores e
orou, fervorosamente, em favor de hereges tão pertinazes, pedindo
para si mesmo luzes e forças, para que fossem coroados os seus novos
esforços de um feliz êxito.
Na
oração achou consolação e conforto. Levantou-se, resolvido
firmemente a lançar mão de um meio extraordinário, para obter a
realização dos seus ardentes desejos.
Percebendo
a inspiração de Deus, deixa a gruta e dirige-se às praias do mar,
fazendo sobre ele o Sinal triunfante da Santa Cruz. Depois levantando
a voz, exclama em tom imperioso: “Peixes, escutai a
palavra de Deus, já que os hereges e infiéis se recusam ouvi-la”.
Grande
maravilha!
A
esta intimativa do Santo aparecem incontinente inúmeros cardumes de
peixes de todas as espécies, que se colocam em certa ordem e
posição, formando o mais pitoresco aspecto e produzindo uma
impressão indescritível. Deste modo dispostos conservam-se,
esperando impacientemente ouvir a voz abençoada do servo fiel do
Senhor.
Com
a rapidez do relâmpago, corre pela cidade a notícia deste
espetáculo prodigioso.
Imediatamente
as praias ficam alastradas de curiosos, aguçados pelo desejo de se
convencerem, por si mesmos, do fato, que lhes parece simplesmente
incrível.
Vendo-se
rodeado de um lado da aglomeração
enorme dos hereges, atraídos pela novidade do ocorrido, considerando
do outro lado os peixes, mais obedientes e dóceis, do que os
pecadores, o glorioso apóstolo lhes faz ouvir a sua palavra
inspirada, nos termos seguintes:
“Meus
irmãos peixes, segundo o vosso entendimento, muitas graças tendes a
render ao vosso Criador, que vos destinou este elemento majestoso
como moradia e, com tal munificência, que vos reservou águas doces
e salgadas, ao sabor especial de cada um.
Além
disto, deu-vos refúgio numerosos, a fim de pôr-vos ao abrigo das
tempestades, concedeu-vos elemento transparente e límpido, para
verdes perfeitamente a direção, que tendes a seguir e os alimentos
a escolher, oferecidos cotidianamente para viverdes.
Na
criação do mundo recebestes a bênção de Deus com o preceito de
multiplicar-vos.
No
dilúvio universal fostes preservados desta desgraça imensa, que
extinguiu os outros animais fora da Arca de Noé.
Providos
destas barbatanas, que vos adornam e vigorizam, percorreis, como voz
apraz, os incomensuráveis espaços do oceano.
Vós
tivestes de Deus a honrosa prerrogativa de acolherdes o grande
Profeta Jonas e restituí-lo, depois de três dias, são e salvo na
praia.
Foi-vos
concedida ainda a honra de fornecerdes os meios pecuniários a Jesus
Cristo, na sua qualidade de indigente, para satisfazer o imposto
geral do censo.
Fostes
vós, que tivestes a dita de servir de principal alimento ao Rei
eterno, antes e depois da sua gloriosa Ressurreição.
Daqui
vede quanto tendes a louvar e a bendizer a Deus, que vos preferiu aos
outros animais, por meio de privilégios inúmeros!”
A
estas exortações do inspirado pregador, os peixes testemunharam-lhe
o seu contentamento e prazer em ouvi-lo, fazendo certos movimentos e
sinais com a cabeça, rendendo deste modo, respeitosas homenagens ao
Altíssimo, que se ostentava tão admirável e glorioso no seu
querido e fiel servo Antônio.
Arrebatado,
em santo entusiasmo, por este espetáculo maravilhoso, quase
extasiado perante essa cena sublimemente bela e grandiosa, Santo
Antônio exclamou:
Bendito
seja Deus! Pois, mais honram o Senhor os peixes do mar, do que os
homens hereges; escutam-no melhor os ouvintes privados das luzes da
razão, do que os homens destituídos do clarão da fé!”
A
multidão, que presenciou essa cena tocante e sumamente comovente,
ficou estupefacta e convencida da santidade singular do eminente
pregador e da verdade da doutrina de Jesus Cristo.
Sempre
todo ternura e suavidade, para com os que erraram e pecaram, Santo
Antônio então se dirigiu aos hereges, exortando-os, com todo o
fervor apostólico, a renderem o justo tributo de reconhecimento e
adoração ao Altíssimo, segundo o exemplo dos irracionais, a
renunciarem as suas heresias e abraçarem a crença verdadeira e
salvadora de Jesus Cristo.
O
resultado foi surpreendente.
A
cidade quase inteira converteu-se, graças às orações e pregações
do insigne Ministro de Deus.
Este
prodígio memorável é perpetuado por uma bela e elegante Capela,
erguida no lugar pela crença e gratidão dos habitantes da cidade de
Rimini.
Os
Santos encontraram no decurso da sua vida muitos obstáculos a
remover, no desempenho do seu Ministério, grandes dificuldades a
vencer e acerbas e prolongadas dores a curtir.
Ninguém
creia que lhes tenha corrido sempre tudo conforme a sua própria
vontade e desejo.
Bem
árduo e melindroso foi por vezes o estado, em que se acharam, como o
de Santo Antônio, ao principiar a sua missão apostólica na cidade
de Rimini.
Mas,
como é sublime a lição, que nos deu, e claro o exemplo, que nos
deixou, naquela situação dificultosa!
Não
se deixou levar pelo desânimo, nem dominar-se pela indignação; nem
abandona a obra já empreendida, nem procura desabafar o coração
oprimido, queixando-se, murmurando e lamentando-se com os homens,
não!
Abre
a sua alma pela oração só ao seu Pai celestial, por cuja honra
trabalha, cuja glória zela, por cujo amor sofre, de cujo auxílio
espera tudo e a cuja Providência recomenda e entrega tudo com
confiança filial e ilimitada.
Daí
a sua paciência inabalável no meio dos sofrimentos, a sua
resignação imperturbável nas dificuldades quase insuperáveis, o
sucesso verdadeiramente admirável, que assinala todos os seus
trabalhos.
Sigamos,
portanto, os seus vestígios abençoados, no caminho do dever, da
virtude e da perfeição, caminho áspero e árduo sim, mas seguro e
esplêndido! Imitemos o seu exemplo fascinante!
Encontrando
obstáculos, nos nossos trabalhos, na situação, em que a divina
Providência nos colocou; nas ansiedades e angústias, em que nos
acharmos, levantemos os olhos e o coração Àquele a quem nada é
impossível. Pois é Ele mesmo, quem nos afirma:
“Pedi
e recebereis, procurai e achareis, batei à porta e abrir-se-vos-á”.
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Fonte:
Rev.
Pe. Frei
Luiz, O.F.M., “A
Vida e o Culto de Santo Antônio”, 1ª
Parte,
Cap. 17º,
pp. 181-189.
3ª Edição. Butzon e Bercker – Editores Pontifícios,
Petrópolis/RJ, 1907.