Falando
a respeito de São José, diz o Padre Huguet: A casa de Nazaré era
um verdadeiro paraíso. Ali reinava a paz, a concórdia, a mais
sublime caridade; tudo se fazia na mais perfeita ordem; aquela
Família era um admirável Modelo das Famílias Cristãs e das
Comunidades Religiosas. Ali, era habitual o recolhimento,
religiosamente observado o silêncio, o dia distribuído entre o
trabalho e os exercícios de piedade.
As
pessoas de fora, admitidas à oficina de São José, eram excluídas
dos dois santuários, ou seja, dos dois quartinhos reservados a Jesus
e Maria. Ali reinava a pobreza religiosa, resplandeciam a castidade,
a obediência; ali habitava o Criador com as Suas criaturas; ali, a
Fé, a Esperança haviam estabelecido sua moradia em comum com a
Caridade, que une estreitamente os corações. A Bem-aventurada Casa
de Nazaré serviu de Modelo às Comunidades Religiosas. Diz-se que os
primeiros cristãos eram um só coração e uma só alma; possuíam o
mesmo espírito, os mesmos desejos, os mesmos afetos, mas com maior
razão se pode dizê-lo da Sagrada Família.
E
como vivia São José com tão augustas Pessoas? Na familiaridade
mais terna e mais íntima que se possa imaginar. Jesus o chamava Pai,
falava-lhe com grande respeito, participava de suas fadigas,
sentava-Se à sua mesa, servia-o com solicitude e jamais
negligenciava quanto pudesse contribuir para torná-lo feliz. Maria
chamava-o Esposo, servia-o como a seu senhor, preparava-lhe as
modestas refeições, fazia e arrumava suas roupas, e muitas vezes
sabia torná-lo feliz. Maria chamava-o Esposo, servia-o com
dulcíssima conversação.
São
José, penetrando cada vez mais no Coração de Jesus pelos afetuosos
cuidados que d’Ele recebia, permanecia suavemente arrebatado.
Quando Jesus parava junto ao coração de São José, oh, com que
santos ardores o inflamava!
Quando
Jesus descobria a São José algum novo traço das próprias
perfeições infinitas, ou demonstrava comprazer-Se nas carícias
recebidas, ou lhe agradecia as fadigas sustentadas por Seu amor, tais
gestos e expressões eram como óleo lançado ao fogo daquele amor,
que ardia no coração do Santo, para inflamá-lo ainda mais.
E
que responderia o Santo, se Jesus lhe fizesse a pergunta, depois
dirigida a São Pedro: José, tu Me amas? Oh, como teria repetido
então, estreitando-O contra o peito: “Sim, eu Te amo, meu Deus,
meu Redentor, infinitamente amável, Te amo mais que às pupilas de
meus olhos, mais que a mim mesmo”.
Tanta
felicidade concedida ao Santo, passageira, deveria causar-nos
admiração. Ora, que admiração não nos deve causar, sabendo que
tão feliz convivência durou cerca de trinta anos? A união de Jesus
Cristo, de Maria Santíssima e de São José, era uma viva imagem da
união das Três Pessoas da Santíssima Trindade.
Jesus
em Nazaré orava pelos pecadores e, além disso, com Seus desejos
suspirava pela hora santa de subir ao Calvário para derramar
o Sangue que devia apagar a sentença de eterna maldição. No
entanto, trabalha com grande amor, até o suor, sujeitando-Se ao
castigo temporal já imposto a Adão e Eva.
Maria
e José, refletindo nisso, experimentavam grande aflição; todavia,
o pensamento de que mais tarde participavam dos frutos do Sacrifício
cuja aprendizagem Jesus fazia, suavizava-lhes bastante a amargura.
Sentados juntos a uma mesa frugal, comunicavam entre Si misteriosas
confidências. E foi então que as grandes verdades, por Jesus
trazidas do Céu, começaram a sair de Seus divinos lábios, pois diz
São Lucas, que Suas palavras, Maria as conservava no próprio
Coração. E quando Jesus falava a Maria Santíssima, muitas vezes na
presença de São José, este recolhia e saboreava os preciosíssimos
oráculos, os ensinamentos cheios de luz e de celestes consolações.
As
inumeráveis fadigas, sustentadas por São José em todo o decurso de
sua vida, pouco a pouco produziram uma notável diminuição de suas
forças. A tranquila felicidade da vida em Nazaré foi por algum
tempo interrompida, com o trânsito do Santo, desta vida para a
eternidade.
Dados
seguros a respeito do tempo e circunstâncias desse trânsito não
possuímos. Mas certo é que, ao tempo de Jesus deixar Nazaré,
aproximadamente aos trinta anos, para dedicar-Se à vida pública,
São José não era mais deste mundo.
Não
diz o Evangelho que, ele estivesse entre os convidados às Bodas de
Caná; significa que não estava com Jesus e Maria. Não se achava
tão pouco no Calvário, entre os amigos de Jesus moribundo, pois de
outra forma Jesus não teria confiado Sua Mãe, a São João. Podemos
pois afirmar que, chegado o
Salvador à idade de poder cuidar de Sua Mãe, o Santo, havendo
cumprido sua própria missão, deixou este vale de lágrimas.
Assim
como Moisés saudou do cimo do Monte Nebo, a longínqua terra
prometida. São José viu de longe os dias gloriosos da pregação de
seu Filho divino; depois, depois,
como o inocente Batista, desapareceu, cedendo lugar ao Salvador que
criara, mantivera e guardara com suas fadigas e assíduos cuidados. E
como poderia ter suportado a pérfida e maligna resistência,
suscitada pelo ódio e perseguições dos judeus contra as obras
esplendorosas do Messias, até colocá-Lo barbaramente na Cruz?
Quanto
ao lugar de sua morte, julga-se que tenha sucedido em Nazaré, onde
passara a maior parte de sua vida, exercendo o ofício de
carpinteiro. A causa de sua morte, diz São Francisco de Sales, que
São José constituiu exceção à regra geral e morreu de morte
semelhante à de sua Esposa Maria, isto é, de puro amor de Deus.
São
José era a palmeira que crescia na corte real, o cipreste de Sião,
sempre à vista do Santuário, a árvore do Paraíso, que, refrescada
pelas águas-vivas, hauria seu vigor das divinas fontes da vida. Mas,
se Deus foi grato e prodigalizou com grande abundância Suas graças
aos Pastores, aos Magos, ao Precursor e a tantos outros, que tiveram
a felicidade de apresentar-Lhe uma só vez e por breve tempo, o
coração aberto à graça, que não terá feito em favor de seu Pai
adotivo, que com Ele conviveu contínua e intimamente por tantos
anos?
Se
Jesus prometeu lembrar-Se até de um copo d’água dado ao próximo
por seu amor, qual não terá sido a Sua generosidade para com São
José, que O estreitou, conduziu nos braços, teve em casa,
alimentou, vestiu e salvou da morte, afrontando toda espécie de
privações? Deus quis ser devedor, e, por isso, lhe
recompensou o afeto cumulando-o das mais belas graças. Cada dia, São
José aumentava no santo amor de Deus, a cuja veemência não mais
podia resistir por longo tempo.
Jesus
achava-Se perto dos trintas anos, Maria dos quarenta e cinco e José
contava sessenta e três. Gozavam todos ótima saúde, mas José
sentia uma voz interior a dizer-lhe: “Chegaste ao término
de tua vida”.
Nesse
ponto, exclama Santo Afonso: “Quem poderá jamais
explicar ou compreender as doçuras, as consolações, as esperanças,
os atos de resignação, as chamas de caridade, que inspiravam ao
coração de São José as palavras de vida eterna que, ora Jesus,
ora Maria, lhe diziam na hora extra de seu viver?”
Ó,
quão preciosa se lhe apresentou naquele momento a memória das
fadigas e penas suportadas por amor de Jesus e Maria! Como terá
abençoado as viagens, as
privações e o exílio!
Diz
São Francisco de Sales, no Tratado do Amor de Deus: “Tendo
São José terminado a obra para a qual Deus o escolhera, que lhe
restava, senão dizer ao Pai Eterno: ‘Realizei a obra que me deste
a fazer’; e ao Filho: ‘Assim como teu Pai celeste confiou às
minhas mãos o Teu Corpo no dia de Tua vinda a este mundo, eu, no dia
de minha partida do mundo, às Tuas confio o meu espírito’.”
Diz
a Ven. Maria de Ágreda, que Maria Santíssima lhe pediu perdão,
caso houvesse cometido alguma falta ao servi-lo e desejou a sua
bênção. Por humildade, o Santo quereria abster-se de tal, mas por
obediência A abençoou. Recebida a bênção, Maria encarregou-o de
saudar os parentes e todos os Santos recolhidos no Seio de Abraão.
Depois,
queria São José ajoelhar-se para receber a bênção do Divino
Redentor, mas Jesus não lho permitiu, antes aproximou-Se e o
estreitou docemente nos braços. E o Santo, a tanto amor de Jesus
para com ele, sentiu-se ainda mais enternecido; e, cheio de
humildade, disse-Lhe:
Meu
Senhor, meu Deus, meu Criador e Redentor, oh, quanto me amas!… Mas,
perdoa-me as ofensas que cometi!… De minha parte, eu Te glorifico e
de todo o coração Te dou infinitas graças por me teres escolhido,
com inefável benignidade, para Esposo e Custódio de Tua divina Mãe,
e também para Custódio de Ti mesmo.
São
José, diz neste ponto São Bernardino de Sena, não tendo mais
forças para falar, despedia espaçados suspiros.
No
entanto, Jesus, após tomar-lhe a mão para beijá-la, disse:
Pai
amado, dou-te a Minha bênção. Deixa agora este Vale de Misérias
e, acompanhado pelos Anjos, desce ao Limbo, entre os teus Pais e
leva-lhes a alegre notícia de que, dentro de pouco tempo, descerei a
eles, para consolá-los e conduzi-los Comigo ao Paraíso.
Chegou
a última hora.
Morre
o dia e o “homem justo”
está para morrer. Na estreita morada, a obscuridade se torna cada
vez mais densa; acende-se a lâmpada de óleo e uma luz pálida e
trêmula se difunde ao derredor.
Jesus,
com um olhar expressivo a Maria, parece dizer: Mamãe, aqui estamos!…
Maria,
ao lado esquerdo do leito, inclina-se sobre o coração do moribundo
e com um paninho enxuga-lhe delicadamente o suor e as lágrimas.
São
José ampara a fronte no ombro direito de Jesus que, com a mão
livre, lhe mostra o Céu.
Todos
oram.
A
respiração do moribundo torna-se lenta, intermitente… No
quartinho parece esvoaçar algo de misterioso, de grande, de sublime…
É a morte!
– Jesus!
Maria! – invoca, num fio de voz o moribundo.
– Pai
meu! Meu Esposo! – respondem ambos.
– Até
a vista…
– Lá
em cima!
Um
beijo de amor e de reconhecimento filial foi o juízo que o
Homem-Deus, com toda a efusão de Seu Coração, pronunciou sobre
aquela alma Santa, que de seus lábios passou à eternidade.
Todas
as coisas, como bem se compreende, são fruto de imaginação e
conjecturas, muito verossímeis porém, e podemos considerá-las
verdadeiras, concluído que a
morte de São José não foi precedida de enfermidade ou qualquer
doença; foi precedida unicamente pela voz do Senhor, que lhe
anunciou e por um grande transporte de amor de Deus.
Vivera
como justo e como justo morreu. Por isso, canta a Igreja: “Ó
felicíssimo, ó beatíssimo José, a cuja última hora assistiram
juntos, com sereno semblante, Jesus e Maria!”
E
se Jesus Cristo chorou a morte de Seu amigo Lázaro, muito mais terá
chorado a de Seu caríssimo Pai adotivo.
Diz
Gérson, que Jesus mesmo lavou o corpo virginal de José e o abençoou
para preservá-lo da corrupção. O corpo do Santo, que permaneceu
belo e fragrante, foi envolto, com os braços cruzados sobre o peito,
em um lençol branco e sepultado, como dizem São Jerônimo e o Ven.
São Beda, em um lugar entre a montanha de Sião e o Jardim das
Oliveiras, no mesmo túmulo em que se depositou, mais tarde, o Corpo
de Maria Santíssima.
No
cortejo fúnebre, foi certamente acompanhado por Jesus e Maria, pelos
parentes e amigos. Jesus diante do sepulcro, diz Emmerich, abençoou
novamente aquele sagrado corpo com uma bênção especial; Maria lhe
deu o último adeus e depois, tristes e lacrimosos, regressaram à
casa. No túmulo, o corpo de São José conservou-se incorrupto por
cerca de três anos, isto é, até a morte de Jesus na Cruz.
A
sua bendita alma, no entanto, apenas saída do corpo, acompanhado por
grupos de Anjos, desceu ao Limbo, onde a esperavam as Almas dos
Patriarcas, dos Profetas e dos justos mortos antes do Messias. E eis
que, ao chegar ali a sua bem-aventurada alma, ilumina-se aquele
Cárcere de expectativa com extraordinária luz, transforma-se em um
antecipado Paraíso.
Já
quase trinta anos antes, os Santos do Antigo Testamento, ao chegarem
ali as almas dos Santos Inocentes, tinham visto os primeiros frutos
da Redenção, mas agora, chegava a alma do Pai adotivo do próprio
Redentor.
Que
júbilo para todas aquelas almas justas; para Adão e Eva, para
Moisés, para Jacó e para todos aqueles que o
haviam figurado no Antigo Testamento: ver entre eles São José, dele
ouvir que o Messias já se achava na terra, que com seus próprios
olhos O tinha visto, conduzira-O em seus próprios braços,
assistira-O desde o Nascimento até a idade em que agora se achava,
isto é, quase trinta anos!
Os
nossos infelizes Progenitores enxugara então as lágrimas, cessaram
os suspiros dos Patriarcas, exultaram os Profetas. A alma de São
José, toda radiante de alegria, de esperança e de amor no Messias
já vindo, antecipou a todos os Justos do Antigo Testamento, a
alegria da iminente libertação.
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Fonte:
Rev. Pe. Tarcísio M. Ravina, da Pia Sociedade de São Paulo, São
José – na Vida de Jesus Cristo, na Vida da Igreja, no Antigo
Testamento, no Ensino dos Papas, na Devoção dos Fiéis e nas
Manifestações Milagrosas; 1ª
Parte, pp. 95-103.
Edições Paulinas, Recife, 1954.