A
Submissão ao Bispo
é
uma Bem-aventurança antecipada
Diante
da ignorância, invencível ou culposa, de muitos católicos em
relação da submissão dos leigos às Autoridades Eclesiásticas,
passo a expor alguns lampejos de doutrina certa e segura sobre o
assunto.
Eis
a Doutrina do Novo Testamento:
►
“O
que vos ouve, a
Mim ouve,
e o que vos despreza, a
Mim despreza.
E quem Me despreza, despreza Aquele que Me enviou”
(S. Luc. 10, 16).
►
“O
que vos recebe, a
Mim recebe;
e o que Me recebe, recebe Aquele que Me enviou”
(S. Mat. 10, 40; S. Jo. 13, 20).
►
“...
E, se
não ouvir a Igreja, considera-o como um gentio e um publicano...”
(S. Mat. 18, 15-18).
►
“Toda
a alma esteja sujeita aos Poderes Superiores,
porque não há poder que não venha de Deus; e
os
(poderes) que
existem foram instituídos por Deus.
Aquele,
pois, que resiste à Autoridade, resiste à ordenação de Deus. E os
que resistem, atraem sobre si próprios a condenação”
(Rom. 13, 1-2; 16, 17-20; 1ª Cor. 5, 9-13).
►
“Alexandre,
o latoeiro, fez-me muitos males; o
Senhor lhe pagará segundo as suas obras.
Tu também guarda-te dele, porque
opõe uma forte resistência às nossas palavras”
(2ª Tim. 4, 14-15).
►
“...
Ninguém
te despreze”
(Tit. 2, 9-10.15).
►
“Igualmente
vós, ó jovens, obedecei aos Sacerdotes”
(1ª S. Ped. 5, 5).
Caso
alguns menos favorecidos não tenham ainda entendido, passo a expor
com maior clareza.
►
“É
preciso glorificar de todos os modos a Jesus Cristo... a fim de
que... reunidos na mesma obediência, submetidos ao Bispo e ao
Presbítero, sejais santificados em todas as coisas... Convém
caminhar de acordo com o pensamento de vosso Bispo... Está claro,
portanto, que devemos olhar o Bispo como ao próprio Senhor...”
(Santo Inácio de Antioquia, “Carta aos Efésios”).
►
“Convém
que não abuseis da idade do vosso Bispo, mas, pelo poder de Deus
Pai, lhe tributeis toda reverência... Portanto, para honra daquEle
que nos amou, é preciso obedecer sem nenhuma hipocrisia, porque não
é ao Bispo visível que se engana, mas é ao invisível que se
mente...
É preciso não só levar o nome de cristão, mas ser de fato. Alguns
falam sempre do Bispo, mas depois agem de modo independente. Estes
não me parecem ter boa consciência... Por isso vos peço que
estejais dispostos a fazer todas as coisas na concórdia de Deus, sob
a presidência do Bispos, que
ocupa o lugar de Deus...
Que não haja nada entre vós que vos possa dividir, mas uni-vos ao
Bispo e aos chefes como sinal
e ensinamento de incorruptibilidade... Assim
como o Senhor nada fez, nem por Si mesmo nem por meio de seus
Apóstolos, sem o Pai, com O qual Ele é um, também vós não façais
nada sem o Bispo e os Presbíteros. Não tenteis fazer passar por
louvável coisa alguma que fizerdes sozinhos... Sejam
submissos ao Bispo...”
(Santo Inácio de Antioquia, “Carta aos Magnésios”; cfr. Carta
do Beato João Paulo II a todos os Sacerdotes da Igreja por ocasião
da 5ª Feira Santa de 1979).
►
“Quando
vos submeteis ao Bispo como a Jesus Cristo, demonstrais a mim que não
viveis segundo os homens, mas segundo Jesus Cristo... Da mesma forma,
todos respeitem... ao Bispo, que é a imagem do Pai... Sem eles
(Bispos, Presbíteros e Diáconos), não se pode falar de Igreja...
Aquele
que age sem o Bispo,
sem o Presbítero e os Diáconos, esses
não tem consciência pura...”
(Santo Inácio de Antioquia, “Carta aos Tralianos”).
►
“Com
efeito, todos
aqueles que são de Deus e de Jesus Cristo, esses estão também com
o Bispo...
Foi o Espírito que me anunciou, dizendo: 'Não
façais nada sem o Bispo...'
...” (Santo Inácio de Antioquia, “Carta aos Filadelfienses”).
►
“Segui
todos ao Bispo, como Jesus Cristo segue ao Pai... Sem o Bispo,
ninguém faça nada no que diz respeito à Igreja... Onde aparece o
Bispo, aí esteja a multidão, do mesmo modo que onde está Jesus
Cristo, aí está a Igreja Católica... Tudo
o que ele aprova, é também agradável a Deus... Quem respeita o
Bispo, é respeitado por Deus; quem faz algo às ocultas do Bispo,
servo ao Diabo...”
(Santo Inácio de Antioquia, “Carta aos Esmirniotas”).
►
“Atendei
ao Bispo, para que Deus vos atenda...”
(Santo Inácio de Antioquia, “Carta a São Policarpo”).
►
“Devemos
honrar não só nossos genitores, mas também os que merecem o nome
de pais, como são os Bispos, Sacerdotes... Todos são dignos, uns
mais e outros menos, de tirar proveito de nossa caridade, obediência,
e fortuna.
Dos
Bispos e outros Superiores Eclesiásticos está escrito: 'Sacerdotes,
que desempenham bem seu ministério, são dignos de honra dobrada,
principalmente os que se afadigam em pregar e ensinar' (1ª Tim. 5,
17). Na verdade, quantas provas de amor não deram os Gálatas ao
Apóstolo? Ele próprio lhes rendeu grande preito de gratidão:
'Posso assegurar-vos que, se possível fosse, até os próprios olhos
teríeis arrancado, para me fazerdes presente deles' (Gál. 4, 15)...
Deve-se-lhes
também obediência, conforme ensina o Apóstolo: 'Obedecei a
vossos Superiores, e sujeitai-vos a eles, pois estão vigilantes,
como quem deve contas de vossas almas' (Heb. 13, 17). Cristo
Nosso Senhor mandou até obedecer aos maus Pastores, quando
declara: 'Na cadeira de Moisés estão sentados os escribas e
fariseus. Respeitai, pois, e executai tudo o que vos disserem. Mas
não façais de acordo com suas obras, porque eles falam e não
praticam' (S. Mat. 23, 2-3)” (Catecismo Romano, Part. III, Cap. V,
Art. 13-14).
►
“Em
relação aos Superiores Eclesiásticos, eis o que nos ensina o
Espírito Santo: 'Teme
ao Senhor com toda a tua alma, e venera os seus Sacerdotes. Honra a
Deus de toda a tua alma e reverencia os Sacerdotes'
(Eclo. 7, 31.33). Eles
representam e ocupam o lugar de Deus
(1ª Cor. 4, 1)” (Teól. Giuseppe Perardi, “Novo Manual do
Catequista”, Part. II, Cap. I, Art. 2, N. 190, Pont. 3º).
►
“Na
própria Diocese, o
Bispo é visível princípio e fundamento da unidade da Igreja
formada à imagem da Igreja Universal, que surge como uma e única do
conjunto das igrejas particulares... É
dever dos fiéis acatar, com religiosa submissão, o ensinamento do
próprio Bispo,
aderindo à sua doutrina, sempre que ensine, em nome de Jesus Cristo,
verdades de Fé ou Costumes... Em
virtude deste poder, tem os Bispos o direito e o dever sagrado,
diante do Senhor, de legislar, de julgar e governar, em tudo quanto
se refere ao bem de suas ovelhas, ao culto e ao apostolado... Como
Pastores e moderadores da Igreja devem ser os Bispos honrados pelo
povo fiel, com obediência, amor e reverencia.
A situação singular que tem na Igreja justifica todo o aparato
externo que circunda suas pessoas, especialmente nas cerimônias
sagradas (D. Antônio de Castro Mayer, “Instrução Pastoral sobre
a Igreja”, de 2 de março de 1965).
Não
percam ocasião de inculcar verdadeira devoção ao Santo Padre o
Papa, e, em grau menor, ao Bispo... (D. Antônio de Castro Mayer,
“Carta Pastoral sobre Problemas do Apostolado Moderno”,
Diretrizes, nº 7, de 6 de janeiro de 1953; cfr. “Por um
Cristianismo Autêntico”, Editora Vera Cruz, São Paulo, 1971).
Estão,
portanto, fora do reto caminho os que criticam, tentam
desmoralizar e desprestigiar o Bispo, ou diminuir a sua autoridade...
Nem
seria necessário lembrar-vos as terríveis ameaças com que Jesus
quis proteger a missão dos seus Apóstolos e Sucessores: 'Se não
vos receberem nem ouvirem as vossas palavras, ao sair daquela casa ou
cidade, sacudi o pó dos vossos pés. Em verdade Vos digo: será
menos punida no dia do juízo a terra de Sodoma e Gomorra do que
aquela cidade' (S. Mat. 10, 14-15).
E
todos ouvimos, na cerimônia da Sagração, em defesa do Bispo, a
séria advertência da Igreja aos maledicentes: 'Quem falar mal
dele seja amaldiçoado; quem dele disser bem seja cumulado de
bênçãos!' (Pontifical Romano – Rito da Sagração
Episcopal)” (D. Fernando Arêas Rifan, “Mensagem Pastoral sobre o
Início do Ministério Episcopal do Novo Administrador Apostólico”,
de 5 de janeiro de 2003).
“Pastores
do rebanho,
os
Bispos sabem que podem contar
com
uma graça divina especial
no
cumprimento de seu ministério”
(Beato
João Paulo II, Exortação Apostólica “Pastores Gregis”,
dirigida
aos Bispos em 16 de outubro de 2003).
“Se
alguns não obedecerem às palavras que Cristo pronunciou por nossa
boca, saibam que se tornam réus de culpa mortal, e incorrem em
extremo perigo”
(Papa S. Clemente de Roma, 59, 1). Ou ainda este outro:
“Tudo
o que é contra a consciência leva ao Inferno”
(Papa Inocêncio III, Decret. Lib., II, Tit. 3, c. 3).
E,
por fim, se apesar de todo este aparato doutrinal, na tentativa de
formar uma boa consciência, ainda persistirem no erro, não resta
mais nada a fazer do que rezar a Deus por todos, e deixar estas
últimas palavras:
“Neste
ponto, faço minhas as palavras que um dia Santa Bernadete Soubirous
dirigiu a alguém, que quis ouvir de seus lábios a história das
aparições, mas que, depois de ouvi-la, declarou descortesmente:
'Não acredito'.
A
esse alguém, disse Santa Bernadete à queima-roupa: 'Estou
encarregada de contar-lhe o que lhe contei. Não estou, porém,
encarregada de fazê-lo crer'.
Crer
não é tarefa só do homem. É tarefa de dois: do homem e de Deus”
(Rev. Pe. João José Cavalcante, “As Aparições de Lourdes,
maravilha do século XIX”, p. 7).
Tratando
da obediência devida à Hierarquia Eclesiástica,
assim
ensinou o, então, Cardeal Albino Luciani:
“Querida
Santa Teresa, outubro é o mês da tua festa; pensei que me
permitirias entreter-me contigo por escrito.
Quem
olha para o famoso grupo de mármore no qual Bernini te representa ao
seres transpassada pelo dardo de um Serafim, pensa nas tuas visões e
êxtases. E faz bem: a Teresa mística dos arroubos é uma Teresa
verdadeira.
Mas
também verdadeira é a outra Teresa, a que mais me agrada:
aquela mais chegada a nós, tal como se depara na Autobiografia
e nas Cartas. É a Teresa da vida prática; que passa pelas
mesmas dificuldades que nós e sabe superá-las com destreza; que
sabe sorrir, rir e fazer rir; que se movimenta com desembaraço no
meio do mundo e dos acontecimentos mais diversos, e tudo isso graças
a numerosos dons naturais, mas sobretudo à sua constante união com
Deus.
Explode
a Reforma Protestante, a situação da Igreja na Alemanha e na França
é crítica. Tu te preocupas e escreves: 'Nem que fosse para
salvar uma só alma das muitas que lá se perdiam!'
Mulher!
Mas que vale por vinte homens, que não deixa nenhum meio por
experimentar, e consegue realizar uma reforma interna magnífica e,
com sua obra e seus escritos, influi na Igreja inteira; a primeira e
única mulher que – com Santa Catarina de Sena – haja sido
proclamada Doutor da Igreja.
Mulher
de linguajar sincero e de pena aparada e incisiva. Tinhas um
altíssimo conceito da missão das religiosas, mas escreveste ao
Padre Graciano: 'Pelo amor de Deus, atente bem ao que está fazendo!
Não acredite jamais nas freiras, porque se elas querem uma coisa,
recorrerão a todos os meios possíveis'. E, ao Padre Ambrósio,
recusando uma postulante, dizes: 'O senhor me faz rir quando afirma
que compreendeu aquela alma só de vê-la. Não é tão fácil
conhecer as mulheres'.
É
tua a lapidar definição do Demônio: 'Aquele pobre desgraçado
que não pode amar'.
A
Dom Sancho D'Ávila: 'Distrações na reza do Ofício Divino, eu
também as tenho... confessei-me disso com o Padre Domingos (Bañez,
teólogo famoso, N. do A.) e este me disse que não fizesse caso.
O mesmo digo ao senhor, pois o mal é incurável'. Conselho
espiritual é este, mas tu esparziste conselhos a mancheias e de todo
o tipo; ao Padre Graciano, chegaste a aconselhar que, em suas
viagens, montasse um burrinho mais manso, que não tivesse o vezo de
atirar os frades no chão, ou então se deixasse amarrar no próprio
burro para não cair!
Insuperável,
todavia, te demonstras na hora da batalha. Nada menos que o Núncio
ordena que te encerrem no convento de Toledo, chamando-te de 'mulher
irrequieta, vagabunda, desobediente e contumaz...' Mas, do convento,
os mensageiros que envias a Felipe II, a Príncipes e Prelados,
resolvem toda a embrulhada.
Conclusão
tua: 'Teresa sozinha não vale nada; Teresa mais um centavo valem
menos do que nada; Teresa mais um centavo e Deus, podem tudo!'
A
meu ver, és um caso notável de um fenômeno que se repete
regularmente na vida da Igreja Católica.
E
é que as mulheres, de per si, não governam – isto pertence à
Hierarquia – mas elas muitas vezes inspiram, promovem e, às
vezes, dirigem.
De
fato, se por um lado o Espírito 'sopra onde quer', por outro, a
mulher é mais sensível à religião e mais capaz de se consagrar
generosamente às grandes causas. Daí o exército numerosíssimo de
Santas, de místicas e de fundadoras surgidas na Igreja Católica.
Ao
lado destas, seria mister recordar as mulheres que iniciaram
movimentos ascético-teológicos cujo raio de ação foi vastíssimo.
A
nobre Marcela, que dirigiu no Aventino uma espécie de convento
formado de ricas e cultas patrícias romanas, colaborou com São
Jerônimo na tradução da Bíblia.
Madame
Acarie influenciou ilustres personagens, tais como o jesuíta Coton,
o capuchinho de Canfelt, o próprio Francisco de Sales e muitos
outros, influindo em toda a espiritualidade francesa do início do
século XVII.
A
princesa Amália de Gallitzin, desde o seu 'Círculo de Münster'
estimado até por Goethe, difundiu em toda a Alemanha setentrional
uma corrente de vida intensamente espiritual. Sofia Swetchine, russa
convertida, surgiu na França no início do século passado como
'diretora espiritual' dos leigos e Sacerdotes mais representativos.
Eu
poderia citar mais casos, mas torno a ti que, mais do que filha,
foste mãe espiritual de São João da Cruz e das primeiras
Carmelitas reformadas. Hoje, tudo está claro e aplainado a este
respeito, mas no teu tempo houve o desencontro acima relatado.
De
uma parte estavas tu, rica em carismas, energia ardente e luminosa,
que te havia sido concedida em proveito da Igreja de Deus; da outra,
estava o Núncio, isto é, a Hierarquia, a quem se impunha julgar da
autenticidade dos teus carismas. Num primeiro momento, devido a
informações distorcidas, o parecer do Núncio foi negativo. Uma vez
de posse das devidas explicações e examinando melhor as coisas,
estas se esclareceram: a Hierarquia aprovou tudo e os teus dons
puderam, assim, expandir-se em prol da Igreja.
٭٭٭
Mas
de carismas e de Hierarquia muito se ouve falar hoje também.
Especialista que foste no assunto, tomo a liberdade de tirar das tuas
obras os seguintes princípios:
1
– Acima de tudo, encontra-se o Espírito Santo. Dele provém tanto
os carismas como os poderes dos Pastores; cabe ao Espírito realizar
o acordo harmônico entre Hierarquia e carisma e promover a unidade
da Igreja.
2
– Carismas e Hierarquia são ambos necessários à Igreja, mas de
maneira diferente. Os carismas agem como acelerador, favorecendo o
progresso e a renovação. A Hierarquia deve antes servir de freio,
em proveito da estabilidade e da prudência.
3
– Por vezes, carismas e Hierarquia se entrelaçam e sobrepõem.
Alguns carismas, de fato, são concedidos em especial aos Pastores,
como os 'dons de governo' lembrados por São Paulo na 1ª Carta aos
Coríntios. E vice-versa, tendo a Hierarquia obrigação de regular
todas as principais fases da vida eclesiástica, os carismáticos
não se podem subtrair à sua direção, a pretexto de que possuem
carismas.
4
– Os carismas não são caça privilegiada de ninguém: podem ser
concedidos a todos, Padres e leigos, homens e mulheres. Uma coisa,
porém, é poder ter carismas, outra tê-los
de fato.
No
teu livro das Fundações, acho escrito o seguinte (c. VIII,
n. 7): 'Uma penitente afirmava a seu Confessor que Nossa Senhora
vinha visitá-la com frequência e com ela se entretinha a falar por
mais de uma hora, revelando-lhe o futuro e muita coisa mais. E, visto
que no meio de tanto dislate saía alguma coisa verdadeira, tudo se
tinha em conta de verdade. Logo entendi do que se tratava... mas
limitei-me a dizer ao Confessor que olhasse para o êxito das
profecias, que se informasse do estilo de vida da penitente e
exigisse outros sinais de santidade. Afinal... viu-se que tudo
eram extravagâncias'.
Querida
Santa Teresa, se voltasses hoje! A palavra 'carisma' anda num
desperdício; distribuem-se diplomas de 'profeta' a mancheias,
concedendo esse título até aos estudantes que enfrentam a polícia
nas praças e aos guerrilheiros da América Latina. Pretende-se
opor os carismáticos aos Pastores. Que dirias tu, que obedecias aos
teus Confessores mesmo quando os conselhos deles contrastavam com os
conselhos que Deus te outorgava na oração?
E
não penses que eu seja pessimista. Isso de ver carismas por toda
a parte, espero seja somente moda passageira. Por outro lado, bem
sei que os dons autênticos do Espírito sempre são acompanhados de
abusos e falsos dons; não obstante, a Igreja sempre progride de
igual maneira.
Na
jovem igreja de Corinto, por exemplo, havia grande florescimento de
carismas, mas São Paulo ficou bastante preocupado com alguns
abusos ali descobertos. O fenômeno repetiu-se depois em formas
aberrantes mais vistosas.
Duas
mulheres, Priscila e Maximila, que sustentavam e financiavam o
Montanismo na Ásia, começaram pregando 'carismaticamente' uma
renovação moral baseada em grande austeridade, na renúncia total
ao Matrimônio, na prontidão absoluta para o Martírio. Acabaram
contrapondo aos Bispos os 'novos profetas', homens e mulheres
que, 'investidos do Espírito', pregavam, administravam sacramentos,
aguardavam a Cristo que, de uma hora para outra, deveria vir
inaugurar o reino milenar.
No
tempo de Santo Agostinho, houve Lucila de Cartago, rica senhora que o
Bispo Ceciliano repreendera porque, antes da Comunhão, costumava
apertar ao peito um ossinho não se sabe de que Mártir. Irritada
e ressentida, Lucila induziu um grupo de Bispos a se oporem ao seu
Bispo; tendo perdido um processo perante o Episcopado africano, o
grupo protestou sem sucesso perante o Papa, depois perante o Concílio
de Arles, depois perante o próprio Imperador e deu início a uma
nova igreja. Com isso, havia em quase todas as cidades africanas
dois Bispos, duas catedrais, frequentadas por categorias antagônicas
de fiéis que, ao se encontrarem, chegavam às vias de fato; dum lado
os católicos e do outro os donatistas, seguidores de Donato e
Lucila.
Os
donatistas denominavam-se 'puros'; não se assentavam em lugar antes
ocupado por um católico, sem primeiro limpá-lo com a manga;
evitavam os Bispos católicos como pesteados; apelavam para o
Evangelho contra a Igreja, que diziam estar amparada pela autoridade
imperial; constituíram tropas de assalto. Certa vez, o
santíssimo Bispo Agostinho foi forçado a enfrentá-los: 'Se tanto
desejam o martírio, por que não tomam uma corda e não se
enforcam?'
No
século XVIII tivemos as religiosas de Port Royal. Uma sua abadessa,
Madre Angélica, começara bem; tinha 'carismaticamente' reformado a
si mesma e o convento, chegando a expulsar da clausura os próprios
pais. Escudada por grandes dons, nascida para governar, tornou-se,
porém, a alma da resistência jansenista, intransigente até o fim
perante a Autoridade Eclesiástica. Dela e de suas religiosas
costumava-se dizer: 'Puras como Anjos, soberbas como Demônios'.
Como
tudo isso fica longe do teu espírito! Que abismo entre essas
mulheres e tu! 'Filha da Igreja' era o nome de que mais
gostavas. Murmuraste-o no leito de morte, ao passo que, durante a
vida, tanto labutaste pela Igreja e com
a Igreja, aceitando mesmo sofrer alguma coisa da parte da Igreja.
E
se ensinasses um pouco o teu método às 'profetizas' de hoje?!
Outubro,
1974”.
(Cardeal
Albino Luciani, “Ilustríssimos Senhores”, Cap. Teresa, um
centavo e Deus, pp. 201-205; Edições Loyola, São Paulo, 1979).