Blog Católico, para os Católicos

BLOG CATÓLICO, PARA OS CATÓLICOS.

"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

domingo, 23 de julho de 2023

COMO NA TRIBULAÇÃO, DEVE O HOMEM SE ENTREGAR NAS MÃOS DE DEUS.

(Qualiter homo desolatus se debet in manus Dei offerre)1


1. ALMA FIEL. Senhor meu Deus, Pai Santo, bendito sejais agora e para sempre, porque como quereis assim foi feito, e tudo quanto fazeis é bom.

Alegre-se o vosso servo, não em si nem em criatura alguma, senão em Vós; só Vós sois a verdadeira alegria, minha esperança e minha coroa, Vós, minha felicidade e minha glória.

Que possui o vosso servo que de Vós não tenha recebido, sem nenhum merecimento seu?

Eu sou pobre e em trabalhos vivo desde a minha juventude;2 algumas vezes contrista-se a minha alma até as lágrimas, outras, perturba-se por causa das paixões que ameaçam assaltá-la.

2. Desejo a alegria da paz, imploro a paz dos vossos filhos que apascentais na luz das vossas consolações.

Se me concederdes a paz, se me infundirdes a santa alegria, encher-se-á de melodias a alma de vosso servo e, em transportes de devoção, entoará os vossos louvores.

Mas se Vós, Vos retirardes, como costumais fazer tantas vezes, já não poderá correr no caminho dos vossos Mandamentos; cairá de joelhos e baterá no peito, porque já não lhe vão as coisas como antes, quando resplandecia sobre a sua cabeça a vossa luz,3 e à sombra de vossas asas se abrigava,4 contra o assalto das tentações.

3. Pai justo e digno sempre de ser louvado, é chegada a hora da provação para o vosso servo.

Pai amável, justo é que nesta hora padeça alguma coisa por vosso amor.

Pai eternamente adorável, chegou a hora que previstes desde toda a eternidade em que por algum tempo há de sucumbir o vosso servo exteriormente, sem cessar, internamente, de viver sempre em Vós.

Por algum tempo necessário é que seja vilipendiado, humilhado e abatido diante dos homens, quebrantado de sofrimentos e enfermidades, para que de novo convosco ressuscite na aurora da nova luz e nos esplendores do Céu.

Pai Santo, assim o determinastes, assim o quisestes; cumpriu-se o que ordenastes.

4. É uma graça que fazeis aos que Vos amam: enviar-lhes padecimentos e tribulações neste mundo, por vosso amor, quantas vezes permitis e por quem permitis.

Nada acontece na terra sem razão, sem sabedoria e sem ordem da vossa Providência.

Bom para mim, Senhor, foi que me tenham humilhado, para que aprenda vossos justos juízos5 e desterre do meu coração toda presunção e toda soberba.

Foi-me útil que o meu rosto se haja coberto de confusão6, para que procure a consolação antes em Vós que nos homens.

Aprendi assim a temer também os vossos imperscrutáveis juízos, segundo os quais afligis o justo e o ímpio, mas sempre com equidade e justiça.

5. Graças Vos dou, porque não deixastes sem castigo as minhas maldades, ferindo-me severamente, infligindo-me dores e enviando-me angústias interiores e exteriores.

De quanto existe debaixo do Céu, nada é capaz de consolar-me; só Vós, Senhor meu deus, Médico celeste das almas, que feris e sarais, lançais no abismo e tornais a salvar.7

Estou sob a vossa disciplina e os vossos próprios castigos me instruem.8

6. Pai querido, eis-me nas vossas mãos, curvo-me sob a vara que me castiga.

Feri-me as costas e a cerviz, para que a vossa vontade endireite o que em mim há de tortuoso.

Fazei-me discípulo vosso, humilde e piedoso, como sabeis tão bem fazê-lo, sempre pronto a obedecer ao menor aceno vosso.

Entrego-me com tudo o que me pertence a vossa correção: melhor é ser punido nesta vida do que na futura.

Conheceis todas as coisas e cada uma em particular; e nada Vos é oculto na consciência do homem.

Sabeis o futuro antes que se realize e não tendes necessidade de quem Vos instrua ou advirta do que se passa na terra.

Sabeis o que é útil ao meu aproveitamento e como serve a tribulação para purificar a ferrugem dos vícios.

Disponde de mim segundo a vossa adorável vontade, e não me desprezeis por causa de minha vida pecaminosa, que ninguém conhece melhor e mais claramente que Vós.

7. Dai-me, Senhor, a graça de saber o que veem os olhos, nem sentencie pelo que ouço de homens sem experiência, mas fazei que saiba discernir, com juízo verdadeiro, as coisas sensíveis e as espirituais e busque acima de tudo a vossa vontade.

8. Enganam-se muitas vezes no julgar os sentidos dos homens; erram também os amigos do mundo, amando só as coisas visíveis.

Torna-se porventura melhor um homem, porque por maior o estima um outro?

O homem que exalta outro é um mentiroso, que engana outro mentiroso; um vaidoso que engana outro vaidoso; um cego que engana outro cego; um doente que engana outro doente; e na realidade cobre-o de confusão com os seus vãos louvores.

Por isso, já dizia o humilde São Francisco: o homem vale o que vale aos vossos olhos e nada mais.

1ª Reflexão9

O valor das nossas oferendas diante de Deus está dependente das disposições da nossa vontade; damos muito, quando damos de boa vontade o que Deus nos pede: meu filho, dá-me o teu coração.10 Deus primeiro olha para o coração do que para as mãos do oferente. Abel fazia oblações ao Senhor e Caim também as fazia, mas com resultado muito diverso; as de Caim eram desprezadas e as de Abel aceitas: e o Senhor olhou favoravelmente para Abel e para as suas dádivas.11 E por que não olhou nem para Caim, nem para as suas ofertas? Porque as ofertas de Caim eram desacompanhadas da oferta do seu coração, e Deus quer primeiro que tudo, a oferta de um coração puro. Se o o coração de Caim não agradava ao Senhor, que valor podiam ter os frutos da terra oferecidos pelo mesmo Caim? Eram sem valor as ofertas, porque era sem amor o coração do oferente.

Grande lição esta para muitas pessoas que, no meio das suas enfermidades e aflições, costumam fazer promessas e votos sem cuidarem, primeiro que tudo, de se tirarem do estado de pecado mortal, por meio de uma Confissão bem-feita. Fazem ofertas a Deus e não tratam de se reconciliar com Ele! Invocam a proteção dos Santos e ultrajam o Santo dos Santos!

Tiremos das provações que Deus nos enviar o maior fruto possível: feliz o homem que é repreendido por Deus; não recuses, pois, a exprobração do Senhor.12 Imitemos o exemplo dos Santos. São Marco e São Marcelliano, irmãos e romanos, tendo sido presos pelo general Fabiano, foram amarrados a um poste e pregados pelos pés com cravos. Voltando-se para eles o juiz, disse-lhes: olhai, ó miseráveis, escapai-vos também destes tormentos! – Eles responderam: nunca tivemos festim que tanto nos deliciasse, como este de sofrer de boa vontade por causa de Jesus Cristo, em cujo amor começamos agora a ser cravados. Praza a Deus que nos seja permitido sofrer estes tormentos durante todo o tempo que estivermos revestidos deste corpo corruptível. Tendo passado a cantar louvores ao Senhor, um dia e uma noite, no meio dos suplícios, alcançaram, finalmente, a palma do Martírio, atravessados a golpes de lança.13 O cristão que assim se entrega nas mãos de Deus, com inteira submissão, é um cristão perfeito. Quão raros são hoje esses cristãos!

2ª Reflexão14

Permite Deus, que nossa alma seja algumas vezes como que abandonada. Nenhuma consolação, nenhuma luz; mas de todas as partes provações, trabalhos, tentações, angústias: parece-lhe que vai sucumbir, porque não sente já o braço que a sustentava. Que faremos então? Diremos como Jesus: “Meu Deus, meu Deus, por que me desamparastes?” E, contudo, ficaremos em paz no sofrimento e nas trevas, “até que declinem as sombras, e descubramos a aurora de um novo dia”.15

Este estado é o maior exercício da fé; é para a alma uma imagem da morte; fria, sem movimento, insensível em aparência, está como encerrada no túmulo, e parece não se unir a Deus senão por uma vontade frouxa de que ela mesma não está segura. Oh, quantas graças são o fruto desta agonia suportada com humilde paciência! Oh, quantos pecados resgata este padecimento! Então se completa em nós o Mistério da salvação,16 e chegamos a ser verdadeiramente conformes a Jesus, contanto que não cessemos de repetir, com uma fé sincera, estas palavras de resignação: “Sim, meu Pai, aceito o cálice; quero bebê-lo até o fim; sim, Pai Santo, porque essa é vossa vontade”.17

Por que não aprendo de Vós, meu Divino Mestre, aonde hei de ir buscar o remédio e consolação quando me vejo tentado e afligido? Por que busco fora de Vós consolação, alegria de minha alma? Quem me a pode dar senão Vós? Adoro-te, Divina e amorosa mão, que castigando consolas, atribulando animas, afligindo alegras, derrubando levantas, e matando dás vida. Com razão vivo triste, pois de Vós fujo. Sou todo miserável, Bom Jesus, porque, ou de Vós fujo quando me atribulais, e não busco em Vós consolação; ou, Vos busco apegado à minha vontade e amor-próprio, que impede a obra que quereis fazer nesta alma. Livrai-me de mim, Deus meu, pois eu sou o que me mato, e o que ponho todos os impedimentos à vossa graça e à vossa luz; curai-me Vós, Deus meu, em tudo, como quem sois. Verdadeiramente, Deus meu, sois Pai deste pecador e Amigo desta alma, quando Vos amarei de todo o coração e Vos obedecerei em tudo sem contradição? Quando do íntimo desta alma Vos dirá meu coração sempre e em tudo: Não se faça minha vontade senão a vossa? Onde mereci eu, Deus meu, ser governado por essa Vontade paternal, amorosa e divina? Ó, verdadeiro Pai de misericórdia, perdoai-me minhas ingratidões e fraquezas, fazei sempre em mim vossa vontade. Oh, Bom Jesus, faça-se vossa vontade e não a minha, em tudo e por tudo.

3ª Reflexão18

Oh, que excelente maneira de orar, é a de contentar-nos de representar simplesmente nossas necessidades a Nosso Senhor, depois deixá-Lo fazer, estando seguros de que Ele há de prover, segundo nos for mais conveniente, contentando-nos de Lhe dizer: Senhor, eis aqui vossa pobre criatura desolada e aflita, cheia de secura e aridez, cheia de misérias e de pecados; mas, Vós bem sabeis do que eu necessito, basta-me apresentar-me qual sou; a Vós pertence prover as minhas misérias, segundo o que Vos aprouver e me for mais útil para vossa glória.19

Não, minha querida filha, não só devemos levar a bem, que Deus nos fira, mas devemos aquiescer a que seja sobre o lugar que Lhe aprouver. A escolha há de se deixar a Deus, porque Lhe compete. Davi oferecia sua vida pela de Absalão, mas porque este se perdia morrendo; em tal caso deve-se conjurar a Deus: mas nas perdas temporais, sirva-se Deus tocar e ferir onde quiser e sobre tal corda de nosso alaúde que escolher; nunca deixará de fazer boa harmonia. Senhor Jesus, sem reserva, sem condição, sem exceção, sem limitação, seja feita vossa vontade sobre pai, sobre mãe, sobre filha, em tudo e em todas as partes! Ah, eu não digo que não se deva orar pela conservação deles, mas a Deus não se deve dizer: Deixai isto, e tomai aquilo.20


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1.  Imitação de Cristo, nova tradução portuguesa pelo Pe. Leonel Franca, S.J., Livro III, Cap. L, pp. 181-184. 4ª Edição, Livraria José Olympio Editora, Rio de Janeiro/São Paulo, 1948.

2.  Ps. LXXXVII, 16.

3.  Job XXIX, 3.

4.  Ps. XVI, 8.

5.  Ps. CXVIII, 71.

6.  Ps. LXVIII, 8.

7.  Tob. XIII, 2.

8.  Ps. XVII, 36.

9.  Imitação de Cristo, novíssima edição, confrontada com o texto latino e anotada por Monsenhor Manuel Marinho, Livro III, Cap. L, pp. 268-273. Editora Viúva de José Frutuoso da Fonseca, Porto, 1925.

10.  Prov. XXIII, 26.

11.  Gên. IV, 4.

12.  Job V, 17.

13.  Breviário de 18 de Junho.

14.  Imitação de Cristo, Presbítero J. I. Roquette, Livro III, Cap. L, pp. 346-353. Editora Aillaud & Cia., Paris/Lisboa.

15.  Matth. XXVI, 46; Cânt. II, 17.

16.  Col. I, 24.

17.  Matth. XI, 26.

18.  Imitação de Cristo, versão portuguesa por um Padre da Missão, Livro III, Cap. L, pp. 285-289. Imprenta Desclée, Lefebvre y Cia., Tornai/Bélgica, 1904.

19.  São Francisco de Sales, Sermão para o II Domingo depois da Epifania.

20.  São Francisco de Sales, 78ª Carta espiritual, X.


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