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D. Jaime de Barros Câmara |
Regozijemo-nos no Senhor,
mas não Cruzemos os Braços.
Jesus Cristo, o Verbo de Deus, que se fez homem para salvar
o homem, é hoje o que era ontem e o que será pelos séculos, a Luz do mundo, o
Caminho, a Verdade e a Vida. Sem Cristo não haverá salvação, nem para os
indivíduos nem para os povos. Longe d’Ele ou contra Ele, todos os esforços de
construção serão baldados. E por haverem deliberadamente fechado os olhos à luz
da mensagem evangélica, multiplicaram-se os erros políticos, sociais e morais,
que desfecharam na catástrofe que ora enluta a humanidade… Cruzar os braços em
face de ruínas, não é gesto cristão…
A Igreja a todos estende os benefícios de sua assistência
espiritual; Ela não é nem pode ser partidária, e sua atividade, sempre
indispensável às almas e às nações, não pode estar sujeita aos vai-vens da
política de partidos. “Querer empenhar a Igreja”, já escrevia Leão XIII, “nas
lutas de partido e pretender servir-se de seu apoio para triunfar com mais
facilidade dos adversários, é abusar indiscretamente da Religião” (Carta
Encíclica “Sapientiae Christianae”, Editions des Lettres Apostoliques de Léon
XIII, Maison de la Bonne Presse, t. II, p. 289). A política divide, a religião
une...
Aos fiéis (a Igreja) permite que, no desempenho de seus
deveres cívicos, militem em partidos que não contrastem com as exigências
superiores do bem comum e da consciência católica…
Na esfera das respectivas atribuições, lembremo-nos todos
ainda da lição do grande Papa Pio XII, na sua Alocução de Natal de 1942: “Quem deseja
que a estrela da paz nasça e se detenha sobre a sociedade… favoreça por todos
os meios lícitos, em todos os campos da vida, aquelas formas sociais em que se
torne possível e se garanta plena responsabilidade social” (Pio XII, “Problemas
da Guerra e da Paz”, Lisboa, s. d., p. 351.
“Tudo quanto, nas instituições ou nos costumes, contribuir
para desviar a família dos seus altos fins, representa uma vitória das paixões
sobre a razão, do individualismo egoísta sobre os imperativos sociais do bem
comum, e acarretará sobre um povo as mais calamitosas desgraças que poderão
desfechar até na catástrofe fatal do suicídio… Aos fiéis e às próprias famílias
recomendamos a solicitude vigilante e enérgica em combater as ideias, os
costumes, as infiltrações insidiosas de mentalidades que possam atentar contra
a dignidade tradicional e cristã da família brasileira.
A crença em Deus é o mais forte esteio da vida moral…
Enquanto o ateísmo desfecha logicamente no amoralismo, a presença de Deus
representa nas almas uma fonte inesgotável de fortaleza, de dedicação, de
sacrifício, de energias sempre renovadas para o bem… A incredulidade trabalha
para a ruína e desagregação dos povos; a religião é a base insubstituível de
toda a vida social. Sem voltar sinceramente a Deus e a Jesus Cristo, a
humanidade, desolada por tantas ruínas e dividida por tantos ódios, não
encontrará os verdadeiros caminhos da paz.
Nós temos, por graça de Deus, na mensagem da nossa fé, uma
doutrina de verdade e de vida. Esconder esta luz sob o alqueire seria omissão
de incalculáveis responsabilidades. Nenhuma alma generosa pode resignar-se à
cumplicidade de abstenções comodistas. O amor de Deus e das almas, o sentimento
de justiça e de caridade, a piedade filial para com a Pátria condenam a inação,
e impõem-nos uma atividade esclarecida, coesa e disciplinada.
Aos esforços da ação cumpre associar uma cruzada de orações.
Se Deus não construir a casa, em vão trabalham os que a edificam; se Deus
não guardar a cidade, frustrada será a vigilância dos que por ela velam
(Salm. 126, 1). Levantemos os braços a Deus numa oração constante e humilde
para que Ele proteja o Brasil e a humanidade, inspire propósitos de justiça e
de paz aos que neste momento têm em mãos os destinos dos povos.
À Virgem Imaculada, que,
da colina da Aparecida, estende o seu manto materno sobre a Terra de Santa
Cruz, renovemos, com a consagração das nossas almas, a desta Pátria estremecida
a Ela singularmente devotada.
Fonte: "Manifesto do Episcopado - Sobre o Problema Político e a Questão Social no Brasil"; Livraria Agir Editora, 1945.