Blog Católico, para os Católicos

BLOG CATÓLICO, PARA OS CATÓLICOS.

"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

quarta-feira, 25 de dezembro de 2019

Santa Missa de Natal - Ritos Finais. (25/12/2019)

Santa Missa de Natal - Comunhão. (25/12/2019)

Santa Missa de Natal - Consagração. (25/12/2019)

Santa Missa de Natal - Credo. (25/12/2019)

Santa Missa de Natal - Sermão. (25/12/2019)

Santa Missa de Natal - Glória - Epístola e Evangelho. (25/12/2019)

Santa Missa de Natal - Ritos Iniciais. (25/12/2019)

terça-feira, 24 de dezembro de 2019

A NATIVIDADE DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO.


25 DE DEZEMBRO1


Em 749, ano da fundação de Roma, gozando todo o universo de uma profunda paz, Jesus Cristo, Deus Eterno, e Filho do Eterno Pai, querendo santificar o mundo com seu Santo Advento, tendo sido concebido por obra do Espírito Santo, e tendo-se passado nove meses depois de sua Conceição, nasceu em Belém, cidade de Judá, da gloriosa Virgem Maria. Hoje é este dia tão solene no mundo, no qual se celebra a Natividade de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo a carne.

Deste modo anuncia a Igreja hoje a todos os fiéis o dia célebre do Nascimento do Salvador do mundo, dia tão desejado, por tanto tempo esperado, pedido com tantas instâncias pelos Patriarcas e Profetas, e por quantos esperavam a Redenção de Israel; e este é o Nascimento ditoso, cuja história vamos dar.

Nunca tinha havido no mundo uma paz mais universal, do que a que então reinava. Aproveitando-se o imperador Augusto desta tranquilidade geral, teve a curiosidade de fazer o recenseamento das forças do império, fazendo-se para isso uma descrição exata de todos os seus súditos. Cirino teve a comissão de fazer o da Síria, da Palestina e da Judeia; para melhor execução, ordenou que cada um fosse inscrever-se na cidade, donde era originária sua família.

Logo que se publicou o edito do imperador, São José partiu de Nazaré, pequena cidade da Galileia, onde tinha seu domicílio, e dirigiu-se à Judeia, à cidade de Davi, chamada Belém, porque era da casa e da família de Davi, para se fazer inscrever com Maria, sua esposa, que estava nas proximidades do parto. Belém não passava então de um lugar ou aldeia da tribo de Judá a duas léguas de Jerusalém. Não foi pequeno trabalho para a Santíssima Virgem e para São José terem de fazer quatro dias de marcha para irem da baixa Galileia até Belém, primeira residência da tribo de Davi, da qual derivavam a sua origem um e outro. Mas como ambos estavam perfeitamente ao fato do Mistério, e sabiam que o Messias, segundo a profecia de Miqueias, devia nascer em Belém, sofreram com gosto os incômodos da viagem.

Tendo chegado a Belém, foram mal recebidos; não houve a menor consideração nem por sua qualidade, nem pelo estado, em que ia a Santíssima Virgem. A pobreza atraiu-lhes o desprezo e o abandono; estando além do mais, as estalagens todas repletas de hóspedes, que tinham concorrido de todas as partes, e entrando já de noite na povoação, Maria e José, as duas pessoas mais santas e respeitáveis do universo, a quem todos os homens deveriam render homenagem, viram-se obrigados a retirar-se para uma espécie de curral ou estábulo fora do povoado, onde então estavam um boi e um jumento, tendo-o assim disposto a Providência divina em cumprimento das profecias de Habacuc e de Isaías.

Uma pousada tão abjeta não deixou de contristar a Mãe de Deus e São José; mas era conveniente para Aquele que vinha ensinar a humildade aos homens, e cuja grandeza e majestade são independentes de todos os artifícios exteriores. Não ignorando a Santíssima Virgem a hora, em que o Salvador devia nascer, passou com São José todo o tempo que precedeu este nascimento em uma suave e amorosa contemplação do Mistério que ia ter lugar. À meia-noite, sentindo que o termo era chegado, deu à luz sem dor e sem lesão alguma de sua pureza virginal a seu Filho Primogênito, e também Único Filho, ao qual adorou prostrada por terra com aqueles transportes de amor, de admiração e de respeito, de que só Deus pode conhecer o ardor o preço e a medida. Tomando-O depois em seus braços, envolveu-O nos panos que tinha trazido, e reclinou-O no presépio, onde se dava de comer aos animais. Tal foi o berço que escolheu Jesus Cristo para começar a confundir o nosso orgulho, e ensinar-nos a desprezar as grandezas, as comodidades e todos os falsos bens do mundo. Fácil será compreender que impressão produzira em São José à vista deste divino Salvador, que por uma predileção particular havia escolhido, para que fizesse para com Ele as vezes de Pai; quais seriam os seus atos de adoração, amor e humildade aos pés de um Deus feito Menino! Aos pés do Verbo Encarnado, Filho Único de Deus Vivo, igual em tudo ao Pai! Aquele vil lugar, aquela abjeta gruta foi então o lugar mais respeitável do universo. Nenhum Anjo deixou de vir adorá-lO a este lugar; não houve um só que no primeiro momento, em que este divino Infante veio à luz, não se desse pressa de vir render-lhe suas homenagens.

Que fundo de reflexões, meu Deus, não nos oferecem todas as circunstâncias deste maravilhoso Nascimento! A Santíssima Virgem busca uma pousada na aldeia de Belém; mas o grande concurso de gente que chega a toda hora faz que não a encontre; reservam-se os alojamentos para hóspedes mais ricos. A Santíssima Virgem e São José talvez que houvessem tido um pobre canto, quando o procuravam; mas, sem dúvida, que não havia em Belém lugar bastante pobre para Jesus Cristo. Era necessário uma caverna, um curral, um estábulo para acolher e albergar as duas pessoas mais dignas, mais amadas de Deus, mas repelidas por todos e desprezadas em toda a parte. Ó Salvador meu, como começais cedo a reprovar e a confundir a soberba do mundo! Quem imaginaria que o Supremo Autor do universo havia de nascer em lugar tão vil e desprezível? Que espetáculo tão assombroso! Um Deus Menino, e este Menino-Deus para quem o Céu não tem coisa bastante magnífica, e que firma um trono entre as estrelas, está reclinado em um presépio, é aquecido e confortado pelo hálito de dois animais, está exposto a todas as inclemências da estação, enquanto que tantos reis, que são seus súditos, nascem em palácios magníficos e na abundância de todas as coisas. Ibi aula regia, exclama São Bernardo, ubi curiae regalis frequentia? Onde está o palácio deste Rei recém-nascido? Onde está o seu trono, onde os oficiais de sua numerosa corte? Nunquid aula est estabulum, thronus praesepium; et totius aulae frequentia Joseph et Maria? Seu palácio é o estábulo, seu trono é o presépio; Maria e José compõem toda a sua corte. Queres saber, diz Santo Agostinho, quem é o que nasceu desta sorte? Eu o direi a ti: É o Verbo do Pai Eterno, o Criador do mundo, a Luz do Céu, a Fonte da paz e da Bem-aventurança eterna, a Salvação da linhagem humana, O que traz ao caminho os que se extraviam; enfim, Aquele que é toda a alegria e esperança dos justos.

Não obstante ter querido o Filho de Deus nascer em um estábulo, não deixou de manifestar o seu Nascimento aos Judeus e aos Gentios. Os Anjos anunciam-nO aos pastores, e uma estrela milagrosa aos reis magos. Vigiavam uns pastores nos campos dos arredores, guardando seus gados, porque sendo o inverno temperado e tardio na Judeia, podia muito bem apascentar-se o gado por este tempo de noite. Apareceu-lhes um Anjo mais resplandecente do que o sol; ao princípio ficaram deslumbrados e cheios de temor; mas o mesmo Anjo que ocasionara esse sobressalto tranquilizou-os, dizendo-lhes: Não temais, porque sou portador da Nova mais alegre que podeis esperar, a qual deve ser para vós e para todo o povo motivo de grande gozo: Evangelizo vobis gaudium magnum, quod erit omni populo. Acaba de nascer o Salvador em Belém, que vós chamais de Davi, o qual é o Messias, o Salvador das almas, vosso Senhor e vosso Deus; adorá-lo-eis envolvido em panos e reclinado muito pobremente no presépio de um estábulo; estes são os sinais, por onde O haveis de conhecer, e convencer-vos da verdade do que vos digo. Mal acabara o Anjo de falar, eis que ressoou a música dos concertos angélicos, que entoavam louvores a seu Senhor e seu Deus: Gloria in excelsis Deo, et in terra pax hominibus bonae voluntatis, glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de coração reto. O Salvador que acaba de nascer traz e procura infundir uma e outra.

Notai, dizem os Santos Padres, que Deus não manda anunciar o Nascimento de seu Filho aos sábios, nem aos ricos de Belém, porque a soberba, a avareza, o prazer, são grandes embaraços para ir adorar um Deus pobre e humilde. Os primeiros, a quem se anuncia Jesus Cristo são os pastores, homens pobres, humildes, trabalhadores, porque são os mais capazes de entrar por meio da sinceridade nos Mistérios da Religião. Mas que sinais descrevem a esta pobre gente da Divindade deste Menino e da verdade do Messias? Os panos em que está envolto, o presépio, onde está reclinado e o estábulo. São estes os sinais, por onde se há de chegar ao conhecimento da Suprema Majestade de Deus? Não por certo; mas por estes sinais de pobreza e aniquilamento se chega ao conhecimento de um Deus Salvador, que vem livrar os homens da escravidão do pecado e da tirania das paixões. Mas que glória, a que advém a Deus deste Nascimento! A Encarnação é a obra por excelência de Deus; todas as divinas perfeições, o poder, a sabedoria, a bondade, a justiça, a misericórdia, resplandecem aqui do modo mais excelente. Jesus Cristo vem reconciliar o mundo com seu Pai, destruir o pecado, domar o Demônio, sujeitar a carne ao espírito, unir as vontades dos homens entre si e com a de Deus.

Com razão pois se anuncia hoje paz àqueles que foram dóceis à doutrina e às graças do Salvador.

Os pastores não desprezam o aviso que o Céu lhes enviou, ao contrário disso, exortando-se uns aos outros a irem ver estas maravilhas, partem sem perda de tempo, chegam a Belém depois da meia-noite, e tendo achado o estábulo, entram nele penetrados de uma unção admirável da graça, que em suas almas derramava interiormente aquele divino Menino; prostram-se a seus pés, adoram-nO como a seu Deus e Salvador, e tendo feito seus cumprimentos à Santíssima Virgem e a São José, voltam a seus rebanhos cheios de um gozo inefável; não cessam de glorificar ao Senhor por todas as coisas que viram e ouviram, e contam-nas com sua natural sinceridade a quantos encontram. Todos os que os ouviram, diz o Evangelho, ficaram atônitos das coisas que souberam e aprenderam da boca dos pastores.

Ó amor inefável! Exclama aqui Santo Agostinho; ó caridade incompreensível, cujo preço somos incapazes de conhecer! Quem teria jamais podido imaginar que Aquele que está no seio do Pai desde a eternidade, havia de nascer de uma mulher no tempo por nosso amor? Que honra e que glória a tua, ó homem, acrescenta o mesmo Padre, que um Deus se haja dignado fazer-se teu irmão!” “Quis nascer assim, diz São Pedro Crisólogo, porque assim quis ser amado”. “No Nascimento de Jesus Cristo, diz São Bernardo, o presépio grita-nos altamente que devemos fazer penitência; o estábulo, as lágrimas, os pobres panos pregam a mesma virtude. Tudo prega no Nascimento do Salvador, tudo é instrutivo, tudo é lição, e tudo nos diz que em qualquer condição, em que tenhamos nascido, em qualquer estado, em que vivamos, seja vil ou eminente o posto, que ocupamos no mundo, é necessário que o nosso coração esteja desprendido dos bens e prazeres desta vida; é necessário que sejamos humildes, penitentes, mortificados, se queremos que o Nascimento do Salvador nos seja útil, se queremos ter parte na Redenção".

A festa da Natividade do Salvador, que sempre tem sido das mais solenes da Igreja, o Advento que a precede, e que por muitos séculos foi um tempo de jejum, como o é ainda hoje para muitas comunidades religiosas; as orações e a solenidade dos oito últimos dias do Advento, as três Missas que cada Sacerdote diz neste dia; tudo isto está denotando a celebridade da festa. Em todos os tempos se tem celebrado o dia aniversário dos príncipes em todas as cortes e em todos os povos.

E poderia ser menos célebre para os fiéis o dia de Natal do seu Salvador? Esta consideração pesou no juízo da Igreja, quando, vendo-se forçada a abolir todas as vigílias que estavam em uso, deixou a da Natividade por causa da solenidade do dia. A Tradição desde os Apóstolos até nós fixou sempre a célebre época deste Nascimento no dia 25 de Dezembro, e a Igreja conta os anos da Redenção pelos da Natividade, e neste cálculo tem disposto todos os Ofícios, como se conclui da ordem de sua liturgia e dos antigos martirológios, fixando o começo do ano eclesiástico no dia do Nascimento do Salvador do mundo.

Pelo que respeita às três Missas que diz o Sacerdote neste dia, este uso estava já estabelecido na Igreja no tempo do Papa São Gregório, aí pelo ano de 600; pois este doutor adverte que o tempo, que se emprega em dizê-las, devia ser motivo para neste dia se abreviar o tempo destinado à pregação. O sentido místico das três Missas neste dia, tem dado lugar ao estudo dos fundamentos deste rito extraordinário. Uns julgam que era para honrar particularmente cada uma das Pessoas da Santíssima Trindade, que tão notável parte tinham neste Mistério. Outros creem, como o Salvador nasceu à meia-noite, que a Igreja tem o intento de santificar esta primeira manifestação do Salvador com outra Missa, e a terceira é a que se diz solenemente, quando congrega o povo para celebrar as grandes solenidades. Outros dizem que a Missa da meia-noite era para honrar o Nascimento temporal do Salvador; a que se diz ao amanhecer para honrar o tempo da Ressurreição, e a terceira que se diz solenemente perto do meio-dia, era em honra do Nascimento eterno no seio do Pai.

Pelo que diz respeito à gruta sagrada, onde quis nascer o Salvador, sempre foi objeto da maior veneração. É verdade que o imperador Adriano em ódio aos cristãos mandou levantar em cima um templo consagrado a Adônis, esperando apagar com esta sacrílega profanação a memória de um lugar tão respeitável; mas não obstou tudo isto a que os próprios pagãos olhassem este santo lugar com respeito, e dissessem sempre: “este é o lugar onde o Deus dos cristãos quis nascer”. Cessando as perseguições, demoliram o templo dos pagãos e edificou-se em seu lugar uma igreja magnífica, forrada de folha de prata, as paredes embutidas de mármore. Edificaram-se muitos mosteiros ao redor; e o que o tornou mais célebre foi a predileção que São Jerônimo teve por este sítio, que escolheu para morada. O presépio santificado com o contato do Salvador, foi levado depois para Roma, onde se conserva com muita veneração na célebre igreja de Santa Maria Maior, que por isto se chama de Santa Maria ad praesepe.


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1.  Rev. Pe. Croiset, “Ano Cristão”, Vol. XII, 25 de Dezembro, pp. 272-276. Traduzido do Francês pelo Rev. Pe. Matos Soares, Tip. “Porto Médico”, Porto, 1923.


Desejo a Todos
um Santo e Feliz Natal



segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

O PRIMEIRO PRESÉPIO MONTADO.


A Devoção
ao Presépio Natalino

S. Francisco de Assis prepara um Presépio no dia de Natal.1 Sua maior intenção, seu desejo principal e plano supremo era observar o Evangelho em tudo e por tudo, imitando com perfeição, atenção, esforço, dedicação e fervor os “passos de Nosso Senhor Jesus Cristo no seguimento de sua doutrina”. Estava sempre meditando em suas palavras e recordava seus atos com muita inteligência. Gostava tanto de lembrar a humildade de sua Encarnação e o amor de sua paixão, que nem queria pensar em outras coisas.


Precisamos recordar com todo respeito e admiração o que fez no dia de Natal, no povoado de Greccio, três anos antes de sua gloriosa morte. Havia nesse lugar um homem chamado João, de boa fama e vida ainda melhor, a quem São Francisco tinha especial amizade porque, sendo muito nobre e honrado em sua terra, desprezava a nobreza humana para seguir a nobreza de espírito. Uns quinze dias antes do Natal, São Francisco mandou chamá-lo, como costumava, e disse: “Se você quiser que nós celebremos o Natal de Greccio, é bom começar a preparar diligentemente e desde já o que eu vou dizer. Quero lembrar o Menino que nasceu em Belém, os apertos que passou, como foi posto num Presépio, e ver com os próprios olhos como ficou em cima da palha, entre o boi e o burro”. Ouvindo isso, o homem bom e fiel correu imediatamente e preparou o que o Santo tinha dito, no lugar indicado.

Aproximou-se o dia da alegria e chegou o tempo da exultação. De muitos lugares foram chamados os irmãos: homens e mulheres do lugar, de acordo com suas posses, prepararam cheios de alegria tochas e archotes para iluminar a noite que tinha iluminado todos os dias e anos com sua brilhante estrela. Por fim, chegou o Santo e, vendo tudo preparado, ficou satisfeito. Fizeram um Presépio, trouxeram palha, um boi e um burro. Greccio tornou-se uma nova Belém, honrando a simplicidade, louvando a pobreza e recomendando a humildade. A noite ficou iluminada como o dia e estava deliciosa para os homens e para os animais. O povo foi chegando e se alegrou com o Mistério renovado em uma alegria toda nova. Os frades cantavam, dando os devidos louvores ao Senhor e a noite inteira se rejubilava. O Santo parou diante do Presépio e suspirou, cheio de piedade e de alegria. A Missa foi celebrada ali mesmo no Presépio, e o Sacerdote que a celebrou sentiu uma piedade que jamais experimentara até então.


O Santo vestiu dalmática, porque era Diácono, e cantou com voz sonora o Santo Evangelho. De fato, era “uma voz forte, doce, clara e sonora”, convidando a todos às alegrias eternas. Depois pregou ao povo presente, dizendo coisas maravilhosas sobre o Nascimento do Rei pobre e sobre a pequena cidade de Belém. Muitas vezes, quando queria chamar o Cristo de Jesus, chamava-O também com muito amor de “menino de Belém”, e pronunciava a palavra “Belém” como o balido de uma ovelha, enchendo a boca com a voz e mais ainda com a doce afeição. Também estalava a língua quando falava “menino de Belém” ou “Jesus”, saboreando a doçura dessas palavras.

Multiplicaram-se nesse lugar os favores do Todo-poderoso, e um homem de virtude teve uma visão admirável. Pareceu-lhe ver deitado no Presépio um bebê dormindo, que acordou quando o Santo chegou perto. E essa visão veio muito a propósito, porque o Menino Jesus estava de fato dormindo no esquecimento de muitos corações, nos quais, por sua graça e por intermédio de São Francisco, Ele ressuscitou e deixou a marca de sua lembrança. Quando terminou a vigília solene, todos voltaram contentes para casa.

Guardaram a palha usada no Presépio para que o Senhor curasse os animais, da mesma maneira que tinha multiplicado sua Santa Misericórdia. De fato, muitos animais que, padeciam das mais diversas doenças naquela região comeram daquela palha e tiveram um resultado feliz. Da mesma sorte, homens e mulheres conseguiram a cura das mais variadas doenças.

O lugar do Presépio foi consagrado a um templo do Senhor e no próprio lugar da manjedoura construíram um altar em honra de nosso pai Francisco e dedicaram uma igreja, para que, onde os animais já tinham comido o feno, passassem os homens a se alimentar, para salvação do corpo e da alma, com a Carne do Cordeiro Imaculado e incontaminado, Jesus Cristo Nosso Senhor, que se ofereceu por nós com todo o seu inefável amor e vive com o Pai e o Espírito Santo eternamente glorioso por todos os séculos dos séculos. Amém. Aleluia, Aleluia.


Devoção ao Natal do Senhor.2 Celebrava com incrível alegria, mais que todas as outras solenidades, o Natal do Menino Jesus, pois afirmava que era a Festa das festas, em que Deus, feito um menino pobrezinho, dependeu de peitos humanos. Beijava como um esfomeado as imagens dessa criança, e a derretida compaixão que tinha no coração pelo Menino, fazia até com que balbuciasse doces palavras como uma criancinha. Para ele, esse Nome era como um favo de mel na boca. Certa vez em que discutiam os frades, se era permitido comer carne porque era uma sexta-feira, disse a Frei Morico: “Irmão, cometes um pecado chamando de sexta-feira o dia em que o Menino nasceu para nós. Quero que nesse dia até as paredes comam carne. Se não podem, pelo menos sejam esfregadas com carne!”

Queria que, nesse dia, os pobres e os esfomeados fossem saciados pelos ricos, e que se concedesse uma ração maior e mais feno para os bois e os burros. Até disse: “Se eu pudesse falar com o imperador, pediria que promulgasse esta lei geral: que todos que puderem joguem pelas ruas trigo e outros grãos, para que nesse dia tão solene tenham abundância até os passarinhos, e principalmente as irmãs cotovias”.

Não podia recordar sem chorar toda a penúria de que esteve cercada nesse dia a pobrezinha da Virgem. Num dia em que estava sentado a almoçar, um dos frades lembrou a pobreza da Virgem Bem-aventurada e a miséria de Cristo seu Filho. Ele se levantou imediatamente da mesa, soltou dolorosos soluços e comeu o resto de pão no chão nu, banhado em lágrimas. Dizia que essa virtude era real, pois brilhava de maneira tão significativa no Rei e na Rainha. Quando os frades lhe perguntaram em uma reunião qual a virtude que mais nos fazia amigos de Cristo, respondeu, como quem contava um segredo de seu coração: “Ficai sabendo, filhos, que a pobreza é o caminho especial da salvação, que seu fruto é enorme mas são muito poucos os que o conhecem”.

Um bando de cotovias saúda, cantando, Francisco moribundo.3 Sábado à tarde4, depois de Vésperas, antes do cair da noite, em que o Bem-aventurado Francisco morreu, um bando de cotovias volteava em círculos, cantando, pouco acima do teto da casa onde ele jazia moribundo.


Nós, que estivemos com o Bem-aventurado Francisco, e estamos a redigir estas memórias, damos testemunho de que, muitas vezes, ouvimo-lo dizer: Se eu puder falar ao imperador, suplicar-lhe-ei que, por amor de Deus atenda o meu pedido para que publique um edito em que seja proibido apanhar as irmãs cotovias, ou fazer-lhes qualquer mal. Do mesmo modo, quero que todos os governadores das cidades, os senhores dos castelos e vilas ordenem a seus súditos que, em cada ano, pelo Natal, mandem pessoas espalhar trigo ou outros cereais pelos caminhos, para que as aves, e sobretudo as nossas irmãs cotovias, tenham que comer nesta grande solenidade. Gostava também, em homenagem ao Filho de Deus reclinado no Presépio pela Virgem Maria, entre o boi e o burro, que toda a gente fosse obrigada a dar uma farta ração de feno aos irmãos bois e aos irmãos burros, naquela santa noite. Enfim, no dia de Natal deviam todos os pobres saciar-se à mesa dos ricos”.

O Bem-aventurado Francisco festejava com mais solenidade o Natal do que as outras festas do Senhor, porque, dizia, embora nas outras solenidades o Senhor tenha operado a nossa salvação, no dia em que Ele nasceu tivemos a certeza de que íamos ser salvos. Por isso, queria que no dia de Natal, todos os cristãos exultassem no Senhor; por amor d’Aquele que se deu por nós, todo homem devia dar com generosidade do que lhe pertence, não só aos pobres, como também aos animais e aves do Céu.

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1.  “Escritos e Biografias de São Francisco de Assis, Crônicas e outros testemunhos do primeiro século franciscano”, Tomás de Celano, Vida I, Cap. 30, Arts. 84-87, pp. 238-240. 7ª Edição, Editora Vozes Ltda, Petrópolis/RJ, 1996.

2.  Ob. cit. Tomás de Celano, Vida II, Cap. 151, Arts. 199-200, pp. 427-428.

3.  Ob. cit. Legenda Perusina, Art. 110, p. 841. Cfr. ob. cit. O Espelho da Perfeição, Cap. 114, p. 974.

4.  “Durante a noite”. Frei Elias, na Carta Encíclica De transitu beati Francisci, diz com mais precisão: prima hora noctis, isto é, ao anoitecer, logo depois do pôr-do-sol. Era o dia 3 de outubro, mas, a partir daquela hora, já se considerava o dia 4, segundo os costumes de então.

sábado, 21 de dezembro de 2019

ETERNIZAÇÃO DA VIRGEM MARIA.



São Cirilo de Alexandria

DISCURSO PRONUNCIADO NO CONCÍLIO DE ÉFESO1
(P. L. 77, 1029-1040)


Grande honra, para mim, elevar a voz ante tão ilustre Assembleia de Veneráveis Padres. Meu ânimo, profundamente penalizado pela ímpia blasfêmia de Nestório, suspirava pela celebração deste Concílio, cheio de harmonia e de encantos, Concílio angélico, celestial. Nele vejo congregados os Mestres da piedade, os que são Colunas e corifeus de nossa fé, seus Baluartes inexpugnáveis, seus Portos bonançosos, seus prudentes e fiéis Dispensadores, seus sábios Arquitetos, os que assinalam com sua vida de evangelização na terra os roteiros do Céu, os Êmulos dos Profetas, os Sucessores dos Apóstolos, os Pontífices das santas igrejas, Vingadores da blasfêmia criminosa, da perseguição que padecemos e dos ultrajes infligidos a nosso prestígio. Quanta alegria vendo-vos sentados no formoso e divino trono do Sacerdócio, derramando doçura e suavidade, Pregoeiros espirituais do saber divino, que vindes das quatro partes do mundo, sem que as inclemências do ar, as tormentas do mar, o indômito furor das ondas, os ventos ou as tempestades tenham sido suficientes para vos impedir de vir aqui e associar-vos ao entusiasmo dos fiéis. Muito pelo contrário, pressurosos, nas asas de vossos desejos (direi melhor: levados pelo temor de Deus e armados com a Cruz), viestes para mostrar-vos sábios Defensores da Mãe de Deus! Confortados com vossas santas orações, demos a esta cidade os parabéns por tanta felicidade!

Salve, cidade de Éfeso, mais formosa que os mares, porque em vez dos portos da terra, marcaram encontro em ti os que são Portos do Céu! Salve, honra desta região asiática semeada por todos os lados de templos, como preciosas joias, e consagrada, no presente, pelos benditos pés de muitos santos Padres e Patriarcas! Com sua vinda, cumularam-te de toda bênção, porque onde eles se congregam, aumenta e multiplica-se a santidade: Religiosos fiéis, Anjos da terra, afugentam eles, com sua presença, todo satânico poder e toda afeição pagã, tanto a dos porfirianos como a dos sabelianos, apolinaristas, fortinianos… Eles, repetimos, confundem toda heresia e são glórias de nossa fé ortodoxa.

Salve, Bem-aventurado João, Apóstolo e Evangelista, glória da virgindade, Mestre da honestidade, Exterminador de toda fraude diabólica, Destruidor do templo de Diana, Porto e Defesa de Éfeso, Conforto dos pobres, Refúgio dos aflitos, Refrigério e Descanso da cidade e de seus moradores. Salve, Vaso puríssimo da temperança! A Ti virgem, confiou, na Cruz, nosso Senhor Jesus Cristo a Mãe de Deus, sempre Virgem!

Salve, ó Maria, Mãe de Deus, Virgem e Mãe, Estrela e Vaso de eleição! Salve, Maria, Virgem, Mãe e Serva: Virgem, na verdade, por virtude d’Aquele que nasceu de Ti; Mãe por virtude d’Aquele que cobriste com panos e nutriste em Teu seio; Serva, por Aquele que tomou de servo a forma! Como Rei, quis entrar em tua cidade, em Teu seio, e saiu quando lhe aprouve, cerrando para sempre sua porta, porque concebeste sem concurso de varão, e foi divino Teu parto. Salve, Maria, Templo onde mora Deus, Templo Santo, como o chama o Profeta Davi, quando diz: O teu templo é santo e admirável em sua justiça”.2 Salve, Maria, criatura mais preciosa da criação; salve, Maria, puríssima pomba; salve, Maria, lâmpada inextinguível; salve, Maria, porque de Ti nasceu o Sol da Justiça! Salve, Maria, morada da infinitude, que encerraste em Teu seio o Deus infinito, o Verbo Unigênito, produzindo sem arado e sem semente a espiga incorruptível! Salve, Maria, Mãe de Deus, aclamada pelos Profetas, bendita pelos pastores, quando com os Anjos cantaram o sublime hino de Belém: “Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade”.3 Salve, Maria, Mãe de Deus, alegria dos Anjos, júbilo dos Arcanjos que Te glorificam no Céu! Salve, Maria, Mãe de Deus: por Ti adoraram a Cristo os Magos guiados pela estrela do Oriente; salve Maria, Mãe de Deus, honra dos Apóstolos! Salve, Maria, Mãe de Deus, por quem João Batista, ainda no seio de sua mãe exultou de alegria, adorando como luzeiro a perene Luz! Salve, Maria, Mãe de Deus, que trouxeste ao mundo graça inefável, da qual diz São Paulo: “apareceu a todos os homens a graça de Deus Salvador”.4 Salve, Maria, Mãe de Deus, que fizeste brilhar no mundo Aquele que é luz verdadeira, a nosso Senhor Jesus Cristo, que diz em seu Evangelho: “Eu Sou a luz do mundo!”5 Deus te salve, Mãe de Deus, que alumiaste aos que estavam em trevas e em sombra de morte; porque o povo que jazia nas trevas viu uma grande luz,6 uma luz não outra senão Jesus Cristo nosso Senhor, luz verdadeira que ilumina todo homem que vem a este mundo.7 Salve, Maria, Mãe de Deus, por quem se apregoa nos Evangelhos: “bendito o que vem em nome do Senhor!”,8 por quem se encheram de igrejas nossas cidades, campos e vilas ortodoxas! Salve, Maria, Mãe de Deus, por quem veio ao mundo o Vencedor da morte e o Destruidor do Inferno! Salve, Maria, Mãe de Deus, por quem veio ao mundo o Autor da criação e o Restaurador das criaturas, o Rei dos Céus! Salve, Maria, Mãe de Deus, por quem floresceu e refulgiu o brilho da Ressurreição! Salve, Maria, Mãe de Deus, por quem luziu o sublime batismo de santidade no Jordão! Salve, Maria, Mãe de Deus, por quem o Jordão e o Batista foram santificados e o Demônio foi destronado! Salve, Maria, Mãe de Deus, por quem é salvo todo espírito fiel! Salve, Maria, Mãe de Deus, – pois acalmaste e serenaste os mares para que pudessem atravessá-los, com bonança, nossos servos e cooperadores, conduzindo-os, com alegria e jubilo espiritual, a esta Assembleia de entusiásticos defensores de tua honra!

A vinda dos santos Padres inundou de paz esta terra, perturbada pelos ladrões (da heresia), como estava escrito: “Como são belos os pés dos que anunciam a paz...”9 Que paz? A paz que é nosso Senhor Jesus Cristo, anunciador da paz, que diz nos Evangelhos: “Minha paz vos dou”.10 Que paz? A paz que o blasfemo Nestório perturbara, negando que de Maria Virgem nasceu o Verbo e Filho de Deus, nosso Senhor Jesus Cristo. Ele não quis reconhecer a inviolável virgindade de Maria, nem crer na Palavra do Arcanjo: “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo”.11 Subornador de incautos, para despojar da divindade o Unigênito Filho de Deus, inventou essa blasfêmia, essa ruína das almas.

Já vos falei longamente de suas más artes, ao expor-vos a passagem de Jeremias: “a perdiz chocou os ovos que não pôs”.12 E agora que esse homem funesto e blasfemo, enfatuado com a proteção dos poderosos, crendo-nos aterrorizados, assiste a nosso triunfo, digamos com gemidos e lágrimas de gratidão a Deus: “mais vale esperar no Senhor que nos príncipes”.13 Se o execrável heresiarca, valendo-se de toda classe de armas, tratou de seduzir os poderosos e as próprias pessoas reais, repitamos nos agora com o Rei Profeta: “eles vêm em carros e em cavalos, porém, nós nos apoiamos no Nome do Senhor nosso Deus”.14 Se tivesse eu algo a dizer aos poderosos do mundo, ou ao piedosíssimo imperador, não me envergonharia nem tampouco temeria, porque me conforta sempre o Profeta Davi, com suas palavras: “falarei diante de reis, e não serei confundido”.15

Quem jamais ouviu coisas tão horrendas e tão terríveis? Cristo, Deus Verbo, anunciado pelos Profetas e pregado pelos Apóstolos, transformado aqui em puro homem! Chamar a Mãe de Deus, Mãe tão somente de um homem! Não me faleis já da audácia daqueles ingratos e malvados judeus que mataram a Jesus Cristo. Quem não vê ser mais criminosa a blasfêmia de quem os escusa dizendo: vós crucificastes apenas um homem? O erro dos gentios, aqueles ímpios e nefandos sacrifícios que eram oferecidos às próprias pedras; os abomináveis intentos e a horrível heresia de Ario; a funestíssima blasfêmia dos maniqueus; as detestáveis maquinações de Sabélio, Porfírio, a do maligno Fotino, cuja blasfêmia reproduz ousadamente… que digo? A todos supera em maldade, chegado ao cúmulo da soberba, para fazer suas estas palavras: “destruirei meus celeiros e edificarei outros maiores. Ao que lhe respondeu o Senhor: Insensato! Esta mesma noite meus Anjos hão de exigir de ti a entrega de tua alma; de quem será tudo que armazenaste?”16 Tua queda, ó Nestório, foi maior que tua soberba. Tu, perverso, nascido de estirpe impura, foste precipitado no abismo mais profundo da blasfêmia, desprezando o grande Apóstolo, vaso de eleição, voz da Igreja, incenso evangélico e celeste, fonte odorífica; aquele que, levando cartas de perseguição, foi derrubado pela luz do Céu no caminho de Damasco, aprendendo a escrevê-las tão formosas, confirmando com elas o mundo na fé da Trindade consubstancial, de um só Senhor, de um só Batismo; de um só Pai, um só Filho, um só Espírito Santo; da substância inseparável e simplíssima; da divindade incompreensível do Senhor, Deus de Deus, Luz de Luz, Esplendor da Glória, que nasceu de Maria Virgem, conforme o anúncio do Arcanjo: “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo, o Espírito Santo descerá sobre ti, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com sua sombra, e por isso o Santo que de ti nascer será chamado Filho de Deus vivo”.17 Não somente o sabemos pelo Arcanjo Gabriel; também Davi, no vaticínio que canta diariamente a Igreja, nos diz: “O Senhor me disse: és meu filho; no dia de hoje te gerei”.18 Já o sábio Isaías, filho do Profeta Amós, Profeta nascido de Profeta, o predissera: “Eis que a virgem conceberá, e dará à luz um filho e seu nome será Emanuel, que significa Deus conosco”.19

Se não queres crer nos Profetas, nos Apóstolos, no Arcanjo Gabriel, imita ao menos teus companheiros de petulância, os Demônios, que gritaram horrorizados: “Que temos de comum contigo, Jesus, filho de Deus? Antes do tempo vieste a atormentar-nos?”20 Se, então, o próprio Demônio disse: “antes do tempo”, eis que agora, por fim, chegou em ti…

Coisa tremenda e assombrosa! Os Demônios, com seu pai, o Diabo, chamam Filho de Deus o que nasceu de Maria Virgem. Nestório reduz a um mero homem o Filho de Deus; e com a conversão que nesciamente imagina, inventou perverter e enganar o piedosíssimo imperador, servo e amigo da fé ortodoxa, e, juntamente com ele, as esclarecidas e santas rainhas… Foram, porém, estéreis seus esforços. Repartiu ao homens sedentos de ouro o dinheiro dos pobres, crendo poder assim impugnar a verdade, mas sua própria ambição de lucro nefando o fez naufragar miseravelmente. Naufragou no porto, por não jogar as âncoras da fé. Submerso em males, tornou-se teatro de tragédia, para o mundo inteiro. Contava, sim, persuadir os cultores da piedade, por não entender em sua mente entenebrecida, a doutrina dos Pais, Apóstolos, Evangelistas e Arcanjos; tentava estabelecer na terra uma religião ímpia e malfazeja. Mas não nos colheu de surpresa, nem desarmados contra seu intento ímpio e blasfemo. Não estava nossa esperança vinculada às forças militares, nem ao poder e brilho do ouro, e assim o combatemos, opondo-lhe as Santas Escrituras, divinamente inspiradas. Nossas armas não são carnais ou terrenas, mas espirituais e celestes, como predisse o Apóstolo São Paulo.

Ninguém, porém, ao ouvir-nos dizer estas palavras, julgue que nos alegramos com sua desgraça! Ao contrário: quando caíste ao fundo de tua blasfêmia, estendemos-te a mão através de cartas; e se insististe em contumácia, foi desprezando nossas advertências. Testemunha disso é Celestino, santíssimo Arcebispo de todo o orbe, Pai e Patriarca da grande cidade de Roma, o qual diretamente te escreveu, exortando-te a que desistisses de tua inconcebível blasfêmia. Desobediente para com ele, tu te vangloriaste e te envaideceste na insensatez. Convertido em inovador do mundo, perturbaste a paz das quatro partes da terra; e por tua causa foi necessário que todos os santos se congregassem aqui, à custa de mil fadigas. Por isso, Deus te destituirá de teu Sacerdócio, te privará da sabedoria dos Padres, e serás afastado da cidade imperial e do trono pontifical, que injustamente obtiveste.

Por isso, os justos verão e temerão, rir-se-ão de ti e dirão: eis um homem que não tomou a Deus como seu defensor, mas preferiu esperar nas riquezas, e se ensoberbeceu em sua vaidade”.21 Todos, porém, os que formos seguidores da verdade do Evangelho, permaneceremos, como disse o Profeta, “como a oliveira fértil na Casa de Deus”,22 glorificando a Deus Pai todo-poderoso, a seu Filho Unigênito, que nasceu de Maria, e ao vivificante Espírito Santo, que comunica a todos a vida; submissos aos fidelíssimos imperadores, honrando as rainhas, discretas e santas virgens, e pedindo que a rainha desposada tenha sucessão e persevere em sua piedade para com Deus e em seu amor à fé ortodoxa de Cristo Jesus, nosso Senhor, a quem se deve glória pelos séculos dos séculos. Amém.


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Fonte: Cirilo Folch Gomes, O.S.B., “Antologia dos Santos Padres – Páginas Seletas dos Antigos Escritores Eclesiásticos”, Ponto 571 – São Cirilo de Alexandria, pp. 388-393. 4ª Edição, Coleção Patrologia, Edições Paulinas, 1979.

1.  Sobre a autenticidade desta famosa homilia mariana, ver Altaner, Patrologia, Edições Paulinas, p. 290.

2.  Salm. 64, 6.

3.  S. Luc. 2, 14.

4.  Tit. 2, 1.

5.  Jo. 8, 12.

6.  Is. 9, 2.

7.  Jo. 1, 9.

8.  S. Mat. 21, 9.

9.  Is. 52, 7.

10.  Jo. 14, 27.

11.  S. Luc. 1, 28.

12.  Jer. 17, 11.

13.  Salm. 117, 9.

14.  Salm. 19, 8.

15.  Salm. 118, 46.

16.  S. Luc. 12, 18.

17.  S. Luc. 1, 35.

18.  Salm. 2, 7.

19.  S. Mat. 1, 23.

20.  2 Cor. 10, 4.

21.  Salm. 51, 8.

22.  Salm. 51, 10.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

SANTA TEREZINHA DO MENINO JESUS ENSINA, QUE A VIRGINDADE É UM TESOURO.



"Senhor, se a pureza do Anjo Tu amas, desse espírito brilhante, no Céu a esvoaçar, não amas também, erguendo-se da lama, o lírio que puro teu amor dignou-se conservar?

Se o Anjo de asas de prata dourada é feliz, meu Deus, aparecendo perante Ti branco de pureza, desde este mundo meu trajar é semelhante ao seu, porque tenho da virgindade a riqueza!"1


"Celina, façamos de nosso coração um canteirinho de delícias, no qual Jesus venha descansar... Não plantemos senão lírios no nosso jardim, sim, lírios e não admitamos outras flores, que outros podem cultivar... mas os lírios só as virgens podem oferecer a Jesus.

"A virgindade é um silêncio profundo de todos os cuidados da terra", não só dos cuidados inúteis, mas de todos os cuidados... Para ser virgem, em nada se deve pensar a não ser no Esposo, que não consente nada à sua volta que não seja virgem, "visto ter querido nascer de uma Mãe Virgem, ter tido um Precursor virgem, um Tutor virgem, um Discípulo predileto virgem, e enfim, um túmulo virgem".2


"A castidade me torna irmã dos Anjos, esses espíritos puros, vitoriosos a valer; espero um dia voar em suas falanges, mas no exílio, como eles, devo combater.

Sem repouso e sem tréguas devo lutar por meu Esposo, o Senhor das nações; a castidade é minha espada singular que pode Lhe conquistar os corações.

A castidade é minha arma invencível; por ela meus inimigos abaterei, por ela, eu me torno, ó felicidade invencível, esposa de Jesus, meu Rei!"3


E a Santíssima Virgem? Ah! Celina, esconde-te bem à sombra de seu manto virginal, para que Ela te virginize!... A pureza é tão bela e tão cândida! "Bem-aventurados os corações puros, porque eles verão a Deus.4

Celina, os corações puros são muitas vezes cercados de espinhos, muitas vezes estão nas trevas, então, os lírios creem ter perdido a sua brancura, pensam que os espinhos que os cercam conseguiram rasgar a sua corola! Compreendes, Celina? Os lírios no meio dos espinhos são os prediletos de Jesus, é no meio deles que Ele tem as suas delícias! "Bem-aventurado aquele que foi achado digno de sofrer a tentação!5".6


Pedi, ainda, a Nossa Senhora das Vitórias, que desviasse de mim tudo o que poderia manchar minha pureza. Não ignorava que, numa viagem como esta para a Itália, aconteceriam muitas coisas suscetíveis de me perturbarem, mormente porque, ignorando o mal, receava descobri-lo, pois não sabia ainda por experiência que "tudo é puro para os puros",7 e que a alma simples e reta não vê o mal em coisa alguma, uma vez que o mal não existe efetivamente senão nos corações impuros e não em objetos insensíveis...8


Jamais ficaremos separados, jamais. Tu sabes, só o lírio amarelo9 teria podido afastar-nos um pouco, digo-te isso, porque estou certa de que o Lírio branco será sempre a tua parte, visto que o escolheste e Ele te escolheu primeiro. Compreendes os lírios?...

Algumas vezes me perguntava a mim mesma por que razão Jesus me escolheu em primeiro lugar. Agora compreendi: tu sabes, a tua alma é um Lírio-Perpétua,10 Jesus pode fazer dele tudo o que quiser. Pouco importa que ele esteja num lugar ou no outro. Será sempre: Perpétua.11


É esta graça que Jesus nos concede, Ele quer que sejamos suas esposas, e depois promete-nos ainda sermos sua mãe e suas irmãs, porque Ele o diz no seu Evangelho: "Aquele que faz a vontade de meu Pai, esse é minha mãe, meu irmão e minha irmã".12 Sim, aquele que ama Jesus é toda a sua família; esse acha neste Coração único que não tem semelhante, tudo o que deseja, n'Ele encontra o Céu!...13


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1. Poesia 33.

2. Carta 102.

3. Poesia 30.

4. S. Mat. 5, 8.

5. S. Tiag. 1, 12.

6. Carta 85.

7. Tit. 1, 15.

8. Manuscritos Autobiográficos, A 57. (À Madre Inês).

9. Símbolo com que Teresa indicava o Matrimônio.

10. Aqui, ao símbolo do lírio - pureza virginal - Teresa une o da perpétua, flor sempre-viva que não murcha nunca.

11. Carta 32.

12. S. Mat. 12, 50.

13. Carta 109.

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