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"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

sábado, 27 de agosto de 2016

Regras da Vida Espiritual Para Meditação e Estudo das Sinceras e Devotadas Filhas de Maria e de Todos os seus Diretores Espirituais


Tratado de Teologia Mística1



Regras da Vida Espiritual

Para Meditação e Estudo
das Sinceras e Devotadas Filhas de Maria
e de Todos os seus Diretores Espirituais



Os Três Graus do Amor de Deus

1º Grau: Permanece e vive no primeiro grau, a alma que julga de si amar já suficientemente a Deus, praticando os Mandamentos da Lei, e procura evitar o Pecado Mortal, para não cair no Inferno.



2º Grau: Permanecem e vivem no segundo grau do amor de Deus, todas aquelas pessoas devotas, que desejam serem sempre, e só agradáveis a Deus, e que Nosso Senhor goste delas, com elas esteja contente e as tenha sempre na conta de servas suas, ou filhas espirituais. Estas almas vivem tranquilas, pois, buscam a sua felicidade só em Nosso Senhor, esperando receber d'Ele, de sua divina liberalidade, de seu Coração dadivoso, terno e amante, a abundância das suas graças, dos seus dons e das suas divinas recompensas.



3º Grau: Vivem, tendo atingido o terceiro grau do amor de Deus, aquelas almas que amam a Nosso Senhor só pelo gosto e prazer espiritual de O amarem e servirem, pois, tem íntima consciência e pleno conhecimento de quanto Ele gosta de ser amado pelas suas criaturas, acima de todas as coisas criadas. Este é já o amor sutil, puríssimo e enlevante dos Santos, sendo preciso para alcançá-lo, que a alma arranque do fundo do seu coração, as raízes mais miúdas que nele existam ainda do amor-próprio, bem como de todas as inclinações naturais para o mundo e seus prazeres enganadores.



Princípio da Vida Espiritual



Na estrada mística que a ela conduz, caminham primeiro os crentes, as almas vindas do plano moral do endurecimento, da malícia, ou da ignorância, que os conservava no estado, no plano tenebroso do Pecado Mortal. Ainda neste estado, há também vários graus, pois que, uma alma rebelde à graça de Deus, ao contrário de uma alma fiel, também pode resvalar de precipício em precipício, de abismo em abismo, até as profundezas insondáveis do mal. Assim aconteceu com Davi. Ele agradecia a Nosso Senhor, tê-lo libertado do inferno inferior, isto é, do horrível estado de adultério em que caíra, seguido do horroroso pecado da morte de Urias.2



Porque grande foi, Senhor, a tua misericórdia para comigo, pois, libertastes a minha alma do inferno inferior”3.



A alma endurecida rejeita todas as graças; a sua obstinação no pecado, a sua infidelidade tenaz e a sua resistência impassível à prática do bem, da virtude, acaba por aniquilar nela até os próprios remorsos, apagando-se, então, inteiramente no seu espírito o último lampejo da fé, vindo em seguida assenhorearem-se dele as paixões mais exigentes e avassaladoras. Já não há razões que demovam, que despertem a insensibilidade desta alma; resvala sobre ela a voz da verdade, como a água sobre o mármore, sem que possa penetrar, ou abrandar a sua dureza, pois o mal não está no entendimento, mas sim na vontade de uma alma que rejeita de antemão todos os argumentos, julgando desonrar-se, aceitando-os. É estado o estado da obstinação de uma alma às influências da graça de Deus, obstinação que a conduzirá à impenitência final, à morte horrível em Pecado Mortal, sem arrependimento.



Quando, porém, uma alma começa a sentir-se movida por uns sinceros desejos de viver na graça de Deus, no amor de Jesus Cristo, diz-se que essa alma entrou na vida purgativa, isto é, no primeiro grau da Caridade, ou do amor de Deus. Como esta caridade das almas incipientes na vida espiritual, é ainda muito contrariada pelos vícios e paixões, que a mortificação dos sentidos ainda não pode apagar nelas, então, elas se sentem também, ainda muito atormentadas por essas mesmas paixões, ainda em brasa, pelo que não prelibam ainda, o mel das consolações espirituais com que é inebriada a alma, que atingiu já os graus mais adiantados da perfeição. Estas almas ainda correm muito perigo, de voltarem a cair no estado tenebroso do Pecado Mortal. É um estado de alma, de luta bem definida: chamam-lhe os Místicos a Vida Purgativa, pois que o principal dever e trabalho destas almas, que se encontram em tais disposições, é resistirem aos seus apetites, mortificando as suas paixões, fomentando, nutrindo e saciando a sua alma com o alimento forte, a água cristalina da caridade. É esta a doutrina do eminente teólogo Suarez4, bem como do Anjo das Escolas, São Tomás.



Santa Teresa de Jesus, a Serafina do Carmelo, que é, uma eminente escritora mística, trata maravilhosamente este mesmo assunto em seu livro célebre O Castelo. Nesta obra-prima de teologia mística, ensina a ilustre Santa, que a porta única por onde poderemos entrar nele, é a da oração e da meditação, tanto vocal, como mental, pensando atentamente no que somos e quem é Aquele com quem falamos.



Para Santa Teresa o Castelo é o lugar onde Deus mora, sendo este a alma justa e santificada pela caridade. É este o paraíso onde Deus tem o seu deleite, habitando-o. Neste Castelo distingue a Santa sete mansões, ou moradas, cada qual sempre mais formosa, à medida que a alma, cada vez mais fiel, se vai unindo mais intimamente com Deus, que lhe dá sucessivamente um brilho novo, consoante d'Ele a alma mais se vai aproximando.



O Beato Suzo, em seu Dialogo dos nove penhascos, fala também, dos moradores deste primeiro penhasco, ou primeiro grau, ou morada da vida espiritual, dizendo serem os que nela moram ou caminham, os tíbios e os covardes que não trabalham dedicadamente para a sua perfeição, contentando-se, apenas em não cometerem Pecado Mortal, pensando não ser possível ir mais longe. Eles se salvarão se não morrerem em Pecado Mortal; estão, porém, muito expostos a caírem nele, pois julgam nesciamente poder obedecer e agradar ao mesmo tempo a Deus e ao mundo, bem como à sua própria natureza. Nestes é muito difícil a perseverança, acrescenta o pio escritor; se perseverarem, porém, salvar-se-ão; aguarda-os, todavia, um terrível Purgatório, no qual, enquanto não se purificarem totalmente, sofrerão longos e cruéis castigos e dores em expiação da satisfação que deram a todos os seus caprichos, subindo, depois de purificados, ao Céu, onde receberão a sua coroa, mui pequena e pobre, contudo, em comparação da que será dada às almas nobres e generosas que viveram pelejando denodadamente, heroicamente para conquistarem na vida terrena o mais alto grau da perfeição, o pleno amor de Deus.



Tratemos, porém, dos diversos graus de formação espiritual de uma alma, que busca a perfeição, o puro amor de Deus.



Já em suas Obras, reflete São Dionísio Areopagita, que esse trabalho se opera e completa em três fases sucessivas: a da purificação, a da iluminação, a qual se segue a da perfeição. São os três estados de alma que mais tarde os Místicos da Idade Média denominariam Vida Purgativa, Vida Iluminativa e Vida Unitiva.



Em seu Stromates, Clemente de Alexandria, um dos mais eminentes Padres da Igreja primitiva, ensina também, já que a ascese do cristão para a gnose, isto é, para chegar ao conhecimento da doutrina secreta e perfeita, se efetua por três graus, dominando no primeiro o temor, no segundo a esperança de alcançar o Sumo Bem e no terceiro a caridade, que é o conhecimento perfeito.5



A mesma doutrina ensinam São Basílio, São Gregório Nazianzeno e muitos outros Padres e Doutores da Igreja fazendo, como nota Fénelon, a mesma divisão entre os que buscam o caminho da vida perfeita: escravos, mercenários e filhos, enquanto são levados e conduzidos nele, ou pelo temor, ou pelo interesse, ou pelo amor.



Na Idade Média esta mesma divisão era clássica entre todos os Teólogos. Eles distinguiam os mesmos três graus porque passa a alma que busca a perfeição: principiantes, ou incipientes (Vida Purgativa), adiantados (Vida Iluminativa), proficientes ou perfeitos (Vida Unitiva). A Santa Igreja aprova e aprovou sempre esta doutrina, pois, condenou uma célebre proposição do teólogo Molina que a rejeitava.



Santa Catarina de Sena, em seu livro de título o Diálogo, ensina, também, a mesma doutrina sobre os três graus que passa a alma em sua subida para Deus, acrescentando-lhes, porém, um quarto, a que chama desposório místico, ou a união perfeita e consumada, adotando, também, esta mesma doutrina dos quatro graus, São Francisco de Sales, no seu Tratado do Amor de Deus6. Esta mesma doutrina é seguida por Santa Teresa de Jesus em seu livro Castelo Interior. Ela o desenvolve aí mui largamente, ajudada não só pelo seu engenho natural, como pela sua grande experiência e pelas superabundantes luzes que Deus lhe comunicava.



O conhecimento perfeito, o estudo completo de todas estas fases sucessivas da vida ascética, forma o fundo da ciência a que chamarei Psicologia Espiritual, que é muito necessária e indispensável estudar para uma perfeita direção da alma no caminho da perfeição, pois, mui diverso é o ensino e mui diversa é a direção a dar aos incipientes, ou aos adiantados, ou aos perfeitos.



É esta a doutrina de todos os Autores Místicos7.



Pouco faltou a Santa Teresa para deter-se no caminho da perfeição, só porque um seu Confessor a quis fazer caminhar nele mais depressa do que convinha.



Muitas almas, porém, puras, generosas e dedicadas, têm deixado de subir ao mais alto grau da perfeição, só porque não tiveram a felicidade de serem encaminhadas por um Confessor prático, sábio, prudente e experimentado.



Todavia, confesso não ser fácil, possível mesmo, determinar regras e limites claros e precisos entre todos estes deveres gerais do caminho da perfeição, pois, que em todos os sujeitos, tanto pecadores, como almas fiéis e fervorosas, se encontram e contrariam as mais variadas qualidades, disposições e sentimentos morais, como sejam a ignorância, a fraqueza, o descuido, a negligência, e a malícia, disposições, qualidades e sentimentos todos sempre mais ou menos distantes ou próximos da perfeição, entrecruzando-se e tornando mui difícil o juízo do Confessor. A regra a prevalecer, então, resume-se na sentença clássica: “judicium fertur ex communiter contingentibus”.



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Todos os seres criados, piedosas e devotíssimas Filhas de Maria, tendem pela sua própria natureza a um fim determinado. Não há ser, criatura alguma na criação universal, que não tenha bem fixa e determinada a sua finalidade. Na ordem da natureza, como na ordem da graça, tudo é perfeito, equilibrado, harmonioso, dependente, maravilhoso. Cantam os Céus a glória de Deus, diz o salmista inspirado: canta o universo inteiro, na sua ordem e beleza admirável, a maravilha de todas as obras saídas das mãos de Deus.



As almas dos justos, nos ensinam as Sagradas Escrituras, estão nas mãos de Deus, não lhes transmudando o seu destino o tormento da morte. Ligeira foi a sua aflição; será eterna a sua recompensa. Eles brilharão, cintilarão eternamente no firmamento azul da eternidade, como fachos deslumbrantes de fulgor e de luz.



Na ordem da natureza, dizem os sábios, nada se aniquila, mas tudo se transforma; um dia anuncia sempre outro dia que lhe há de suceder, bem como a noite anuncia anoite seguinte. Eis o mesmo fenômeno na ordem da graça: tal como os seres materiais, assim todos os seres espirituais tendem à perfeição, isto é, à sua união com Deus. O homem ao nascer vem das mãos de Deus; pela morte volta ao seio de Deus, donde teve o seu princípio e origem. Assim como todos os rios vão desaguar nos seios dos mares, donde novamente voltam pela evaporação e através dos canais secretos do centro da terra, aos seus leitos de rosas abertos através das planícies floridas, ou aos seus leitos de espinhos, estrangulados entre os desfiladeiros aspérrimos das montanhas, assim também, na infinita jornada da vida, as almas voltam ao seio puríssimo e carinhoso de Deus, pela depuração de suas impurezas morais e pelo desejo ardente e insaciável que as abrasa de possuírem o Bem absoluto, eterno!



Estas verdades sublimes são demonstradas pela teologia e pela filosofia, pela razão e pela revelação, pois elas nos ensinam que, sempre que o ser inteligente, liberto das trevas dos erros e das paixões humanas, deseja a posse da felicidade pura que não pode encontrar-se na terra, logo a sua vontade se torna comparticipante da Vontade divina, que só deseja a nossa perfeição e a nossa maior glória.



Este é, pois, o primeiro passo a dar no caminho da perfeição espiritual: uma vez dado, logo começa a desenvolver-se em nossa alma uma tendência constante e eficaz, um desejo ardente, um desejo irresistível de conseguirmos praticar a virtude no mais alto grau possível. A graça de Deus coopera já na alma que O busca. Eis a razão porque diz Nosso Senhor: Bem-aventurados são os que têm fome e sede de justiça8 e a Virgem Santíssima, vossa Mãe amorosa e excelsa Padroeira, exclama: Encheu de bens o Senhor os que tinham fome9. Sim, os que tinham fome de amor, de graça, de bênção, de perfeição!



O grande e santo varão hebreu Daniel foi ouvido em sua oração, porque era um varão de desejos10. Também Salomão, porque desejou a sabedoria, um bem melhor – foi enriquecido mesmo com os bens deste mundo.11



São Tomás, chamado o Doutor Angélico pela sublimidade e transcendência dos seus ensinos, diz que o desejo torna o homem apto para receber o que deseja.12



Também, a Águia real de Hipona, Santo Agostinho, escreve: Tota vita cristiani boni, sanctum desiderium est.13



Agora me perguntais, devotíssimas Filhas de Maria, qual é, então, o meio principalíssimo para chegardes à perfeição? Dir-vos-ei: é a Oração.



Da Oração



Para obtermos a salvação eterna necessitamos orar, como nos ensinam as Sagradas Escrituras; a oração é, porém ainda, um meio indispensável para o nosso adiantamento espiritual.



Eis porque diz Nosso Senhor: “Pedi e recebereis”. E ainda: “Sem Mim nada podeis fazer”; e ainda: “Vigiai e orai para não cairdes na tentação”. O mesmo Nosso Senhor Jesus Cristo nos ensinou a orar, ensinando-nos o Pater – o Pai Nosso. A oração é absolutamente indispensável às almas que ainda permanecem no primeiro grau da vida espiritual, na vida purgativa. Só pela oração é que foram justificados Davi14, o filho pródigo15 e o publicano16. Eles saíram do estado de Pecado Mortal em que se encontravam só depois do seu arrependimento e da oração que fizeram ao Senhor. Digo-vos que este voltou justificado, diz o Senhor, falando do publicano, que fizera com verdadeira humildade a sua oração no Templo.



São João Crisóstomo ensina que a oração não só limpa a alma do pecado, mas também afasta os perigos de cair nele.17



O mesmo Santo Doutor da Igreja, ensina que a oração é um colóquio com Deus18. E São João Damasceno, diz ser a oração uma elevação da nossa mente, ou espírito para Deus19.



Dividem-na os místicos em mental e vocal, exercendo-se a primeira só por intermédio das potências interiores da alma, terminando a segunda nas exteriores.



A oração deve ser animada de uma reta intenção, tendendo a um fim santo, espiritual e puro aos olhos de Deus, isto é, feita só com a intenção de obter-mos as graças de que necessitamos para alcançar a salvação, a nossa santificação pessoal e a dos nossos semelhantes e o perdão dos nossos pecados.



Ensina São Boaventura, serem três as espécies dos que oram: os que oram só com os lábios, os que oram com o coração, e os que oram com os lábios e o coração.20



Santo Agostinho costumava dizer ser a sua maior alegria e gozo a recitação do Saltério.21



As almas pias e devotas oram também muitas vezes orações breves, que são aspirações fundas da alma contrita e amante que suspira pelo Esposo celeste. São orações mentais, como que instantâneas e ainda vocais, resumindo um afeto da alma, doce, terno e piedoso. Chamam-lhe comumente os místicos e escritores ascéticos jaculatórias. Santo Agostinho nos diz que estas orações tiveram a sua origem dos monges da Tebaida.22



Enfim, grandes e maravilhosos são os efeitos da oração para as almas que ainda permanecem na vida purgativa. Para os que, porém, já entraram na vida iluminativa ela é, ainda, eficacíssima para o seu progresso espiritual. Ela iluminou Moisés na montanha, como nos ensina o Eclesiástico23, iluminou sucessivamente o varão justo chamado Daniel24, e tem iluminado sempre todos os varões e santos que a têm praticado com fervor, como canta em sua maviosa lira o Cantor dos Salmos: Olhai para Ele, a fim de vos alegrardes25. Assim como o sol dá luz ao corpo, assim a prece, a oração, é a luz da alma, diz São João Crisóstomo.26



Oh! Quão admiráveis são os efeitos da oração balbuciada pelos lábios daquelas almas que atingiram já a vida unitiva! Por virtude e poder dela desceu o Santo Espírito, o consolador ótimo, como lhe chama a Igreja Santa, sobre as cabeças dos Doze Apóstolos de Jesus, no sempre memorável dia de Pentecostes, transformando-os a todos em varões perfeitos, como nos narram os Atos27, continuando sempre a repetir-se invisivelmente, o mesmo fenômeno maravilhoso e divino em todas as almas santas, que oram com fervor e pureza espiritual, recebendo por intermédio da oração a abundância de todos os dons da sabedoria e da graça de Deus, como no-lo ensina São Tiago, Apóstolo intemerato de Nosso Senhor Jesus Cristo: E se algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus e ser-lhe-á dada.28



É, pois, necessário, como nos ensina o mesmo já citado ilustre e grande Doutor da Igreja, São João Crisóstomo, já acima por vezes citado, que quem deseja ter familiaridade com Deus, tornar-se santo e sábio, ore fervorosamente ao Pai das luzes, de todas as ciências, de todas as perfeições e de todas as graças, como sempre tem orado todos os sábios e todos os Santos.



Santo Agostinho diz que a oração é a chave do Céu; Santo Ambrósio diz que ela é o escudo da alma; São João Crisóstomo diz que ela é a arma poderosa; São Boaventura, que ela é o açoite do Diabo e São Tomás, finalmente, afirma que ela é a armadura do soldado espiritual.



Ensina, ainda, o mesmo Santo Doutor Angélico, ser a oração o único meio que nos dá a Divina Providência para obtermos os favores do Céu e podermos alcançar a virtude perfeita, sendo, ainda, absolutamente necessária para podermos vencer todas as dificuldades da vida e todos os perigos de cairmos no pecado.



Se a oração perfeita é a mental, também a vocal é necessária, pois que, como nos ensina a Escritura Santa, para louvarmos ao Senhor é que nos foi dada a língua29.Não é só a nossa alma que pertence a Deus, mas também o corpo: é, pois, pela oração vocal que se completa o nosso sacrifício de ação de graças a Deus. Além do mais, a oração vocal constitui a base da oração pública, ou social, pois de outra maneira não se podem comunicar os homens nesta vida, como ensina, ainda, São Tomás.30



Quantas lágrimas não verteram os meus olhos, Senhor, quando comovido ouvi os hinos e os cânticos que com tanta suavidade entoava a tua Igreja Santa, exclama Santo Agostinho31! Corriam de meus olhos abundantes lágrimas, sendo então a minha alma inundada de um inefável gozo!



A oração humilde, fervorosa, saída do fundo do coração, como o grito pungente de um filho que pede socorro a seu pai, ou a sua mãe, é sempre ouvida por Deus. Ela é sempre eficaz quando ao nosso bom Pai celestial pedimos a sua graça, a sua misericórdia, a sua bênção, o seu perdão, o seu amor: sempre que com o coração contrito lhe pedimos as graças que mais convém à nossa salvação, ou sejam mesmo os bens materiais deste mundo, ou os bens morais, a saúde, a felicidade, a alegria de viver, a inspiração, a inteligência, o gênio, o sentimento elevado da arte, ou os desprezos e vilipêndios do mundo, os sofrimentos físicos, as dores fundas e dilacerantes do coração e da alma, sim, tudo quanto a Deus pedimos, ou diretamente como um filho a seu pai, ou indiretamente por intermédio dos seus Santos gloriosos, de todos os seus Santos e Benditos Espíritos, e, sobretudo, de seu Filho Unigênito, Jesus, nosso Salvador e sua Mãe divina e seu Esposo amantíssimo São José, como nos ensina Santa Teresa, como na terra, no mundo material fazemos aos nossos Superiores, por intermédio de seus e nossos amigos, tudo alcançaremos, desde que a nossa prece seja feita com uma intenção pura, desinteressada de outro bem, de outro fim que não seja a nossa eterna salvação, desde que seja inteiramente confiada na sua eficácia, e sustentada por uma fé inabalável na infinita bondade, misericórdia e amor de Deus para com todas as criaturas criadas.



Notai, porém, piedosas e devotas Filhas de Maria, que Nosso Senhor Jesus Cristo, nos aconselha muito particularmente a dirigirmos as nossas súplicas e preces diretamente, sempre em todas as nossas necessidades temporais e espirituais, a seu Eterno Pai.



É de fé, que Nosso Senhor nos concede sempre todas as suas graças, quando as lhes suplicamos com humildade, fé, confiança e amor: assim mesmo nos ensina Nosso Senhor nas páginas das Sagradas Escrituras32, que devereis ler e meditar muitas vezes, pois, a leitura diária, assídua, pia e devota das Sagradas Escrituras, do Novo Testamento, bem como do livro sublime da Imitação de Cristo, devem ser o pão espiritual, a água que dá a vida eterna, que todos os dias devem comer e beber as almas fiéis que buscam os caminhos do Céu, que vivem entre os homens na vida da piedade cristã.



É preciso, porém, advertir que não basta orarmos, pedirmos uma só vez, ou dez, ou vinte, ou até cem vezes, as graças de Nosso Senhor, para logo termos a certeza de sermos ouvidos. Não é assim. A principal qualidade da oração – e nisto está o seu verdadeiro mérito e eficácia – consiste em orarmos sempre e perseverantemente em todos os dias da nossa vida, ainda mesmo que sempre nos pareça que Nosso Senhor em nada do que lhe pedimos, nos atende compassivo.



Nosso Senhor não está surdo: Ele está simplesmente experimentando a nossa perseverança, esta perseverança, esta virtude sobrenatural, filha da Fé que tem sempre força, poder, e eficácia para obtermos do Senhor o deferimento das nossas súplicas, deferimento que é muitas vezes demorado para que melhor nos possam aproveitar as graças divinas, como o mesmo Nosso Senhor nos ensina.33



Não necessito, piedosas Filhas de Maria, de vos advertir ainda que um dos requisitos principais da oração vocal é a atenção. Ela deve ser atenta, isto é, deveis pôr nela todo o vosso entendimento, como nela deveis pôr toda a vossa vontade, para que ela seja devota e piedosa. As orações maquinais, saídas apenas dos lábios, mas não sentidas pelo coração, como as orações dos hipócritas, não tem valor algum para o Senhor: perdem-se no ar, como as fosforescências fátuas. Os Teólogos místicos ensinam, que a atenção na oração é de três espécies: ad verba, ad sensum e ad Deum – atenção às palavras, ao sentido, com a mente em Deus.34



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Vamos, agora, piedosas Filhas de Maria, discorrer algum tempo sobre a Oração Mental, enumerando os três modos como ela pode desenvolver-se, pois, já vimos que esta espécie de oração tem sempre mais eficácia para nos fazer progredir no caminho da vida espiritual.



As almas que ainda se encontram na vida purgativa, isto é, no primeiro grau da ascese, do amor de Deus, geralmente não praticam a oração mental. Vós, porém, que desejais amar mais Nosso Senhor, do que O amam essas almas frias, tíbias e frívolas, que apenas pensam em não ofender a Nosso Senhor, cometendo o Pecado Mortal, deveis com todo o esmero cultivar no jardim das vossas almas esta mimosa flor da oração mental, cujos fragrantes odores embalsamam o Céu. Atendei, pois, muito à doutrina que sobre esta matéria vou expor-vos.



O primeiro modo como podereis orar mentalmente, é o afetivo, isto é, fazendo a oração mental afetiva. Se não compreendeis lá muito bem este ensino, este modo de orar, eu vo-lo explico por comparação, por meio de uma ilustração mais clara. Imaginai, por exemplo, que estais vendo Nossa Senhora lá no Céu, sentada junta de seu amado Filho, no lugar mais distinto, junto mesmo ao trono excelso da Beatíssima Trindade. Meditai, agora, como para Ela lá chegar, como para Ela ser cheia de tanta glória e grandeza foi necessário que sofresse tanto e tanto na sua alma divina, no seu primoroso Coração de Mãe, de Filha e Esposa; alma pungida no Calvário das mais acerbas dores, Coração dilacerado junto à Cruz por sete espadas penetrantes.



Colocai na vossa imaginação o Calvário mesmo em frente desse Trono de glória, pois foi lá que o seu Coração tão terno e sensível, o mais terno e sensível de todos os corações humanos, mais dolorosamente ressangrou a mais intensa dor, a mais inconfortável angústia humana.



Ah! Demorando-vos vós nesta contemplação dizei-me se não inunda a vossa alma uma grande onda de sentimentos e afetos comovidos sentimentos e afetos de ternura, de compaixão e amor para com a Virgem Santíssima, no Mistério das suas Dores?



Sim, piedosas Filhas de Maria, essa é a oração mental afetiva, oração de afeto, de sentimento íntimo.



Podeis, porém, também fazer de outra forma a oração mental, pelo processo do entendimento, e então ela se chama Progressiva, ou de entendimento. Fazeis esta oração, por exemplo, pensando no mesmo ponto em que haveis pensado para fazer a oração afetiva, mas pensando agora de um modo diferente. Assim, ao passo que ides meditando em todos os sofrimentos e angústias da Santíssima Virgem, em todos os Mistérios Dolorosos da sua existência na terra, na sua fugida para o Egito, em tantas tribulações, apertos, ansiedades e perigos que Ela sofre nessa viagem áspera e longínqua, discorrendo sempre assim por todos os passos da sua vida até ao dia tormentoso, à tarde caliginosa do Calvário, perguntai: E por que foi que a Santíssima Virgem tanto e tanto sofreu, padeceu e chorou? Refleti depois, que Ela tudo sofreu resignada com a vontade de Deus, para santificar-se mais ainda, pois já nascera Santa, concebida sem Pecado Original, e para que assim preparada, depurada no crisol do sofrimento e da dor, honrasse de uma maneira ainda mais particular a Paixão de Nosso Senhor.



Pois é fazendo, piedosas Filhas de Maria, estas reflexões, considerações e interrogações, passando assim o vosso pensamento sucessivamente de um a outro ponto deste discurso mental, que estais fazendo a oração que os Místicos chamam oração mental discursiva, ou de entendimento.



Podeis ainda, piedosas Filhas de Maria, fazer uma outra espécie de oração, a que chamam os Místicos oração contemplativa, ou oração de quietação e recolhimento, ou ainda de contemplação sensível, ou de silêncio e de sepulcro, na frase da Bem-aventurada Madre Santa Teresa de Jesus. Qual o método, porém, o processo, o meio de fazerdes esta espécie de oração, me perguntais? Respondo-vos primeiramente que, para fazerdes esta espécie de oração, necessitais viver já na vida iluminativa, que é o segundo grau da vida espiritual, a segunda etapa do caminho da perfeição. E é muito simples o processo de fazer esta oração contemplativa, ou de recolhimento, ou de quietação, ou de silêncio, ou de sepulcro, como assim, por vários termos, a designam os Autores ascéticos. Por exemplo: pensai assim, dizendo convosco mesma, no silêncio do templo santo, ou mesmo no recanto tranquilo da vossa casa, ou do vosso quarto: ora, eu sempre sou, ainda, muito soberba e vaidosa: ou, então, – bendito seja Nosso Senhor Jesus Cristo, que tanto sofreu por meu amor – ou ainda: – eu não faço nada que preste em comparação com o que para se salvarem fizeram os Santos – ou ainda, imaginando que estais vendo na vossa frente um monte alto e áspero de pedras soltas, de urzes bravas e empinadas rochas, figurai-vos que esse monte é o Calvário, que no seu topo estão levantadas três cruzes, da qual pendem três crucificados, sendo na do meio Jesus, estando ao lado, em pé, olhando o Senhor, Nossa Senhora – deixai-vos ficar inteiramente presas pelos laços da vossa imaginação, da vossa fé e da vossa piedade a esses pensamentos, a essas visões, sem pensardes em mais nada do mundo exterior, ou do mundo interior da vossa alma e já estais fazendo a oração contemplativa, ou de sepulcro.



Preza a vossa alma só a esse pensamento, ela não ora, nem balbucia jaculatória alguma; está como que adormecida nesse pensamento, nessa contemplação.



Figurai-vos, ainda, que estais vendo e assistindo à Santa Ceia do Senhor, Jesus, ao centro da mesa, fala em voz doce e amorosa com João. No rosto de todos os outros Apóstolos resplende o fulgor de uma celestial alegria. Que cena tão tocante e comovedora!



Os Anjos do Céu, vestindo túnicas longas, alvas como as neves, irradiando raios de luz vivíssima em torno de Jesus, assistem em pé, rodeando toda a mesa, a este espetáculo sublime, a este banquete fraterno, símbolo perpétuo do amor e da fraternidade humana!



Pois, olhando e vendo assim com os olhos da vossa fé e da vossa imaginação, vós podeis ficar mesmo como que esquecidas de tudo o que se passa em roda de vós, a ponto que, quem assim vos vir, chega a pensar que até estais semelhantes às pessoas patetas que ficam pasmadas a contemplar um edifício suntuoso, por exemplo, numa grande cidade, por estarem habituadas, apenas a ver as cabanas pobres dos seus campos. Ficam as pessoas do mundo muitas vezes como que esquecidas a contemplarem um jardim muito lindo, um campo florido, uma paisagem dos mais suaves tons de luz e cor, um rosco poente, a ponto de que lhes perguntam outros: em que estais pensando?



Pois, alegrai-vos quando vos perguntarem: “em que estais pensando?”, de dizer a essa pessoa: estou fazendo a minha oração ao Senhor. Sim, as pessoas que só pensam e cuidam nas coisas que são de Nosso senhor, não se admirem de que muitas vezes fiquem assim, como que esquecidas, inteiramente presas a Ele. Assim como Nossa Senhora estava de pé, no monte Calvário, em oração contemplativa, ou de silêncio, também vós deveis estar sempre de pé no vosso Calvário, isto é, quando Nosso Senhor vos manda alguma tribulação, deveis resignar-vos com a sua Divina Vontade. Não digo que não vos doa esta ou aquela afronta, ou ofensa recebida, principalmente quando é injusta, ou filha da ingratidão; não digo que não vos queixeis, porque Nosso Senhor também se queixou e por três vezes o fez e foi a primeira no Horto, quando pediu alívio a seu Pai celeste, e a segunda, quando o soldado da coorte do Pontífice lhe deu uma bofetada, pois lhe perguntou, porque era que O feria, e a terceira, já quando estava pregado na Cruz, foi quando exclamou: Meu Pai, meu Pai, porque Me desamparastes. – Bem sei que, a quem lhe pisam, chora, mas não é razão bastante para desfalecerdes sob o peso da vossa cruz; Nossa Senhora, vossa Mãe e Padroeira, também não sucumbiu sob o peso da cruz dos seus exulcerantes martírios, na hora extrema das fundas amarguras da sua alma divina, no Calvário.



Aí tendes, vós, piedosas Filhas de Maria, bem explicada a oração contemplativa, que só praticam as almas que entraram já na vida iluminativa. Ela é já o último progresso nas vias da oração que conduzem à santidade perfeita da alma.



Santa Teresa comparava a alma que se entrega toda à prática assídua desta oração, que ela chamava de sepulcro, ou quietação, como já vos disse, a uma criança que está junto ao peito de sua mãe e com o calor do mesmo adormece, sem nunca o largar: se lh'o tiram docemente, logo chora, porque sentiu a falta dele.



Assim acontece à alma que se entrega amorosamente à oração contemplativa, pois ela tem sempre a Nosso Senhor em seu pensamento.



É, pois, piedosas Filhas de Maria, nestas três espécies de oração e só nelas que a vossa alma se pode tornar de um modo especial mais agradável a Deus, aumentando dia a dia e inflamando-se continuamente em amor para com Ele, recebendo a luz das suas graças, aprendendo cada vez mais a chegar à perfeição da sua alma. E esta oração mental, em suas três espécies, ou modos, os podeis fazer, com toda a facilidade, a toda a hora, mesmo nos vossos trabalhos, em meio da vossa costura, ou do vosso bordado; sem ser preciso recolher-vos ao vosso quarto, irdes à igreja, ou ao ermo silencioso da caverna de Gethsêmani, ou das ribas poéticas do rio Jordão, como os antigos penitentes dos desertos da Tebaida faziam: nem mesmo precisais meter a cabeça entre as mãos, ou conservá-la pendida ao lado. Em todo o lugar podeis concentrar o vosso espírito e fazer a vossa oração contemplativa.



A menina leviana também faz a sua contemplação, ainda que não seja aquela que agrada a Nosso Senhor. Está ela bordando, costurando, ou fazendo qualquer outro serviço doméstico e, em que pensa ela? Está pensando na cor dos cabelos do seu noivo, ou do seu namorado, se são ruivos, ou pretos, ou castanhos, ou na cor dos seus olhos e está tão embebecida neste pensamento que até muitas vezes lhe cai a agulha das mão e o dedal dos dedos!



Também o rapaz estouvado que está pensando na sua menina, qual a cor dos seus olhos, o feitio dos seus vestidos, ou o corte da sua blusa de pregas, parecendo mesmo um pateta, um boi mudo a olhar para um palácio, faz a sua oração contemplativa, ainda que não seja essa a oração que melhor lhe possa abrir e iluminar o caminho da perfeição espiritual!



A vossa oração contemplativa, ditosas Filhas de Maria, – e notai que vos chamo ditosas, pois, suponho que o sois pela devoção piedosa e pelo afeto enternecido das vossas almas, para com a Virgem Santíssima, – seja pois, – como os mais floridos jardins, o são pelos aromas das rosas, – embalsamada pelos perfumes suaves das mais peregrinas virtudes cristãs, imitando a prática delas, da vossa Padroeira e Mãe.



Assim, se pensais no Calvário e estais ouvindo as blasfêmias do povo e até do mau ladrão crucificado contra o Senhor, pensai e refleti que Nossa Senhora nada diz, nem mesmo se queixa, de onde deveis concluir, que também vos deveis calar, quando vos ofendem e que se Nosso Senhor permitiu que a Virgem Santíssima sofresse tanto, foi para que Ela mais se sublimasse, ainda, em méritos aos olhos de seu Eterno Pai.



Se, por exemplo, ainda meditardes, depois da leitura do Sermão, ou Homilia sobre o Evangelho, no passo em que ele fala da mulher cananeia, a quem o Senhor cura da sua enfermidade, refleti bem sobre a humildade daquela mulher e, na recompensa que ela lhe atraiu da parte de Jesus, e conhecereis então que só as pessoas humildes são dignas de se aproximarem da Sagrada Mesa de Nosso Senhor. Eis como podereis fazer uma útil e proveitosa oração contemplativa, quer meditando sobre um ponto qualquer dos Sagrados Evangelhos, ou das áureas páginas da Imitação de Cristo.



A alma que faz oração contemplativa, está durante ela, inteiramente presa a Nosso Senhor: neste estado permanece, às vezes, horas seguidas; é uma paz, um sossego tão tranquilo e manso, inebriando e envolvendo a sua alma, que ela insensivelmente aprende a ser recolhida, sossegada e refletida, qualidades estas que mais dignificam a mulher e a tornam apta para conseguir os grandes triunfos da perfeição espiritual.



E se, por exemplo, ainda, fazeis uma visita ao Santíssimo Sacramento, pensai bem: é só por meu amor que Nosso Senhor ali está preso… Deixai-vos ficar assim o maior tempo possível presas a este pensamento, não pensando em mais nada, a não ser na humildade, dedicação e amor de Nosso Senhor, que assim se constituiu nosso Prisioneiro, nos cárceres dos Sacrários, nas âmbulas, nos ostensórios, nas píxides sagradas dos Tabernáculos e dos Tronos Eucarísticos, e vós tereis feito uma fervorosa e santificante oração mental contemplativa.



Se pensais, ainda, que estais vendo Nosso Senhor pregado na Cruz, no monte Calvário, também aí podeis ficar presas aos pés de Nosso Senhor e tão presas que até podeis adormecer presas a esta ideia. É então que a alma devota aprende a virtude do recolhimento, do sossego e da paciência em todas as provações que Deus lhe envia, ficando assim a ser uma alma sossegada, madura, ajuizada, recolhida e paciente. Mas este adiantamento no caminho da perfeição, bem como a verdadeira disposição para fazer uma verdadeira e frutuosa oração contemplativa, só se alcançam com muito trabalho e tempo no exercício da piedade cristã, sob a direção de um Confessor experimentado nas lutas do espírito contra a sedução do mundo, e, sobretudo, também ele santificado pela contínua e fervorosa oração contemplativa, cujos frutos de bênção e salvação para ele são a humildade, a caridade e a renúncia a todos os bens materiais deste mundo, às suas pompas, vaidades e glórias.



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Um mal quero corrigir, ainda, piedosas Filhas de Maria, que pode vir e vem sempre, – pois nunca Satanás descansa no seu trabalho maligno de perder as almas, – também a inquietar as vossas, prejudicando-as e atrasando-as no caminho da perfeição.



Eu quero dizer que todas as vossas orações, de qualquer espécie que sejam, devem tender sempre unicamente a vossa santificação e não a tornar-vos, ou a fazer ainda de vós doutoras em teologia mística, de forma que vos constituais a vós mesmas em mestras das outras, como quem tem mais valor e superioridade aos olhos de Nosso Senhor.



Sim, estamos diante de um caso grave, de um perigoso impedimento para a salvação e santificação de uma alma. Sim, porque sobre isso, sobre este ponto de mestras e doutoras em ciência de perfeição, estamos entendidos! O certo é que tão ruins criaturas, querendo ser doutoras, é só para censurarem as outras; domina-as o orgulho e a soberba, pelo que se tornam semelhantes, senão piores do que o Demônio! E andam, infelizmente, nesta vida da piedade, na frequência diária dos Sacramentos, alistadas, também, na Pia União das Filhas de Maria, muitas meninas, novas ou já adiantadas na idade, que se tem por doutoras, por mais sábias do que as outras nos caminhos, nos meandros da perfeição espiritual! Pois a tais criaturas eu nem mesmo garanto a sua alvação, quanto mais a sua perfeição, pois, se elas não tem perfeição alguma!



Se alguma há que deseje adiantar-se na perfeição e no conhecimento da ciência espiritual, faz muito bem e não a repreendo por isso, pois em verdade as pessoas patetas e ignorantes nunca podem adiantar-se muito no caminho da perfeição.



Seja, porém, essa pessoa, ou sejam essas pessoas, edificantemente humildes e caritativas, aniquilando em si o amor-próprio e a vaidade, julgando-se sempre indignas das graças de Deus! Que as veja eu beijar as chagas dos leprosos, como fazia São Pedro Claver, na Colômbia, ou repartir metade da sua capa pelo velho andrajoso, como fazia São Martinho de Tours, e então eu lhes direi que terão alcançado já os altos cumes da montanha da perfeição, sobre a qual Deus habita.



Esta ciência divina da perfeição espiritual só se adquire, porém, depois que a alma devota entrou no templo sagrado, no santuário recôndito onde só conseguem penetrar as raras almas eleitas que se habituaram já a fazer diariamente, e a bem-dizer permanentemente, a oração discursiva e a contemplativa.



Não sabia ler Santo Antão, Patriarca dos Monges da Tebaida e iam consultá-lo à sua gruta os homens de letras, os sábios mais afamados do seu tempo. A um destes que, por curiosidade, o fora visitar, perguntou o Santo: “qual era melhor: ter juízo, ou ser homem de letras?” Ele lhe respondeu: “que era ter juízo”. Volve-lhe o Santo: “E o juízo vem das letras, ou são as letras que vem do juízo?” Respondeu-lhe ele: “que as letras vinham do juízo”. Então, lhe volve o Santo: “Vai-te, então, pois não preciso das tuas letras”.



Vem estas considerações a propósito de eu dizer que, para que uma pessoa seja santa e fervorosa, é necessário que não seja inteiramente ignorante das coisas de Deus, isto é, da ciência ascética, mas é também necessário que não seja, que não se arrogue a si mesma a honra de doutora nessa ciência.



É necessário que seja uma pessoa de juízo, sim; mas é preciso, ainda, que não seja teimosa e caturra. Há certas criaturas que não aceitam outros pensamentos e ideias que não sejam as suas próprias: resistem mesmo às admoestações de um santo e sábio Confessor. Tais pessoas devotas não tem devoção nenhuma agradável ao Senhor; não são pessoas santas, mas caturras; não são pessoas de perfeição, pois não tem juízo. Nosso Senhor não está para aturar pessoas caturras, nem faz santos e santas de pessoas patetas e de cabeças tontas.



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E já que falamos em ciência mística, deveis saber, piedosas Filhas de Maria, é conveniente aprenderdes algumas noções gerais desta ciência, em que foram eminentes e mestres consumados S. Basílio, S. João Crisóstomo, S. Jerônimo, S. Gregório Magno, S. Isidoro, S. Anselmo, S. Bernardo, S. Boaventura, S. Tomás de Aquino, S. João Clímaco, S. Teresa de Jesus, S. Agostinho, S. Francisco de Sales, S. Hildegardes (Abadessa Beneditina), S. Gertrudes, S. Brígida, S. Catarina de Sena, S. Vicente Ferrer, S. João da Cruz, S. Inácio de Loyola, a Venerável Maria de Ágreda, S. Matilde, S. Ângela de Foligno, S. Afonso Maria de Ligório, e os grandes varões, ilustres pela sua virtude e ciência, Hugo e Ricardo da abadia de S. Víctor, em Paris, Guilherme de Pariz, João de Ruysbroeck, Tomás de Kempis, João Gérson, S. João de Ávila, Luís de Granada, S. Afonso Rodrigues, Beato Fr. Bartolomeu dos Mártires, S. Roberto Belarmino, o Beato Luís de la Puente, Bossuet, Fénelon, o Cardeal Bona, o Padre Faber, S. Antônio Maria Claret, Sandreau, Meynard, Woiss, e muitos outros antigos, e, principalmente ainda, espanhóis modernos, como Arbiol, La Reguera, Scoramelli, Miguel Godinez, Morotio, Alvarez de Paz,Valgonera, e outros ainda, que nos legaram preciosos Trabalhos de Teologia Ascética, entre os quais, deveis escolher para vossa leitura, as Revelações de S. Gertrudes, e as de S. Brígida, Os Diálogos de S. Catarina de Sena, a Introdução à Vida Devota de S. Francisco de Sales, os Exercícios Espirituais de S. Inácio de Loyola, a Imitação de Cristo de Tomás de Kempis, Tudo por Jesus do Padre Faber, Oratoriano, pois existem edições modernas destas Obras Místicas, como dos Exercícios Espirituais de S. Afonso Rodrigues.



Assim esta palavra Mística, formada etimologicamente da palavra grega mistikios, significa uma coisa oculta, secreta, de mistério. A palavra ascética significa exercício, pois é formada da palavra grega askeris, que tem esse sentido.



Tanto a ciência mística, como a ascética, se podem entender e dividir em dois sentidos: o teológico e o prático e experimental.



Mística, sob o ponto de vista teológico, define-se: Sabedoria secreta, como a chama S. João da Cruz, que é o príncipe dos Místicos, em seus livros: Subida do Monte Carmelo, lib. 2º, cap. 8, e Noite Escura, lib. 2º, cap. 17. Como ciência prática e doutrinal definem-na os Autores: A ciência que tem por objeto a perfeição cristã e a direção das almas em ordem a conduzi-las à perfeição espiritual.



Sob o ponto de vista prático e experimental, ela é o conhecimento experimental de Deus pelo amor prático ao mesmo, levado ao mais alto grau possível. Foram eminentes místicos experimentais e teóricos Henrique Suso e João Tauler.



A Ascética é, também, experimental e doutrinal.



Como ciência experimental ela é o conhecimento e o amor de Deus obtidos pelos meios ordinários, com a meditação e a contemplação ativas. Como ciência doutrinal é a ciência que trata da perfeição cristã e da direção das almas em ordem à mesma, obtida pelos meios ordinários da divina Providência.



Como vedes, é melhor para vós estudardes a Ascética experimental, do que a doutrinal. A compunção, ou o arrependimento íntimo é uma parte desse estudo. Eis porque o sublime místico Tomás de Kempis diz, no lib. 1º, cap. 1º da Imitação de Cristo: Antes quero sentir a compunção, do que saber-lhe a definição (“Opto magis sentire compuentionem, quam scire ejus definitionem”). Assim deveis pensar vós também.



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Como tão difusamente vos tenho ensinado já, notai ainda e gravai bem na lâmina de ouro da vossa alma esta suprema verdade, que repito mais uma vez: Sem oração é impossível uma alma ser agradável a Deus, ter disposições para ser perfeita.



Ainda vou desenvolver mais largamente esta matéria, para que fiqueis possuindo toda a ciência e conhecimento experimental da oração, tanto contemplativa, como discursiva, na qual se nutre a alma e aprende as coisas que são de Nosso Senhor, tornando-se assim apta para melhor se santificar.



Lendo os Santos Evangelhos, encontrará sempre a vossa alma campo vasto para a sua instrução, pois nessa leitura, vaga sempre um esquisito e raro perfume celestial que a inebria e a deixa cada vez mais inclinada a buscar e amar Nosso Senhor.



Se, por exemplo, lerdes e meditardes aquela passagem do Evangelho de S. Lucas35, em que se lê: E aconteceu que, como fossem de caminho, entrou depois Jesus em uma aldeia e, uma mulher, por nome Marta, o hospedou em sua casa. E esta tinha uma irmã chamada Maria, a qual assentada aos pés do Senhor, ouvia a sua palavra. Marta, porém, andava toda afadigada, na contínua lida da casa: a qual se apresentou diante de Jesus e disse: Senhor, a Ti não se te dá que minha irmã me deixasse andar servindo só? Dize-lhe, pois, que me ajude.



E, respondendo o Senhor, disse-lhe: Marta, Marta, tu andas muito inquieta e te embaraças com o cuidado em muitas coisas. Entretanto, só uma coisa é necessária: Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada – não compreendeis logo quão grande mal e defeito é tirarmos as almas que estão aos pés de Nosso Senhor, pois cada uma segue só o que Nosso Senhor lhe pede e quer e lhe faz sentir. Não se diz, é certo, no Evangelho que Marta fizesse ou fazia mal, mas diz-se muito claramente que Maria fazia melhor estando aos pés de Nosso Senhor.



Mas, quantas meninas e Filhas de Maria, quantas pessoas devotas não há que são como Marta! Sempre andam espiando a vida das outras, procurando observar e saber se esta foi ou não hoje, ou ontem à Missa, à Comunhão, se falou com o Confessor e quanto tempo com ele se demorou e isto tudo espreitam e querem saber, até para irem dizê-lo a outros Confessores!



Tais pessoas que andam na vida da piedade e assim procedem, andam muito mal: melhor lhes seria deixarem-se ficar em casa, bordando, cosendo, ou cozinhando, ou pensando em outras coisas mais alegres, agradáveis e distrativas para si próprias, do que andarem assim na vida da devoção, do confessionário para a mesa da Comunhão e desta para as sacristias, sempre em colóquios particulares, ora com os Padres, ora umas com as outras; elas nada aproveitam com a sua estéril piedade para o Céu, para a sua salvação; são umas bilhardeiras, cuja devoção e piedade é de borra, como ouvi classificá-las já a um piedoso e experimentado Diretor de consciências.



E aqui tendes o fruto da oração contemplativa e discursiva que podeis colher, depois da leitura do Evangelho sobre o caso de Marta.



E se me perguntardes, se para serdes santas tendes necessidade de estar sempre de joelhos aos pés de Nosso Senhor, como Maria, responder-vos-ei que não, pois Marta também foi Santa.



Não censureis, porém, os que estão sempre aos pés de Nosso Senhor, como Maria, pois cada pessoa segue as inclinações naturais do seu coração e sempre é melhor estar aos pés de Jesus do que em outra parte. Nunca deveis omitir o cumprimento dos vossos deveres domésticos para fazerdes as vossas devoções espirituais, pois mesmo cumprindo-os, podeis fazer a vossa meditação, por isso mesmo mais frutuosa ainda. E como fareis a meditação neste caso, sem omitirdes os vossos deveres domésticos? Fazei assim: ao acenderdes, por exemplo, a luz para o vosso almoço, se vos achardes e sentirdes impacientes e zangadas, por não poderdes ir à igreja, meditai assim: – olha que estas soberbinhas e faltas de paciência e respeito, ó minha alma inquieta, ó meu coração desassossegado, para com tua mãe, ou o teu esposo, ou a tua avó, ou a tua tia, a tua aspereza e impertinencia para com os domésticos da casa, os irás expiar num lume, num fogo bem pior, bem mais ardente do que este! Posso eu meter o dedo neste lume, como posso meter uma lenha!



Ainda se vais a levar a comida ao cevado, reflete assim: Não serei eu, também, como este animal, que sempre traz a cabeça voltada para o chão e só tem gosto em fuçar a lama? Não sou eu, também, como ele pensando apenas nas coisas terrenas, nos bens materiais, no que hei de comer e no que hei de beber?



E se não tens este animal imundo em tua casa, tens ao menos flores, cravos e rosas, nos canteiros da tua porta, ou do teu jardim. Pensa então assim, olhando esses cravos viçosos, essas flores gentis, essas rosas da cor dos topázios: “E se eu também fosse um dia uma flor nos jardins do Céu!” Se é o mar que se estende diante dos teus olhos, medita, então, assim: “a minha alma também anda desassossegada e sem paz, como as ondas daquele vasto e dilatado mar!



Se eu verdadeiramente buscasse só a Jesus teria a paz, pois só Ele é o Rei da paz e da alegria”.



Ora, aí tendes vós, piedosas Filhas de Maria, vários métodos de oração discursiva, que podeis aproveitar, pois sempre se oferecem-nos oportunidades para fazê-la.



Ainda vos quero fazer uma reflexão, a propósito daquelas palavras de Nosso Senhor a respeito de Maria, quando disse a Marta “que ela escolhera a melhor parte”. Essa linguagem de Nosso Senhor é figurativa e simbólica, tendendo simplesmente a ensinar-nos que nunca devemos deixar perder a ocasião de ouvirmos a Palavra de Deus, quando ela se nos oferece, como aconteceu com Maria. Se Nosso Senhor voltasse a aparecer no meio de nós, decerto que tudo deixaríamos ficar para ouvi-lO; Nosso Senhor, porém, seria o primeiro a advertir-nos, depois de ouvirmos o Sermão que Ele nos pregasse, a que fossemos cuidar dos nossos deveres e obrigações domésticas, dos nossos deveres de família e de relação para com o nosso próximo. Para bem amarmos Nosso Senhor não é necessário cortarmos todas as nossas relações com o mundo: Nosso Senhor se contenta com a nossa íntima convivência com Ele, inteiramente separados dos homens e do mundo, apenas por alguns dias, como seja durante uma semana de Retiro espiritual, ou durante o tempo de uma Missão. A vida religiosa nos claustros é apenas um Conselho do Senhor para podermos atingir o derradeiro grau da vida espiritual. Todos são chamados, mas poucos são os escolhidos, diz Nosso Senhor, isto é, justos aos olhos de Deus pela prática dos Mandamentos, todos podemos ser; porém, perfeitos pela prática dos três Conselhos Evangélicos, nem todos.



Obrigações e deveres materiais e morais todos temos a cumprir na vida: deles mesmo não estão livres as pessoas que vivem em clausura. O cumprimento, porém, dos nossos deveres não nos impede de cuidarmos conjuntamente da salvação da nossa alma; antes, é no meio do cumprimento dos nossos deveres e obrigações temporais que aprenderemos a praticar as virtudes da paciência, da mortificação, da humildade e da obediência, sendo até essa a melhor ocasião para praticarmos todas essas virtudes.



E não me digais que esse cumprimento dos nossos deveres e obrigações temporais perturba a alma e lhe faz perder o sentimento da presença de Deus; quem assim pensa é porque não sabe regular-se bem na prática delas. Tenhamos sempre Nosso Senhor no nosso pensamento, para sempre lhe pedirmos a sua ajuda e teremos achado o remédio para essa perturbação. É também remédio para ela conservar sempre o nosso espírito sossegado, pensando só naquilo que estamos fazendo presentemente e não em muitas outras coisas ao mesmo tempo. Este é o conselho que nos dá Nosso Senhor: “A cada dia e a cada hora basta-lhe o seu peso e o seu cuidado”.



Tudo devemos fazer com sossego e paz, método e oportunidade. Assim, por exemplo: Se estás bordando o teu lenço, ou cosendo à máquina, ou à mão a tua costura e ouves tocar ao meio-dia, ponto certo em que costumas fazer em pensamento, mesmo sem saíres de casa, a tua visita ao Santíssimo Sacramento, não penses mais em acabar o restinho do bordado, ou da costura que falta.



Diz contigo mesma: “agora é a Visita, vou fazê-la e depois venho acabar o meu lenço”. Mas esta pontualidade rigorosa só a deves guardar, quando não fores forçada a faltar ao dever.



Então, entra no teu quarto e aí, no teu cantinho, fala assim a Nosso Senhor: “Meu Deus, não vedes como eu estava aferrada àquele restinho de lenço para não Vos visitar! Como eu sou tão defeituosa e má!” Reza, então, um Pai Nosso à Nosso Senhor e uma Ave Maria a sua divina Mãe e tua Mãe e Protetora, e vai depois acabar o teu lencinho, ou a tua costura.



Um outro exemplo ainda: Se alguma tua amiguinha te vier dizer que tem para te dar, ou logo ou amanhã, uma novidade muito importante, não te preocupes em sabê-la sem demora; faz o que estás fazendo e a tarde, é à tarde e o dia de amanhã, é amanhã, e o momento de agora, é agora: é isto, é o serviço que estais fazendo. E assim, dominarás o mau espírito da curiosidade que é a tinta que desfeia muitas almas que andam na vida da piedade. Assim adquirirás o hábito de viver sempre sossegada e de tudo fazeres a tempo e horas, santificando-te cada vez mais em cada dia que passa.



É assim que fazem todos os bons Padres das Ordens Religiosas, pois, tendo sempre muitos trabalhos, sempre andam sossegados e tranquilos. E quem sabe guardar o silêncio tem adquirido e encontrado o segredo de se santificar muito depressa, pois não há pior defeito, do que o da murmuração. Raramente deixará de cair nele quem não ama a virtude do silêncio.



Conheceis, acaso, Filhas de Maria, a história de João o Silencioso? Pois, vivendo no deserto quarenta anos, nada mais dizia do que: “Senhor, eu te amo?” Mas, perguntar-me-eis: Então, sr. Padre, deverei eu ir para os montes passear e bordar para não encontrar ninguém?



Não, vos respondo. É, porém, guardando o silêncio quando tendes companhia, que melhor vos podeis santificar. Também as tentações que tanto fazem afligir as almas pias, não são, afinal, mais do que graças de Nosso Senhor, para que elas se possam santificar, combatendo-as. Pode acaso o lavrador colher fruto do seu campo, se o não lavrar com muita fadiga, regando-o com o seu suor? Assim são as tentações para as almas piedosas; são como o orvalho do Céu para as terras áridas.



Uma pessoa verdadeiramente piedosa deve aprender a calar e a falar só quando é preciso, a sofrer com paciência um defeito alheio, desculpando-o, sendo, porém, rigorosa com os seus próprios defeitos.



Mas, esta alta virtude só se pode adquirir no trato com os homens.



Sim, me direis, mas eu cai em dizer esta palavra e assim, eu que era tida na qualidade de uma rapariga boa e virtuosa, agora que dirão de mim? Melhor era não falar para ninguém. Este que é, agora, o ponto da nossa meditação. Não te aflijas porque caíste nessa fraqueza; aprende a humilhar-te e não condenes o trato social, porque não é esse que ofende a Nosso Senhor, mas sim a nossa vontade de O ofender, ou não.



Quando Nosso Senhor disse de Maria, irmã de Marta, “que ela escolhera a melhor parte”, não queria dizer que Marta não fazia bem, tanto que ela também é santa; Nosso Senhor só quis significar por essas palavras que lhe agradam, mais do que todos os obséquios exteriores e materiais, os afetos e sentimentos delicados do nosso coração para com Ele; afetos de amor, afeição e generosidade.



Mas, sr. Padre, direis ainda, melhor seria não falar com pessoa alguma para me santificar e ser feliz, pois ainda ontem fui à Missa e recebi Nosso Senhor e senti na minha alma tal delícia, doçura, suavidade, alegria e paz, que me parecia mesmo estar já no Céu. Quando, porém, cheguei em casa, disse-me minha mãe: ainda agora vens? Minha irmã também me disse não sei que e também a vizinha: sabes, olha! Fulana disse isto de ti! E eu fiquei, então, com o meu coração tão alvoroçado e a arder tanto que, se pusessem sobre ele a panela ou a cafeteira, logo ferveriam mais depressa do que sobre o fogo e lá se me foi toda a doçura e suavidade, alegria e a paz da alma que sentira de manhã.



Respondo-te, querida Filha de Maria, dizendo-te: Então, tu querias achar o Céu na terra? O que sentistes foi, apenas, uma graça que Nosso Senhor te fez, para te fortalecer e ajudar a venceres o teu coração nessas ocasiões e tribulações que passastes.



Esse fervor, como dizem os Místicos, que se adquire, só costuma durar aproximadamente dois anos; depois vem a noite da alma, a secura, a aridez, de que fala Santa Teresa.



Somos chegados, agora, a tratar de um assunto místico da mais alta importância: – A paz da Consciência.



Da Paz da Consciência



A paz da consciência é o fruto sazonado da oração contemplativa. Tiveram-na íntegra e plena todos os grandes Santos que chegaram aos altos picos do Himalaia da perfeição espiritual, após a mais profunda meditação contemplativa: – S. Inácio de Loyola, como S. Bento, como S. Francisco de Assis, só lançaram os fundamentos das três grandes Ordens Religiosas da Igreja, depois de, à semelhança da contemplação e penitência de Jesus durante quarenta dias no deserto da montanha judaica, terem passado pela grande prova da perfeita vida mística adquirida pela oração contemplativa, – Inácio, na cova de Manresa, Bento, na gruta do Subiáco, Francisco, o Poverelo sublime da Úmbria, na encosta do Monte Alverne.



Te-la-ão todas as almas que, pelo exercício da piedade tiverem atingido o terceiro grau da perfeição espiritual: – a vida unitiva. As que tiverem entrado, apenas, no primeiro grau da ascese, saídas da noite do pecado para a vida da graça de Deus e que se contentam em evitar a culpa mortal, confessando-se, por exemplo, só uma vez cada mês, não conhecem sequer a doçura, o enebriamento espiritual em que vivem mergulhadas as almas que são capazes de praticar, de fazer a oração contemplativa, com as mesmas disposições interiores com que a faziam os Santos.



Nem mesmo são capazes de fazer, ainda, esta espécie de oração as almas entradas já no segundo grau da ascese e que são as que se esforçam por evitar os próprios pecados veniais, conduzindo-se já na vida cristã dentro de um regulamento espiritual, como seja: ouvir Missa diária, a Confissão semanal e a Comunhão quotidiana, a Visita ao Santíssimo Sacramento e a recitação do Terço, ou do Rosário de Nossa Senhora. Nestas almas, ainda não pode afirmar-se que exista já a verdadeira piedade, mas só que elas praticam os atos próprios que a ela conduzem.



Estas almas, tem já muito desejo de agradar a Nosso Senhor: o seu progresso na virtude, ao caminho da perfeição depende agora, apenas, da direção que a esta alma dará o Confessor. Este é o grande escolho em que naufragam muitas almas que buscam ansiosas Nosso Senhor. Mas como poderá avançar a nau no solitário oceano sem bússola?



Orem fervorosamente a Deus as almas pias, para que lhes depare um Diretor idôneo, isto é, prudente, sábio e virtuoso. Infelizmente, como já dizia Santa Teresa, “a maior parte dos Confessores de pessoas beatas, ou piedosas, nunca chegam a ser canonizadas pela Igreja, pois, já o foram pelas beatas, suas confessadas”.36



A verdadeira piedade consiste no sentimento íntimo de agradar a Deus acima de todas as coisas. Esta perfeição espiritual, que é já o terceiro grau da ascese, só se adquire, porém, depois de largo tempo no exercício dos atos de piedade, que não devem ser, apenas, atos de devoção passional, como são as Novenas, os Terços, as Confissões, as Comunhões, para a maior parte das pessoas que andam na vida devota, mas sim, atos sinceros, reais e públicos de humildade, caridade, perdão, benevolência e amor para com todos, de forma que essa pessoa seja para todas as outras um exemplo vivo e edificante de doçura e de suavidade em todas as suas palavras, como em todas as suas relações diretas com o seu próximo. A alma que não renda inteira obediência à vontade dos seus Superiores, pais, mães e Confessores, que não visite solicitamente, para agradar a Nosso Senhor, os enfermos pobres, os órfãos e as viúvas desamparadas, dispensando-lhes, a proteção moral e material que lhe é possível, que não renunciou ainda inteiramente às vaidades, riquezas e gozos do mundo, que transige ainda com as modas do século em seu vestuário, com grave ofensa e escândalo da modéstia cristã, que não pratica a frugalidade, a sobriedade e a temperança na sua alimentação, que não sente arder em seu peito o zelo pela salvação dos seus irmãos, o amor pelo trabalho e sofrimento, sentindo alegria e contentamento em meio dos vilipêndios e dos desprezos do mundo, bem como em meio das suas próprias doenças e enfermidades corporais, que deve espiritualmente considerar, apenas, como dádivas, como graças de Deus, que lhe são enviadas como provações, ou expiações de seus pecados, que só Ele conhece e que são absolutamente necessárias para a sua santificação, tal alma, por mais devota e fervorosa que pareça, está muito longe, ainda, de atingir o terceiro grau da ascese, de entrar no grande fervor, como lhe chamam os Místicos, e que é esse estado de alma em que, aquela que já o atingiu, pode orar em contemplação, em quietação de espírito, profunda, insondável, beatífica já.



É, então, que ela adquire a posse, o gozo inalterável da paz de consciência. Nestas alturas a alma busca Deus com a ânsia com que O buscava Davi: “Quem me dera a mim asas, como as das pombas, para voar para Ti e descansar em Teu seio!” exclamava o ungido do Senhor. Chegada a este alto grau da ascese a alma sente o tormento da fome e da sede de alimentar-se e dessedentar-se com o pão divino e a água puríssima da leitura das Escrituras Santas, da Imitação de Cristo, da Vida devota, dos suaves e perfumados Livros ascéticos dos grandes Santos místicos.



Todavia, a alma que atingiu este último grau da ascese deve limitar o mais possível a leitura espiritual, pois deve orar, agora, mais em espírito, mentalmente, pois já está em condições de receber a iluminação divina de Jesus que se comunica diretamente neste estado pelas efusões da Sua graça e pelas misteriosas operações da graça do Espírito Santo.



Este trabalho, porém, piedosas Filhas de Maria, esta ceifa ubérrima das messes de Jesus, leva sempre muitos anos a amadurecer, e só pode chegar à plena maturidade, aquecida pelo sol fecundante da oração contemplativa, dos mais puros e fervorosos atos de piedade interior e exterior, não só em relação direta com Nosso Senhor, como indireta para com todos os nossos semelhantes.



Mas ainda, se não pode dizer que a pessoa devota que atingiu este estado de alma possua já a verdadeira e inalterável paz da consciência, ou quietação de espírito, pois, como dizem os Santos, os Autores místicos, ainda Nosso Senhor quer fazer passar pelo crisol da última prova a alma que Ele verdadeiramente ama.



Dizem eles, então, que a pessoa que já passou alguns anos no estado de fervor, ou de oração contemplativa, que é o da verdadeira piedade e não o da prática, apenas, dos exercícios de piedade, entra num quarto estado de alma, que é o da secura, como lhe chamam.



Num momento toda essa suavidade e doçura que a alma gozava no exercício da oração contemplativa desaparece, bem como o ardente fervor místico que a abrasava e ela fica, como que seca e escura; todo o fervor e amor, toda a delícia que ela sentia no serviço de Deus, esvai-se e desaparece. É um abalo moral que desconjunta todo o edifício da vida espiritual quando parecia faltar pôr nele, apenas, a cúpula dominante!



Santa Teresa, a Mestra sublime da Mística, chama a este novo estado de alma a primeira noite da vida religiosa. A alma pensa, então, não terem já mérito algum todos os seus exercícios de piedade; pensa e julga que Nosso Senhor a abandonou e que em nada lhe agrada já; sobrevêm-lhe, então, uma indizível aflição e angústia, pois crê-se abandonada da graça de Deus.



A estas almas nobres, sinceras e devotadas no exercício espiritual da devoção e da piedade, faz ainda Nosso Senhor passar por muitas tentações, das mais horríveis e impuras e, ainda, contra a fé, contra o Santíssimo Sacramento, a ponto de as deixar inteiramente desoladas. Este é, porém, nelas um sinal infalível da sua eterna predestinação.



Este período, todavia, das tentações do Maligno é transitório; dele triunfam sempre todas as almas que sinceramente buscam a perfeição; depois de passada esta tempestade é que, então, a alma adquire o sossego e a paz duradoura e inalterável.



É, agora, que para ela começa a definitiva paz de consciência que já na terra lhe faz prelibar a doçura dos bens celestiais, dos frutos preciosos da bem-aventurança.



É, então, que pela primeira vez essa alma triunfante tem o sentimento íntimo da presença de Deus em si mesma; da inteira posse que Deus dela faz. Para ela, agora, a oração contemplativa é o átrio do templo sagrado e místico onde ela é arrebatada em espírito pelos êxtases, pelas visões; ela pode ver já, bem nítidas e luminosas, as imagens divinas de Jesus, de Maria, dos Anjos e dos Santos, refletindo-se na retina dos olhos da sua alma.



A oração pura e fervorosa que agora brota, como um fio de mel do Hymetto, dos seus lábios trêmulos de amor espiritual, é já a oração de quietação, de recolhimento, ou de sepulcro, como lhe chama Santa Teresa.



Esta alma tem, agora, a coragem heroica dos mais nobres sacrifícios, das mais sublimes dedicações; ela mergulhará nas ondas do mar, ou nas chamas dos incêndios para salvar os seus irmãos aflitos, certa de que, nem o oceano, nem o fogo tocarão um só dos seus cabelos; ela derramará o seu sangue até a última gota por amor de Jesus, em holocausto à sua doutrina e ao amor apaixonado, fervido e ardente que lhe consagra; esgotará todas as energias do seu coração e todas as suas forças e recursos materiais para acender a luz da fé e da esperança cristã nas almas entenebrecidas e desoladas e ministrar o pão substancial ao faminto, bem como o vestido protetor ao órfão, à viúva, ao velho, ao mendigo roto e abandonado; dará aos corruptos filhos do mundo os exemplos mais edificantes da candura e da humildade, da resignação e da conformidade com a vontade de Deus em meio de todas as contrariedades, afrontas, vilipêndios e sofrimentos físicos e morais do seu corpo e da sua alma; sentirá inefável delícia em ser desprezada, abandonada, perseguida, vilipendiada.



E assim, piedosas Filhas de Maria, ficais conhecendo agora que são cinco os graus da ascese, ou do caminho da perfeição espiritual, dividindo-se em cinco classes as almas cristãs que o seguem, a saber: primeira – as almas crentes – segunda – as almas boas – terceira – as almas piedosas – quarta – as almas fervorosas – quinta – as almas perfeitas. E assim, também, ficais sabendo que a oração, ou a ligação da alma com Deus é ou simples, ou humilde, ou confiada, ou fervorosa, ou extática, segundo corresponde a cada um dos cinco graus da ascese.



As almas que pertencem ao primeiro grau, chamam-se as almas crentes e são elas os bons cristãos que, procurando evitar o pecado mortal, nenhum desejo, porém, alimentam de adiantarem-se no caminho da perfeição.



As que pertencem ao segundo grau são as almas boas, porém, débeis, tíbias, fracas, apenas com intermitências de desejos de progredirem no caminho da perfeição, ainda que procuram evitar já também as faltas veniais. São muitas as almas, escreve o profundo teólogo Suarez, que passam toda a sua vida neste estado de alma. Elas estão ainda muito longe da perfeição e, se não houver nelas muita vigilância e atenção para as coisas celestiais correm, ainda, estas almas o perigo de caírem no hábito puramente material de receberem os Sacramentos e fazerem oração, esquecendo inteiramente a prática das boas obras, principalmente da caridade, da justiça, da bondade e da mansidão, tornando-se fanáticas, supersticiosas, hipócritas, vaidosas e orgulhosas da sua própria piedade, bisbilhoteiras da Igreja, das Sacristias, dos Presbitérios, dos Adros, dos grupos congêneres em que se reúnem, atribuindo-se só a si próprias a virtude e a amizade de Deus, julgando ver só réprobos, condenados às penas do Inferno em todos e todas as que não vão na corrente das suas ideias, sentimentos e práticas religiosas!



São estas as pseudo-devotas de que falam os Místicos e que os pecadores, os filhos do século, os escravos das paixões humanas, vilipendiam com o epíteto antinômico e irônico de beatas, termo para eles sinônimo de impostoras, pois nestas pessoas não veem o exemplo, ou o espelho da prática das virtudes cristãs. Estas almas correm maior perigo de condenação, ainda, do que as almas crentes, diz o piedoso teólogo, que pertencem ao primeiro grau da ascese. Muito melhor lhes seria não passarem dele. É uma experiência desoladora que nos mostra serem estas almas que se encontram no segundo grau da ascese e nada progridem no caminho da perfeição, estagnando numa devoção artificial e sem fruto para a salvação, em grande número entre as almas boas.



As almas piedosas que são as que pertencem já ao terceiro grau de ascese, tem já uma vontade firme de adiantarem-se cada vez mais na perfeição. E, em verdade, elas se esforçam nesse propósito, lendo livros de Mística como leitura quotidiana de meditação, como sejam a Imitação de Cristo, a Introdução à Vida Devota, do Santo Bispo Francisco de Sales, o Tratado da Perfeição espiritual, de São Vicente Ferrer, a Perfeição Cristã, de Santo Afonso Rodrigues e outras substanciosas obras de virtuosos Autores Místicos. Estas almas presas já por um grande afeto a estas leituras e que se esforçam em progredir no caminho da perfeição, tanto pela prática das devoções pias, como pela das obras de zelo, caridade e amor do próximo, encontram-se já na vida iluminativa, isto é, no terceiro grau de ascese.



A ascensão aos dois graus superiores da ascese é obra do trabalho persistente e perseverante de muitos anos de exercício e prática das obras pias e das obras de zelo e de luta contra as mil tentações do Maligno, através da fase, na marcha da vida espiritual, que os Místicos chamam de secura e Santa Teresa a primeira noite da alma, como já notamos. É, então, que chega o fervor, mas como sentimento de uma natureza diversa do primeiro experimentado nos graus inferiores, pois é muito mais suave, íntimo e espiritual. Todos os Santos passaram por estas fases da vida ascética.



Não penseis, pois, piedosas Filhas de Maria, que não vos contentais em permanecer no segundo grau de ascese, embora vigilantes para não cairdes no fanatismo, na superstição e na hipocrisia de que atrás falei, mas que desejais progredir no caminho da perfeição espiritual, não penseis que ela se pode atingir de um salto, nem mesmo que, depois de atingido o terceiro, ou o quarto grau, vivereis embaladas sempre numa atmosfera sutil, diáfana e pura de luz, de sonho místico, de suavidade e doçura. O caminho do Céu não é semelhante ao caminho que leva a uma romaria, para a qual o romeiro leva um cavaquinho, ou uma viola, para alegrar e animar os outros e uma cabacinha de vinho para se alegrar a si mesmo, de forma que sai e entra outra vez em sua casa sempre alegre e contente, tocando e cantando. O caminho do Céu é o caminho da Cruz; quem o segue tem que levar a sua cruz, como Jesus levou a sua até ao alto do monte, onde O crucificaram nela.



Não é quando estás contente e o mundo te sorri venturas e felicidades que deves pensar no caminho do Céu; antes, pelo contrário, desconfia muito de estares fora dele, quando tudo te vai correndo a teu gosto: teme muito quando não tiveres sofrimento a afligir-te.



O verdadeiro sinal do verdadeiro amor de Deus está em que uma alma que sinceramente O ama, possa dizer a toda a hora: Hoje mesmo que Nosso Senhor me chamasse a contas, eu aceitaria a morte com alegria, confiando inteiramente a minha alma à sua Divina bondade e misericórdia. Esta alma é obediente já à voz de Jesus, que disse e ensinou: “Se alguém deixar pai, mãe, parentes, amigos, todos os bens, honras e glórias deste mundo por amor dEle, este sim, é um verdadeiro discípulo e terá uma larga recompensa no Céu”.37 Ela entrou já, vencedora do mundo e dos seus laços, no caminho real da perfeição.



* * *



Notai bem, piedosas Filhas de Maria, que para se ser santo, ou santa, segundo o modo de falar humano, pois no Céu todos são espíritos do Senhor, sem diferença de sexo, como ensinou o Divino Mestre,38 é preciso aproveitar todas as primeiras graças que Nosso Senhor nos dá, não desprezando nunca nenhuma das que nos veem pelo exercício da paciência, da humildade e da oração: a Nosso Senhor pertence depois aumentar essas e novas graças, ou dons celestes. Não penseis que se pode ficar santa de um dia para o outro, de hoje por exemplo, em que sentistes muito fervor no amor de Nosso Senhor, até amanhã já, ou até daqui a três dias, ou ao fim de um mês. De hoje até amanhã podem ser dois anos e até quarta-feira, três anos e até sábado, ou até ao fim do mês, podes contar que sejam, cinco, ou seis, ou até dez anos e mesmo vinte.



Esse tempo leva muitas vezes a construir uma obra de arte, dessas com que se honra o engenho dos homens; quanto mais tempo não levará a construir essa obra de arte espiritual a que podemos chamar uma pessoa santa, que é o esplendor do Céu e da terra?



Quantos anos não passaram na penitência os grandes Santos? Uma pessoa que quisesse assim ser santa tão apressadamente era como se fosse um estudante que quisesse aprender a filosofia, sem primeiro aprender a gramática, cujo conhecimento é imprescindível para se aprender a filosofia? Custa muito aprender a gramática? Pois, não há outro remédio para se aprender a filosofia senão aprender primeiro a gramática. Assim são as almas que entram na vida devota: elas devem primeiro aprender a cumprir os seus deveres cristãos, cujo conhecimento é a gramática que primeiro devem aprender; só depois, sofrendo com paciência e humildade as tribulações e provas que Nosso Senhor lhes mandar, é que alcançarão graças maiores.



Bem sei que de princípio custa muito a aprender a gramática dos nossos deveres cristãos: sofrer com resignação e paciência inalteráveis as afrontas e vilipêndios, resistir sem desfalecimentos às tentações mais fragueiras e impetuosas, fugir heroicamente de todas as ocasiões de pecado, de ir a um certo lugar, a uma certa reunião de amigas que nos solicitam vivamente a nossa assistência, a uma Missa, ou Sermão, porque nosso pai, ou nossa mãe nesse dia no-lo proíbem e ainda outros atos da mortificação da nossa vontade, ou dos nossos sentidos. Mas, não há outro remédio; parece que até estes sacrifícios nos rasgam no coração uma chaguinha que nos dói tanto, tanto, que, com a violência da dor, lhe pomos em cima umas papinhas a ver se passa um pouco, e ainda que passa, custa muito a sarar esta ferida de alma, esta chaga do coração que parece estar sempre doendo e purgando.



Mas não há outro remédio, como vinha dizendo, para se aprender a gramática da vida da perfeição, senão aprender, até se ser mestra, o exercício e a prática perfeita das santas virtudes da paciência, da humildade e da obediência.



Aprendei, piedosas Filhas de Maria, aprendei a sofrer com a vossa celestial Padroeira, a Virgem Maria, pois foi pelo sofrimento e pela saudade que tão resignadamente Ela sofreu de Nosso Senhor, durante vinte e três anos depois da sua morte, que Ela passou na humildade, na oração e no recolhimento, não falando com ninguém, a não ser com São João, vivendo só da saudade de ir unir-se a seu bendito Filho, que Ela se tornou a Mestra exímia, o espelho cristalino do exemplo e da prática das sublimes virtudes do recolhimento, da humildade e da resignação cristã.



Imitai Nossa Senhora na prática dessas sublimes virtudes; a santidade perfeita só se obtém pela caridade ardente e pelo espírito de abnegação e sacrifício, aliados ao culto da justiça, da humildade e do zelo prudente e inflamado pela instrução e salvação dos nossos irmãos.



***



Desejo, também, falar-vos num assunto muito importante que diz respeito à maior, ou menor facilidade com que podereis caminhar na vida da piedade, para chegardes à perfeição.



Refiro-me ao ponto da Emenda dos Defeitos.



Não deveis afligir-vos porque não podeis corrigi-los tão depressa como desejais, porque essa emenda leva sempre muito tempo a fazer-se, meses, anos e até muitos anos. O que é necessário, é terdes sempre muita paciência, muito boa vontade de emendá-los e muita confiança em Deus de que vos haveis de emendar deles.



Aumentar, ou agravar na Confissão os nossos próprios defeitos e faltas morais é um grande mal e defeito que deveis inteiramente corrigir, pois, as pessoas que assim fazem dão prova de que não teem verdadeiro amor a Nosso Senhor, e, de que andam fora da graça de Deus, pois, não há outro caminho para alcançarmos a graça de Deus, senão a verdade.



As pessoas que se afligem e perturbam por não poderem emendar os seus defeitos tão depressa quanto desejavam, não têm verdadeira confiança na bondade, na longanimidade, na misericórdia e no amor infinito de Nosso Senhor para com todas as suas criaturas. Elas parecem ter mais temor de Nosso Senhor, do que amor. Ora, quem tem medo não tem amor. Se temos confiança com uma pessoa, é porque lhe temos amor; pois, acontece o mesmo com Nosso Senhor. E, isto mesmo, já nos ensinou S. João, quando disse: “Aquele que não ama, não conhece a Deus, porque Deus é a caridade”.39



Aquelas almas, porém, que tem verdadeira confiança em Nosso Senhor, também lhe tem verdadeiro amor e gozam, então, de uma paz inalterável, doce e tranquila na sua alma. Elas não temem os escrúpulos; confessando-se só nos tempos marcados, vão com muita facilidade corrigindo pouco a pouco os seus defeitos e imperfeições. E assim fazem porque possuem já a verdadeira humildade cristã, o verdadeiro espírito da oração e da paciência; elas crescerão sempre em virtude; aumentará a graça de Deus sempre em suas almas; chegarão, finalmente, a alcançar a graça da vida contemplativa ordinária e simples em meio dos seus múltiplos afazeres e assim gozarão sempre de um verdadeiro sossego e tranquilidade da alma, sentindo-se sempre na presença de Deus, pois, O colocaram acima de todos os afetos e sentimentos sensíveis do seu coração. Assim acontecia com aquele camponês, que todos os dias vinha orar em horas certas diante do Santíssimo Sacramento. Perguntou-lhe o Santo Cura d'Ars o que fazia assim, sem nada dizer, tanto tempo, diante do Sacrário, e ele lhe respondeu: Eu estou aqui: “Ele olha para mim e eu olho para Ele!”



Esta ingênua e simples alma do campo, tinha alcançado já, pela sua ilimitada confiança em Deus, o quarto grau de ascese, – dom da oração contemplativa. Como vedes, piedosas Filhas de Maria, não é necessária a vida da clausura para se obter a perfeição espiritual, como acontecia com esse humilde camponês. Antes, com maior mérito o podeis alcançar em meio do mundo, pois, como o soldado no campo de batalha cercado de perigos, vós a atingis. E para alcançardes tão assinalada vitória, nada mais vos é preciso do que ter inteira confiança em Deus.



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Com relação a vossa Comunhão diária, quero dizer-vos e ensinar-vos, que nunca a deveis omitir, desde que a vossa consciência não vos acuse de pecado mortal. O Santo Padre Pio X, manda e recomenda muito expressamente, proibindo que se discuta ou contradiga esta sua determinação, que todos os cristãos, desde que não estejam em pecado mortal, comunguem diariamente, mesmo sem confessar-se, embora tenham a consciência de terem cometido pecados veniais.40



As pessoas muito escrupulosas, logo correm a confessar as faltas leves, como sejam uma impaciência, uma palavra inconveniente, e outras comuns e sempre inevitáveis da fraqueza humana. Pois, é este um defeito que é preciso corrigir por causa dos escrúpulos e dúvidas em que elas vem a cair, confessando-se imediatamente por qualquer motivo leve.



Dessas imperfeições nem os Santos estavam livres; o remédio é pedirmos logo a Deus perdão delas de joelhos, no nosso próprio quarto mesmo, ou então, à própria pessoa a quem ofendemos, sendo este ato de humildade muito mais agradável a Nosso Senhor. Este ato de humildade é a verdadeira pedra de toque da nossa perfeição espiritual, como também o é reconhecermos sempre a nossa miséria diante de Nosso Senhor.



Ainda com relação à Santa Comunhão quero dizer-vos que, por mais fria e desolada que se encontre uma alma, mesmo que lhe pareça estar inteiramente abandonada de Deus, ainda assim deve ir sempre ajoelhar-se à Sagrada Mesa, pois, Nosso Senhor a não instituiu como prêmio a dar aos Santos, mas sim como remédio e alívio para as nossas misérias. Mas esta doutrina se entende, apenas, como verdadeira só quando a consciência não nos acuse claramente de havermos cometido culpa grave e que ela se refere também, apenas às almas sinceras, de boa vontade e reta intenção e não a essas criaturas frívolas, bisbilhoteiras e desobedientes, que, para maior condenação sua, fingem andar na vida devota.



A emenda dos nossos defeitos mais predominantes e habituais é, ainda, trabalho aspérrimo de muitos anos, pois que, quando mesmo se atingiu já o quarto grau da ascese, ainda são grandes as tentações que assaltam a alma, correndo ela mesmo o risco de perder todos os louros conquistados.



Distingamos, porém, nitidamente, defeito de pecado. Defeitos, são imperfeições, filhas da mísera condição da fragilidade, da fraqueza humana. Pecados, são os frutos do orgulho, da soberba, da ambição, da cupidez, da malícia da alma. Ora, os defeitos, ou imperfeições, se corrigem sempre que há boa vontade e temor de Deus e viça (aumenta) na alma a flor perfumada do amor e desejo da perfeição. Se os pecados, geralmente, só se corrigem pelo temor do castigo que eles atraem, a sua emenda e correção exige uma boa vontade perseverante de os eliminar da nossa vida moral. Caímos um, dois, três anos nele? Não importa: haja sempre boa vontade de os corrigir, de os extirpar como raízes, daninhas do jardim da nossa alma, e um dia virá, em que eles desaparecerão.



E assim é oportuno dizer, ainda, que se já é verdadeiramente piedosa a alma que tem um regulamento certo de vida espiritual, como seja a Confissão em dias certos e a Comunhão diária, a Visita ao Santíssimo e o Exame Geral de Consciência, também diário e em horas certas, particularmente todas as noites, a meditação e leitura espiritual, todavia, é preciso que todos estes atos de devoção sejam feitos unicamente com o fim de ganhar a estima e a amizade de Nosso Senhor, para que se possa dizer que esta pessoa, esta alma, é já uma alma piedosa, que ela está já no terceiro grau da ascese, aonde ainda não chegaram as almas crentes e as almas boas, que formam o primeiro e o segundo grau do caminho da perfeição.



Se é para agradar ao mundo, que uma pessoa piedosa pratica os atos de devoção que distinguem dos graus inferiores as pessoas que já atingiram o terceiro grau da ascese, então, melhor seria a essa pessoa deixar-se ficar em casa trabalhando, do que andar a juntar lenha, para no meio dela, arder no Fogo do Purgatório.



Notai, também, que no terceiro grau da ascese, são sempre certas muitas tentações, dúvidas e desânimos, faltas de contrição nas confissões, distrações na oração, e mesmo até muitas quedas na humildade, na obediência e na mortificação dos sentidos. Não vos aflijais, porém. Dizem os Santos, que Nosso Senhor permite ainda neste estado que o Diabo assalte as almas com muitas dores, aflições e tentações horríveis.



O remédio é nunca desanimar, nem desesperar, esperando que passe a tempestade, certos sempre de que Nosso Senhor vela por nós e nos quer experimentar. Nunca se deve perder a calma.



Quando Nosso Senhor disse a São Pedro, que perdoasse até setenta vezes sete vezes, quis ensinar-nos esta doutrina das quedas, dos desfalecimentos, dos naufrágios contínuos da nossa alma.



Nosso Senhor permite todas essas tribulações a fim de nos fazer perder o amor-próprio, pois, é ele o pior defeito, a raiz mais funda que, ainda até a morte, conserva vida latente, nas almas mais puras.



Enfim, piedosas Filhas de Maria, sejam as três virtudes teologais, a Fé, a Esperança e a Caridade, as três gemas do mais cintilante brilho, que fuljam engastadas na vossa coroa de servas de Maria Imaculada.



É a uma virtude sobrenatural e infusa, como ensinam os Teólogos, pela qual rendemos o nosso espírito, obediente e humilde, às verdades que Deus nos revelou. Ela funda-se na autoridade Divina que não se engana, nem pode enganar-nos.



Ela é viva, quando unida à Caridade, isto é, ao amor de Deus acima de todas as criaturas, e morta, quando a alma está separada de Deus pelo pecado mortal. Ela é a primeira das virtudes teologais. Quando as Santíssimas Escrituras nos ensinam as verdades necessárias para a nossa salvação, é o próprio Deus que nos ensina por intermédio dos seus Enviados. Se errarmos, digamos, como o profundo teólogo escolástico, Ricardo de São Vitor41: Domine, si error est quod credimus, a te decepti sumus: Senhor, se estamos em erro, fostes Vós que nos enganastes.



Sem fé é impossível agradar a Deus, nos ensina São Paulo.42 E em outro ponto, diz ainda: O justo, porém, vive da fé.43 O que não crê, já está condenado ensina, ainda, São João.44



A fé, ensina, finalmente, São João Crisóstomo, é a origem da justiça, a cabeça da santidade, o princípio da devoção e o fundamento da religião: origo justitiae, sanctitatis caput, devotionis principium, religionis fundamentum.45



A Esperança é, igualmente, uma virtude infusa, isto é, vem diretamente de Deus. É São Paulo, ainda, quem no-lo ensina quando escreve aos Romanos: “O Deus, pois, de esperança vos encha de todo o gozo e de paz na vossa crença, para que abundeis na esperança e na virtude do Espírito Santo”.46 O Santo Apóstolo chama-lhe, ainda, uma âncora segura e firme da alma.47



É, fortalecidas por esta virtude sobrenatural, que vós deveis caminhar resolutamente na estrada real da perfeição, absolutamente certas de que caminhais para alcançar seguríssimamente o vosso fim último: a posse da bem-aventurança eterna.



Nas horas passageiras dos vossos desalentos repeti, como São Paulo: “Porque na esperança é que temos sido feitos servos”.48



A Caridade é, também, uma virtude sobrenatural e infusa, que leva a alma ao amor de Deus. São Paulo nos ensina que esta virtude é maior ainda, do que as outras duas, a e a Esperança.49



Ela é o vínculo de toda a perfeição, diz ainda o Santo Apóstolo de Jesus.50 Vós amareis já a Deus intensivamente, quanto a nossa miséria humana O pode amar, quando puderdes dizer verdadeiramente, como o mesmo Santo Apóstolo: “Quem nos separará, pois, do amor de Cristo? Será a tribulação? Ou a angústia? Ou a fome? Ou a nudez? Ou o perigo? Ou a perseguição? Ou a espada?”51



A Caridade para com o vosso próximo praticai-a sempre em nome e por amor de Deus, para que seja meritória. Foi Nosso Senhor que assim nos ensinou, quando disse: “Aquele que der um copo de água em Meu nome, terá a sua recompensa”.52



Por amor de Deus perdoai sempre todas as afrontas e ofensas que receberdes dos vossos semelhantes, quando eles, delas vos pedirem perdão. Assim fez o Apóstolo São Tiago ao seu delator, que o acusara ao rei de Jerusalém de ser cristão. Caminhava já para a morte este Santo Apóstolo de Jesus, cheio de coragem e esperança nas divinas recompensas. Então um homem lhe sai ao encontro, prostra-se a seus pés, e, banhado em lágrimas, lhe pede perdão de o ter denunciado. O Apóstolo de Jesus, levanta-o carinhosamente, abraça-o e lhe diz: “Sim, eu te perdoo; o teu arrependimento apaga a tua culpa. Eu te abençoo! Queira também, Aquele com quem me vou juntar breve no Céu, esclarecer com a Sua luz a tua alma”.



João Gualberto, nobre florentino, que resplandece em nossos altares, vê um dia na sua frente, inteiramente descarnado, o assassino de seu irmão Hugo. Cheio de furor, pronto já a vingar o sangue de seu irmão que fora derramado pela espada desse seu inimigo, este estende para ele os braços em cruz e lhe suplica que lhe poupe a vida e lhe perdoe, em memória da Santa Cruz onde morrera o Divino Salvador. Então, Gualberto, ferido pela graça do Céu, não só lhe perdoa, mas com ele vai a uma igreja próxima ratificar esse perdão generoso e a nova aliança de paz que fazia dali em diante com aquele seu inimigo. Pois foi este perdão compassivo e cristão que arrancou Gualberto das cadeias do mundo e o fez ingressar no caminho da perfeição cristã, cuja meta atingiu.



Ainda desejo lembrar-vos, piedosas Filhas de Maria, que não são as penitências corporais os meios mais eficazes para alcançardes a perfeição. Jesus deseja mais particularmente de vós o exercício, a prática ativa e perseverante das penitências morais.



Ora, entre elas, avulta essa virtude sublime do perdão de todas as ofensas. Se vós só castigásseis o vosso corpo com penitências físicas e não praticásseis as virtudes morais no perdão, da bondade, da indulgência e da misericórdia, que são leis eternas e sagradas por Deus, postas como diretivas da nossa existência terrestre, vós não serieis dignas das Suas celestes bênçãos. São Francisco de Assis à hora da morte, pediu perdão ao seu corpo dos maus tratos que lhe dera em vida.



Ele não teria sido um Santo tão admirável se não tivesse também subido ao mais alto grau de todas as virtudes morais e evangélicas.



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A ideia fixa, como a estrela polar, que deve dirigir a vossa vontade, há de ser, devotas Filhas de Maria, só fazerdes sempre e em tudo a vontade de Deus. “Todos quantos quiserem fazer na vida só a vontade de Deus, devem caminhar na terra, indiferentes tanto às honras, como aos desprezos do mundo”, disse um dia Nosso Senhor à Venerável Anna de S. Barthelemy.53



E à Soror francisca da Mãe de Deus, disse também Jesus um dia, no momento em que o Sacerdote descia a Sagrada Custódia do Trono para a recolher ao Tabernáculo santo: “Vede, Eu me deixo erguer e baixar como querem”.



Por estas palavras Jesus aludia e respondia à repugnância que ela tinha em aceitar o cargo de Mestra das Noviças que lhe impunha a sua Superiora. Jesus lhe ensinou, ainda, de outra vez, que os três fundamentos da Sua morada nas almas eram: uma inclinação reta e pura do coração para Ela; o desprendimento completo de todas as coisas materiais; e o desprezo de si mesmo.54



A Santa Catarina de Sena, disse também um dia Jesus sobre o juízo dos justos e o dos pecadores: “Tanto uns, como outros, não tem depois da morte outros juízes senão a si mesmos; o juiz de cada um é a sua própria consciência. Os maus morrem no ódio, os justos no amor, os arrependidos na confiança da misericórdia Divina.



Após a morte, cada um segue instintivamente o seu destino, que eles pressentem já antes mesmo de haverem abandonado inteiramente o corpo. Aos bons, guia-os a luz do amor, da fé e da esperança no Sangue do Calvário; os arrependidos, confiados na misericórdia Divina, seguem para o Purgatório; os condenados são seguidos pelo ódio e pelo desespero. Muitos pecadores há, que na hora da morte obtém tal contrição, que até o Purgatório mesmo lhes é perdoado”.55



À esta mesma Santa revelou um dia Nosso Senhor os terríveis suplícios, porque passam no Inferno as desgraçadas almas que lá caem. “Minha filha, lhe disse Jesus, a língua não pode jamais exprimir o que aí sofrem as desgraçadas almas. Aí vão e levam, o orgulho, o ódio, o amor-próprio, a cupidez, a voluptuosidade, a ambição, a injustiça, as crueldades e as devassidões.



São quatro os seus suplícios: primeiro, privação da visão de Deus; segundo, o verme do remorso; terceiro, a visão do Demônio; quarto, o fogo que arde e não consome e que arde eternamente. O Demônio aí é visto em toda a sua realidade e a sua figura é tão espantosa e medonha, que jamais pode ser concebida pela imaginação humana.



À estes suplícios, se juntam ainda: o frio, o calor, e o ranger dos dentes. Todos estes sofrimentos esperam os pecadores que, não se convertem à hora da morte. O ódio dos condenados é tão forte, que eles não desejam bem algum, mas blasfemam sem cessar o Santo Nome de Deus. E porque? Porque o livre arbítrio dura até a morte. Passou já para eles o tempo de merecer”.56



E à Santa Maria Madalena de Pazzi, disse também Jesus: “Reina entre os condenados, um ódio eterno. Quanto mais aumenta o seu número, mais os seus sofrimentos aumentam, pois que os novos que chegam aumentam a raiva que os anima uns contra os outros.57



Estando um dia Santa Matilde em oração, viu o Inferno aberto sob os seus pés, e viu que aí reinava uma miséria e horror infinitos; semelhantes a serpentes e escorpiões, a cães, a leões e bestas ferozes, aí se despedaçavam, os que lá estavam, uns aos outros.



Estes são, lhe disse Jesus, os que não se lembraram de Mim, nem uma hora sequer na sua vida”.58



Santa Verônica Juliana, em 14 de Fevereiro de 1694, viu também, o Inferno aberto. Ela via que muitas almas aí caíam e que elas eram tão feias e negras, como medonhas. Precipitavam-se umas após outra e desapareciam no meio das chamas.



Do meio do fogo que as engolia, elevavam-se cutelos, navalhas e diversos instrumentos de suplício, que caíam sobre todos esses desgraçados. Entre essas almas, ela vê muitas de Religiosas, culpadas de violação das suas Regras. Ela só vê aí trevas e ouve blasfêmias e gritos; um horrível cheiro a estonteia. O fumo e o fogo é negro e espesso. Vê, ainda, muitos Demônios envoltos em fogo, ferindo os condenados. O Salvador lhe aparece então flagelado, coroado de espinhos, conduzindo a Cruz e lhe diz: “Olha para esse horror, que não terá jamais fim. Aí se exerce a Minha justiça e a Minha terrível cólera”.



De outra vez, ela sentiu-se como que colocada sobre uma fornalha ardente e sofre penas atrozes, como de lanças que a penetravam, ferros em brasa, chumbo derretido sobre todo o seu corpo. Ela vê o Inferno tão vasto, como toda a máquina do mundo; ela vê, ainda, uma mó imensa de pedra, que sobe e desce continuamente esmagando os condenados. Ela sente todos os seus ossos despedaçados como que por rodas de navalhas; sente-se picada por alfinetes e agulhas, queimada por ferros em brasa, despedaçada por instrumentos cortantes.



Todos esses sofrimentos, atormentavam os condenados.59



Em 27 de Janeiro de 1716, Maria aparece-lhe e, chamando dois Anjos que lhe serviam de guarda, lhes manda que a conduzam em espírito ao Inferno. A Mãe de Jesus abençoou-a e lhe diz: “Nada temas, minha filha, Eu serei contigo e te ajudarei”.



Ela, então, de repente encontra-se num lugar escuro, profundo e nauseante; aí ela ouve bramidos de touros e rugidos de leões, assobios de serpentes, muitas vozes confusas e espantosas e rugidos de trovões que a enchem de pavor. Ela aí vê relâmpagos e um fumo muito espesso. Ela vê uma grande montanha cheia de serpentes, víboras e basiliscos, entrelaçados uns nos outros e em número incalculável. Ela ouve vozes de maldição que saem de debaixo deste montão de répteis repugnantes; ela pergunta aos seus Anjos da Guarda de quem eram aquelas vozes. Responderam-lhe que eram das almas que ali se acham em tormentos. A montanha, então, abre-se e ela vê dentro tudo cheio de almas de Demônios. Eles estavam todos amarrados uns aos outros, formando uma massa só; estavam ligadas as almas aos Demônios, por cadeias de ferro e fogo; cada uma das almas tinha muitos Demônios em volta de si.



Depois ela foi transportada a uma outra montanha coberta de touros e cavalos furiosos, que se mordiam como cães danados. Saía-lhes o fogo dos olhos, do nariz e da boca; os seus dentes eram como lanças agudas e espadas cortantes, reduzindo num instante a migalhas todo quanto mordiam.



E ela compreendeu, então, que eles mordiam, devoravam almas.



Ela vê ainda, outras montanhas onde há tormentos ainda mais cruéis, mas que ela diz ser impossível descrever. Ao centro desta morada infernal, ela vê, um trono muito alto; é este o assento do Demônio, príncipe e chefe dos Demônios. Aí está Lúcifer, horrível e espantoso, ultrapassando em horror todos os outros Demônios. Ele parece ter cem cabeças, cheias todas de lanças, em cuja extremidade brilha como que um olho, que lança setas inflamadas, que fazem arder todo o Inferno.



Todos os Demônios e todos os condenados, ainda que em número incalculável, veem esta cabeça medonha e recebem tormentos sobre tormentos, deste medonho Lúcifer.



Então, os Anjos lhe explicam que, assim como no Céu, a vista de Deus torna felizes todos os eleitos, também esta medonha figura de Lúcifer, o monstro infernal, é um tormento contínuo para todos os condenados. O seu maior sofrimento é terem perdido Deus. Esta pena atormenta Lúcifer e todos os réprobos. E se ele blasfema, todos blasfemam; se ele maldiz, todos maldizem.



Ela vê ainda, a alma de Judas debaixo dos pés de Satanás; vê, também aí, por indicação dos Anjos, as almas de muitas Religiosas.



O trono abre-se, e ela vê no meio dos Demônios, grande número de almas de Prelados, de Dignitários da Igreja, de Superiores de Ordens Religiosas e de Conventos! Ela pensa que teria morrido de dor e de pavor se não fosse a proteção dos Anjos e de Maria. Tudo que ela diz é nada, conclui, como tudo que ela tem ouvido aos pregadores é nada, em face do que viu!60



Não toquei neste assunto, piedosas Filhas de Maria, para perturbar a vossa alma, mas sim, para despertar nela um sentimento mais vivo ainda do amor a Deus. Deus é amor, e, só por amor quer ser servido, honrado e amado. Mesmo tais visões terríveis não são dogmas de fé. Apenas como verdade revelada é a existência do Inferno, onde, como ensinou Nosso Senhor, há prantos, choros e ranger de dentes.



Ainda, também, estas expressões de Jesus se podem tomar, como ensinam eminentes Teólogos, num sentido figurado. S Tomás de Aquino estudando a questão da natureza do fogo do Inferno, diz que Santo Ambrósio e outros Padres antigos creram ser ele espiritual, outros real, outros eterno e outros, ainda, não eterno.61 Também, resolvendo a questão evangélica tão debatida sobre a Comunhão de Judas, na saudosa tarde do Cenáculo, o mesmo excelso Doutor diz que, Santo Epifânio e outros Padres afirmam que ele comungou e outros que não. Santo Tomás, porém, ensina que sim, pois Jesus não quis que se descobrisse o segredo da sua traição, pois estava ainda oculta e sem testemunha, para assim dar exemplo aos Prelados, para que nunca condenassem o súdito sem que o delito fosse testemunhado.62



Sim, não foi para perturbar a vossa alma que eu abordei esta doutrina das penas e castigos do Inferno, valendo-me, para melhor vos impressionar, do relato feito por alguns Santos extáticos.



Também ensinam ilustres Místicos, que se estas visões, ou êxtases, são fenômenos raros, graças especiais só concedidas a raras pessoas, que chegaram a alcançar a posse perfeita da oração contemplativa sensível, também muitas vezes são alucinações místicas, ou trevas, ou ainda, como querem os Cientistas, fenômenos patológicos do amor místico, resultantes, ou do temperamento, ou de uma especial organização da vidente, modificados segundo as circunstâncias ambientes.



Também são por vezes pias fraudes, introduzidas nos livros místicos, principalmente, nas Vidas dos Santos extáticos, como o confronto das suas várias edições tem revelado. Eis porque a Mestra infalível da verdade, a Santa Igreja, não condenando tais visões e êxtases, também não os impõe à nossa fé, como verdades reveladas.



A meditação, porém, do Inferno exerce sempre uma santa e boa influência para a salvação de uma alma e principalmente para a santificação de uma piedosa Filha de Maria, que deve lembrar-se sempre de que, como disse Jesus, a quem muito foi dado, muito será pedido.63



Não há dúvida de que, como escreve o piedoso místico Padre Faber,64 a meditação daquele lugar de horrores não deixa de exercer uma boa influência na salvação de uma multidão de almas, por causa do santo e salutar pavor que nelas excita. Quem dera, que não existisse um recanto só no universo, que não estivesse cheio todo da glória de Deus! Ah! Mas existe um lugar de onde a glória do Senhor parece não ter nada já a esperar, um sitio de onde não saem nem orações, nem bênçãos, nem louvores, nem ações de graças, nem aspirações, nem desejos. É a morada daqueles cujo processo está concluso e que perderam a sua causa, perdendo a Deus.



Para eles a graça não produziu frutos, ou se os produziu, apodreceram na árvore; os Sacramentos ficaram sem efeito; a Cruz foi por eles ultrajada; os desígnios de um Deus ardente de amor encontraram neles resistência pertinaz e foram levados de vencida.



Quem duvidará que no Céu estão agora milhares de almas, que lá não teriam entrado, se não houvesse Inferno! Ah! Assim como da superfície estéril do oceano, que não produz pão nem vinho, se elevam vapores que vão formar as nuvens e que, em seguida, caem em chuva fecundante sobre montes e vales, assim do seio daqueles abismos de fogo e maldição, eleva-se a misericórdia Divina, como nuvem benéfica, para derramar ondas de graças sobre as almas viventes.



Sim, é bom, é salutar pensar no Inferno e no milagre da bondade Divina, que faz com que lá não estejamos a estas horas. Fez um dia Nosso Senhor ver à Irmã Francisca do Santíssimo Sacramento, Carmelita espanhola, o estado de uma alma condenada, e, tendo-a obrigado por diferentes vezes em uma visão, a estudar os diversos suplícios daquele lugar de dor, repreendeu-a por ela chorar, dizendo-lhe: “Francisca, porque choras?” Prostrando-se ela a seus pés, respondeu: “Senhor, choro a condenação desta alma e a maneira como foi condenada”. Jesus dignou-se responder-lhe: “Minha filha, esta alma está condenada, porque ela assim o quis: ofereci-lhe os múltiplos recursos da graça, para que se salvasse, mas repeliu-os. A tua compaixão é agradável aos meus olhos, mas preferiria que adorasses a minha justiça”. E, em outra ocasião, como ela fosse obrigada a ter a vista fixa nos suplícios do Inferno, os Anjos disseram-lhe: “Francisca, trabalha para meter em teu coração o santo temor de Deus”.



Eis, piedosas Filhas de Maria, o segredo da nossa salvação e santificação: guardar sempre em nossos corações o santo temor da justiça de Deus, aliado a uma doce esperança na sua bondade e misericórdia infinitas.



Quem tiver caído nos abismos da culpa ainda pode levantar-se a tempo. Cada novo dia que chega, nos oferece a oportunidade da salvação. Hoje, nos diz o Santo Profeta Davi, se ouvirdes a palavra de Deus, se ouvirdes a sua voz, não queiras endurecer os vossos corações.65



Cada dia que vem, é um refrigerante começo; cada manhã, o mundo nos aparece como que criado de novo. Ó tu, que gemes sob o peso das tuas tristezas e das tuas culpas, aí tens uma esperança para ti; para ti e para mim. Passadas estão todas, as passadas coisas, as labutas angustiosas e as lágrimas vertidas. Deixa que o dia de ontem se cubra com os erros de ontem; as feridas de ontem, bem como a sua dor candente e hemorragia, secaram já com a medicina que verteram. Deixemo-las, já que não as podemos mais expiar, nem desfazer. Só é nosso agora, o novo dia. Aí estão os Céus brunidos de esplendor, aí está a morta terra outra vez renascida; os teus cansados membros participam novamente, com o raiar da manhã, do batismo do rócio e da frescura da alvorada.



Sim, repito, cada dia é um refrigerante começo. Escuta, minha alma, os alegres cantos do Céu e da terra, dos seres e das coisas; põe fora as antigas tristezas, os velhos pecados, as ideias angustiosas, as sensíveis penas. Toma alento com o dia que amanhece e começa de novo a tua tarefa. Começa-a ao alvorecer do novo dia que surge para ti com todas as suas glórias e riquezas, com todas as suas sublimes e eternamente determináveis possibilidades e tu chegarás à realização da mais alta vida que possa conceber-se, pois nada há que não possa realizar-se como cada um queira e quando queira.



Deste modo, se chega ao amor e à aliança com o mais alto e elevado amor do universo, e assim, o mais alto e elevado amor do universo, chega a estar também em aliança e amor com quem tão altos cumes alcança.



Fecho agora, piedosas Filhas de Maria, estas considerações breves, mas verdadeiramente instrutivas sobre os diversos modos, regras e métodos de oração, com que podereis chegar ao mais alto cume da montanha da perfeição espiritual, isto é, a serdes santas dignas da canonização, a serdes verdadeiras Esposas de Cristo, que é o Espelho da eterna beleza, a Fonte do amor eterno e a Luz inextinguível, como lhe chama um Místico.66 Acompanha-lO-eis um dia, coroadas de grinaldas, de jasmins e rosas, seguindo todos os seus passos.



Borboletas divinas no seio da luz imensa, roçareis, vivereis nela, sem nela vos queimardes; o fogo vos tornará ainda mais belas, ó almas santas, esposas do mavioso Cordeiro.



Sim, exclama um Místico, ó doce Pastor das almas, das ovelhas desgarradas, quando, à hora do meio-dia te deténs a gozar o repouso, junto a uma nascente de água viva, elas impacientes de amor, rodeiam as claras fontes.



O delicioso perfume que exala a tua boca, ó terno Amante, atrai-as e o doce amor que palpita em teu seio as impele para Ti, porque aquele que uma vez Te viu, ama-Te para sempre.



Tu caminhas rodeado por elas espargindo mil claridades, como o sol no meio das estrelas, iluminando os altos cumes dos montes eternos.



Ó meu doce Amigo, eu sinto a tua presença e minha alma nada mais deseja do que ir para Ti. Vejo o teu rosto, ouço a tua voz mais suave do que a das cítaras dos Anjos. O meu espírito como que desperta de um sonho; cumpriu-se o meu voto, vejo-Te, ouço-Te, toco-Te, e possuo-Te.”



Ó abismo do amor insondável, exclama João d’Ávila, ilimitado oceano de amor, pode alguém deixar de considerar-se mais rico do que todos os reis da terra, quando tem a felicidade de possuir o teu amor?”



Fala por sua vez o místico Diogo de Stella: “O amor divino, único amor verdadeiramente unitivo, é, também, o único que pode nos salvar e só por ele cada um dispõe da salvação. Deus não prescreveu que nos salvássemos pela esmola; seriam então excluídos os pobres; nem pelo jejum, impossível aos doentes; nem pela ciência, ou sabedoria; que seria dos ignorantes e dos pobres de espírito? Nem pela virgindade; que seria das pessoas casadas? Nem pela pobreza; que seria dos ricos? Mas, o amor é nosso; depende de nós, é comum a todos os estados, a todas as idades e sexos; ninguém está doente, nem é pobre, nem velho para amar. Cristo promulgou para todos a Lei Nova, a Lei do Amor.”



Dirigindo-se a Deus, ele celebra assim o Amor divino: “Todas as criaturas, Senhor, me dizem que Te ame, e cada uma delas tem a sua linguagem para publicar a Tua grandeza e a Tua bondade.



A beleza dos Céus, a claridade do sol e da lua, os fogos das estrelas e dos planetas, o curso dos rios, a verdura dos campos, o brilho e diversidade das flores, tudo que Tuas divinas mãos produziram, ó Deus do meu coração, Esposo da minha alma, tudo isto me ordena que Te ame, tudo o que eu vejo me convida ao Teu amor…”67



***



Dou-vos, piedosas Filhas de Maria, um derradeiro conselho espiritual: abreviai sempre o mais possível as vossas confissões; perfeitas sejam sim, mas sejam simplesmente a acusação das vossas culpas, recebendo sem demora a absolvição sacramental, com o coração verdadeiramente repungido pela dor de haverdes ofendido a Deus e a mente inteiramente determinada a corrigir todos os defeitos da alma. Dizia Santa Teresa de Jesus, “que tinha quase a certeza de que acabavam sempre mal as confissões demoradas.”68



Outro aviso e conselho vos dou ainda: cultivai com esmero e devoção o Canto Sacro nas igrejas. Depois do Sinal da Cruz, dizia São Gregório Magno, grande Papa, grande Santo e Doutor da Igreja, que era ele a arma mais terrível contra Satanás.



Também assim cumprireis o preceito do Apóstolo São Paulo: “Falando entre vós mesmas em Salmos e Hinos e Canções espirituais, cantando e louvando ao Senhor em vossos corações.”69



Orai ao Senhor por mim, ó almas piedosas e compassivas, que lerdes estas páginas escritas em nome de Jesus, e só para a sua glória e do seu e nosso Eterno Pai, que está no Céu.


A Lei da Sub-rogação,
ou da Substituição nos Santos Místicos


ESTIGMAS E VISÕES –



Como complemento necessário a este pequeno Tratado, da dissertação sobre Teologia Mística, dir-vos-ei ainda, piedosas Filhas de Maria, pois esta doutrina muito interessa às almas entregues à prática de uma vida cristã verdadeiramente fervorosa, que, todos os fenômenos físicos e extraordinários manifestados em vida, ou após a sua morte, parecendo mesmo contrariarem as leis da natureza, em muitas almas que atingiram a perfeição espiritual e que mereceram as honras dos altares, devem ter para vós, apenas, uma importância secundária, pois a Igreja não os considera, geralmente, como base necessária para a sua canonização.



Perante a inefável prudência da Igreja, esses dons, esses privilégios, esses fenômenos, essas maravilhas manifestadas em alguns Santos, nada provam de superioridade de uns sobre os outros. São as qualidades e não os atos extraordinários, que determinam a Beatificação dos Santos. Sim, repito, perante o criterioso e inflexível juízo da Igreja, muitas vezes os milagres não passam de provas secundárias, porque Ela sabe muito bem que o Espírito do Mal os imita.



Há nas biografias de muitos Beatificados, fenômenos mais perturbadores, ainda, do que nas de muitos Santos e, no entanto, a Igreja tem diferido por muito tempo a sua promoção a tão soberana dignidade.



O argutíssimo espírito de Santa Teresa escreveu: “É preciso não se imaginar que uma pessoa, pelo fato de ser favorecida de graças, seja melhor que as que o não são, porque Nosso Senhor dirige cada um, segundo a sua necessidade particular”.



Nós vemos, por exemplo, o arroubamento em muitos Santos, o dom do arrebatamento do corpo aos ares, como em Santa Teresa, em Santa Cristina, a Admirável, em São Pedro de Alcântara, em Domingas de Maria e Jesus, em Inêz da Bohêmia, em Margarida do Ss. Sacramento, na Bem-aventurada Gorardesca de Pisa e em São José de Cupertino, que se elevava do solo quando queria.



Vemos noutros Santos a supressão do estômago, que se transforma, recusando todo o alimento terrestre, consumindo, apenas, as Espécies Eucarísticas. Santa Catarina de Sena e Ângela de Foligno viveram exclusivamente, durante anos e anos do Sacramento, e este dom foi, igualmente concedido a Santa Coleta, a Domingas do Paraíso, à Beata Maria Bagnesi, a Francisca de Serrane, a Luíza da Ressurreição, a Santa Colomba de Rietti, a Santa Rosa de Lima, a São Pedro de Alcântara, ao Beato Nicolau de Flue (hoje, São Nicolau), à Madre Inêz de Langeac e a muitos outros.



O olfato e o gosto sofrem e apresentam estranhas metamorfoses em São Filipe Nery, em Santa Margarida de Cortona, que reconhecem um gosto especial no pão ázimo, quando, depois da Consagração, deixava de ser uma simples pasta de farinha de trigo, para se transformar na própria Carne de Cristo.



São Pacômio distinguia os heréticos pelo seu mau cheiro; Santa Catarina de Sena, São José de Cupertino, a Madre Inêz de Jesus, descobriam os pecados pelo seu odor fétido; Santo Hilário, Santa Lutigarda, Gentil de Ravena, São Filipe Nery podiam dizer às pessoas com quem se encontravam, cheirando-as, apenas, as faltas que haviam cometido!



E há Santos que exalam em vida e depois de mortos, embriagantes perfumes. Quando São Francisco de Paula e Venturini de Bérgamo celebram Missa, rescendem aos bálsamos; São José de Cupertino segregava tais fragrâncias que por elas se lhe podiam seguir os passos; Santa Rosa de Viterbo rescendia à violeta e Santa Teresa de Jesus à violeta e ao lírio, símbolos da sua humildade e castidade.



E estes fenômenos extraordinários dão-se e manifestam-se em muitos Santos nas suas doenças. São João da Cruz e o Bem-aventurado Didio, coberto de úlceras, Bartholo, o terciário, roído e comido pela lepra até aos ossos, exalam de seus corpos virginais as essências dos lírios desabrochados; Santa Coleta, Ida de Louvain, Salomoni de Veneza, a clarissa Joanna Maria da Cruz e Santa Fina da Toscana, que passou a vida sobre um leito, Santa Humiliana, Maria Vitória de Gênova, Domingas do Paraíso, Santa Lydwina de Schiedam, todas elas cobertas de úlceras, escalavradas pelas chagas esvurmando pus, embalsamam a atmosfera envolvente, como se fossem turíbulos de incenso redolente!



E há os Myroblitas, os Celícolas, cujos cadáveres destilam essências e bálsamos. Tais foram São Nicolau de Myre, São Wllibrord, o apóstolo da Holanda, São Vitaliano, Santa Lutigarda, Santa Walburgia, Santa Rosa de Viterbo, a Beata Maria de Nazaré, Santa Hedwiges, Santa Eustáquia, Santa Inêz de Montepulciano, Santa Teresa, Santa Madalena de Pazzi, a carmelita Margarida Van Valkenissen, a Beata Arcangela Girlani, prioresa em Mântua, cujo cadáver incorruptível, teve a especialidade de curar pelo seu contato, as mulheres atacadas de cancros no rosto e na garganta, e outros ainda.



E há outros Deícolas que viveram sem a refeição do sono, como foram Santa Cristina, a Admirável, Santa Coleta, Santa Catarina de Ricci, a Beata Águeda da Cruz, Santo Elpídio e Santa Flora, hospitaleira da Ordem de São João.



E há muitos Santos, cujos corpos voltaram de novo, depois da sua morte, à sua mocidade, como foram São Francisco de Assis, Santo Antônio de Lisboa, São Lourenço Justiniano, Santa Lutigarda, Santa Catarina de Sena, Santa Catarina de Ricci, Santa Madalena de Pazzi, a Venerável Francisca Doroteia, Maria Villani de Nápoles, Santa Rosa de Lima e outros ainda.



Há Santos que possuíram o dom da bilocação, o poder de se desdobrarem, de se geminarem, o poder de estarem ao mesmo tempo e no mesmo momento em dois lugares diversos. São Francisco Xavier e Maria de Ágreda estavam ao mesmo tempo no seu convento de Espanha e no México, onde pregavam aos infiéis; a Madre Inêz de Jesus, sem sair do seu convento de Langeac, vinha visitar, em Paris, M. Olier. Quem não conhece o fato célebre de Santo Antônio de Pádua que, estando a pregar na cidade de Milão, na Itália, de repente apareceu na cidade de Lisboa e aí, no Tribunal, defendeu e provou a inocência das acusações que faziam a seu pai?70



E o que sucedeu com Santo Afonso Maria de Ligório que, achando-se em Arienzo, tendo-se sentado, depois de dizer Missa numa cadeira de braços, ficou como que adormecido e assim permaneceu um dia e uma noite, narrando, depois de voltar a si, que tinha ido assistir ao Papa Clemente XVI, que acabava de morrer?71



Outros Santos tinham o seu coração tão ardente e abrasado, que até as roupas se lhes crestavam; o fogo que consumia Úrsula Benincasa, fundadora das Teatinas, era tão vivo que esta Santa expirava colunas de fumo, todas as vezes que abria a boca; Santa Catarina de Gênova mergulhava os pés e as mãos em água gelada, que depois ficava a escaldar; a neve derretia-se em torno de São Pedro de Alcântara, e, um dia em que o Bem-aventurado Gerlach atravessava uma floresta, em pleno inverno, aconselhou ao seu companheiro que caminhava atrás de si e que não podia avançar mais, porque as suas pernas se enregelavam, a que pusesse os pés sobre as suas pegadas, e este deixou logo de sentir mais frio!



A missão de uns Santos foi toda ruidosa e expansiva, pregando às multidões, correndo o mundo, convertendo idólatras, reformando os costumes, regenerando as sociedades, como São Vicente Ferrer, chamado o Anjo do Apocalipse, Santo Antônio de Lisboa, ou São Leonardo de Porto Maurício; a missão de outros foi toda passiva, a missão do sofrimento, a de serem vítimas expiatórias e propiciatórias dos pecados do seu tempo.



O mundo não sabe compreender, nem conhece sequer os desígnios de Deus sobre ele. Em verdade, é preciso ser-se bem um santo, quase um São Francisco de Assis, um São João da Cruz, ou uma Santa Teresa de d’Ávila, para compreender-se essa lei sempre em vigor da substituição, que a Justiça imutável de Deus exige para o equilíbrio do mundo. Quando Moisés no alto da montanha afrouxa os braços, que sustenta no ar em penitência, logo o castigo de Javé cai sobre os acampamentos do povo hebreu.72



As almas sublimes que percorreram já as diversas etapas da mística, sabem muito bem, como tudo isto é verdadeiro. Nós não o compreendemos, mas compreenderam-no nitidamente os Santos e Santa Teresa, nos seus admiráveis Castelos d’Alma, deixou bem definida essa suprema lei da estabilidade do mundo.



Exclamar: “sofrer ou morrer”, como Santa Teresa de Jesus, ou “sempre sofrer e não morrer”, como Santa Madalena de Pazzi, ou “ainda mais, Senhor, ainda mais”, como São Francisco Xavier, agonizando de dores nas praias da China, ou “queria ser despedaçado pelos sofrimentos, a fim de provar a Deus o meu amor”, como a Venerável Maria da Trindade, carmelita do século XVII, ou “o desejo de sofrer é um verdadeiro suplício; eu iria ao mercado comprar dores, se elas lá se vendessem”, como às freiras do seu mosteiro dizia a Serva de Deus, a Madre Maria du Bourg; – eis as grandes fórmulas da substituição. Todos esses admiráveis Santos tiveram bem a intuição dessa inflexível lei da Justiça e da Misericórdia divinas. Todos os escritores supraelevados que cultivaram a fragrante açucena da mística nos canteiros da ascese cristã, tiveram a mesma compreensão dessa lei divina da sub-rogação, todos, desde São Boaventura até Santa Teresa d’Ávila, passando por São João da Cruz, Santa Catarina de Gênova, Santa Catarina de Sena, Santa Ângela de Foligno, Maria de Ágreda, Ruysbroeck, Suzo, Tauler, soror Emmerich e muitos outros.



E o que mais nos espanta, é vermos, ainda, que Deus vai recrutar estas almas entre os leigos, fazendo-os, a eles, os herdeiros dessa graça, que jorrou a flux sobre a Igreja, na Idade Média.



Aonde está, pois, nos planos divinos da salvação do mundo, aonde fica o Padre, o rendeiro das almas, o cultivador dos alfobres celestiais? Ah! Parece que Deus se desviou dele, que Deus lhe retirou a sua confiança, e como que para lhe exprobrar a sua frieza e o seu egoísmo, faz apelo ao concurso dos leigos, para operar a obra da salvação dos homens!



Esta é a verdade manifesta; o Clero vai perdendo toda a sua influência sobre o patriciado das almas; os Eclesiásticos raras vezes operam conversões; a indiferença social por esta classe tão prestimosa e tão benemérita avoluma-se dia a dia e, punge-me dizê-lo, a não ser nos claustros e nas Ordens religiosas, que o Padre até, geralmente, aborrece, e as quais são verdadeiramente os únicos baluartes da Igreja, o Padre secular vive numa grande ignorância, numa grande e plena ininteligência e incompreensão da mística, da ascese cristã, da liturgia e da arte religiosa, que são os divinos e misteriosos eflúvios que atraem as almas a Cristo, ao seio do Salvador.



Ultimamente, morreu no Porto uma religiosa alemã, Superiora do recolhimento do Bom Pastor, a soror Maria do Divino Coração Droste Zu Vischering, cujos últimos anos da sua existência foram um verdadeiro inferno, de males e sofrimentos. Foi-lhe revelado, que ela sofria em expiação das culpas e dos sacrilégios cometidos pelos Padres portugueses.73 Esta mesma lei da substituição, foi bem conhecida da dominicana Santa Catarina de Sena. Ela foi verdadeiramente terrível para os Padres do seu tempo. Ela verifica os seus delitos, exprobra-lhes claramente, de venderem o Espírito Santo, de serem cupidos e orgulhosos, de praticarem sortilégios, de se servirem do Sacramento para praticarem malefícios!



E ela não suaviza as suas palavras quando os acusa dos excessos que cometiam nos pecados da carne, ameaçando-os em nome do Senhor, porque ela era verdadeiramente inspirada por Ele. A sua doutrina era haurida nas nascentes divinas – Doctrina ejus infusa, non acquisitadiz a Igreja, na lição sexta do seu Ofício.74 E, na flora mística das vítimas reparadoras, que expiaram em seus corpos inocentes as prevaricações do mundo, não faltam as que são particularmente votadas, a dar satisfação a Deus pelos pecados dos Padres.



A todas essas sublimes compensadoras foi revelado o fim especial da sua missão de sofrimentos na terra. Santa Colomba de Rieti, uma italiana, da Ordem Terceira Dominicana, foi encarregada pelo Senhor para intimar o Papa, a corrigir os seus costumes e a depurar a sua corte; ela foi submetida em Roma às mais impiedosas e minuciosas investigações e às mais cruéis sevícias; foi uma estigmatizada que compensou por meio de doenças, os crimes da sua época e morreu no seu posto, em 1501.



Uma outra grande compensadora foi Santa Ludovina, natural de Schiedam, na Holanda. Era ela uma donzela de extraordinária beleza que, aos quinze anos, após uma terrível doença, que a flagelara, se tornou feia. Algum tempo depois, já restabelecida, quando se divertia com algumas companheiras, patinando no inverno sobre os canais gelados da cidade, dá uma queda e quebra uma costela. A partir deste acidente, fica estendida num leito até a morte; os males mais terríveis precipitaram-se, então, sobre ela. O seu corpo cobriu-se de chagas; a gangrena corria nelas e, das suas carnes em putrefação, nasciam bichos! Depois, veio-lhe o mal temido da Idade Média, o fogo sagrado, que a devora, apoderando-se-lhe do braço direito e consumindo-lhe as carnes até aos ossos; os tendões dos seus músculos torceram-se e acabaram por estalar, exceto um que segurava o braço, impedindo-o de se destacar do tronco; desde então, ela não pode mais voltar-se sobre esse lado e só lhe fica livre o braço esquerdo, para erguer a cabeça que, era também, por sua vez, pasto da podridão!



Assaltavam-na, nevralgias horrorosas, que lhe trespassavam as fontes como pregos, como pancadas de martelo; a fronte fendeu-se-lhe desde a raiz dos cabelos até ao nariz; o queixo deslocou-se-lhe por baixo do lábio inferior e a boca inchou-lhe de um modo horrível; apagou-se-lhe a luz do olho direito e o outro ficou tão sensível, que não podia suportar o menor clarão de luz, sem verter sangue; sofria dores violentíssimas, que lhe duravam semanas e que quase a deixavam louca; por vezes o sangue jorrava da sua boca, nariz e ouvidos em tanta quantidade, que chegava a escorrer do leito!



Dir-se-ia, que todas as doenças da terra se pastavam nela, que ela havia percorrido todo o ciclo das dores e das enfermidades humanas! Mas, não era tudo ainda.



Pouco tempo depois, o seu peito, até então indene, apareceu afetado de equimoses lividas, de furúnculos e pústulas acobreadas; a doença da bexiga, de que sofrera na infância e que havia desaparecido, sobreveio, ainda, e ela evacuou cálculos do tamanho de ovos pequenos; cariaram-se-lhe seguidamente os pulmões e o fígado; depois um cancro cavou um buraco profundo, que acabou de corroer as carnes e, para excesso de todos estes males medonhos, a peste que, então, abatera sobre a Holanda, escolheu-a como, a primeira a ser afetada; dois bubões irromperam, um na virilha e outro sobre o coração. – Dois só, bem está, exclamou ela então, mas se for a vontade de Nosso Senhor, três seriam melhor, em honra da Santíssima Trindade” – e, imediatamente, um terceiro lhe rebentou no rosto. Sobreveio depois a hidropsia, e Ludovina inchou medonhamente.



Por espaço de trinta e cinco anos, viveu assim num quarto sem luz, não tomando alimento algum sólido, orando e chorando sempre! Tão tolhida estava de frio no inverno, que pela manhã as suas lágrimas formavam dois regos de água gelada ao longo das suas faces! E os seus tormentos corporais pareciam crescer todos os dias.



Às vezes, os rangidos dos seus dentes tornavam-se tão ferozes, que a sua cabeça tremia; as febres minavam-na com as suas alternâncias de calores violentos e de grandes frios e, quando estes acessos atingiam os graus extremos, ela expectorava um líquido avermelhado e caía num enfraquecimento tal, que lhe era impossível proferir uma só palavra, ou ouvir falar as pessoas que a rodeavam!



Quando lhe perguntavam, se ela desejava ser curada, respondia: não, não, eu não desejo ser despojada das minhas penas e das minhas dores”!



As úlceras de Ludovina eram piras de perfumes; Jesus fazia que emanassem delas as efluências tênues, os odores raros e esquisitos das rosas e das especiarias; Ele vinha vê-la muitas vezes com os seus Anjos e a sua Mãe Santíssima e ela comungava pelas suas próprias mãos; assistiu aos seus últimos momentos e, depois da sua morte, restituiu ao se corpo virginal a sua primitiva beleza. Chegaram os enfermos e curaram-se muitos só com se aproximarem dela.



Ludovina morreu no ano do Senhor de 1433. Expiou pelas Almas do Purgatório, pelos pecadores e pelos maus Padres.75



Seria longa, se eu pensasse escrevê-la, a lista das vítimas sublimes da sub-rogação, cujos nomes os Hagiógrafos se cansam em transmitir-nos para nosso exemplo, edificação e temor.



Dentre todas as flores desse fragrantíssimo horto, que perfumam o agiológio, demonstrarei, apenas, num bouquet, algumas das suas mais olorosas violetas, o qual ofereço, como dádiva inapreciável, aos corações cristãos que me leem, às almas piedosas, que são vasos alabastrinos, onde floresce, como em terra divina, a rosa mística da fé e do amor à Paixão do nosso amado Salvador.



A Beata Osana, a Padroeira da cidade de Mântua, Religiosa da Ordem Terceira de São Domingos, foi também, uma compensadora sublime. Aos sete anos, pôs-lhe Jesus aos ombros a Sua Cruz e predisse-lhe uma vida de torturas. A sua existência foi toda cheia de dores e sofrimentos; ela foi bem o vaso aonde Nosso Senhor derramou todas as iniquidades do seu tempo, para as lavar e purificar na fermentação das suas lágrimas. Faleceu em 1505.



Santa Catarina de Gênova foi, a princípio, uma mundana para quem Nosso Senhor lançou um dia os seus olhos de misericórdia, atraindo-a à sua graça. Depois que desposou Jesus, ela tornou-se o modelo das doentes sobrenaturais; ela foi, segundo a sua própria expressão “despedaçada da cabeça aos pés”; sofreu em vida o fogo do Purgatório, para salvar as almas e deixou sobre esta mansão de dores e de suplícios, um tratado transcendente. Ela morreu em 1510, depois de ter vivido uma existência de macerações e sofrimentos, cuja narrativa espanta. O seu cadáver ver-se, ainda hoje, em estado de incorrupção, em Gênova.76



A Beata Maria Bagnesi, uma italiana, da Ordem Terceira de São Domingos, sofreu, para reparar as perversidades dos homens, tudo quanto é possível sofrer-se; por espaço de quarenta e cinco anos, foi torturada por males da cabeça, quebrantada pela febre, ferida de mutismo e de surdez; dizem os Bolandistas, que não teve um único dos seus membros que ficasse intacto à dor; morreu de um cálculo, em 1577.



Santa Teresa d’Ávila, a reformadora das Carmelitas, foi outra grande expiadora, cuja história é bastante conhecida, para que se torne necessário reproduzi-la. Basta dizer, que ela esteve constantemente doente e expiou, como Santa Ludovina, pelas Almas do Purgatório, pelos pecadores e pelos maus Padres; morreu em 1582.77



Santa Catarina de Ricci, é uma italiana, pertencente a uma família ilustre de Florença. Entrou num convento da Ordem Terceira franciscana, e pediu a Jesus para sofrer no seu corpo e na sua alma os castigos merecidos pela expansão das heresias e pelo desregramento dos costumes do seu tempo. Foi atendida e a sua existência foi um inferno de males; o Senhor insculpiu nas suas carnes os instrumentos da sua Paixão, afirma a Bula da sua Canonização; faleceu em 1590.78



Archangela Tardéra, foi uma italiana, da Ordem Terceira franciscana; esteve doente durante trinta e seis anos e passou no leito os últimos vinte e dois da sua vida; a sua missão foi a de expiadora das ofensas dos ímpios. Alvoreceu-lhe o dia do Paraíso, no ano de 1599.



Santa Maria Madalena de Pazzi, é também, uma italiana, carmelita; pediu ao Senhor para expiar os pecados do mundo e o Senhor satisfez-lhe o pedido. Viveu sempre doente e quase num estado permanente de êxtase; foi dotada de espírito profético e escreveu obras espirituais, cheias de apóstrofes, exclamações e antíteses, aonde há páginas sublimes e soberanas sobre a Circuncisão, o Espírito Santo, a deificação da Alma Humana, a sua união com o Céu e o papel assinado nesta operação às Chagas do Verbo.



Foi ela quem exaltou a potência da fé e da graça, escrevendo, ao falar do Senhor: “Se eu vos visse com os meus olhos deixava de ter a Fé, porque a Fé cessa justamente no ponto aonde se encontra a evidência”. Faleceu em 1607.79



Pudenciana Zagnoni, italiana, terceira de São Francisco, natural de Bolonha, foi neste mundo esmagada por enfermidades, cuja origem sobrenatural foi reconhecida pelos médicos; era arrastada pelos cabelos e fustigada cruelmente pelos Demônios; nove semanas antes de morrer foi visitada pelos nove Coros dos Anjos, cada um por sua Ordem; faleceu em 1608.80



A Beata Passidea de Sena, italiana, da Ordem das Capuchinhas, expiou os pecados de impureza do seu tempo. Sobre as suas moléstias, que remédio algum suavizava, infligia em si mesma, espantosas penitências; fustigava-se até verter sangue com varas de zimbro e espinheiro e lavava seguidamente com sal e vinagre quente, as suas carnes laceradas pelos açoites; andava pela neve com os pés nus e deitava grãos de chumbo no calçado; mergulhava-se em tinas de água gelada no inverno e no estio, pendurava-se com a cabeça para baixo sobre o fogo; foi visitada por Jesus, por sua Mãe, pelos Anjos, e os seus êxtases eram tão frequentes, que “a faziam viver mais no Paraíso do que na terra”, escreve o seu historiador, o P. Venturi. Expirou em 1615.

Uma outra expiadora que caminha nesta sangrenta via dos holocaustos, é a Venerável Estefânia dos Apóstolos, carmelita espanhola; obteve do Senhor a graça de se sub-rogar aos pecadores; viveu uma vida de jejuns, de cilícios, de cadeias e círculos de ferro. Acabou a sua missão purificadora em 1617.

Venerável Úrsula Benincasa, uma italiana, fundadora da Congregação das Teatinas, é outra sublime penitente, que evitou pelas suas torturas os perigos que ameaçavam a Igreja; a sua existência foi horrível; ardia nas chamas do Purgatório e o amor Divino incendiava-a de tal modo, que lhe saia uma coluna de fumo pela boca fora; foi submetida em Roma aos mais duros tratos e morreu em 1618.

Águeda da Cruz, é uma espanhola, terceira da Ordem de São Domingos; a seu pedido a Jesus, por desejo de imolação, tornou-se estropiada e cega. As suas carnes caiam de podridão sobre a palha e também foi consumida pelo fogo do Purgatório. Faleceu em 1621.

Mariana Escobar, é outra espanhola, reformadora da Regra de Santa Brígida; esteve cinquenta anos doente e passou trinta estendida sobre a sua cama; exalava os mais delicados aromas. Quando se lhe mudava a roupa, conta o seu biógrafo, espalhava-se no ambiente um perfume embriagante; sucumbiu em 1633.

Margarida do Ss. Sacramento, é uma francesa, carmelita; suportou torturas extraordinárias; sofreu tais dores no crânio que, depois de o terem picado com pregos de ferro em brasa, os cirurgiões fizeram-lhe a trepanação; não experimentou alívio algum com estas sevicias; só a aposição das Santas Relíquias lhe atenuava o sofrimento. Expiou mais particularmente as ofensas feitas a Deus pela dureza de coração dos ricos; participou do suplício de diferentes mártires, durante quinze meses e ofereceu-se ao Salvador como vítima para livrar a França, da invasão dos exércitos alemães; o seu sacrifício terminou em 1648.81

Paula de Santa Teresa, é uma italiana, da Ordem Terceira de São Domingos; tomava à sua conta os pecados dos maus Padres; viveu na cama e foi visitada pelo Salvador; libertou, também, pelos seus sofrimentos muitas almas do Purgatório, que a sitiavam e imploravam de todas as partes o seu auxílio expiador; morreu em 1567.

Maria Ock, é uma belga, carmelita; sofria penas apropriadas aos excessos das pessoas, a quem ela supria nas suas penitências; pagava os castigos das Almas do Purgatório e era molestada por golpes, rolada pelas escadarias, mergulhada em poços pelos Demônios. Quando não estava de cama, percorria as más pousadas para retirar delas as suas moradoras; sucumbiu no seu posto em 1684.82

Joanna Maria da Cruz, italiana, terceira franciscana, constantemente doente e torturada por dores atrozes nos rins, teve de sofrer os tratamentos mais bárbaros dos médicos, que acabaram por fim, em reconhecer a origem supranatural dos seus males; recebeu o anel místico do Esposo e exalava de si, inexplicáveis perfumes; curava os enfermos com a sua bênção e multiplicou os pães. Imolou-se, mais especialmente, para combater a heresia protestante e entrou no Céu, no ano de 1673.

Maria Angélica da Providência, foi uma francesa, carmelita terceira; intercedeu mais particularmente pelas Comunidades relaxadas e pelos maus Padres. O Senhor indicava-lhe os pecadores, cujas faltas, Ele queria que ela expiasse; foi uma grande adoradora do Santíssimo Sacramento e uma das vítimas sobre quem mais se encarniçaram os Demônios. Eles batiam-lhe furiosamente, arremessavam-na contra as paredes e calcavam-na aos pés. A sua existência foi um livro de dores, que se fechou em 1685.

Mas, Deus meu! Aonde me leva a fluência das ideias, manando a flux da mente extasiada! Já os lírios e os jasmins enchem, cobrem o altar dos holocaustos, e o jardim das flores místicas da expiação, ainda nem sequer mondado83 está!

Os ciriais da penitência, os candelabros da oração, as cruzes vertendo o sangue de todos os martírios, desfilam ininterruptas a nossos olhos deslumbrados! Estão passando todas as Santas personagens da Igreja Militante purgativa; passam Inêz de Langeac, francesa, enferma, arrastando-se sobre muletas, suportando todos os tormentos do Purgatório, para libertar as almas; morreu em 1634; – Santa Verônica Giulani, italiana, clarissa, imagem viva de Cristo crucificado, gritando: “viva a Cruz, toda só e toda nua, viva o sofrimento”; ela paga os pecados cometidos nas orgias dos dias do Carnaval; recebe a transverberação do coração, como Santa Teresa e a impressão dos instrumentos do Calvário, como Santa Clara de Montefalco e morre em 1727; – Santa Maria Francisca das Cinco Chagas de Jesus, italiana, da Ordem Terceira de São Francisco, cuja vida é um tecido de enfermidade; ela transvasava sobre si mesma, as doenças do próximo; foi perseguida pela sua família, pelo seu Confessor e visitada pelos Anjos; morreu em 1791, tendo estalado o seu coração de dor, ao serem-lhe mostrados e revelados os sofrimentos da Igreja, nos tempos da Revolução Francesa; – Marcellina Pauper, francesa, irmã da caridade em Nevers; é uma reparadora das profanações do Santíssimo Sacramento e dos roubos de hóstias; era ela quem dizia: a minha vida é um purgatório delicioso, onde o corpo sofre e a alma goza”; morreu em 1708;84 – Maria Josepha Kumi, suíça, dominicana, uma vítima expiatória da Igreja, dos pecadores, das Alma do Purgatório, de quem partilhou os tormentos; todo o seu corpo era uma chaga viva; morreu em 1817; – Anna Catharina Emmerich, uma alemã, agostiniana, a maior vidente dos nossos tempos; ela sofre dores sem nome, sofre pelos outros e apodera-se dos seus males; suprimido o seu convento em 1811, sob o governo de Jerônimo Bonaparte, rei de Westphalia, ela é transportada para o quarto de um albergue e aí sofre todas as curiosidades e todos os insultos; recebe de Cristo os sagrados estigmas e depois não pode mais levantar-se, nem sentar-se sequer; não se nutre mais do que com o sumo de uma cereja; segue, em visões sublimes, a Via Dolorosa da Paixão do seu Salvador e, ao vê-lo expirar, brada: “deixai-me morrer na ignomínia com Jesus sobre a Cruz”, e morre, arroubada de alegria, agradecendo ao Céu a sua vida de suplícios;85 – Isabel Canori Móra, uma italiana, da Ordem Terceira das Trinitárias Descalças, falecida em 1825, tendo amortizado a dívida dos perseguidores da Igreja; – Anna Maria Taigi, como a antecedente, da mesma pátria e Religião, cujos olhos vertiam sangue quando feridos pelo mínimo clarão, falecida em 1837, depois de ter sofrido torturas físicas, cefalalgias, febres, gota e asma, que não lhe deixavam um só momento de repouso;86 – Maria Rosa Andriani, italiana, da Ordem Terceira franciscana; foi desde a idade de cinco anos uma mártir e o Senhor agravava-lhe os tormentos, não a consolando sequer; arrancava do peito ossos sãos; foi sustentada durante vinte e cinco só com a Eucaristia, e veio a falecer em 1848; – Maria Domingas Lazzari, falecida, como a antecedente, no mesmo ano, teve uma existência que foi uma agonia prolongada; também se alimentou durante quatorze anos, unicamente com as Sagradas Espécies; foi uma das estigmatizadas do Tirol; – Maria de São Pedro da Santa Família, uma francesa, carmelita, cuja vida ela mesma resumia nesta frase: “foi para a reparação que eu vim ao mundo, e é por ela que eu morro”; sucumbiu no mesmo ano de 1848; – Maria Inêz Steiner, uma alemã, clarissa num mosteiro da Umbria, sofreu para bem da Igreja, as mais cruéis moléstias e exalava celeste aroma; faleceu em 1862;87 – Maria de Moerl, terceira da Ordem de São Francisco; – Barbara de São Domingos, espanhola, dominicana, inumada aos trinta anos, em 1872; – Luíza Lateau, belga, que viveu sempre deitada, expiando as culpas dos outros e tendo como único alimento, durante doze anos, a Sagrada Eucaristia;88 – Maria Catharina Putigny, francesa, visitandina, uma vítima reparadora que sofreu as mais lancinantes torturas pelas Almas do Purgatório; ela viu, como a soror Emmerich, todos os quadros da Paixão, morreu no seu convento de Metz, em 1885; – e outras que cesso de citar, para não protelar indefinidamente esta monografia modestíssima.

Quem não conhece a Sociedade de Maria Reparadora, fundada pela Venerável soror Maria de Jesus, no século Emilia D’Oultremont, baronesa D’Hooghworsth, cuja divisa é a da sua santa instituidora: “ao lado de Maria e pelo seu Coração, tudo na nossa vida será por Deus, para a sua glória e reparação”.89

Satisfazer a Deus pelos negligentes, pelos ingratos, pelos pecadores, fazer entrar novamente nas almas negligentes, ingratas e pecadoras a lembrança de Deus e do seu amor, eis o duplo fim da Sociedade de Maria Reparadora.

A reparação na Sociedade, efetua-se por meio da Adoração do Santíssimo Sacramento. Todos os dias o Rei Imortal dos Séculos, é exposto, logo de manhã, à Missa da comunidade, e, assim fica, até à Bênção, que se soleniza ao fechar do dia. Diante do Santíssimo Sacramento, as adoradoras se sucedem ininterruptamente, de meia em meia hora. E, em reparação ainda das ofensas que Nosso Senhor recebe durante a noite, duas religiosas fazem uma hora de adoração, seguidamente à meia-noite.

E, em todas as quintas-feiras do ano, em memória da Instituição da Santíssima Eucaristia, o Santíssimo Sacramento permanece exposto toda a noite, bem como nos três dias de Carnaval.

Além das adorações contínuas, da oração da manhã, da Missa, dos exames, da bênção, da meia hora de leitura espiritual, da recitação do terço e das Ladainhas da Virgem e dos Santos, as religiosas da Sociedade de Maria Reparadora, recitam todos os dias o Ofício do Sagrado Coração de Jesus, ainda no espírito de reparação. Os mesmos Sacramentos que elas recebem, a Penitência, a Eucaristia e a Extrema-unção devem ser recebidos com o mesmo fim.

São as seguintes, as instruções dadas às suas Filhas, pela Venerável fundadora da Sociedade:

Que nenhuma ocasião de reparação se perca para vós. Ao romper do dia, um ato de amor para com Nosso Senhor, em reparação daqueles cujo primeiro pensamento é só para o mundo, será o vosso primeiro cuidado.

O incômodo de nos levantarmos de manhã, será a reparação da indolência e ociosidade dos que perdem o seu tempo no leito.

Suportaremos o frio e o calor, em reparação daqueles que se molestam com as alternativas do tempo.

Ouviremos com o maior respeito e recolhimento, a Santa Missa, em reparação daqueles que só a ouvem para serem vistos. Comungaremos com todo o amor, fé e pureza da alma, em reparação das comunhões sacrílegas. Adoraremos o Santíssimo Sacramento, em reparação daqueles que O insultam. Reparação em todos os momentos do dia e da noite; em todas as palpitações do nosso coração, em todas as aspirações da nossa alma, em todos os movimentos dos nossos lábios”.

A Venerável soror Maria de Jesus, faleceu, em odor de santidade, em Florença, a 21 de Fevereiro de 1878. Sua Santidade o Para Leão XIII, numa audiência particular, concedida à Superiora Geral da Sociedade Reparadora e às suas Assistentes, disse-lhes “que tinha conhecido na Bélgica, Maria de Jesus, antes e depois do seu casamento e que a tinha tornado a ver em Roma, depois da fundação da Sociedade Reparadora; que ela fora sempre uma alma de Deus, uma alma de eleição”.

Quem ignora a existência de tantas Ordens expiadoras e reparadora que viçam, como flores lapidadas, nos jardins da Igreja, para contrabalançarem o peso das iniquidades do mundo?

Quem não conhece entre muitas outras, e só para citar ao acaso, as Carmelitas, as Agostinianas, as Clarissas, as Calvarianas, Ordens todas austeríssima, de dura observância e de sub-rogação, entre as quais mais se destaca a das Beneditinas, expiadoras que se revezam dia e noite, ininterruptamente, com uma corda ao pescoço, diante de uma tocha acesa, para repararem os insultos que, sob a forma Eucarística, Jesus sofre? Quem desconhece as obras de penitência e sub-rogação das Trapistinas? E o mundo imbecil, apoda essas admiráveis místicas de histéricas e de loucas, a impiedade insulta-as, brutaliza-as com expulsões e perseguições e arrola-lhes os cilícios e as cadeias dos seus resgates!

Meu Deus, perdão! Os vossos desígnios são insondáveis e o homem não os pode penetrar. Não falha a vossa hora de reparação e de justiça.

A nós, só nos resta, curvarmo-nos na vossa presença supra-Adorável, e admirar a infinidade da vossa misericórdia e do vosso amor, para com os desgraçados pecadores.



(Do Revisor).



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1.  Manual da Pia União das Filhas de Maria – sob o Patrocínio da Virgem Imaculada e de Santa Inês, Virgem e Mártir, Cap. IV, pp. 166-268; Traduzido do Italiano pelo Cônego Dr. Ananias Corrêa do Amaral, 11ª Edição, cuidadosamente revista pelo Padre Gonçalo Alves e enriquecida com um precioso Tratado sobre Teologia Mística pelo mesmo ilustre escritor católico, Editora Livraria Católica Portuense Ltda., Porto, 1926.

2.  II Rs. 11.

3.  Salm. 86, 13.

4.  De Statu Reiligioso, Livro I. Cap. XIII.

5.  Stromates, IV, 1º.

6.  Livro X, cap. IV.

7.  Vid. Los grados dela vida espiritual, pelo R. A. Saudreau. Barcelona, 1906.

8.  Cfr. Mat. 5, 6.

9.  Cfr. Luc. 1, 53.

10.  Cfr. Dan. 9, 23.

11.  Sab. 7.

12.  Summa, par. 1ª. Quest. 12. art. 6º.

13.  Tract. In Epist. 1º Joan.

14.  Salm. 50, 1 seg.

15.  Luc. 15, 11 seg.

16.  Luc. 18, 10 seg.

17.  Deprecatio non solum purgat a peccatis, verum etiam ingentia pericula depellit (De orando Deum, lib. 1º).

18.  Oratio est colloquium cum Deo.

19.  Oratio est mentis in Deum ascensus, aut eorum a Deo postulatio quae postulare convenit.

20.  Alil solis labiis, alil solo corde, alil labiis et corde (S. Boav. Super. Psalmum, 16).

21.  Gaudium meum, Psalterium meum.

22.  Dicuntur fratres in Aegypto crebas quidem habere orationes, sed eas tantum brevissimas et raptim quodammodo jaculatas (Epist. Ad Probam. Num. 121).

23.  45, 1 seg.

24.  9, 4.

25.  Accedite ad eum et illuminamini (Psalm. 33, 6).

26.  Quemadmodum lucem sol praebet corpori, sic animae lumen est precatio (De orando Deum, livr. 1º).

27.  Cap. 1º.

28.  Epist. 1, 5.

29.  Epist. S. Thiago, 3, 9.

30.  Summ. Theol.

31.  Confiss. Libr. 9, cap. 1º.

32.  Nos Evangelhos de S. Mateus, cap. 8º, de S. Marcos, cap. 11, v. 23 e S. João, cap. 15, v. 7.

33.  Luc. 11, 8 e cap. 18, 1.

34.  S. Thomaz. Summa Theol.

35.  Luc. 10, 38 e seg.

36.  Pe. - Exercícios Espirituais no Seminário do Porto, em 1919.

37.  Mat. 19, 29.

38.  Marc. 12, 24-25.

39.  1ª Jo. 6, 8.

40.  Vid. Saudreau, p. 62. Nota.

41.  Lib. 1º de Trinit., cap. 2º.

42.  Epist. Hebr. 11, 6.

43.  Rom. 1, 17.

44.  Jo. 3, 18.

45.  Homil. de fide Abrahae.

46.  Rom. 15, 13.

47.  Hebr. 6, 19.

48.  Rom. 8, 26.

49.  1ª Cor. 13, 13.

50.  Col. 3, 14.

51.  Rom. 8, 35.

52.  Marc. 9, 41; Mat. 10, 42.

53.  Vid. Les Divines Paroles, ou ce que le Seigneur á dit a ses disciples dans le cours des sieles Crétiens – par le R. P. Saudreau. O. D. Paris – 1914, vol. 2º, pag. 214.

54.  Ibidem, pag. 447.

55.  Ibidem, pags. 457 e 458.

56.  S. Catarina de Senha, “Diálogos”, cap. 38; Vid. Saudreau, ibidem, Lib. 2º, pag. 475.

57.  Ibidem.

58.  Ibidem, Saudreau, vol. 2º.

59.  Ibidem.

60.  Ibidem. Les Divines Paroles, vol. 2º, pag. 482 e seg. Pariz, 1914. Charles Amat. Editeur. II: rue Casset. VI.

61.  S. Thomaz. Summa Theolog.

62.  Summa Theol.

63.  Luc. 12, 48.

64.  Obra: Tudo por amor de Jesus, ou Caminhos fáceis do amor divino.

65.  Salmo 94, 7-8.

66.  Pedro Malon de Chaide.

67.  Rousselot. Les Mystiques espagnols.

68.  Exercícios Espirituais, Seminário do Porto, 1918.

69.  Efés. 5, 19.

70.  Vida de Santo Antônio, pág. 149, por Antônio José d’Almeida, 1895 – Porto – Livraria Chardon.

71.  Vid. Para onde vamos? Pelo Pe. Lodiel, Lisboa, 1900 – Couto Brandão – editor.

72.  Êxod. 17, 11.

73.  Comunicação feita em Agosto de 1904, aos Exercitandos no Seminário do Porto, pelo venerado Prelado de Meliapôr, D. Theotonio, que foi Confessor dessa religiosa.

74.  Vie de Sainte Catherine de Senne, Paris, 1 vol. Sagnier et Bray, 1853.

75.  A mais completa das biografias desta Santa, é a do eminente literato francês Huysmans.

76.  Vida e Obras de Catarina d’Adorny de Gênova, 1 Vol. Paris, casa Martin Durand, 1627.

77.  A sua vida sob o título de Historia de Santa Thereza, escrita por uma carmelita, foi impressa em Paris, em 1887, em 2 vol. Há também, a sua vida escrita por ela mesma e traduzida em francês pelo Padre Marcel Bouix, S.J., tomo 1º das Obras da Santa, Lecoffre, 1884.

78.  Vie de Sainte Catherine de Ricci, par le P. Bayonne, d’l’Ordre des Fréres Prêcheurs, 2 vol. Paris, Poussielgue fréres, 1873.

79.  Vie de Sainte Madeleine de Pazzi, par Fabrizzi, 1 vol. Lyon et Paris, Pélagand, 1873.

80.  Vies des Saints et Bienheureux d’l’Ordre de Saint François, par le R. Léon, franciscain, 1 vol. Paris, Blond et Barral, 1887.

81.  Vie de Marguéritte du Saint-Sacrament, par de Cissey, 1 vol. Paris, Ambroise Bray, 1856.

82.  Vie de la souer Maria Ock, par le P. Albert de Saint-Germain, 1 vol. Tournay et Paris, Casterman, 1886.

83.  Podado.

84.  Vie de Marcelline Pauper, publié par le P. Marcel Bouix, S.J., 1 vol. Nevers; Imprimerie Fage, 1871.

85.  Anne Catherine Emmerich, as vie, par le P. Schmoeger, de la Congregation du T. S. Redempteur, traduit de l’allemand, par l’abbé Cazalés, 3 vol. Paris, Bray, 1868.

86.  La venerable Anne Marie Taigi et la servante de Dieu, Élisabeth Canora Móri, par le P. Calixte, trinitaire déchaussè, 1 vol. Bruxelles, Goemare, 1871.

87.  Marie Claire Agnés Steiner, as vie par le P. de Reus, traduit de l’italien, par Mgr. Constans, 1 vol. Paris, librairie catholique internationale, 1883.

88.  Les Stygmatisées – du Dr. Imbert Gourbeyre.


89.  La Societé de Marie Reparatrice, par le P. V. Delaporte, S.J., Paris. Imprimerie de D. Dumoulin et Cie., 1891.

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