Perigos e Efeitos Funestos do Desânimo
O desânimo é a
tentação mais perigosa que o Inimigo da salvação dos homens possa colocar por
obra. Nas outras tentações, ele só ataca uma virtude em particular e mostra-se
a descoberto; no desânimo, ataca-as todas, e esconde-se.
Nas outras
tentações, vê-se facilmente a cilada: na Religião, não raro na própria razão, e
numa educação cristã, achamos sentimentos que as condenam: a vista do mal que
não podemos disfarçar, a consciência, os princípios da Religião que despertam,
servem de apoio para nos sustentarmos. No desânimo não achamos socorro algum;
sentimos que a razão não basta para praticar todo o bem que Deus pede; por
outro lado, não esperamos achar junto a Deus a proteção de que havemos
necessidade para resistirmos às paixões. Achamo-nos, pois, sem coragem, prontos
a tudo abandonar; e é até aí que o Demônio quer conduzir a alma desanimada.
Nas outras
tentações, vemos claramente que seria mal aderirmos a elas por um sentimento
refletido: no desânimo, disfarçado sob mil formas, acreditamos ter razões as
mais sólidas para nos deixarmos guiar por esse sentimento, que não consideramos
como uma tentação. Entretanto, esse sentimento faz considerar como impossível a
prática constante das virtudes, e expõe a alma a se deixar vencer por todas as
paixões. É, pois, importante evitar essa cilada.
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Fonte: “Tratado do Desânimo nas Vias da Piedade”, obra Póstuma do
Padre J. Michel, S.J., Cap. I, pp. 5-6; Editora Vozes Ltda, Petrópolis/RJ,
1952.
Obs: Recomendo vivamente a leitura de
todo o “Tratado”.
As Tentações não são uma Prova de Abandono
da Parte de Deus, se as
Vezes são uma Prova
da sua Cólera, é de uma
Cólera
Dirigida pela sua
Misericórdia.
As tentações
perturbam as almas piedosas: arrastam ao precipício as almas dissipadas. Para
prevenir o mal que delas pode resultar, é a propósito fazer-vos saber as razões
que tendes de não as temer demasiado, os princípios sobre os quais podeis
decidir-vos em muitas ocasiões, a maneira de vos comportardes no tempo em que
elas vos atacam, e de vos premunirdes contra os efeitos delas; e mostrar-vos as
vantagens que delas podeis tirar.
As tentações são
ideias, sentimentos, inclinações, pendores que nos induzem a violar a Lei de
Deus, para nos satisfazermos. Essas tentações não devem nem perturbar nem
desanimar uma alma cristã. O Demônio declara guerra principalmente às almas que
detestam o império dele, que combatem as suas próprias paixões, que são
discípulas de Jesus Cristo tanto pela pureza dos seus costumes como pelo cunho
inefável da sua regeneração; ou àquelas que pensam seriamente em sacudir o jugo
sob o qual o Demônio as mantém. Pelas molas que faz funcionar contra elas, o
Demônio só procura concitá-las a renunciar ao amor de Jesus Cristo,
desprendê-las de Deus, tornando-as cúmplices da desobediência dele. Esta
reflexão deve consolar as almas que são tentadas. É a oposição delas ao Inimigo
da salvação, é o seu apego à piedade, à vontade de Deus, que lhes atrai essa
perseguição doméstica. Um pouco de constância torná-las-á vitoriosas,
firmá-las-á na virtude.
Almas
naturalmente tímidas, ou aquelas que o Senhor por longo tempo conduziu na calma
das paixões e nas doçuras da paz, imaginam que as tentações que elas às vezes
experimentam são sinais da cólera de Deus sobre elas; e com isso chegam até a
pensar que Deus as abandonou, quando as tentações são fortes e frequentes. Não
podem persuadir-se de que Deus possa deitar olhares favoráveis sobre um coração
violentamente agitado por sentimentos contrários à virtude. Esta cilada é o
último recurso do Inimigo da salvação para derrubar uma alma que ele não pode
vencer pelas vãs satisfações do vício. Rouba-lhe essa preciosa confiança que
pode sustentá-la contra todos os esforços do Inferno.
Grosseiramente
se enganam essas almas. As que são instruídas, as que conhecem melhor os
caminhos de Deus, não se surpreendem com essa guerra que têm de sustentar.
Pelos oráculos do Espírito Santo aprenderam que a vida do homem é um combate
contínuo; que temos de nos defender incessantemente, por dentro contra os
nossos gostos, as nossas inclinações, o nosso amor-próprio, esses inimigos
domésticos tão capazes de nos seduzir pelas suas artimanhas e pretextos; por
fora, contra a sedução dos maus exemplos, contra o respeito humano, contra as
potências do Inferno, invejosas da felicidade do homem e conjuradas contra ele
desde o começo do mundo; e aprenderam que só pelas vitórias que alcançamos com
o socorro da graça é que abrimos caminho para chegarmos ao Céu; que, enfim,
consoante o Apóstolo (2 Tim., 2, 5), só haverá coroa para aqueles que houverem
fielmente combatido até o fim.
São Paulo não
considerou como efeito da cólera e do abandono de Deus as tentações que
continuou a experimentar, embora tivesse pedido ser livrado delas. Os Santos,
por tanto tempo e tão vivamente atacados pelo Demônio até nos desertos e nos
exercícios da mais austera penitência, não tiveram das tentações a mesma ideia
que vós. Pelo contrário, consideraram-nas sempre como o objeto dos seus
combates e a matéria dos seus méritos. Não ignoravam o que é dito nos Livros
Sagrados: “Por isso, que éreis agradável a Deus, necessário se fazia fosseis
provado pela tentação” (Tob., 2, 13). É esta a ideia que deveis fazer da
tentação; é a única que seja justa nos princípios da Religião; e, destarte, não
ficareis nem perturbada nem desanimada com ela.
Contudo, embora
as tentações não sejam um sinal do abandono de Deus, porque Deus nunca abandona
inteiramente o homem enquanto este estiver na terra; e embora essas tentações
sejam, ordinariamente, provações para as almas justas, às vezes são também
efeitos da Justiça divina, que pune certas fraquezas a que se deixam levar
almas desaplicadas e presunçosas, certas aplicações naturais que dividem o
coração. Mas, seja punição ou provação, a submissão em recebê-las, a fidelidade
em lhes resistir devem ser as mesmas. Da parte do mais terno dos pais, a
justiça é sempre acompanhada de misericórdia. A sua graça está sempre ligada à
oração e à confiança. Ele não quer perder-nos, não quer punir-nos senão para
nos reconduzir a Ele. Esta circunstância, bem longe de desanimar e de perturbar
uma alma, deve, pelo contrário, animá-la ao combate pela vista do perdão que
lhe é oferecido, se com coração contrito e humilhado, e com fidelidade
inviolável, cumprir a penitência que Deus lhe impõe.
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Fonte: “Tratado das Tentações”, obra póstuma do Padre Michel,
S.J., Cap. I, pp. 5-9; Editora Vozes Ltda. Petrópolis/RJ, 1952.
Obs: Recomendo vivamente a leitura de
todo o “Tratado”.
O Amor é um Fundamento
Seguro
Estamos numa
época em que todos têm a preocupação de endireitar o mundo, mas poucos querem
começar consigo mesmos, pelo aniquilamento completo e doação a Deus.
É a santidade
que endireita o mundo e o salva. Enquanto os Apóstolos não estiveram no ponto
da perfeição requerida pelo Espírito Santo, não se mexeram do Cenáculo, nem
saíram pelos caminhos da terra para empreender a gigantesca obra da salvação e
reforma dos homens.
Quantos
apóstolos vemos iludidos através da história e estamos contemplando ainda hoje.
Quiseram abrasar o mundo com um carvão apagado. É mais pelo sofrimento, pelo
sacrifício, pela penitência e pela oração, que se salvam os homens, do que por
muito ativismo exterior.
Para saturar-te
de seu Espírito, o bom Deus te servirá bons pratos de sofrimento. Podes esperar
mesmo todo gênero de tormentos. Sobretudo o exílio do coração, o isolamento, o
abandono, a incapacidade, a incompreensão, as trevas e amarguras sem conta e
sem medida.
Tirar-te-á o bom
Deus toda alegria sobre a terra. As vezes, nem mesmo as alegrias da
Bem-aventurança conseguirão consolar tua pobre alma.
Mas fica
sabendo, Pusilóteo, que as almas pequeninas, aparentemente fracas e sem forças,
estão na verdade, fundadas na rocha onde se adestram para o combate, ou antes,
Deus as tem escondidas e Ele mesmo combate por elas.
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Fonte: Rev. Pe. Ângelo R. Lucena, “Infância Espiritual Segundo o
Espírito de Santa Teresa de Lisieux”, Nº 12, pp. 21-22; Edições Paulinas,
Caxias do Sul/RS, 1972.