1) Nem homem nem mulher tinham direito a voto na Idade Média.
 A ideia de “sufrágio universal” só apareceu muito tardiamente na 
história do Ocidente. Para ser exato, a primeira nação a adotar foi a 
Primeira República Francesa em 1792 (lembrando que o símbolo era uma 
Mulher imortalizada na obra de Delacroix). No entanto, para surpresa de 
muitos, a Nova Zelândia em 1893 se tornou a primeira nação do mundo a 
conceder o sufrágio universal para mulheres e homens. A ordem política 
medieval não é fixa, pois o período durou mais ou menos mil anos. Para 
quem se interessar, há grandes estudos sobre isso, recomendo, embora não
 seja uma leitura tão fácil, o livro História das Ideias Políticas, 
volumes II e III, de Eric Voegelin. Sobre a importância política das 
mulheres, recomendo o livro “The Fourth Estate: A History of Women in 
the Middle Ages” da importante porém ainda pouco conhecida aqui no 
Brasil historiadora Shulamith Shahar.
2) A ideia de que mulheres não podiam se expressar através das palavras pode ser facilmente refutada com os fatos.
 Basta SÓ lembrarmos da atividade intelectual de uma única mulher 
notável como Hildegarda de Bingen (1098-1179), autora de obras 
filosóficas (trilogia Liber scivias Domini, Liber vitae meritorum e 
Liber divinorum operum), ciências naturais (escreveu uma grande chamada:
 Liber subtilitatum diversarum naturarum creaturarum) e uma quantidade 
significativa de músicas e poesias por ela publicada (eu tenho obras 
completas em CD, a Ordo virtutum é a mais famosa).
3) Para refutar a ideia de que mulheres eram destinadas a servir apenas às suas famílias numa submissa vida doméstica,
 citarei também um exemplo: a Duquesa Leonor da Aquitânia. Ela foi, sem 
dúvida, uma das mulheres mais poderosas da Idade Média. Para um outro 
relato a respeito da vida cotidiana das mulheres na Idade Média, 
recomendo o livro “Women’s Lives in Medieval Europe: A Sourcebook” da 
medievalista Emilie Amt, publicado em 2009. O livro traz uma série de 
fontes primarias sobre a influência das mulheres na sociedade.
Quando o assunto é Idade Média algumas 
pessoas levantam da cadeira para “esbravejar verdades”. Todos têm um 
palpite sobre a terrível “Idade das Trevas” (bocejos). Agora, quando o 
assunto é Idade Média e Mulher, prepare-se, será bem provável arrumar um
 inimigo fundamentalista defendendo a “opressão machista” medieval. 
Muita informação acerca da Idade Média chegou mediante os críticos e não
 os estudiosos sérios. Levante a mão quantos medievalistas você 
realmente conhece.
O Iluminismo
 francês foi uma verdadeira máquina de propaganda anticlerical — sem 
contar a ajudinha da Reforma protestante. Tudo o que era relacionado à 
Igreja, portanto a Idade Média, tornou-se motivo de chacota: sinal de 
ignorância, medo e escuridão. Nada ficaria em pé até que o 
último rei fosse enforcado nas tripas do último padre. Arroga-se ao 
Iluminismo francês ter sido o primeiro movimento intelectual a produzir 
uma Enciclopédia: “Encyclopédie, ou dictionnaire raisonné des sciences, 
des arts et des métiers”. Na verdade, já haviam sido produzidas 
enciclopédias antes, sobretudo na Idade Média.
No século XII há uma profusão delas. 
Honório de Autun (1080–1154) escreveu a “Imago mundi”, uma verdadeira 
crônica da história universal. Arnold Saxon escreve a “De Rerum 
naturalium Floribus”. William de Auvergne publica “De universo 
creaturarum” em 1231. Entre tantas outras.
Mas é de uma mulher que precisamos 
lembrar: a abadessa Herrade de Landsberg. Nascida em 1167, na França, 
foi responsável pela primeira enciclopédia ilustrada do século XII, 
intitulada Jardim das Delícias Terrenas (Hortus Deliciarum), reuniu 
estudos sobre teologia, astronomia, agricultura, artes, história e 
direitos. O livro servia para instrução de outras freiras do convento. 
Sua obra é de 1169 e 1175. Além disso, dedicou-se à poesia e ao ensino. 
São atribuídas a ela as ilustrações de sua enciclopédia. Herrade 
Landsberg figura o medalhão na fachada da Biblioteca Nacional e da 
Universidade de Strasbourg. Quanta opressão essas mulheres sofriam! Só 
comparada com opressão da nossa ignorância.
Para quem realmente deseja conhecer o 
papel das mulheres na Idade Média, e conhecer por meio da obra de uma 
verdadeira ESPECIALISTA no assunto “mulheres na Idade Média”, e não 
especialista em preconceituosas generalidades sobre Idade Média, 
recomendo o livro da Régine Pernoud “As mulheres no tempo das 
Catedrais”. Há outros sobre as mulheres: “Aliénor d’Aquitaine”, “Jeanne 
d’Arc”, “Hildegarde de Bingen : conscience inspirée du XIIe siècle”, 
“Visages de femmes au Moyen âge” etc.
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Fonte: Francisco Razzo