Blog Católico, para os Católicos

BLOG CATÓLICO, PARA OS CATÓLICOS.

"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

quarta-feira, 21 de março de 2012

Alguns exemplos onde não há Pecado (Vestes Masculinas na Mulher)



Alguns exemplos edificantes

Santa Antonina e Santo Alexandre, Mártires.

Além do exemplo de Santa Joana d'Arc, do qual falarei com mais extensão depois, o Mar­tirológio faz menção a 3 de Maio, aos Santos Mártires, Alexandre, soldado, e Antonina, Virgem, em Constantinopla; que durante a perseguição de Maximiano, sendo Festo prefei­to, Antonina foi condenada ao lupanar, donde a tirou ocultamente Ale­xandre, trocando os vestidos e fican­do no lugar dela; depois foram ambos descobertos e atormentados, cortaram-lhes as mãos e lançaram-nos ao fogo, com o que alcançaram à glória eterna, em 313 (cfr. "Ano Cristão", Vol. V, Martirológio de 3 de Maio, p. 49, pelo R. Pe. Croiset, Porto, 1923).

Santa Joana D'Arc não usava
traje masculino a mandado do próprio Deus?

► Resposta: É verdade, porque, excepcionalmente, por vontade de Deus, ela teve que exercer uma função que era própria do homem. Deus pode suspender certas leis morais de or­dem secundária. Além disso, para impedir que sua função e sua veste fossem causa de qual­quer risco de sensualidade entre os homens, Deus a dotou de uma pureza e modéstia tais que superava qualquer inconveniente de ordem natural: Os comandantes do exército francês, compa­nheiros de armas da Santa guerreira, depunham no Processo de revisão de sua condenação: diante de Santa Joana d'Arc jamais eles sentiam qualquer tentação carnal, mesmo nas condições precárias de um acampamento militar, tal era a irradiação milagro­sa de pureza que dela se desprendia ("Jeanne d'Arc", E. Bourassim, 1977, pp. 55 e 125).

O Exemplo de Santa Joana d'Arc


"O bruxo e visionário Merlin teria profetizado que a França seria salva por uma virgem com trajes de homem. E mais, acreditava-se que esta jovem viria da Lorena. Uma das testemu­nhas no Processo (contra Joana d'Arc) afirmou ter lido num livro velho que esta virgem sairia de um mato de carvalho na Lorena. Não importa que Merlin falasse de um país diferente. O que aqui interessa é o fato de tais boatos existirem antes da aparição de Joana d'Arc.

Diante do 'Dauphin' apareceu uma piedosa mulher, Marie d'Avignon, contan­do suas visões relacionadas com os sofrimentos inauditos da França. Uma voz lhe comunicara que a calamidade ha­via de crescer ainda. Apareceu-lhe uma armadura. Assustada pensou ter de usá-la. Mas a voz escla­receu: 'Viria uma virgem que devia vesti-la, vencer os inimigos e sal­var o reino da França'.

A comissão que antes da libertação de Orleans examinou Joana d'Arc, conhecia também es­tes boatos e vaticínios, constatando que então estavam realizados.

Quando em 1412 nasceu Joana, a quarta filha de Jacques d'Arc e Isabelle Romée, nin­guém pensou nas profecias, que se contavam em todas as casas. O futuro da menina parecia o comum de todas as crianças, nascidas em condições humildes: seria o que eram seus pais, como as demais meninas da mesma aldeia, uma camponesa laboriosa, uma boa mãe de família.

Em Domrémy, aldeia Lorena, onde se achava a casa paterna, não havia escola. A meni­na não aprendeu a ler nem escrever. A única coisa que Joana sabia eram as Verdades da Fé, ensi­nadas por uma inteligente e enérgica mãe. Foi dela que aprendeu a fazer o Sinal da Cruz e a re­zar o Creio em Deus Pai, o Pai Nosso e a Ave Maria.

Quando Joana saía de casa, via na próxima vizinhança a igreja paroquial, que cada vez mais a atraía. Ao badalar dos sinos, soando o Angelus, ela fazia o Sinal da Cruz e ajoelhava-se. Fora da aldeia, numa elevação, havia uma capelinha, consagrada a Nossa Senhora de Bermont. Muitas ve­zes, de preferência nos sábados, Joana visitava aquela imagem e, quando possível, acendia uma vela em honra da Mãe de Deus".

As Vozes do Céu


"Joana tinha 13 anos quando, num dia que a história nunca fixou, ouviu uma voz 'divina, boa e nobre', que não saía de boca humana. Eram 12 horas. Dia de verão. A menina achava-se sozinha no jardim da casa paterna. A voz vinha da direita, do lado da igreja e estava acompanha­da de viva luz. A voz lhe recomendou de atender bem a si mesma e de frequentar diligentemente a igreja.

Nos dias seguintes a voz voltou. Na terceira vez Joana soube que era o Arcanjo São Mi­guel que lhe falava, o Príncipe dos exércitos celestes, o Padroeiro da casa Valois, reinante, e da própria França.

Pouco depois o Arcanjo se fez acompanhar e finalmente substituir por Santa Catarina e San­ta Margarida. Eram aparições majestosas, com ricas coroas na cabeça. Joana via-as, tocava e sentia a fragrância que espalhavam, mas em geral referia-se a elas só como a 'vozes' que ou­via, 'suas vozes'. Sabia que eram Virgens e Mártires, mas o que não podia imaginar era a ra­zão por que Deus as escolhera para esta missão: seriam guias e protetoras da virgem e mártir Joana, futu­ra salvadora e santa ideal da França Católica".

A Vocação

"Certo dia as vozes, tão familiares, mudaram de tom. Atônita, ela ouviu as palavras: 'Filha de Deus, deves sair da tua aldeia e ir para a França'.

Passaram momentos de estupor. Tendo finalmente compreendido o sentido das palavras ela respondeu: 'Mas eu sou uma pobre menina que não sabe andar a cavalo, nem travar bata­lhas!' Mas as vozes insistiam. A partir daquele dia elas repetiam sempre a ordem, variando os termos. As intima­ções tornavam-se mais peremptórias: 'Toma tua bandeira que o Rei dos Céus te dá, toma-a corajosa­mente, e Deus te ajudará!' Em outra ocasião ouviu dizer: 'Filha de Deus, vai, vai, vai! Eu serei teu au­xílio. Vai!'

Finalmente ela ouviu a explicação clara da sua missão! 'Filha de Deus, deves conduzir o 'Dauphin' a Reims, para que seja coroado segundo o Rito Tradicional!' 'Deves ir para a Fran­ça e não podes ficar onde estás! Deves levantar o cerco de Orleans'.

Decisivas foram as palavras seguintes: 'Filha de Deus, deves ir ao capitão Robert de Baudri­court na cidade de Vaucouleurs; ele te dará homens que te levarão ao Dauphin'. Joana d'Arc tinha (então) 17 anos.

["A 13 de Fevereiro de 1429, quando contava 17 anos de ida­de, saiu Joana de Vancou­leurs, a caminho da corte do Delfim, en­tão em Chinon, como vimos. Escoltavam-na dois cavalei­ros, João de Metz e Beltrão de Poulangy, quatro homens de armas e es­cudeiros. Pela primeira vez, agora, enverga o traje de campa­nha, que nunca mais há de abandonar; quotizou-se o povo de Vancouleurs para lhe oferecer as peças do seu vestuário novo, a saber: um gibão muito justo, de pano escuro, uma saia curta, que lhe descia até aos joelhos, polainas altas, botas e espo­ras. Leva o cabelo cortado pela altu­ra das ore­lhas, como era de uso entre os cavaleiros da época; cobre-lhe a cabeça um gorro de lã pre­ta. Laxart e um certo Tiago d'Alain deram-lhe um cava­lo, cujo preço foi 16 francos; e re­cebeu de Roberto de Baudri­court uma espada que depois havia de trocar pela milagro­sa lâmina encontrada em Fier­bois"] (cfr. "Ano Cristão", por R. Pe. Croiset, 30 de Maio Festa de Santa Joana d'Arc, Vol. V, p. 417).

Aos 13 de Fevereiro de 1429 a camponesa de Domrémy montou a cavalo tra­jada de ho­mem, com armadura, espada e lança. Seis homens tinham ordem de acompanhá-la. Baudricourt os fez jurar de protegê-la do melhor modo possível. E Robert disse a Joana quando encetou caminho: 'Anda! Vá agora tudo como quiseres!' (Atas do Processo).

A confiança do comandante era pouca, mas em algumas semanas esta moça desconhe­cida espantará o mundo inteiro.

Veremos mais tarde que os juízes fizeram acusação dos trajes masculinos que Joana revestia desde a partida. Ela afirmava ter obedecido às ordens de Deus!

["Das setenta acusações que pesaram sobre Joana, quer o leitor saber qual foi tida por mais importante? O uso de tra­jes masculinos! Custa a crer que assim fos­se; mas o caso não admite dúvidas, nem interpretações divergentes; res­salta com evidên­cia das Atas do Pro­cesso: ‘ Podeis acaso afirmar que não pecais mortal­mente por vestirdes fato de homem?’"] (R. Pe. Croiset, ob. cit., p. 427).

'Se Deus me disse que pusesse trajes de homem e os trouxesse constantemente, sua ordem tem relação com a necessidade de manejar as mesmas armas como homens'. E ainda mais claro: 'Quando estou trajada como homem entre homens, eles não terão desejos de mim, e creio que poderei em pensamentos e ações guardar melhor a minha virgindade'.

Vemos que a moça conhecia os perigos, mas mostrava uma resolução tão decidida de ser inviolável que os rudes homens de guerra eram como instintivamente afastados deste ser extraordinário... o nobre Dunois... o atribuía a uma intervenção Divina. Talvez o mesmo Dunois tivesse ouvido o que acontecera a Joana logo no princípio da carreira militar. Um soldado saudou-a com as seguintes palavras: 'Não é esta a pretensa virgem? Se eu a tivesse uma só noite, com Deus, ela não seria mais virgem, é o que posso prometer'.

Joana ouviu esta saudação. Fixou o homem: 'Blasfemas contra Deus, morrerás em breve'. Em menos de uma hora o homem caiu na água e se afogou".

Por que os Trajes Masculinos?


"O célebre Jean Gerson vivia no exílio em Lyon, onde dera um parecer favorável a Joa­na; em particular não vetara os trajes masculinos".

"Confiando nas promessas recebidas em Saint-Ouen, Joana aceitou trajes femini­nos e esperou ser levada a uma prisão eclesiástica, ser vigiada por uma mulher e poder assistir à Santa Missa. Mas foi outra vez confiada aos mesmos guardas ingleses. Estes, participando da decepção e ódio de todos seus conterrâneos, a maltrataram mais desuma­namente do que nun­ca. Com todas as forças ela se defendeu contra agres­sões desonestas.

As circunstâncias fazem crer que era jogo premeditado induzir a prisioneira a reassumir os trajes masculinos e fornecer assim ensejo para nova ação judiciária. Um ou dois dias depois da volta à prisão, os guardas esconderam os trajes femininos deixando só os proibidos. Mas tar­de restituíram o vestido de mulher, para acusar Joana de má vontade, caso ela o repudiasse. Mas Joana não o aceitou por motivos que logo ouviremos.

Em breve a vítima de uma trama diabólica convenceu-se de que fora enganada. A prisão era a mesma e, segundo a sentença, devia ser eterna. As Santas que lhe falavam repreendi­am sua in­fidelidade. De repente espalhou-se a notícia de que Joana, na sua impiedade, vestia de novo trajes masculinos.

Imediatamente Mons. Pierre Cauchon, Bispo de Beauvais, foi à prisão, onde a encon­trou desfigurada, ensanguentada pelos maus tratos, chorosa, cabelo raspado, trajada de homem. Era aos 28 de Maio, dois dias antes da morte (contava apenas 19 anos).

Ouçamos o último diálogo da prisioneira que, arrependida de sua fraqueza passageira, sobe ao cume do heroísmo.

Cauchon: 'O que significa isso?'

Joana: 'Sim, tornei a pôr os trajes masculinos, tirei os femininos'.

Cauchon: 'Prometeste e juraste não mais vesti-los'.

Joana: 'Era mais conveniente, porque estou em meio de homens. Tornei a vesti-los porque não guardastes a vossa palavra. Prometestes que eu poderia assistir à Santa Missa, re­ceber o Corpo de Nosso Senhor, ficar fora destas cadeias de ferro'.

Cauchon: 'Não abjuraste e prometeste não mais vestir esta roupa?'

Joana: 'Prefiro morrer a estar em cadeias. Mas se me deixam ir à Missa, me tiram as ca­deias, levam a uma prisão decente em presença de uma mulher, então sujeitar-me-ei e fa­rei o que a Igreja me mandar'. 'Prefiro fazer penitência de uma vez e morrer do que suportar mais tempo os so­frimentos da prisão. Nunca agi contra Deus nem contra a Fé, embora vós me obri­gásseis a revogar. Do que estava escrito no documento da abjuração não compreendi nada. Não tinha na mente revogar qualquer coisa, fora se fosse do agrado Divino. Se quiserdes tornarei a revestir os trajes femininos, quanto ao resto, não mudarei nada'.

Cedo no dia 30 de Maio do ano 1431, Joana é avisada que neste dia será queimada vi­va. Começa a chorar: 'Oh! Que me tratam tão terrível, tão cruelmente! Oh! Que hoje meu corpo, que nunca degradei, deve ser consumido e reduzido a cinzas... Diante de Deus acuso es­tes guar­das e os homens que lhes deram entrada aqui, por causa dos assaltos e atos de violência a que me sujeitaram... Apelo para Deus, dos males e das injustiças que me fa­zem!' 'Hoje de noite espero estar no Paraíso'.

Joana é condenada como herege impenitente, mas ilogicamente Cauchon lhe permite con­fessar-se e receber a Sagrada Comunhão... Reza sem interrupção:

'Santíssima Trindade, tende piedade de mim! Santa Maria, rezai por mim! Santa Catari­na, Santa Margarida, ajudai-me!'...

Quando o fogo a atinge, ela não grita nem se lamenta. Várias vezes exclama: 'Jesus! Je­sus!'

Mártir da Virgindade


Acima ouvimos que depois da sua abjuração, Joana voltou aos trajes masculinos, o que lhe foi imputado como recaída e causou sua execução. Mas como em tantas outras circuns­tâncias, as Atas do Primeiro Processo velam a verdade que apreendemos de várias teste­munhas do Se­gundo Processo. Vejamos os textos:

A Pucelle me confiou que depois da abjuração foi atormentada e espancada horrivelmente na prisão; um inglês, até de nobre linhagem, tentou violá-la. Foi por esta razão que vestiu de novo trajes masculinos. Também o declarou publicamente. Quando se aproximou o fim, disse ao Bispo de Beauvais: 'Ai! Morro por vós, porque se me tivésseis internado numa prisão eclesiástica não estaria aqui'(Frei Martin Ladvenu).

Quando Joana tinha prestado a abjuração, ela perguntou ao presidente em que lugar devia permanecer. O presidente respondeu: No castelo de Rouen (a antiga prisão). Foi recondu­zida para lá. Vestia de novo trajes femininos. Tornada relapsa teve que justificar-se perante os juízes. Nisto o próprio (juiz) Mestre André Marguerie correu grande perigo, por dizer que convinha perguntar a Joana por que motivo voltara aos trajes masculinos. Um inglês arro­jou a lança e queria trans­passar o Mestre. Muito assustados, Marguerie e os outros fugi­ram (Jean Massieu).

Pelos depoimentos citados do Segundo Processo e outros que omitimos, apreendemos, portanto, a verdade. Joana não reassumiu os trajes proibidos como símbolo da sua retrata­ção, nem propriamente por causa da prisão secular, como insinuam as Atas do Primeiro Processo, mas por causa do perigo que nesta prisão corria sua virtude e integridade.

Aqui a heroína da Igreja e da França se elevou ao fastígio (cume) da heroicidade. Sabia que enfren­tava a morte e na realidade ela foi decretada em consequência desta mudança de trajes. Se conservasse a roupa feminina, já não a teriam inquietado qualquer que fosse sua disposição inter­na. Mas, antes a morte, do que a violação! Joana d'Arc, já reconhecida durante a vida como a Pu­celle, a Virgem, é a vitoriosa Mártir da Virgindade"(R. Pe. José Bernard, S.J., "Joana d'Arc − A Donzela de Orléans", Vozes em De­fesa da Fé, Caderno 37, Ed. Vozes, 1961).

Santa Pelágia, a Penitente


► "Por meado do V século, deu o Senhor à sua Igreja um dos mais insignes exemplos de sua infinita misericórdia com os pecadores, na pessoa de Pelágia, uma das mais notáveis peca­doras que se viram no mundo.

Tendo convocado em Antioquia o Patriarca Maximiano um Concílio Provincial de todos os Bispos seus sufragâneos, a ele concorreu Nono um dos Prelados mais santos do seu século. Foi monge do célebre mosteiro de Tabenas na Tebaida, donde o tiraram pela fama de sua imi­nente virtu­de para o fazerem Bispo de Edessa na Mesopotâmia, e daqui o transferiram para a Sé de Heliópolis, na Síria, próximo do monte Líbano, onde converteu à Fé inumeráveis nações idóla­tras. Em toda a parte frutificavam maravilhosamente os seus sermões, porque nele tudo pregava: a sua compostura, modéstia, semblante extenuado por suas contínuas penitências, a sua humil­dade e até os seus mo­dos lhanos e sinceros, mas sempre respeitáveis.

Um dia, em que estavam sentados à porta da igreja do Mártir São Julião, o Patriarca, o Bispo Nono e outros oito Prelados dos que haviam concorrido ao Concílio, rogou o Patriarca a São Nono que fizesse ao povo uma prática espiritual. Fê-lo assim o Santo; falou com tanta eloquência e unção que a todos tinha suspenso. A este tempo passava perto deles uma célebre cortesã chamada Pelá­gia.

Era a primeira comediante de Alexandria, famosa por sua extraordinária formosura; mas mui­to mais pelas desordens de sua desgraçada vida. Chamavam-lhe a Margarida, o que na lín­gua do país quer dizer Perola, ou fosse por sua rara beleza, ou porque sempre se apresentava coberta de pedrarias. Aquele dia havia-se adornado com todo o esmero e arte, que lhe pode ins­pirar o desejo de parecer bem. Vinha soberbamente vestida, mas com tanta imodéstia, como os­tentação: o cabelo arti­ficiosamente frisado, levantada a coifa com estudado desalinho, um véu pela cabeça, e tudo o mais com desprezo que lhe sugeria a falta de pudor. Seguia acompanhada de comitiva numerosa, com­posta de donzelas e de pagens. Escandalizaram-se com isto os Pre­lados, afastando os olhos de um espetáculo tão perigoso como profano. Só o Santo Bispo nono, contra o seu costume, a esteve olhan­do fixamente todo o tempo, em que a pôde a vista alcançar, e logo que se lhe ocultou, exclamou des­feito em lágrimas: 'Ah! Irmãos meus, quanto temo que esta mulher, que tanto cuidado põe em agradar aos homens, haja de ser algum dia nossa condenação pelo pouco cuidado, que nós empregamos em agradar a Deus!'

Retirou-se depois à pousada com seu Diácono, que escreveu toda esta história, pros­trou-se, e chorando, e gemendo, e ferindo o peito, dizia: 'Senhor, tende misericórdia deste po­bre pecador. Eis ali uma miserável criatura que gasta os dias inteiros a compor-se, que emprega o que a arte tem de mais sedutor, brilhante e especioso para se tornar agradável aos olhos dos ho­mens, para se fazer amar deles; e eu Sacerdote, e Bispo, que cuidado po­nho em adornar a mi­nha alma com a gala das virtudes? Que tempo gasto em purificar o meu coração para vo-lo apresentar, e para que mereça o vosso agrado? Será possível que aquela infeliz mulher tenha mais indústria para se tornar amada dos homens, que eu para merecer ser amado de Deus?' Passou o Santo Bispo o resto da noite na dor e na compunção, mostrando-se inconsolável por sua imaginária indolência, descuido e frieza.

Na noite seguinte teve o Santo uma misteriosa visão que referiu a seu Diácono, a qual teve o cuidado de a transmitir à posteridade: 'Pareceu-me, lhe disse, que estando a celebrar ao altar se revoluteava ao redor de mim uma pomba coberta de asquerosa imundície, des­pedindo de si cheiro insuportável; e por mais que a afugentasse, ela sempre voltava a in­quietar-me, até que o Diácono disse que saíssem os catecúmenos, e então saiu também a pomba e depois da Mis­sa, dadas as graças, dispondo-me para voltar a casa, encontrei a mesma pomba sobre o um­bral da porta; pareceu que a tomei na mão, e que, mergulhando-a em uma grande taça cheia de água, ficou tão branca como a neve, sem o mais leve resquício de mancha, e tomando rapida­mente vôo para o Céu, desapareceu de meus olhos. Queira o Senhor, acrescentou o Santo, de­clarar-nos o que isto significa'.

O dia seguinte era um Domingo; tendo-se reunido todos os Bispos na igreja para cele­brar os Divinos Mistérios, acabado o Evangelho, apresentou-se o Patriarca a São Nono, e rogou-lhe que re­partisse ao povo a palavra de Deus, explicando-lhe o Sagrado Texto que acabava de ler. Era prodigio­sa a concorrência, porque à Solenidade do dia e à celebridade do Concílio, e com a notícia de que pregava São Nono, haviam concorrido todos os fiéis e todos os catecúme­nos da cidade.

Subiu ao púlpito o Santo Bispo, e pregou com tanta força sobre as grandes verdades da Reli­gião, sobre o mal sumo do pecado e o infinito tesouro da misericórdia de Deus, que todo aquele imenso auditório se desfazia em pranto. Achava-se felizmente entre os ouvintes a famosa cortesã Pe­lágia, que em tempos se alistara no número dos catecúmenos; mas, sufocados nela por uma vida li­cenciosa todos os sentimentos de Religião, só havia concorrido à igreja por mera curiosidade. Mas, quis a Graça fazer aquela ilustre conquista, e tocou eficazmente o seu cora­ção. Tanto a moveu quan­to acabava de ouvir, que não pôde reprimir as lágrimas; e logo que o pregador se recolheu a casa es­creveu-lhe um bilhete nestes termos:

'Ao santo discípulo de Jesus Cristo a pecadora e escrava do Demônio. Ouvi dizer que o vosso Deus baixou do Céu à terra para salvação dos homens, e Aquele, a quem os Queru­bins não se atrevem a fitar pelo respeito, se dignou conversar com os pecadores e com os pu­blicanos sem se dedignar de falar com uma samaritana e com uma insigne pe­cadora. Se sois discípulo de tal Mestre, não desprezeis a uma infame cortesã, como eu sou, e não me negueis o bem e a consolação de ter convosco uma conferência, para poder achar graça por vosso in­termédio junto de Jesus, Nosso Salvador'.

Ficou pasmado o Santo ao ler esta carta; temendo algum laço, pelo artifício de mulher tão perigosa, respondeu-lhe que Jesus Cristo, seu Divino Mestre, não ignorava o que ele era, e conhecia perfeitamente o interior de seu coração; que de resto não pretendesse tentá-lo, pois ainda que fosse servo de Deus, era pecador, e tinha por muito certa a sua miséria; se a sua inten­ção era santa, o po­deria encontrar quando quisesse, não a sós, mas em presença de todos os Bispos.

Logo que Pelágia recebeu esta resposta, voou à igreja de São Julião, e encontrando-o no meio dos outros Prelados do Concílio, lançou-se a seus pés na presença de todos, rogou-lhes com lágrimas que derramava a torrentes, e com voz interrompida de soluços e suspiros, lhe pe­diu o Batis­mo. Representou-lhe o Santo Prelado que os Cânones Eclesiásticos proibiam que se administrasse este Sacramento aos pecadores públicos, e especialmente a uma famosa cortesã, como ela era, en­quanto não renunciassem a sua vida licenciosa, e não dessem provas suficien­tes de não voltarem a mergulhar-se em suas antigas desordens. Pelágia, que se conservava sempre prostrada aos pés do Santo Bispo, respondeu-lhe: 'Padre, minhas lágrimas são as me­lhores fiadoras da sinceridade da minha conversão; e, pois, que Deus me conduziu a vos­sos pés, querendo servir-se de vós para me purificar de meus pecados, olhai que não vos peça conta de dilatardes por mais tem­po o admitir-me no número de suas servas'.

Conheceu o Santo por suas instâncias a sinceridade da sua mudança; sendo de parecer to­dos os Bispos que não devia negar-se-lhe o que pedia com tais mostras de contrição e com tão exemplar perseverança, não pode fazer mais resistência a conceder-lhe. No entrementes se deu par­te ao Patriarca do que se tinha passado, e se lhe pediu a autorização para lhe administrar os Sacra­mentos, rogando-se-lhe ao mesmo tempo que escolhesse alguma virtuosa matrona para que cuidas­se de tão ilustre neófita. Admirado o Patriarca de tão inesperada conversão, deu mil graças ao Se­nhor, e rogou a uma virtuosa dama, chamada Romana, muito conhecida de toda a cidade por um continuado de boas obras, que tomasse a seu cargo aquela nova ovelhinha que ia entrar no aprisco, querendo ser sua madrinha. A virtuosa senhora, fora de si pelo contentamento que lhe causava a ocasião de poder concorrer para uma obra tão meritória, correu à igreja de São Julião e abraçou ter­namente a ditosa pecadora.

Depois de São Nono lhe haver explicado os principais Mistérios da nossa Religião, nos quais já se achava suficientemente instruída, perguntou-lhe como se chamava: 'Meus pais, res­pondeu-lhe, puseram-me o nome de Pelágia; depois, ou por minha vaidade ou pelas rique­zas de mi­nhas galas, deram em me chamar Margarida; vós, Padre, podereis pôr-me o nome que melhor vos parecer'.

Fez-lhe São Nono os exorcismos costumados, e tendo-a Batizado com o nome de Pelá­gia, a confirmou e lhe deu a Sagrada Comunhão. Diz o historiador de sua vida que, quando o Santo Bispo voltou a casa depois de uma festa tão cheia de consolação, não lhe cabendo no pei­to a alegria, disse ao seu Diácono: 'Irmão caríssimo, este dia é muito solene para nós; não o tive em toda a vida de mais gosto, e assim é preciso que tudo diga festa; hoje contra o costumado hás de preparar os legumes com azeite, e havemos de beber um pouco de vi­nho'. Logo que se assentaram à mesa, fez o Demônio um espantoso ruído na pousada; ouviram-se uivos, gritos formidáveis, e entre eles uma triste e pavorosa voz que dizia: 'Oh! Quanto me faz padecer este maldito velho! Não bastava haver convertido e batizado a trinta mil sarra­cenos, e depois a toda a cidade de Helió­polis? Não contente de todas estas conquistas que fizeste para teu Deus à minha custa, vens-me agora arrebatar uma cortesã, que ela só à sua parte me indenizava de todas as minhas per­das; não arrebentares, maldito velho!' Conhecendo o Santo o artifício do Demônio, não fez mais que rir-se e fazer o Sinal da Cruz, com que o calou e o expulsou dali.

Neste entrementes, regressando Pelágia a sua casa, como uma nova criatura, repartiu pelos pobres todas as suas jóias e bens, sem nada reservar para si, e deu a liberdade a todos os seus es­cravos. Nas primeiras noites teve muito que padecer do espírito das trevas; mas, instruí­da por seu Santo diretor, com o Sinal da Cruz e com os dulcíssimos Nomes de Jesus e Maria pôs em fuga todo aquele exército infernal.

Oito dias depois deixou a túnica branca, trocando-a por um cilício; coberta com um manto que lhe deu o Santo Prelado, saiu secretamente da cidade de Antioquia, tomou o cami­nho de Jerusalém, e foi-se sepultar em uma gruta do Monte Olivete, onde todos a tive­ram por um mancebo solitário, chamado Pelágio, e debaixo deste pseudônimo fez vida muito penitente, entregue às maiores austeridades, passando-a em contínua oração. Con­cluído o Concílio de An­tioquia, retirou-se São Nono a Heliópolis, sem descobrir a ninguém o pa­radeiro da sua penitente, pos­to sabê-lo muito bem por meio de Revelação Divina. Seu Diácono Tiago, que o acompanhou ao Con­cílio, e nos deixou escrita toda esta história, desejou ir em pe­regrinação a Jerusalém, para o que pe­diu autorização ao Santo Bispo.

Deu-lhe São Nono; mas encarregou-o de, logo que chegasse à Santa Cidade, perguntar por um solitário, chamado Pelágio, que habitava no Monte das Oliveiras, e que não voltasse sem lhe tra­zer notícias dele. Não se esqueceu Tiago do recado, e por isso, logo que chegou a Je­rusalém, perguntou pelo solitário Pelágio. Disseram-lhe que era um anjo em carne mortal, assombro de todo o país por sua eminente santidade, e reputação por um prodígio de pe­nitência; que havia quatro anos que se havia encerrado em uma espécie de sepultura, só se alimentava de raízes insípidas que brotavam espontâneas.

Partiu Tiago a ver o santo solitário, encontrou-o em uma celazinha aberta no mesmo penhas­co, sem outra abertura que uma janelinha, a qual estava quase sempre fechada.

Como ia com o pensamento de achar um homem, não lhe passou pela mente que pu­desse ser Pelágia. Por outro lado estava a santa tão desfigurada, os olhos tão encova­dos e tão apagados pelas muitas lágrimas, o semblante tão descarnado pelo rigor das pe­nitências, a tez e a figura tão mudada, que lhe seria impossível conhecê-la, ainda quando a não tivesse ido ver com a preocupação de que era um homem. Disse-lhe Tiago que vinha da parte do Bispo Nono, do qual ele era Diácono: 'Nono é um Santo, respondeu ela, diz-lhe que me encomende a Deus'. Com o que fechou logo a janela, e Tiago ouviu que começou a rezar a Tércia.

Regressou a Jerusalém, cheio de regozijo e admiração por ter visto aquele prodígio. De­pois de ter visitado os Santos Lugares, e muitos mosteiros, onde não havia outra coisa a louvar do que a santidade do solitário Pelágio, não quis voltar à Síria, sem o ter visitado uma segunda vez. Chegou à cela, fez ruído para que ouvisse, e vendo que ninguém aparecia, exclamou: 'Ser­vo de Deus, faze-me a caridade de te deixar ver'.

Como ninguém respondesse, voltou ao outro dia, no qual, repetindo-se o mesmo silên­cio, teve a curiosidade de meter a cabeça pela janelinha que estava entreaberta, e então viu que estava sem vida o suposto solitário.

Correu prontamente a dar parte do sucedido aos ermitões dos contornos, vindo todos para prestar ao sagrado corpo os últimos deveres. Arrombaram a porta, e de lá tiraram o cadáver para o embalsamarem, mas todos ficaram estranhamente surpreendidos, quando notaram que era mu­lher a que criam ser homem, e logo se ouviu de todas as partes exclamar: 'Sede eternamente louvado, meu Deus, que tendes tantos tesouros escondidos na terra não só entre os homens, mas também no sexo mais débil e mais delicado'.

Divulgada a notícia daquela maravilha por toda a comarca, correu de tropel gente de Jerusa­lém, bem como inumeráveis religiosas que estavam nos mosteiros das planícies de Jericó e às mar­gens do Jordão, todas com velas acesas, cantando hinos, e assistindo às suas Exéquias, as quais correram com a maior solenidade; e desde aquele tempo ficou muito célebre em toda a Igreja o nome de Santa Pelágia.

Sucedeu esta morte tão preciosa aos olhos do Senhor no mês de Outubro do ano de 460"(R. Pe. Croiset, "Ano Cristão", Vol. X, dia 8 de Outubro − Festa de Santa Pelágia, a Peniten­te, pp. 103-107).

Beata Catarina de Cardona

"Não longe da pequenina cidade de Roda, na Espanha, havia, nos princípios do século XVI, um convento dos Padres da Mercê, aqueles religiosos heróicos cuja vida se consumia em aliviar e resgatar os cristãos prisioneiros dos infiéis. Aos Domingos, afluía à igreja do mosteiro grande número de habitantes das aldeias vizinhas, os quais aí notavam um eremita cujo recolhi­mento e fervor edifica­vam a todos.

Entretanto, ninguém o conhecia, ninguém sabia o lugar da sua morada. Este misterioso per­sonagem despertou e excitou a curiosidade. Puseram-se, portanto, a espiar seus passos ao sair da igreja. Em breve, porém, percebeu ele de que se tratava, e fazia por se demorar muito tempo na igre­ja até cansar a paciência dos curiosos.

Por vezes, todavia, os mais intrépidos esperavam, os mais astutos escondiam-se; mas o ere­mita tomava, umas vezes, um caminho, outras vezes, outro. Além disso, caminhava tão de­pressa que ninguém podia segui-lo. Perdiam-no de vista nos atalhos que se cruzavam ou nas espessas matas onde não temia embrenhar-se, posto que, descalço e com os pés ensanguentados. Toda a espécie de conjecturas e comentários circulava na multidão.

A morada do pobre ermitão não era, todavia, senão a meia légua do convento. Constava ela de uma gruta cavada pela natureza numa rocha cercada de espessas sarças e matagais cuja entrada era fechada por giestas. Aí se escondia o solitário e se entregava aos exercícios da mais austera pe­nitência. O seu alimento eram raízes, ervas e frutos silvestres.

Aí passava os seus dias a louvar ao Senhor, a rezar, a meditar suas grandezas e seu amor, a implorar misericórdia para o mundo, cheio de pecados e corrupção.

Um pastor, perseguindo um dia um rebanho de cabras vagabundas, chegou a descobrir a gruta do piedoso solitário, o qual suplicou ao seu fortuito visitante que não descobrisse o seu asilo a ninguém. 'Não posso prometer-vos isto, meu irmão', disse o pastor, 'eu sirvo um senhor que é muito bom cristão e que há muito tempo deseja saber o vosso paradeiro. Ele será feliz em vos conhecer. Vós careceis de tudo; ele, porém, não permitirá que vos falte nada'. Em vão o er­mitão se desculpava; viu-se obrigado a aceitar uma parte do pão que o bom do pastor levara para sua viagem e receber em seguida o que seu amo lhe enviava. Não tinha sido isto o mais de­sagradável da descoberta.

Não se guardou segredo sobre o caso, e, em breve, a gruta do solitário foi conhecida de toda a gente. A afluência era considerável. Todos desejavam ver este homem de Deus, este anjo da soli­dão, esta maravilha da penitência.

Um dia que o solitário estava ausente − para ir à igreja, sem dúvida, − um curioso pene­trou na gruta para visitar e revistar o mobiliário.

Um crucifixo, entre os instrumentos de penitência, um livro de Horas; eis tudo o que se en­controu.

Este livro não deixou também de ser examinado; aí se encontrou a seguinte inscri­ção: 'Dado a Catarina de Cardona pela Princesa d'Eboli'. Era, pois, uma mulher que habita­va aquela gruta, que levava uma tão austera vida, e esta mulher era da família dos Duques de Cardona, uma das mais ilustres da Espanha.

Desde a idade de oito anos, Catarina sentia-se impelida à prática dos Conselhos Evan­gélicos. Longe de secundá-la, porém, seus pais sonharam em casá-la, logo que ela chegou à idade própria. A humilde rapariga submeteu-se como verdadeira vítima da obedi­ência filial e tudo se preparou para as núpcias. Mas Deus que lia no fundo seu coração li­bertou-a das mãos daqueles que violentavam sua liberdade; o mancebo que lhe estava destinado para esposo morreu neste intervalo. Depois desta catástrofe ninguém se admi­rava de vê-la entrar na casa das Franciscanas. Sua família retirou-a, em breve, deste pie­doso asilo para conduzi-la à corte de Espanha onde foi sucessivamente dama de honra da Princesa de Salerne e da Princesa d'E­boli. Sua alma, porém, experimentava neste meio mundano e buliçoso sofrimentos indizíveis. Uma manhã, foi encontrada no seu quarto uma carta dirigida à Princesa d'Eboli, em que Catari­na agradecia a esta dama todas as suas bondades e lhe anunciava a resolução de ir viver na solidão.

Depois de 20 anos passados na caverna aonde a vimos no começo da narração, rece­beu a nossa ermitã tantas visitas importunas que cedeu a gruta aos Carmelitas e entrou numa reclu­são que estes religiosos lhe prepararam perto do seu convento. Aí viveu ainda 5 anos.

Catarina terminou sua carreira mortal em 1577, com 63 anos"(R. Pe. Croiset, ob. cit., Vol. V, 21 de Maio, pp. 335-337).

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Transcrevo à seguir, um caso impressionante que, creio eu, agradará a muitos.

"Havia em Paris, um protestante que se chamava Francisco Cassier. Tinha este homem des­posado uma boa católica, Madalena Olivier, de quem teve duas filhas. Queria ele convertê-las (as fi­lhas) ao Protestantismo, mas a sua virtuosa mãe preservou-as sempre da apostasia; por isso tratava-as muito mal e tinha-lhes um ódio terrível. Em breve morreu Madalena Olivier. Resol­veu, então, Fran­cisco Cassier tentar agora de novo a conversão das duas órfãs, certamente com êxito.

Obrigou-as a vestir-se com trajes de homem e partiu com elas para Genebra. Um dia que estavam muito cansados do caminho longínquo e fatigante, pediram a seu pai licença para des­cansarem um pouco. O pai consentiu facilmente, e, cansado, sentou-se também.

Deitou-se em seguida sobre a relva e dormiu. Era num lugar solitário. As infelizes rapari­gas, despeitadas com os maus tratos que, desde há muito tempo, recebiam de seu pai, aprovei­tando-se do seu sono, mataram-no e esconderam o seu cadáver nuns matos próximos.

Depois deste horrível crime, saíram de França, sempre em trajes masculinos, e foram, em Milão, pôr-se ao serviço de Carlos II, rei de Espanha, a quem este ducado pertencia. As for­ças mila­nezas foram enviadas em guarnição a Messina, depois a Nápoles, de onde partiram numa expedição contra os bandidos que se tinham retirado para os Abruzos. As duas irmãs luta­ram com denodo; ten­do, porém, uma perecida na refrega, teve a outra o cuidado de sepultá-la, temendo que, sendo o ca­dáver desnudado, fosse reconhecido o sexo e descoberta a fraude. A que ficou incólume tomou o nome de Carlos Pimentel, por que era conhecida pelos camaradas. Depois da exterminação dos ban­dos dos salteadores, voltou a Nápoles, onde a esperava a Gra­ça de Deus.

Estando um dia Carlos Pimentel de guarda ao lugar de Castelo-Novo, viu-a São Francis­co de Jerônimo e fez-lhe sinal para se aproximar.

'Que me quererá aquele homem?', dizia de si para consigo o soldado Carlos. 'Não o co­nheço nem tenho nada que fazer com ele'.

Chamando-a de novo, Carlos foi ter com aquele estranho, o qual chamando-a à parte lhe dis­se:

'Muito queria que te confessasse'.

'Confessar-me!', respondeu o soldado, 'e por quê? Acaso cometi eu algum crime ne­fando? Não me conheço manchado de pecados'. E, dizendo isto, voltou bruscamente às costas.

O Santo embargou-lhe o passo, dizendo:

'Mas como podes dizer tu que estás isenta de pecados?' Tornou ele: 'Não és tu Maria Cassier, nascida em Paris, donde vieste para a Itália? Não te fazes chamar Carlos Pimentel? De nada te serve negar, porque quem tudo me revelou foi o Senhor Jesus que vês pregado na­quele madeiro. Queres que eu diga mais? Não foste tu que, de acordo com tua irmã, mataste teu pai?'

A estas palavras tão claras e inesperadas, o soldado, embaraçado, empalideceu e pôs-se a tremer dos pés à cabeça. Entretanto não se quis confessar:

'Mas Padre', tornou após uns instantes de silêncio. 'Não sei quem pôde dizer-vos tais mentiras'.

Depois refletindo que era preciso impedir o Padre de falar, prometeu ir confessar-se no dia seguinte a ele mesmo. O Santo esperou dois dias, mas inutilmente; foi então procurar o sol­dado re­belde à Graça. Tendo-o, após muitas fadigas, encontrado, diz-lhe:

'É assim que cumpres a palavra que me destes?'

'Padre, crê-de-me', retorquiu o soldado, 'eu não pude fazê-lo; de resto, é impossível confessar-me agora, porque, por ordem do vice-rei, vamos embarcar imediatamente; va­mos para a Toscana'. O Santo refletiu algum tempo:

'Não, tu não partirás', disse por fim: 'Jura-me, então, pelo Nome de Cristo que ama­nhã, logo pela manhãzinha, virás confessar-te. Não tenhas receio, porque eu tenho grande es­perança de que Deus quer salvar-te'.

Efetivamente a ordem de marcha foi revogada para o dia predito pelo Santo, e o soldado diri­giu-se imediatamente à igreja de Gesú-Novo para cumprir a sua promessa. Quando o Padre o viu, estremeceu de alegria.

'Pois quê!', diz ele, 'querias escapar-te das mãos de Deus! É um Pai que te ama e que te quer para si'.

Ouviu-o em seguida em confissão; dispô-lo a receber a absolvição nessa mesma manhã e fê-lo aproximar da Mesa Santa. O soldado passou este feliz dia na igreja, em exercícios de pie­dade. Á tarde, conduziu-o a casa da marquesa de Santo Estêvão. Esta senhora, que era muito piedosa, acolheu-o de bom grado, mandando que retomasse os trajes do seu sexo e que tivesse o seu primeiro nome, Maria Cassier. Aí permaneceu durante quatro meses, estabele­cendo-se por fim numa casa que lhe arranjou a marquesa.

Recebia seis ducados por mês, verba que o Santo lhe obteve da caixa militar, como pen­são dos soldados inválidos.

Esta conversão tão extraordinária teve lugar no ano de 1688. Maria Cassier veio a morrer no ano de 1727 e, sob juramento, confirmou as particularidades da conversão para o Processo de Cano­nização do Santo. Permaneceu sempre nos bons sentimentos de humildade e arrepen­dimento, cho­rando a sua falta e fazendo penitência..."(R. Pe. Croiset, "Ano Cristão", Vol. V, dia 11 de Maio, Festa de São Francisco de Jerônimo, pp. 158-168).

Santo Adriano, Mártir


“... Sabido do imperador que tanto a mulher de Adriano, como outra piedosa mulher, vinham à prisão regalar os santos com alimentos e agasalhos, proibiu a entrada às mulheres; mas Natália (esposa de Adriano) e outras três souberam iludir a vigilância dos guardas, cortando os cabelos e vestindo roupas de homem, continuando as suas caridades com os ilustres Confessores de Jesus Cristo. De novo foram mandados comparecer. Era um espetáculo digno de dó o que ofereciam os santos ao saírem da prisão; só corações empedernidos poderiam ser insensíveis a tanta miséria. Ca­minhavam com muita dificuldade, alegres é verdade, mas despedaçados os corpos. Finalmente, ten­do-lhes sido quebradas as pernas e a Adriano cortada também uma das mãos, deram neste suplício suas almas a Deus.

O corpo de Santo Adriano foi transportado para Constantinopla e depois para Roma à 8 de setembro, dia em que se celebra a sua festividade. Levaram-nas mais tarde para Flandres”(R. Pe. Croiset, “Ano Cristão”, Vol. IX, dia 8 de Setembro, Festa de Santo Adriano, pp. 97-99).

Santa Margarida, Virgem e Penitente

“Margarida, dita Pelágio, virgem belíssima, rica e nobre, foi criada com a maior solicitude por seus pais, que a proveram de ótimos costumes, com tanto pudor que não se deixava ver por homem algum. Enfim, um rapaz de família nobre pediu-a em casamento e, com o consentimento dos pais, fo­ram feitor com grandes gastos e agradável decoração todos os preparativos necessários para as bo­das. No dia do casamento, rapazes, moças e toda a nobreza festejavam com alegria diante do leito nupcial já preparado, quando por inspiração de Deus, ao perceber como a tão danosa perda da vir­gindade era aplaudida, a virgem prosternou-se no chão e avaliou tanto em seu coração os inconveni­entes do casamento, que logo desprezou todas as alegrias desta vida como se fossem estrume. Daí por que se absteve naquela noite de ter relações com seu marido, e à meia-noite, depois de ter se re­comendado a Deus, cortou os cabelos e fugiu às escondidas, com roupas masculinas.

Chegando a um mosteiro distante e chamando-se de irmão Pelágio, foi recebida pelo abade e cuidadosamente instruída. Ela se comportou de maneira tão santa e tão devota, que com a morte do Provisor de um mosteiro feminino, o abade, aconselhado pelos anciãos, impôs a ela este cargo. Enquanto servia às virgens com determinação e inocência o alimento não apenas do corpo, mas tam­bém da alma, o invejoso Diabo colocou obstáculos ao bom curso das coisas, inspirando um crime. Ele incitou ao adultério a virgem que era mensageira do mosteiro, e quando seu ventre cresceu e já não podia ser escondido, todas as virgens e todos os monges ficaram consternados de vergonha e de dor, e sem julgamento e sem investigação condenaram Pelágio, que como Prepósito, era o único que tinha contato frequente com ela.

Por essa desonra, foi expulso do mosteiro e recluso em uma gruta aonde o mais severo dos monges levava-lhe muito pouco pão de cevada e água. Depois os monges se retiraram e deixaram Pelágio sozinho, que suportou tudo com paciência e não se deixou perturbar por nada, sempre agra­decendo a Deus e continuamente se confortando pelos exemplos dos Santos. Enfim, quando soube que sua morte se aproximava, mandou uma carta ao abade e aos monges:

'Nascida de sangue nobre, fui chamada no mundo secu­lar de Margarida, e para atravessar o mar das tentações atribuí-me o nome de Pelágio. Ao me passar por homem não menti, como mostram os fatos, pois do crime ganhei virtude, inocente fiz penitência, e como os homens ignoravam que sou mulher, deixem às santas irmãs o cuidado de me sepultar, e a visão de meu corpo morto será a expiação de minha vida, já que as mulheres reconhe­cerão como virgem aquela que os caluniadores julgaram ser uma adúltera'.

Quando os monges e monjas ouviram a leitura desta carta, correram para a caverna, as mu­lheres reconheceram que Pelágio era uma mulher e virgem intacta. Todos fizeram penitência e ela foi enterrada com honra no mosteiro das virgens”(Jacopo de Varazze, “Legendae Sanctorum, vulgo His­toria Lombardica dicta”, pp. 852-853 da Tradução Portuguesa, Companhia das Letras, 2003).

E ainda poderia narrar a vida de Santa Marina (pp. 478-479), de Santa Teodora (pp. 531-534) e dos Santos Proto, Jacinto e Eugênia (pp. 763-766), que estão contidas na obra “Legenda Au­rea” do Beato Jacopo de Varazze, Arcebispo de Gênova (1226-1298), mas, estenderia muito este trabalhinho.

Fonte: Acessar o ensaio "Reminiscência sobre a Modéstia no Vestir" no link "Meus Documentos - Lista de Livros".


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