Iluminura do séc. XIV onde Dante vê,
horrorizado, os semeadores de escândalo e cismáticos percorrendo a vala onde, a cada volta, são cortados ao meio por um diabo.
Parece que o cisma não é um pecado especial:
1. Com
efeito, diz o papa Pelágio, o cismo “soa a ruptura”. Ora, todo pecado
causa uma ruptura. Está escrito em Isaías (59,2): “Vossos pecados vos
dividiram de vosso Deus”. Logo, o cisma não é um pecado especial.
2. Além
disso, são considerados cismáticos aqueles que não obedecem à Igreja.
Ora, em todos os seus pecados o homem desobedece aos preceitos da
Igreja, pois, segundo Ambrósio, o pecado é “uma desobediência aos
mandamentos celestes”. Logo, todo pecado é um cisma.
3. Ademais, a
heresia nos separa da unidade da fé. Portanto, se o cisma implica uma
divisão, parece não se diferenciar do pecado de infidelidade como um
pecado especial.
EM SENTIDO CONTRÁRIO,
Agostinho distingue entre cisma e heresia, quando diz: “O cismático tem
as mesmas crenças e os mesmos ritos que os outros; só se compraz na
separação da congregação. O herege, porém, tem opiniões que o afastam do
que a Igreja Católica crê”. Portanto, o cisma é um pecado especial.
Segundo
Isidoro, chamou-se com o nome de cisma “a cisão dos ânimos”. Ora, a
cisão opõe-se à unidade. Por isso se diz que o pecado de cisma se opõe
diretamente e por si à unidade. Com efeito, assim como na natureza, o
que é acidental não constitui a espécie, assim também na moral. O que é
intencional é essencial, enquanto o que está fora da intenção existe
como acidental. Por isso o pecado de cisma é propriamente um pecado
especial, pelo fato de alguém tender a se separar da unidade realizada
pela caridade. A caridade une não somente uma pessoa a outra pelo laço
do amor espiritual, mas ainda toda a Igreja na unidade do Espírito.
Chamam-se, portanto, cismáticos propriamente ditos aqueles que por si
mesmos e intencionalmente se separam da unidade da Igreja, que é a
unidade principal. A união articular entre os indivíduos é, pois,
ordenada à unidade da Igreja, da mesma forma que a organização dos
diversos membros no corpo natural é ordenada à unidade do corpo inteiro.
Ora, pode-se
considerar a unidade da igreja de duas maneiras: na conexão ou na
comunhão recíproca dos membros da Igreja entre si; e, além disso, na
ordenação de todos os membros da Igreja a uma única cabeça. Segundo a
Carta aos Colossenses (2, 18-19): “Inchado pelo sentido de sua carne e
não se mantendo unido à cabeça, da qual todo o corpo, por suas
articulações e ligamentos, recebe alimento e coesão para realizar seu
crescimento em Deus”. Ora, esta Cabeça é o próprio Cristo, do qual o
soberano pontífice faz as vezes na Igreja.
Por isso chamam-se de cismáticos aqueles que não querem se submeter ao
soberano pontífice e recusam a comunhão com os membros da Igreja a ele
submetidos.
Quanto às objeções iniciais, portanto, devemos dizer que:
1. A
separação entre o homem e Deus pelo pecado não é procurada pelo pecador,
mas acontece fora de sua intenção, em razão de sua conversão
desordenada ao bem perecível. Por isso não se trata de um cisma
propriamente dito.
2. A
desobediência aos preceitos por rebelião constitui a razão de cisma.
Digo por rebelião, isto é, quando alguém despreza obstinadamente os
preceitos da Igreja e recusa submeter-se a seu julgamento. Nem todo
pecador faz isso. Portanto, nem todo pecado é um cisma.
3. A heresia
e o cisma se distinguem segundo as coisas às quais ambos se opõem por
si e diretamente. A heresia se opõe por si à fé; e o cisma se opõe por
si à unidade da caridade eclesial. É por isso que, da mesma forma como a
fé e a caridade são virtudes diferentes, embora aquele a quem falta a
fé, falte-lhe também a caridade, o cisma e a heresia são também vícios
diferentes, embora todo herege seja também cismático, não, porém, o
inverso. É o que diz Jerônimo: “Entre o cisma e a heresia penso que há
esta diferença: a heresia professa um dogma pervertido, enquanto o cisma
separa da Igreja”.
No entanto,
assim como a perda da caridade é caminho para a perda da fé, segundo a
primeira Carta a Timóteo (1, 6): “Por se terem afastado (da caridade e
das coisas deste gênero), alguns se perderam em vãos palavreados”, assim
também o cisma é caminho para a heresia. Por isso Jerônimo acrescenta
que “o cisma, no início, pode, de certa maneira, ser considerado
diferente da heresia; mas não há nenhum cisma que não modele para si
mesmo alguma heresia para justificar seu afastamento da Igreja.
Suma Teológica II-II, q. 39, a.1
Nenhum comentário:
Postar um comentário