Por A. David Anders, PhD/ Fonte: Coming Home
Network/ Tradução: Tonynho Campos
Eu fui criado como um protestante
evangélico, em Birmingham, no Alabama. Meus pais eram amorosos e dedicados,
sinceros em sua fé, e profundamente envolvidos em nossa igreja. Eles incutiram
em mim o respeito pela Bíblia como a Palavra de Deus, e um desejo e uma fé viva
em Cristo.
Missionários frequentavam nossa casa e
traziam o seu entusiasmo pelo seu trabalho. As estantes em nossa casa estavam
cheias de livros de teologia e apologética. Desde cedo, eu absorvi a noção de
que a minha maior vocação era ensinar a fé cristã. Suponho que não seja nenhuma
surpresa que eu tenha me tornado um historiador da Igreja, mas me tornar um
católico era a última coisa que eu esperava.
A igreja da minha família era nominalmente
Presbiteriana, mas as diferenças denominacionais significavam muito pouco para
nós. Eu frequentemente ouvia que divergências sobre o batismo, a ceia, ou o
governo da igreja do Senhor não eram importantes, desde que eu acreditasse no Evangelho.
Assim, queríamos dizer que a pessoa deve “nascer de novo”, que a salvação é
pela fé, e que a Bíblia é a única autoridade para a fé cristã. Nossa igreja apoiava
os ministérios de muitas denominações protestantes diferentes, mas o grupo
certamente estava em oposição a Igreja Católica.
O mito de uma “recuperação” protestante do
Evangelho era forte em nossa igreja. Eu aprendi muito cedo a idolatrar os
reformadores protestantes Martinho Lutero e João Calvino, porque supostamente
haviam resgatado o Cristianismo das trevas do Catolicismo medieval. Os
católicos eram os que confiavam nas “boas obras” para levá-los para o céu, que
se renderam à tradição ao invés das Escrituras, e que adoravam Maria e os
santos em vez de Deus. Sua obsessão com os sacramentos também criou um enorme
obstáculo para a verdadeira fé e um relacionamento pessoal com Jesus. Não havia
dúvida. Os católicos não eram verdadeiros cristãos.
Nossa igreja era caracterizada por uma
espécie de intelectualismo confiante. Presbiterianos tendem a ser bastante ou
teologicamente intelectuais, e professores de seminário, apologistas,
cientistas e filósofos eram os oradores frequentes de nossas conferências. Foi
essa atmosfera intelectual que atraiu o meu pai para a igreja, e suas estantes
estavam lotadas com as obras do reformador João Calvino, e do puritano Jonathan
Edwards, bem como autores mais recentes como B.B. Warfield, A.A. Hodge, C.S.
Lewis e Francis Schaeffer. Como parte dessa cultura acadêmica, tomávamos como
certo que a investigação honesta levaria alguém a nossa versão da fé cristã.
Todas estas influências deixaram impressões
definitivas sobre mim como uma criança. Eu comecei a achar o Cristianismo um
pouco parecido com a física newtoniana. A fé cristã consistia em certas leis eminentemente
razoáveis e imutáveis, e a você estava garantida a vida eterna, desde que você
tivesse construído a sua vida de acordo com esses princípios.
Eu também pensava que esta era a mensagem claramente enunciada no livro oficial
da teologia cristã: a Bíblia. Somente a confiança irracional na tradição humana
ou a indiferença depravada poderia explicar o fracasso de alguém se agarrar a
estas simples verdades.
Havia uma estranha ironia neste ambiente
altamente religioso e teológico. Deixava-se claro que era a fé e não as obras
que salvavam. Também se confessava a crença protestante clássica de que todas
as pessoas estão “totalmente depravadas”, o que significa que até mesmo os seus
melhores esforços morais são intrinsecamente odiosos para Deus e nada podem
merecer. No momento em que cheguei a escola, eu coloquei essas peças e conclui
que a prática religiosa e o esforço moral eram mais ou menos irrelevantes para
a minha vida. Não que eu tenha perdido a minha fé. Pelo contrário, eu a absorvi
completamente. Eu tinha aceitado a Cristo como meu Salvador e era um
“renascido”. Eu acreditava que a Bíblia era a palavra de Deus. Eu também acreditava que
nenhum dos meus trabalhos religiosos ou morais tinha qualquer valor. Então eu
parei de praticá-los.
Felizmente, a minha indiferença durou apenas
alguns anos, e eu tive uma verdadeira reconversão à fé na faculdade. Descobri que a minha
necessidade de Deus era mais profunda do que um simples “seguro contra
incêndio”. Eu também conheci uma linda garota com quem eu
comecei a ir aos cultos protestantes. Jill tinha sido criada nominalmente
católica, mas não conseguiu manter-se na prática de sua fé após a Confirmação.
Juntos, nós nos encontrávamos crescendo mais profundamente na fé protestante, e
depois de alguns meses, ambos nos tornamos desiludidos com a atmosfera mundana
da nossa Universidade de Nova Orleans. Concluímos que o Centro-Oeste americano
e a faculdade evangélica Wheaton College iria nos proporcionar um ambiente mais
espiritual, e nos transferimos os dois no meio do nosso segundo ano (em Janeiro
de 1991).
Wheaton College, é um farol para cristãos
evangélicos sinceros vindos de várias origens. Protestantes de diversas
denominações diferentes ficam representados, unidos em seu compromisso com
Cristo e a Bíblia. Minha infância me ensinou que a teologia, a apologética e o
evangelismo eram a maior vocação do cristão, e eu encontrei-os todos em oferta
abundante na Wheaton College. Foi aí que pensei pela primeira vez em
comprometer a minha vida ao estudo da teologia. Foi também na Wheaton College
que Jill e eu nos tornamos noivos.
Depois da formatura, Jill e eu nos casamos,
e finalmente, fizemos o nosso caminho para a Universidade Evangélica Trindade
Divina, em Chicago. O meu objetivo era ter uma educação de seminário, e
eventualmente, completar o meu grau de Ph.D. Eu queria me tornar um daqueles
professores de teologia que admirava tanto na igreja durante a minha juventude.
Atirei-me no seminário abandonando tudo. Eu
amei meus cursos de teologia, da Escritura e da história da Igreja, e eu
prosperei sobre a fé, confiança e sentido de missão que permeavam a escola. Eu
também abracei a sua atmosfera anti-católica. Eu estava lá em 1994, quando o
documento “Evangélicos e Católicos Juntos” foi publicado pela primeira vez e a
faculdade foi quase que uniformemente hostil a ele. Eles viam qualquer
compromisso com os católicos como sendo uma traição a Reforma. Os católicos não
eram simplesmente irmãos no Senhor. Eles eram apóstatas.
Eu aceitava as atitudes anti-católicas de
meus professores de seminário, por isso, quando chegou a hora de seguir em
frente nos meus estudos, decidi me focar em um estudo histórico da Reforma. Eu pensava que não
poderia haver uma preparação melhor, para atacar a Igreja Católica e ganhar
convertidos, do que conhecer profundamente as mentes dos grandes líderes de
nossa fé – Martinho Lutero e João Calvino. Eu também queria
entender toda a história do Cristianismo para que pudesse colocar a Reforma no
contexto. Eu queria ser capaz de mostrar como a igreja medieval tinha
abandonado a verdadeira fé e como os reformadores tinham recuperado ela. Para
este fim, comecei estudos de Ph.D. em teologia histórica na Universidade de
Iowa. Eu nunca imaginava que a história da Reforma da Igreja iria me levar a
Igreja Católica.
Antes que começasse meus estudos em Iowa,
Jill e eu testemunhamos o nascimento do nosso primeiro filho, um menino. Seu
irmãozinho nasceu menos de dois anos depois, e uma irmã chegou antes de sairmos
de Iowa (e agora temos cinco filhos). Minha esposa estava muito ocupada
cuidando das crianças, enquanto eu me comprometia quase que inteiramente aos
meus estudos.
Vejo hoje que eu passei muito tempo na biblioteca e não tempo suficiente com a
minha esposa, meus filhos e minha filha. Eu acho que justifica
essa negligência a confiança no meu senso de missão. Eu tinha uma vocação –
para testemunhar a fé através do estudo teológico – e uma visão intelectual da
fé cristã do meu dever cristão. Para os cristãos evangélicos, o que se acredita
ser mais importante é o que a pessoa vive. Eu estava aprendendo a defender e
promover essas crenças. O que poderia ser mais importante?
Eu comecei meus estudos de doutorado em
Setembro de 1995. Fiz cursos no início, de história medieval e da Reforma da
Igreja. Eu li os Padres da Igreja, os teólogos escolásticos, e os reformadores
protestantes. Em cada etapa, tentei relacionar teólogos posteriores aos
anteriores, e todos eles com as Escrituras. Eu tinha um objetivo de justificar
a Reforma e isso significava, acima de tudo, investigar a doutrina da
“justificação pela fé”. Para os protestantes, esta é a doutrina mais importante
“recuperada” pela Reforma.
Os reformadores insistiam em que eles
estavam seguindo a antiga igreja ao ensinar a “Sola Fide”, e como prova
apontavam para os escritos do Padre da Igreja, Santo Agostinho de Hipona
(354-430). Meus professores de seminário também apontavam para Agostinho como a
fonte originária da teologia protestante. A razão para isso era o interesse de
Agostinho nas doutrinas do pecado original, graça e justificação. Ele foi o
primeiro dos Padres a tentar uma explicação sistemática desses temas paulinos.
Ele também colocou um nítido contraste entre “obras” e “fé” (veja sua obra
“Sobre o Espírito e a Letra”, 412 A.D.). Ironicamente, foi a minha investigação desta
doutrina e de Santo Agostinho, o que começou a minha jornada para a Igreja
Católica.
Minha primeira dificuldade surgiu quando
comecei a entender o que realmente Santo Agostinho ensinou sobre a salvação. Em
poucas palavras, Agostinho rejeitou a “Sola Fide”. É verdade que ele tinha um
grande respeito pela fé e graça, mas via estas principalmente como a fonte de
nossas boas obras. Agostinho ensinou que nós literalmente “merecemos” a vida eterna,
quando nossas vidas são transformadas pela graça. Isto é completamente
diferente do ponto de vista protestante.
As implicações de minha descoberta foram
profundas. Eu não sabia o suficiente dos meus dias de faculdade e seminário
para entender que Agostinho ensinava nada menos que a doutrina católica romana
da justificação. Decidi passar então para os Padres mais antigos da Igreja em
minha busca pela “fé pura” da antiguidade cristã. Infelizmente, os Padres mais
antigos da Igreja eram ainda de menos ajuda do que Agostinho.
Agostinho vinha do Norte da África de fala
de língua Latina. Outros vieram da Ásia Menor, Palestina, Síria, Roma, Gália, e
do Egito. Eles representavam diferentes culturas, falavam línguas diferentes, e
foram associados a diferentes apóstolos. Eu pensei que seria possível que
alguns deles pudessem ter entendido mal o Evangelho, mas parecia improvável que
todos iriam se confundir. A verdadeira fé tinha de estar representada em algum
lugar do mundo antigo. O único problema era que eu não poderia encontrá-la. Não importa para onde eu
olhasse, em qualquer continente, em qualquer século, os Padres concordavam: a
salvação vem por meio da transformação da vida moral e não somente pela fé.
Eles também ensinaram que essa transformação começa e é alimentada nos
sacramentos, e não através de alguma experiência de conversão individual.
Nesta fase da minha jornada eu estava
ansioso para continuar a ser um protestante. Toda a minha vida, casamento,
família e carreira, estavam ligados ao protestantismo. As minhas descobertas na
história da Igreja eram uma enorme ameaça para a minha identidade, então eu me
virei para os estudos bíblicos a procura de conforto e ajuda. Eu pensei que se
eu pudesse ficar absolutamente confiante no recurso dos reformadores com as
Escrituras, então eu basicamente poderia demitir 1500 anos de história cristã.
Evitei a academia católica, ou livros que eu achava que tinham a intenção de
minar a minha fé, e preferi me concentrar no que eu achava que eram as obras
protestantes mais objetivas, históricas e também de erudição bíblica. Eu estava
procurando por uma prova sólida de que os reformadores estavam certos em sua
compreensão de Paulo. O que eu não sabia era que os melhores da academia protestante do
Século XX já haviam rejeitado a leitura de Lutero da Bíblia.
Lutero baseou toda a sua rejeição da Igreja
sobre as palavras de Paulo: “Uma pessoa é justificada pela fé,
independentemente das obras da lei” (Romanos 3, 28). Lutero assumiu que este
contraste entre “fé” e “obras” significava que não havia papel para a moralidade no
processo da salvação (de acordo com a visão tradicional protestante, o
comportamento moral é uma resposta para a salvação, mas não um fator
contribuinte). Eu aprendi que os primeiros Padres da Igreja
rejeitaram essa visão. Agora eu havia encontrado toda uma série de estudiosos
protestantes também dispostos a testemunhar que isso não é o que Paulo quis
dizer.
Os Padres da Igreja do Século II acreditavam
que Paulo havia rejeitado a relevância somente da lei judaica para a salvação
(“obras da lei” = lei mosaica). Eles viam a fé como a entrada para a vida da
Igreja, os sacramentos, e o Espírito. A fé nos admite os meios da graça, mas
não é em si um motivo suficiente para a salvação. O que eu vi nos mais recentes
e altamente respeitados estudiosos protestantes é o mesmo ponto de vista. A
partir do último terço do Século XX, estudiosos como E.P. Sanders, Krister
Stendhal, James Dunn e N. T. Wright, têm argumentado que o protestantismo tradicional
interpretou profundamente mal a Paulo. De acordo com Stendhal e outros, a
justificação pela fé é principalmente sobre as relações entre judeus e gentios,
e não sobre o papel da moralidade como condição de vida eterna. Juntos, o seu
trabalho tem sido referido como “A Nova Perspectiva sobre Paulo”.
Minha descoberta desta “Nova Perspectiva”
foi um divisor de águas na minha compreensão das Escrituras. Eu vi, para
começar, que a “Nova Perspectiva”, era na verdade a “Velha Perspectiva” dos
primeiros Padres da Igreja. Comecei a testá-la contra a minha própria leitura
de Paulo e descobri que ela tinha sentido. Ela também resolveu a tensão de
longa data que eu sempre senti entre Paulo e o resto da Bíblia. Mesmo Lutero
tinha tido dificuldade em conciliar sua leitura de Paulo com o Sermão da
Montanha, a Epístola de São Tiago, e o Antigo Testamento. Uma vez que eu tentei
a “Nova Perspectiva” esta dificuldade desapareceu. Relutantemente, eu tive que
aceitar que os reformadores estavam errados sobre a justificação.
Essas descobertas no meu trabalho acadêmico
foram paralelas em certa medida a descobertas na minha vida pessoal. A teologia
protestante distingue fortemente crença de comportamento, e eu comecei a ver
como isso me afetou. Desde a infância, eu sempre tinha identificado teologia,
apologética e evangelismo como a mais alta vocação na vida cristã, enquanto as
virtudes deveriam ser meros frutos da crença correta. Infelizmente, descobri
que os frutos não estavam apenas faltando em minha vida, mas que minha teologia
tinha realmente contribuido para os meus vícios. Ela me fez censura, orgulhosa,
e argumentativa. Eu também percebi que tinha feito a mesma coisa para os meus
heróis.
Quanto mais eu aprendia sobre os
reformadores protestantes, menos pessoalmente eu gostava deles. Eu reconheci
que o meu próprio fundador, João Calvino, era um homem arrogante e
auto-importante, que foi brutal para com os seus inimigos, nunca aceitou a
responsabilidade pessoal, e condenava a qualquer um que não concordasse com
ele. Ele chamou a si mesmo de profeta e atribuiu autoridade divina ao seu
próprio ensino. Isto contrasta totalmente com bastante do que eu estava
aprendendo sobre os teólogos católicos. Muitos deles eram santos, significando
que eles tinham vivido vidas de abnegação e caridade heroica. Mesmo os maiores
deles – homens como Santo Agostinho e São Tomás de Aquino – também reconheciam
que eles não tinham autoridade pessoal para definir o dogma da Igreja.
Exteriormente, permaneci firmemente anti-católico. Continuei a
atacar a Igreja e a defender a Reforma, mas interiormente eu estava em uma
agonia psicológica e espiritual.
Descobri que minha teologia e todo o trabalho da minha vida foram fundamentados
em uma mentira, e que a minha própria vida ética, moral e espiritual estava
profundamente carente. Eu estava perdendo rapidamente a minha motivação para
contestar o Catolicismo, e em vez disso eu queria simplesmente saber a verdade.
Os reformadores protestantes tinham justificado a sua revolta por um apelo à
“Sola Scriptura”. Meus estudos da doutrina da justificação tinham me mostrado
que a Escritura não era o guia tão claro como os reformadores alegavam. E se
todo o seu apelo a “Sola Scriptura” fosse equivocado? Por que, afinal, eu
trataria a “Sola Scriptura” como a autoridade final?
Quando eu levantei essa questão para mim,
percebi que eu não tinha uma boa resposta. A verdadeira razão pela qual apelava
para a “Sola Scriptura” era que isso é o que havia me sido ensinado. Ao estudar
o assunto, descobri que nenhum protestante já deu uma resposta satisfatória
para esta pergunta. Os reformadores realmente não defenderam a doutrina da
“Sola Scriptura”. Eles simplesmente afirmaram ela. Pior ainda, eu aprendi que
os teólogos protestantes modernos que tentaram defender a “Sola Scriptura” o
fizeram com um apelo à tradição. Isso me parecia ilógico. Eventualmente, eu
percebi que a “Sola Scriptura” não está nem mesmo nas Escrituras. A doutrina é
auto-refutável. Vi também que os primeiros cristãos não sabiam mais de “Sola
Scriptura”, do que haviam conhecido de “fé”. Sobre as questões de como somos
salvos e como definimos a fé, os cristãos mais antigos encontravam o seu centro
na Igreja. A
Igreja era tanto a autoridade sobre a doutrina cristã, bem como o instrumento
de salvação.
A Igreja era a questão para a qual eu continuava me voltando. Os
evangélicos tendem a ver a Igreja como simplesmente uma associação de fiéis
unidos mentalmente. Até mesmo os
reformadores, Lutero e Calvino, tinham uma visão muito mais forte da Igreja do
que isso, mas os antigos cristãos tinham a doutrina mais sublime de todas. Eu
costumava ver sua ênfase na Igreja como anti-bíblica, ao contrário da “fé”, mas
eu comecei a perceber que era minha tradição evangélica que era anti-bíblica.
A Escritura ensina que a Igreja é o Corpo de
Cristo (Efésios 4, 12). Os evangélicos tendem a descartar isso como mera
metáfora, mas os antigos cristãos pensavam nisso como, literalmente, embora
misticamente, a verdade. São Gregório de Nissa disse: “Aquele que contempla a
Igreja realmente contempla Cristo.” Enquanto eu pensava sobre isso, eu percebia
que ele disse uma verdade profunda sobre o significado bíblico da salvação. São
Paulo ensina que os batizados foram unidos a Cristo na sua morte, para que
também eles fossem unidos a ele na ressurreição (Romanos 6, 3-6). Esta união,
literalmente, torna o cristão um participante da natureza divina (2 Pedro 1,
4). Santo Atanásio poderia até dizer, “Ele se fez homem para que pudéssemos ser
elevados a Deus” (De Incarnatione, 54,3). A antiga doutrina da Igreja agora
fazia sentido para mim, porque eu via que a própria salvação nada mais é que a
união com Cristo e um crescimento contínuo em sua natureza. A Igreja não é uma
mera associação de pessoas com interesses semelhantes. É uma realidade
sobrenatural porque compartilha da vida e ministério de Cristo.
Essa percepção também fazia sentido na doutrina sacramental da
Igreja. Quando a Igreja batiza, absolve os pecados, ou acima de tudo, oferece o
Santo Sacrifício da Missa, é realmente Cristo quem batiza, absolve e oferece o
seu próprio Corpo e Sangue. Os sacramentos não diminuem a Cristo. Eles o tornam
presente.
As Escrituras são bastante simples sobre os
sacramentos. Se você tomá-los literalmente, você deve concluir que o batismo é
o “banho de renascimento e renovação pelo Espírito Santo” (Tito 3, 5). O que
Jesus quis dizer quando disse: “A minha carne é verdadeira comida e o meu
sangue é verdadeira bebida” (João 6, 55). Ele não estava mentindo quando ele
prometeu “a quem perdoardes os pecados lhes serão perdoados” (João 20, 23).
Isto é exatamente como os antigos cristãos entendiam os sacramentos. Eu já não
podia acusar os antigos cristãos de serem anti-bíblicos. Por que razão eu
deveria rejeitá-los em tudo?
A antiga doutrina cristã da Igreja também
fez sentido na questão da veneração dos santos e mártires. Eu aprendi que a
doutrina católica sobre os santos é apenas um desenvolvimento desta doutrina
bíblica do Corpo de Cristo. Os católicos não adoram os santos. Eles veneram a
Cristo em seus membros. Ao invocar a sua intercessão, os católicos apenas confessam que Cristo
está presente e operante na sua Igreja no céu. Os protestantes
frequentemente objetam que a veneração dos santos católicos de alguma forma
diminui o ministério de Cristo. Eu comecei a entender agora que o inverso é a
verdade. São os protestantes que limitam o alcance da obra salvadora de Cristo,
negando suas implicações para a doutrina da Igreja.
Meus estudos mostraram essa teologia
concretizada na devoção da Igreja antiga. Conforme eu continuava a minha
investigação de Santo Agostinho, eu aprendia que esse “herói protestante”
abraçou completamente a veneração de santos. Peter Brown (nascido em 1935), um
estudioso de Santo Agostinho, também me ensinou que os santos não estavam
relacionados com o Cristianismo antigo. Ele argumentou que não se pode separar
o Cristianismo antigo da devoção aos santos, e ele colocou Santo Agostinho
diretamente nesta tradição. Brown mostrou que esta não era uma mera importação
pagã no Cristianismo, mas sim estava ligado intimamente à noção cristã de
salvação (Veja “O Culto dos Santos: A Sua Origem e Função no Cristianismo
Latino”).
Quando entendi a posição católica sobre a salvação, a Igreja e os
santos, os dogmas marianos também pareciam se encaixar. Se o coração da fé
cristã é a união de Deus com a nossa natureza humana, a Mãe desta natureza
humana tem um papel extremamente importante e único em toda a história. Por isso, os Padres da Igreja sempre celebraram Maria como
a segunda Eva. O seu “sim” a Deus na anunciação desfez o “não” de Eva no
jardim. Se era apropriado, venerar os santos e mártires da Igreja, quanto mais
apropriado não seria dar honra e veneração a ela que tornou possível nossa
redenção?
No momento em que eu terminei meu doutorado,
eu tinha revisto completamente a minha compreensão da Igreja Católica. Vi que a sua doutrina
sacramental, a sua visão da salvação, sua veneração a Maria e aos santos, e
suas reivindicações de autoridade estavam todas fundamentadas nas Escrituras,
nas
tradições mais antigas, e no claro ensino de Cristo e dos apóstolos.
Eu também
percebi que o protestantismo era uma massa confusa de inconsistências e lógica
torturada. Não só era falsa a doutrina protestante, mas criava
contenção, e não poderia mesmo permanecer inalterada. Quanto mais eu estudava,
mais eu percebia que a minha herança evangélica tinha me movido para longe não
só do Cristianismo antigo, mas mesmo a partir do ensino de seus próprios
fundadores protestantes.
Os evangélicos americanos modernos ensinam
que a vida cristã começa quando você “convida Jesus a entrar em seu coração”. A
conversão pessoal (o que eles chamam de “nascer de novo”) é vista como a
essência e o começo da identidade cristã. Eu sabia a partir de minha leitura
dos Padres que este não era o ensino da Igreja primitiva. Eu aprendi estudando
os reformadores que não era nem mesmo o ensino dos primeiros protestantes.
Calvino e Lutero tanto inequivocamente identificavam o batismo como o início da
vida cristã. Eu procurei em vão em suas obras por qualquer exortação ao “novo
nascimento”. Eu
também aprendi que não descartavam a Eucaristia como sem importância, como eu o
fazia. Enquanto eles rejeitavam a teologia católica sobre os sacramentos, ambos
continuaram a insistir que Cristo está realmente presente na Eucaristia.
Calvino mesmo ensinou em 1541 que uma compreensão adequada desta Eucaristia é
“necessária para a salvação”. Ele não sabia nada do individualista, do
Cristianismo do “novo nascimento” no qual eu havia crescido.
Terminei a minha licenciatura em Dezembro de
2002. Os últimos anos de meus estudos foram realmente muito obscuros. Mais e
mais, parecia-me que os meus planos estavam ficando desequilibrados, e o meu
futuro na escuridão. Minha confiança ficou muito abalada e eu realmente
duvidava, que eu poderia acreditar em qualquer coisa. O Catolicismo começou a
me parecer como a interpretação mais razoável da fé cristã, mas a perda da fé
de minha infância foi demolidora. Orei por orientação. No
final, eu creio que foi a graça que me salvou. Eu tinha uma esposa e quatro
filhos, e Deus finalmente me mostrou que eu precisava de mais do que os livros
em minha vida. Sinceramente, eu também precisava de mais do que “somente a fé”.
Eu precisava de ajuda real para viver a minha vida e batalhar contra os meus
pecados. Encontrei isso nos sacramentos da Igreja.
Em vez da “Sola Scriptura”: eu precisava da
orientação verdadeira de um professor com autoridade. Encontrei isso no
Magistério da Igreja. Descobri realmente que toda a minha companhia eram os
santos no céu – e não apenas os seus livros sobre a terra. Em suma, eu descobri
que a Igreja Católica foi idealmente formada para atender as minhas
necessidades espirituais reais. Além de verdade, descobri Jesus em sua Igreja,
através de sua Mãe, e em toda a companhia dos seus santos. Entrei na Igreja Católica
em 16 de Novembro de 2003. Minha esposa também tinha sua própria aversão contra
as profundezas da Igreja e hoje minha família é uma família feliz e
entusiasticamente católica. Agradeço aos meus pais por me apontarem Cristo e as
Escrituras. Agradeço a Santo Agostinho por me apontar a Igreja.
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