Exposição Doutrinal
1. A Alma cândida de Maria voara para o Céu, por entre os cânticos de coros celestiais, segundo refere uma tradição antiquíssima.1
Os Apóstolos sepultaram piedosamente o sagrado Corpo de sua Mãe e Rainha.
Três dias depois, assim conta a Tradição, chegou o Apóstolo Tomé. Pesaroso por não ter podido assistir à morte da Mãe de Deus, insistiu com os Apóstolos em que lhe abrissem o sepulcro, para que pudesse contemplar pela última vez, o rosto virginal de Maria.
Os Apóstolos cederam. Mas, quando abriram o túmulo, encontraram-no vazio. Só acharam os lençóis de linho, alvíssimos, que exalavam um perfume celestial.
Não restava dúvida, de que aprouve a Deus, fosse Maria elevada ao Céu “com Corpo e com Alma”.
A Santa Igreja, celebrando solenemente a festa da Assunção de Maria, desde o sexto século, admite esse fato como verdadeiro, tendo-o definido como dogma de fé, na festa de Todos os Santos, em 1950.
De certo, não convinha, que o Corpo de Maria, imaculado ao ser concebido e ao nascer, puro e ilibado a vida inteira, sofresse a corrupção do túmulo, como os corpos dos pecadores. Pelo contrário, convinha que a Virgem, que trouxe em suas puríssimas entranhas o Corpo do Filho de Deus e o alimentava e abraçava, se encontrasse também corporalmente no Céu, com o seu Filho diletíssimo.
Santo Tomás de Aquino, falando da consequência e maldição do pecado, declara: “Tanto os homens, como as mulheres hão de voltar ao pó do qual foram tirados. Porém, disto foi isenta a Virgem Santíssima, pois, foi assunta ao Céu com Corpo. Cremos que foi ressuscitada da morte e levada ao Céu”.2
2. Quem, entre os homens mortais, seria capaz de só palidamente imaginar ou descrever o imenso júbilo com que os coros celestiais acompanharam a Mãe de Deus, em sua entrada no Céu?
“Quem é esta que sobe?” Assim teriam perguntado uns aos outros, os espíritos celestes, que aguardavam a subida da Imaculada, pasmados de sua inefável beleza. “Quem é esta que sobe como a aurora, quando se levanta, formosa como a lua, brilhante como o sol, terrível como um exército formado em batalha? Quem é esta que sobe do deserto, inebriada de delícias, apoiada sobre o seu amado?”3
Este, seu amado Jesus, indo ao encontro de sua Mãe dulcíssima, tê-la-ia convidado e chamado com as meigas frases repassadas de amorosas saudades do Cântico dos Cânticos: “Levanta-te, amiga minha, pomba minha, formosa minha, e vem; porque já passou o inverno, já se foram e cessaram as chuvas – as lágrimas e sofrimentos do teu exílio terrestre! Vem, e mostra-me a tua face, ressoe a tua voz aos meus ouvidos, porque a tua voz é doce e a tua face graciosa; vem esposa minha, vem e serás coroada”.4
Com efeito, conduzida por seu amado Jesus até o trono do Pai celeste, Este coroa a sua dileta Filha com o diadema do poder, para que se torne a “Rainha do Céu e da terra”.
O Verbo Encarnado coroa sua Mãe Imaculada com o diadema de sabedoria, para que se torne nossa “Mestra e Sede da Sabedoria”.
O Espírito Santo coroa sua castíssima Esposa com o diadema do amor e da graça, para que se torne a “Medianeira e Dispensadora das graças divinas”.
Numa Antífona das Laudes da festa do Sacratíssimo Rosário, a Santa Igreja canta: “Foi exaltada a Virgem Maria sobre os coros dos Anjos e coroada com uma coroa de doze estrelas”. E numa outra Antífona da festa da Assunção: “Hoje a Virgem Maria subiu ao Céu; alegrai-vos, porque reina com Cristo, para sempre”.
Ora, é precisamente por esta razão de ser elevada ao Céu e constituída como Rainha do Céu e da terra, que Maria continua a exercer entre os mortais, com maior poder e eficácia e com redobrado interesse, o seu “Apostolado da salvação das almas e da assistência à Igreja Católica.
Consideração Prática
1. “Sursum corda!” – assim nos admoesta e anima a Santa Igreja no Prefácio da Santa Missa – “Levantai os vossos corações!”
É para o Céu que devemos dirigir os nossos pensamentos, os nossos desejos, as nossas ações, toda a nossa existência. Para o Céu, donde saímos e para onde havemos de voltar.
“Fazei tudo para glória de Deus”, nos exorta o Apóstolo São Paulo.5
Daí, Santo Inácio de Loyola, formou a sua sentença e divisa: “Omnia ad maiorem Dei gloriam”. É este, justamente, o programa do “Apostolado de nossa vida”: “A glória de Deus e, por conseguinte, a salvação das almas”.
Mas, a maior parte da humanidade parece ter esquecido a finalidade de sua vida. “Nada tão comum entre os homens”, lamenta o Papa Pio XI, “como o desprezo dos bens do Céu e a ambição desordenada dos bens passageiros da terra. Quase toda a humanidade vive mergulhada na matéria, sem preocupar-se do que lhe está reservado no além. É preciso espiritualizar o homem”.6
De fato, quem não acredita na eternidade e na imortalidade da alma humana ou, mesmo acreditando, não se importa com as coisas espirituais e religiosas, não é capaz de compreender e, muito menos de exercer um apostolado que visa os interesses de Deus.
Pelo contrário, quanto mais espiritual for o homem, desprendido das consequências e ambições terrenas e unido a Deus, tanto mais eficaz e frutífero será o seu Apostolado. Desta verdade indiscutível temos exemplos e provas nos Santos da nossa Igreja, os quais foram todos heróis no exercício do Apostolado Católico.
De todos os Santos e Apóstolos, porém, a mais heroica e mais poderosa foi e é a Mãe de Deus, pela razão de ser Ela a mais desapegada das coisas terrestres, a mais elevada de espírito e a mais unida a Deus. Por isso, a reconhecemos e veneramos como a “Rainha do Apostolado Universal”.
2. Uma das mais excelentes e mais eficientes instituições da Igreja Católica é a “Companhia de Jesus”, dos Padres Jesuítas, cujo lema “Ad Maiorem Dei Gloriam”, é o Alfa e Ômega de sua atividade apostólica.
Não é, de certo, por acaso que o dia da fundação desta Ordem Religiosa coincide com o dia da festa da “Assunção de Nossa Senhora”.
Os Padres Jesuítas reconhecem e celebram, de fato, esta data como o dia natalício de sua Ordem, visto que em 15 de Agosto de 1534 Santo Inácio de Loyola e os seus primeiros companheiros fizeram, na Igreja de Nossa Senhora de Montmartre, em Paris, os votos religiosos, com o fim de dedicar-se inteiramente à salvação das almas, sob a obediência ao Sumo Pontífice.
Não menos memorável é o fato que 15 anos depois, São Francisco Xavier, um dos mais eminentes Apóstolos da Companhia de Jesus e Padroeiro das Missões da Igreja Católica, se apeasse na terra do Japão, precisamente na festa da “Assunção de Maria”.
Por isso, os japoneses católicos celebravam sempre solenemente esta data como o dia feliz de sua salvação.
Muitas das igrejas e capelas que se construíram, foram dedicadas à gloriosa Rainha do Céu. A maior e mais bonita de todas foi a do porto de Nagasaki, inaugurada e consagrada em 15 de Agosto de 1601, festa de Nossa Senhora da Assunção.
O quanto Maria Santíssima se empenhava em proteger a missão japonesa e as suas obras, demonstra o seguinte fato maravilhoso: Passados apenas 8 dias, depois da solene consagração do Santuário de Nagasaki, um enorme incêndio incinerou, em menos de 6 horas, a metade daquela cidade, sendo que as casas todas eram construídas de madeira.
Como o fogo ameaçasse também a igreja recém-construída, os cristãos puseram-se a suplicar, com instâncias, a Rainha celeste, para que conservasse incólume o Santuário e não permitisse que os pagãos se burlassem de sua confiança e de sua fé cristã.
A Mãe de Deus não tardou em atender as ardentes preces de seus bons filhos; pois que, de repente, se levantou um vento diretamente oposto ao primeiro, que afastava as chamas que ameaçavam a igreja, pondo-a fora de todo perigo.
Reconhecendo neste fato maravilhoso a intervenção celeste, muitos daquela população pagã resolveram abraçar o Cristianismo.7
Reconhecendo também, da nossa parte, o poder e o interesse da gloriosa Rainha celeste em nosso bem-estar temporal e eterno, rezemos com confiança a Oração da Santa Igreja: “Ó Deus e Senhor Nosso, havendo participado do banquete celeste, imploramos a vossa clemência, a fim de que, celebrando a Assunção da Mãe de Deus, sejamos por sua intercessão livres dos males que nos ameaçam neste mundo. Pelo mesmo Jesus Cristo, Nosso Senhor”. Amém.8
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Fonte: Rev. Pe. Dr. Erasmo Raabe, S.A.C., “Regina Mundi – Considerações doutrinal-práticas em trinta e três capítulos para os meses e festas de Maria”, 2ª Parte, Cap. XXIV, pp. 129-134. 2ª Edição, Edições Paulinas, São Paulo, 1954.
1. S. João Damasceno – die 4º infra Oct. Assumptionis, lectio 5.
2. Summa Teol., III. q. 27. et q. 83 ad 8.
3. Cânt., 6, 9; 8, 5.
4. Cânt., 2, 10-14; 4, 8.
5. I Cor., 10, 31.
6. Putorti, “A Maior das maravilhas”, a Santa Missa, p. 133.
7. Geminiano Mislei, S.J., “La Madre di Dio”, Venezia, 1859.
8. Postcom. da Festa da Assunção.
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