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"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

quarta-feira, 6 de outubro de 2021

SANTA TERESINHA E O ESPÍRITO SANTO.


Qui Spiritu Dei aguntur… ii sunt filii Dei”.1 “Os que são conduzidos pelo Espírito Santo… estes são filhos de Deus”. A característica de Teresa é a infância cristã: sua pequena via é a “Via da infância”. Ela é o tipo concreto do “filho de Deus” segundo o Evangelho. Ora, São Paulo diz explicitamente: “Os filhos de Deus são os que se deixam conduzir pelo Espírito de Deus”. Parece-me que temos aqui a explicação teológica da vida e da espiritualidade de Santa Teresa do Menino Jesus.

Todo mundo está de acordo que o ascetismo tem por fim submeter as almas à ação interior do Espírito Santo. A razão teológica é que, só o Espírito Santo, Deus, opera na alma; Ele é o Único que pode aí produzir a vida sobrenatural, a vida divina, a santidade. Todo mundo concorda, mas nem todos colocam, igualmente, este princípio, na base do trabalho ascético. Certos métodos deixam este princípio quase na sombra; praticamente, parecem mostrar à alma que tudo depende, antes de tudo e principalmente de seu trabalho, de seus esforços pessoais, de suas resoluções múltiplas e complicadas.

Em vez de dilatar a alma, fazê-la sair de si mesma, orientando-a para Deus, pela fé no amor, pela humildade e confiança, esses métodos voltam-na sobre si, fazem-na analisar-se, consumir-se, muitas vezes, marcando passo em esforços laboriosos. Diz-se às almas que é preciso rezar, porque sem Deus nada se faz; mas, praticamente, em vez de colocar a alma sob a ação de Deus, faz-se com que ela se volte sobre si; em lugar de levá-la a sair de si, para deixar-se aperfeiçoar-se em si. Daí esses processos complicados para praticar cada uma das virtudes com graus indefinidamente multiplicados, com divisões e subdivisões sem fim.

É desses métodos, sem dúvida, que Teresa dizia:

Às vezes quando leio certos tratados em que a perfeição é apresentada através de mil entraves, meu pobre e pequeno espírito bem depressa se cansa; fecho o sábio livro que me quebra a cabeça e desseca o coração e tomo a Sagrada Escritura. Então, tudo se me torna luminoso… a perfeição parece-me fácil: vejo que basta reconhecer seu nada e abandonar-se, como uma criancinha nos Braços de Nosso Senhor”.

Qui Spiritu Dei aguntur, ii sunt filii Dei!” É quase literal! “Não posso compreender os belos livros e muito menos pô-los em prática! Teresa deixa-os para as grandes almas, alegra-se de ser pequena: porque só as crianças e aqueles que se lhes assemelham serão admitidos no Céu!2”.3

Esses métodos, confessemo-lo, colocam-nos, de fato, longe da simplicidade do Evangelho. A simplicidade é certamente o caráter do ascetismo de Teresa. Ela ensina às almas irem a Deus para que Ele as liberte de suas misérias; a deixar-se atrair por Ele, a esperar n’Ele e a entregar-se a Ele. Isso equivale a dizer que Teresa procura estabelecer e conservar a alma sob a ação e a direção do Espírito Santo. Sua vida não é mais do que a prática, extremamente sugestiva, desse princípio essencial de teologia ascética e mística: “Qui Spiritu Dei aguntur…”. Digo princípio teológico, pois, nesta conferência, encaro Teresa como teóloga. Confesso que jamais admirei bastante a solidez e a profundeza de sua teologia. Estou persuadido de que, sem o saber, sem perceber, ela foi teóloga, da mais profunda teologia, a única verdadeira: a vida de Deus em nós!



1ª Consideração


Considerarei duas páginas em sua obra. Quanto mais as medito, mais parecem condensar toda a doutrina ascética de Teresa.

A primeira é, a meu ver, numa linguagem extremamente simples e cândida, a expressão mesma do “Qui Spiritu Dei aguntur”… Leiamo-la:

Meu desejo, escreve Teresa, foi sempre de me tornar uma santa. Mas ah! Comparando-me aos Santos, constatei que existe entre eles e eu a mesma diferença que vemos na natureza, entre uma montanha cujos cumes se perdem nas nuvens e o grão de areia obscuro, calcado aos pés dos transeuntes. Em vez de me desanimar, pensei: Nosso Senhor não pode inspirar desejos irrealizáveis…”.4

Detenhamo-nos um instante: a Santinha raciocina, aqui, admiravelmente. Deus, o Espírito Santo nunca desperta desejos irrealizáveis numa alma. Suscita-os com a intenção de satisfazê-los, de cumulá-los, além mesmo do que podemos conceber e pedir!

Como os desejos são, pois, coisa divina nas almas! A palavra “Desejo” encontra-se a cada instante, em Teresa: só isto diz muito! Seus desejos pessoais tornaram-se clássicos, ultrapassam todo limite, toda medida razoável: são imensos, infinitos.

Pensei: Nosso Senhor não pode inspirar desejos irrealizáveis; portanto, posso aspirar à santidade apesar de minha pequenez. Crescer é impossível! Devo suportar-me tal qual sou, com minhas inúmeras imperfeições. Quero, todavia, procurar o meio de ir para o Céu, por uma viazinha bem reta, bem curta, uma peque via toda nova. Estamos no século das invenções: não se tem mais o trabalho de subir os degraus de uma escada: na casa dos ricos, um elevador a substitui vantajosamente. Desejei encontrar, também, um ascensor, para subir a rude escada da perfeição”.

Quantas almas dizem isto e permanecem desanimadas, ao pé da escada!

Então, fui procurar nos Livros Santos a indicação do Ascensor, objeto dos meus desejos. Li estas palavras saídas da boca da Sabedoria eterna: ‘Se alguém é pequeno, venha a mim!…’.5 Aproximei-me, pois, de Deus, adivinhando que eu descobrira o que procurava. Querendo saber ainda o que faria com o pequenino, continuei minhas pesquisas e eis o que encontrei: ‘Como a mãe acaricia seu filho, assim eu vos consolarei; vos trarei em meu regaço e vos embalarei sobre meus joelhos’.6 Ah! Jamais palavras mais doces, mais melodiosas vieram alegrar minha alma! O Ascensor que deve levar-me aos Céus são vossos braços, ó Jesus! Por isso, não preciso crescer; devo, ao contrário, ficar sempre pequenina e torná-lo cada vez mais”.7

Os “braços de Jesus” – traduzindo essa metáfora em linguagem teológica – é o Espírito de Jesus, o Espírito Santo e seus dons que são como braços que nos elevam! “Ascensor”: esta palavra é de uma justeza admirável para designar o Espírito Santo. É a palavra de São Paulo, sob uma metáfora moderna: “Qui Spiritu Dei aguntur”. Sob o ponto de vista da santidade é, realmente, o Espírito Santo que nos põe em movimento, nos impele, nos carrega, nos eleva até a perfeição do amor, até a santidade!

Que é preciso para isso? Humildade e confiança: “Si quis est parvulus veniat ad me!” Teresa, esclarecida pelo Espírito Santo, compreendeu perfeitamente esta palavra da Sabedoria: “Ser pequenino”, isto é, conhecer e amar sua impotência e, por conseguinte, “ir a Ele”, isto é, ao Amor Infinito: e é assim que nos pomos no “Ascensor”. Então, Ele nos eleva. Ele, e não nós mesmos. Basta-nos deixá-lO agir e seguirmos seu movimento ascendente; Ele nos eleva acima de nós mesmos, de nossas misérias e defeitos, e pouco a pouco nos liberta de nosso egoísmo. Eis sua obra essencial. Ele fará esta obra divina em nós, se o desejarmos, não contando absolutamente conosco mesmos para realizá-la, mas esperando n’Ele ilimitadamente, sem temor nem hesitação, esperando em seu Amor inteiramente gratuito e onipotente.

Desejo de amar, humildade, confiança! Eis tudo. Eis Teresa toda inteira, com sua santidade e espiritualidade. No princípio: desejo de amar a Deus, de amá-lO até a perfeição; depois, humildade: “si quis est parvulus”; em seguida, confiança: “veniat ad me”. A alma se entrega, coloca-se no Ascensor e é elevada: “Spiritu Deis aguntur”.

Ainda uma vez, depois de ter procurado reduzir a “Pequena Via” de Teresa a seus elementos teológicos, creio que toda sua doutrina se acha nesta página. Mas dirão: onde está a correção dos defeitos, a aquisição das virtudes, a cooperação humana no trabalho da perfeição? Estou certo de que, para Teresa, tudo isso estava magnificamente contido nesta simples fórmula: entregar-se a Deus com humildade e confiança. A alma deve ser sincera neste dom de si, tal qual ela é, com todos os seus defeitos e misérias ao Amor Misericordioso e Onipotente em quem ela crê. Em quem crê: vê-se aqui, a soberana importância da fé no Amor, no Amor Misericordioso pela miséria que nós somos. A alma não está, evidentemente dispensada de agir, de trabalhar, de se esforçar… Mas em tudo isso ela olha bem mais para Deus do que para si; pões sua confiança n’Ele… entrega-se à ação de Deus mais do que à sua ação pessoal: “Spiritu Dei aguntur”. Em tudo isso Deus tem o papel principal, o primeiro movimento, a primeira ação. Quando a alma age e se esforça não perde de vista que é antes de tudo levada por Deus, pelo Amor: sente-se amada! Daí sua confiança, sua força! Seus esforços são, por isso, humildes, suaves, pacíficos, sem agitação, nem impaciência, sem pressa nem inquietação, sobretudo, sem desânimo!



2ª Consideração


Leiamos, agora, a segunda página de nossa Doutorazinha. Visando esta, diretamente, o trabalho da alma, esclarece e completa maravilhosamente a teologia do Ascensor… Não é de sua Autobiografia que tomarei esta página, mas da coleção dos “Conselhos e Lembranças”.

Teresa era, então, Mestra das Noviças. Uma delas, desanimava-se, vendo o pouco sucesso de seus esforços para se corrigir de suas imperfeições.

Vós me fazeis pensar numa criancinha que começa a ficar de pé e não sabe ainda andar. Querendo, absolutamente, atingir o alto de uma escada para encontrar sua mamãe, levanta o pezinho para subir o primeiro degrau. Inútil! cai sempre sem conseguir adiantar-se. Pois bem! Sede essa criancinha. Pela prática das virtudes levantai vosso pezinho para subir a escada da santidade; mas, não penseis que podereis subir sequer o primeiro degrau! Não, mas Nosso Senhor só pede de vós a boa vontade. Do alto desta escada, Ele vos com amor. Logo, vencido por vossos esforços inúteis, Ele mesmo descerá e, tomando-vos em seus braços, levar-vos-á para sempre ao seu Reino – onde não mais O deixareis!”8

Deve ser essa, exatamente, nossa cooperação no trabalho da santificação: é o que Deus nos pede: boa vontade, desejo de lhe dar prazer e nossos pobres esforços… Pequenos esforços inúteis! Eis tudo o que podemos fazer! Quando Deus achar que mostramos bastante boa vontade, isto é, que apesar da inutilidade de nossos esforços, perseveramos em querer sempre Lhe dar prazer, com humildade e paciência: então Ele desce e toma-nos em seus braços e carrega-nos… É sempre o Ascensor! Aqui, porém, temos nossa parte e a parte de Deus…

Quanta paz e tranquilidade nesta maneira de orientar os esforços para a perfeição, e o trabalho da aquisição das virtudes! Sente-se que a alma está toda voltada para Deus, repousa n’Ele, mesmo no meio da ação e do trabalho, confia n’Ele ainda nos insucessos e imperfeições. Sente-se que a alma se ocupa mais de Deus do que de si mesma. Embora procure realizar esse ou aquele progresso, adquirir essa ou aquela virtude, seu esforço visa mais torná-la agradável a Deus do que a sua própria perfeição; o que, de fato, é muito diferente.

Entregar-se, abandonar-se, sem apego nem volta sobre si mesmo, renúncia! Eis tudo! Donde:

A santidade não está em tal ou tal prática; consiste num disposição do coração que nos torna humildes e pequenos nos braços de Deus, conscientes de nossa fraqueza e confiantes até a audácia em sua bondade de Pai”.9

Mas, quão poucos sabem fazer isso!…

É preciso consentir em ficar sempre pobre e sem forças; e eis o difícil… Amemos nossa pequenez, amemos nada sentir; assim seremos pobres de espírito e Jesus virá nos buscar por mais longe que estejamos; e transformar- nos- á em chamas de amor”.10

Tudo serve então, para unir a alma a Deus: e é isso o Único necessário.

Tal é o estado no qual Teresa convida as almas pequeninas a se estabelecerem. Estado de filho de Deus que se deixa em tudo atrair, mover, elevar, carregar nos braços de Jesus, isto é, pelo Espírito de Amor.

É o Evangelho – Tornemo-nos crianças!


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Fonte: Rev. Pe. Liagre, Espiritano, “Retiro com Santa Teresinha do Menino Jesus”, Cap. V, pp. 56-64. 2ª Edição, tradução do Carmelo do I. C. de Maria e Santa Teresinha, Cotia/SP, 1963.

1.  Rom. VIII, 14.

2.  Mat. XIX, 14.

3.  Carta VII a seus Irmãos espirituais, pág. 372.

4.  História de uma alma, IX, pág. 153.

5.  Prov. IX, 4.

6.  Is. LXVI, 13.

7.  História de uma alma, IX, pág. 154.

8.  Conselhos e Lembranças, pág. 261.

9.  “Novíssima Verba”, págs. 112-113.

10.  Carta VI a Irmã Maria do Sagrado Coração, pág. 356.


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