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"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

quinta-feira, 12 de março de 2015

Que se Devem Examinar e Regular os Desejos do Coração.





Que se Devem Examinar e
Regular os Desejos do Coração[1]


Jesus Cristo: Filho, importa que aprendas ainda muitas coisas, que não tens aprendido bem.

A Alma: Senhor, que coisas são essas?

Jesus Cristo: Que sujeites totalmente o teu desejo ao Meu beneplácito, e não te cegues com teu amor próprio, mas sejas fervoroso zelador da Minha vontade.

Muitas vezes te prendem teus desejos, e com veemência te levam atrás de si; mas examina, se te moves mais por Minha honra, que por teu proveito.

Se Eu for a causa, de qualquer modo que ordene, sempre estarás contente; mas se ocultares algum interesse próprio, esse te impedirá e afligirá.

Foge, pois, de confiar demasiadamente no desejo que tiveste sem Me consultares, para que não aconteça que te arrependas e te desagrade o que primeiro te contentou e desejastes como melhor.

Porque nem todo desejo que parece bom logo se há de seguir, nem todo o que parece contrário, à primeira vista, se há de evitar.

Convém que às vezes te refreies até nos bons exercícios e desejos, para que não caias em distrações do coração pela demasia; e que não dês escândalo aos outros por tua indiscrição; ou também para que com a resistência dos outros subitamente não te perturbes e caias.

Também algumas vezes te convém usar de violência e resistir varonilmente ao apetite sensitivo, não reparando no que quer ou não quer a carne; mas trabalhando para que esteja sujeita ao espírito, ainda que não queira; e deve ser castigada e constrangida e sujeitar-se até que esteja disposta para tudo, e saiba contentar-se com pouco e alegrar-se com as coisas moderadas e não murmurar contra o que lhe for contrário.

1ª Reflexão[2]

Assim como todos os dias cuidamos da limpeza e alimentação do nosso corpo, também com melhor razão, devemos cuidar da limpeza e alimentação da nossa alma. Raros são os homens obcecados que, em teoria, não reconheçam a superioridade da alma sobre o corpo; na prática, porém, é forçoso admitir que a maioria deles vivem tão esquecidos da alma, como se não acreditassem na existência dela. Para o corpo, todos os desvelos e mimos parecem poucos: procuram-se-lhe bons ares, boas casas, boa alimentação, bons vestidos e conveniente exercício; se enferma, chama-se-lhe um ou mais médicos, aplicam-se-lhe remédios a horas determinadas, dia e noite, dispensam-se-lhe todos os cuidados. O corpo é um ídolo, o espírito cai de joelhos diante dele e o adora com devoção fervorosa! Já esta espécie de idolatria está de tal maneira enraizada nos costumes, que, sem a menor estranheza, se transmite de geração em geração.

A par disto, a pobre alma é relegada para uma posição muito secundária: na peregrinação mais ou menos longa da vida, raro se olha para ela com decidido interesse. Nasce uma criancinha, desenvolve-se, começa a revelar as primeiras luzes da sua inteligência, e os pais, que devem esmerar-se em corrigir-lhe os defeitos, descuidam da sua educação: deixam-na viver segundo os instintos da natureza, à maneira de um animalzinho doméstico. Será isto verdadeiro amor de pais? Não; tal amor é falso, porque é desordenado. Tens filhos? Educa-os e sujeita-os desde a sua infância[3]. Se ainda os filhos que recebem boa educação muitas vezes se perdem, que se há de esperar dos mal educados? Com a idade crescem os maus hábitos, e depois vem a influência do mundo corrompido completar a desgraça, a que a negligência dos pais dera começo. Encontra-se muitas vezes um destes infelizes às portas da morte e a família não permite que ninguém lhe fale em Sacramentos, porque receia assustar o enfermo. Que barbaridade, que loucura! Então credes na imortalidade da alma e tendes coração para impedir a que um vosso parente, um vosso amigo se reconcilie com Deus! Será isto proceder como bom cristão?

2ª Reflexão[4]

Temos que sustentar uma grande luta: contra nosso espírito, que nos extravia, nos seduz com falsas aparências e com uma funesta curiosidade; contra nossos desejos, que nos perturbam; contra nossos sentidos, cujos apetites maculam a alma e a curvam para a terra. Lamentável condição do homem culpado! Mas Deus não o abandonou: pode vencer se quiser. A fé reprime a inquietação mórbida do espírito, e o fixa na verdade. Uma inteira submissão à vontade divina produz a paz do coração, acalmando os vãos desejos e aqueles mesmos que enganam a devoção com uma aparência de bem. Finalmente, vencemos os sentidos com a oração, a humildade, a penitência, “castigando o corpo rebelde, e reduzindo-o à escravidão”. [5]

Nesta guerra de cada momento é que o cristão se aperfeiçoa, e combatendo com fidelidade pode dizer com o Apóstolo: “Não penso ter ainda chegado aonde aspiro; porém, esquecendo o que fica para trás e aplicando-me ao que está adiante; corro ao termo da carreira para segurar o prêmio que Deus nos destinou, a felicidade celestial, à qual nos chamou por Jesus Cristo”.[6]

3ª Reflexão[7]

Quando vos instar o desejo de serdes livre de algum mal ou de conseguir algum bem, antes de tudo ponde vosso espírito em repouso e tranquilidade, assentai vosso juízo e vossa vontade, e depois, manso e manso, procurai o êxito de vosso desejo, empregando por ordem os meios que forem convenientes.

E quando eu digo manso e manso, não quero dizer negligentemente, mas sem pressa, perturbação e inquietação; aliás, em lugar de terdes o efeito de vosso desejo, estragareis tudo, e vos virá mais forte embaraço...

Não permitais a vossos desejos, com quanto pequenos e de pouca importância, que vos inquietem; por quanto depois dos pequenos, virão os grandes e mais importantes, achar vosso coração mais disposto à perturbação e à desordem. Quando vos sobrevier inquietação, recomendai-vos a Deus, e resolvei-vos a nada fazer do que vosso desejo requer de vós, sem que tenha cessado a inquietação; salvo se não puder diferir-se a execução, e nesse caso, com brando e tranquilo esforço deveis refrear o ímpeto de vosso desejo, temperando-o, acalmando-o e moderando-o quanto for possível, e realizar depois, não segundo vosso desejo, mas segundo a razão.[8]

Oração

Ó Salvador meu, vida de minha alma, esperança do meu coração, por mim padecestes tantos tormentos para me remir e dar o exemplo da mortificação de meu corpo; porque sois para Vós tão cruel, e para mim tão brando? Eu com todos meus membros vos tenho ofendido, e com eles, e com os próprios sentidos, que me destes, tenho servido a malícia de minha vontade, e ao mundo e ao Demônio. Como me descuidei em dizer-vos quão mal de tudo usei? Mas Vós, Luz verdadeira e Sabedoria infinita, o vedes, e sabeis que seria pouco abrirem-me todo em chagas para satisfação e cura das que eu fiz nesta triste alma. E todavia, sabendo Vós quão feias e abomináveis são, a mim perdoais, a mim mantendes com vossos bens, e me chamais à vossa amizade. Ó Amor que sempre ardes, e nunca te consomes, muda toda minha vida, corpo e alma, nesse fogo e em teu serviço. Mudai-me, Senhor meu, desta hora para todo sempre, porque para isso me entrego todo a Vós. Açoitai, castigai e atribulai este perverso pecador, fazei de mim tudo o que for vossa vontade, trazei-me sempre da vossa Mão sujeito e preso à vossa Providência, nem me deixeis querer outra coisa senão padecer conVosco, para que padecendo conVosco possa melhor servir-vos e amar-vos. Amém.[9]

Meu Senhor Jesus Cristo, que de vossas Chagas salutares fizestes correr a fonte de vossas graças, fazei que vosso Sagrado Sangue me fortifique contra os maus desejos, e me seja um remédio salutar para todos os meus pecados. Amém.[10]


[1] Mons. Manuel Marinho, ”Imitação de Cristo”, Liv. III, Cap. XI, PP. 158-161; Novíssima Edição, Editora Viuva de José Fructuoso da Fonseca, Porto, 1925.
[2] Mons. Manuel Marinho, ob. cit.
[3] Ecles. 7, 25.
[4] Pe. J. I. Rouquette, “Imitação de Cristo”, Liv. III, Cap. XI, PP. 192-194; Tradução Nova, Editora Aillaud & Cia., Paris – Lisboa.
[5] 1 Cor. 9, 27.
[6] Filip. 2, 13-14.
[7] Por um Pe. da Missão, “Imitação de Cristo Nosso Senhor”, Liv. III, Cap. XI, p. 167; Colégio da Imaculada Conceição (Botafogo/RJ), Editores Desclée, Lefebvre y Ca., Tornai-Bélgica, 1904.
[8] “Introdução à Vida Devota”, IV Part. Cap. XI.
[9] Pe. J. I. Rouquette, ob. cit.
[10] Por um Pe. da Missão, ob. cit., “Opusc.”, III.

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