LSN: A quem essa agenda está
beneficiando? Como fiéis católicos, estamos surpresos e preocupados com o
surgimento súbito desses temas.
CB: Bem, essa agenda não pode ser
benéfica para ninguém, porque ela não é verdadeira: ela não é a verdade.
E, portanto, ela só está prejudicando a todos. Ela pode ser percebida
como um benefício, por exemplo, para as pessoas que, por qualquer
motivo, são flagradas em situações imorais. Alguns podem percebê-la como
se, de alguma forma, ela os justificasse. Porém, ela não pode
justificá-los, porque os próprios atos não podem ser justificados.
LSN: Em algum lugar o senhor
mencionou a resistência firme a respeito desses pontos por parte de
muitos padres sinodais. Será que esse não é um grande sinal de
esperança? Essa resistência o surpreendeu?
CB: Não, não me surpreendeu, embora eu tenha me sentido muito grato por essa resistência, porque em dado momento quando a relatio post disceptationem
foi entregue, por exemplo, quando observamos a direção que claramente
estava sendo dada ao sínodo, receamos que talvez os padres sinodais não
falassem claramente, mas eles o fizeram. E eles falaram com firmeza,
vários deles, e agradeço a Deus por isso. Espero que esses mesmos padres
sinodais – espero que muitos deles sejam nomeados para a sessão de
setembro de 2015 – também sejam fortes nesse cenário.
LSN: Há ainda alguma confusão
sobre o significado dos votos nos três artigos que não obtiveram
maioria absoluta de dois terços. Eles foram incluídos no relatório final
e nos Lineamenta. Eles efetivamente obtiveram
maiorias simples de mais da metade, mas o que me chama a atenção é que
os parágrafos foram redigidos de tal forma que realmente não podemos
saber o que o voto significa. Será que a minha impressão está
equivocada?
CB: Isso é muito confuso. Creio que já
participei de cinco sínodos, e em todos eles, exceto neste, uma
proposição – nesse caso, um parágrafo – que não tivesse recebido os dois
terços de votos necessários era simplesmente eliminada; ela não era
publicada, e não se tornava parte do documento sinodal. Nesse caso, eles
insistiram em publicar o documento com todos os parágrafos,
simplesmente indicando o número de votos. E, por isso, muitas pessoas
consideram isso como uma indicação de que esses parágrafos são mais ou
menos tão aceitáveis quanto os demais. Porém, na verdade, eles foram
excluídos pelos membros do sínodo. Infelizmente, eles receberam uma
maioria simples de votos, o que me preocupa muito – ou seja, que tantos
padres sinodais tenham votado em favor dos textos que estavam confusos, e
alguns simplesmente continham erro.
LSN: Muitas vezes, até mesmo
os padres sinodais que elogiaram temas como “recasamento” de divorciados
e uniões de homossexuais ou de pessoas não casadas têm reiterado que a
questão não é doutrinal, mas pastoral. Qual é a sua resposta a essa
afirmação?
CB: Que essa é simplesmente uma falsa
distinção. Não pode haver coisa alguma que seja verdadeiramente sã do
ponto de vista pastoral que não o seja do ponto de vista doutrinal. Em
outras palavras: não se pode separar o amor da verdade. Ainda em outras
palavras: não existe amor fora da verdade. Assim, é falsa a afirmação de
que estaríamos fazendo apenas mudanças pastorais que nada têm a ver com
a doutrina. Se admitirmos pessoas que estão vivendo em uniões
matrimoniais irregulares à Sagrada Comunhão, então, estaremos
diretamente fazendo uma declaração sobre a indissolubilidade do
matrimônio, porque Nosso Senhor disse: “Aquele que repudia sua mulher e
se casa com outra, comete adultério”. E a pessoa que se encontra em uma
união matrimonial irregular está vivendo publicamente em estado de
adultério. Se dermos a Sagrada Comunhão a essa pessoa, então, de alguma
forma, estamos dizendo que isso está correto em termos doutrinais. Mas
não pode ser assim.
LSN: Sendo assim, o simples fato de colocar esse tema em discussão já é um erro.
CB: Sim. Na verdade, pedi mais de uma vez
que esses temas que nada têm a ver com a verdade sobre o matrimônio
fossem retirados da agenda do sínodo. [Se as pessoas quiserem discutir
essas questões, tudo bem, mas elas não têm nada a ver com a doutrina da
Igreja sobre o matrimônio.] E o mesmo vale para a questão dos atos
sexuais entre pessoas do mesmo sexo, e assim por diante.
LSN: Como católicos, sabemos
que o matrimônio é vinculante para toda a vida e que ele é um “sinal” da
união de Cristo com a Igreja, e também sabemos da sua profunda ligação
com a Eucaristia. A “teologia do corpo” do Papa João Paulo II lançou uma
luz particular sobre esse assunto, mas sua obra não foi citada nos
sucessivos documentos sinodais. Qual é a sua opinião sobre essa omissão,
e será que a popularização dessa obra não ofereceria respostas
concretas para os problemas contemporâneos?
CB: Sim, sem dúvida. O ensinamento de São
João Paulo II é tão luminoso, e ele se dedicou com tanta atenção e
intenção à questão da verdade sobre a sexualidade humana e a verdade
sobre o matrimônio, como vários de nós dissemos nas discussões sinodais e
nos pequenos grupos de discussão. Pedimos um retorno daquele magistério
do Papa João Paulo II, que é uma reflexão sobre o que a Igreja sempre
ensinou e praticou. Mas, na verdade, alguns poderiam ter a impressão de
que a Igreja não tinha doutrina alguma nessas áreas.
LSN: Isso é muito extraordinário …
CB: Isso é muito extraordinário. Isso é
assombroso. Custei a crer no que estava vendo. Na verdade, acredito que
algumas pessoas se recusam a crer que isso seja verdade, porque é um
absurdo.
LSN: São João Paulo II respondeu efetivamente à ideologia de gênero antes que ela se tornasse bem conhecida.
CB: Sim, sem dúvida. Ele estava tratando
de todas essas questões em um nível muito profundo e lidava com elas
estritamente nos termos da lei moral natural, o que a razão nos ensina e
o que a fé nos ensina, obviamente em união com a razão, mas elevando e
iluminando o que a razão nos ensina sobre a sexualidade humana e sobre o
matrimônio.
LSN: Os pontos de vista do
Cardeal Kasper e, mais recentemente, do Bispo Bonny, de Antuérpia, e de
outros prelados, incluíam a consideração de que homossexuais “fiéis”,
divorciados “recasados” e casais não casados demonstram qualidades de
auto-sacrifício, generosidade e dedicação que não podem ser ignoradas.
Porém, através de sua escolha de estilo de vida, eles se encontram em
uma condição que precisa ser percebida por estranhos como estado de
pecado mortal objetivo: um estado de pecado mortal escolhido e
prolongado. O senhor poderia nos recordar o ensinamento da Igreja sobre o
valor e o mérito da oração e das boas ações nesse estado?
CB: Se estivermos vivendo publicamente em
estado de pecado mortal, não há qualquer ato bom que possamos fazer que
justifique essa situação: a pessoa continua em pecado grave.
Acreditamos que Deus criou todo mundo bom, e que Deus quer a salvação de
todos os homens, mas isso só pode acontecer pela conversão de vida. E
assim temos que chamar à conversão as pessoas que vivem nessas situações
gravemente pecaminosas. Dar a impressão de que, de alguma forma, existe
algo bom a respeito de viver em estado de pecado grave é simplesmente
contrário a tudo o que a Igreja sempre ensinou em todos os lugares.
LSN: Então, será que não
basta quando alguém diz: “sim, é verdade que essas pessoas são amáveis,
são dedicadas, elas são generosas”?
CB: É claro que não é. É como a pessoa que assassina alguém e, no entanto, é gentil com as outras pessoas …
LSN: Que cuidado pastoral
verdadeiro o senhor recomendaria às pessoas nessas situações, e o que
elas podem obter praticando sua fé, na medida do possível, quando elas
não puderem obter absolvição ou receber a Sagrada Comunhão?
CB: Em minha própria experiência pastoral
já trabalhei com pessoas que se encontram nessas situações e tentei
ajudá-las, com tempo, no que diz respeito também às obrigações que por
dever de justiça elas precisam cumprir, para que mudem o rumo de suas
vidas. Por exemplo, no caso daquelas pessoas que estão em uniões
matrimoniais inválidas, tentar ajudá-las a se separar, se for possível,
ou viver como irmão e irmã em um relacionamento casto, se houver filhos e
se eles forem obrigados a educá-los.
LSN: Será que no caso de
casais recasados que têm seus próprios filhos e filhos de um casamento
anterior, isto não cria situações muito difíceis?
CB: Claro que sim. Na verdade, estou
profundamente preocupado com a discussão a respeito do processo de
nulidade matrimonial: as pessoas têm a impressão de que só existe uma
parte envolvida, ou seja, a pessoa que está pedindo a declaração de
nulidade. O fato é que existem duas partes envolvidas, há crianças
envolvidas e há todos os tipos de outros relacionamentos envolvidos em
qualquer matrimônio. E, portanto, o assunto é extremamente complexo, ele
nunca poderá ter algum tipo de solução fácil.
LSN: A questão da Comunhão
espiritual tem sido levantada para essas pessoas que estão vivendo em
matrimônios inválidos ou uniões impossíveis. Não entendo muito bem como
se pode ter uma comunhão espiritual nesse tipo de estado.
CB: Essa expressão foi utilizada de
maneira imprecisa. Para fazer uma comunhão espiritual é preciso ter
todas as disposições necessárias para realmente receber a Sagrada
Comunhão. A pessoa que faz uma comunhão espiritual encontra-se
simplesmente em uma situação em que ele ou ela não tem acesso ao
Sacramento, mas está totalmente disposta a receber o Sacramento, e assim
a pessoa faz um ato de comunhão espiritual. Acho que aqueles que
utilizavam essa expressão tinham em mente o desejo das pessoas que se
encontram em situação pecaminosa de abandonarem essa situação. Então,
elas rezam e pedem a ajuda de Deus para dar a volta por cima, mudar de
vida e encontrar uma nova maneira de viver, de modo que possam viver em
estado de graça. Poderíamos chamar isso de desejo pela Santa Comunhão,
mas não se trata de uma comunhão espiritual. Não pode ser. A propósito, a
natureza da comunhão espiritual foi definida no Concílio de Trento: ele
deixou bem claro que ela exige todas as disposições, e isso faz
sentido.
LSN: Como a Igreja pode
efetivamente ajudar todas as pessoas envolvidas: cônjuges abandonados,
filhos de matrimônios legítimos que são prejudicados pelo divórcio de
seus pais, pessoas que estão lutando contra tendências homossexuais ou
que de certa forma tenham “caído na armadilha” de uma união ilegítima? E
qual deve ser a nossa atitude, a atitude dos fiéis?
CB: O que a Igreja pode fazer, e isso é o
maior ato de amor por parte da Igreja, é apresentar a doutrina sobre o
matrimônio, o ensinamento que resulta das próprias palavras de Cristo, a
doutrina constante na tradição, para todos, como um sinal de esperança
para as pessoas. E também, ajudá-las a reconhecer o pecado da situação
em que se encontram e, ao mesmo tempo, exortá-las a abandonar a situação
de pecado e encontrar uma maneira de viver de acordo com a verdade. E
essa é a única maneira que a Igreja pode ajudar. Essa foi a minha grande
esperança para o sínodo: que o sínodo defendesse perante o mundo a
grande beleza do matrimônio, e essa beleza é a verdade acerca do
matrimônio. Sempre digo às pessoas: a indissolubilidade não é uma
maldição, ela é a grande beleza do relacionamento conjugal. É isso que
confere beleza ao relacionamento entre um homem e uma mulher: a união
indissolúvel, fiel e procriativa. Mas agora as pessoas praticamente
começam a ter a sensação de que de alguma maneira a Igreja se envergonha
do tesouro belíssimo que temos no matrimônio, como Deus criou o homem e
a mulher desde o início.
LSN: Às vezes, alguns pastores parecem ter vergonha de falar sobre o pecado ou sobre castidade.
CB: Isso também foi mencionado no sínodo.
Um dos padres sinodais disse: “Será que não existe mais pecado?” As
pessoas têm essa impressão. E, infelizmente, desde a queda de nossos
primeiros pais, há sempre a tentação de pecar, e o pecado está presente
no mundo. Temos que reconhecer essa realidade, chamá-la pelo nome
apropriado e tentar superá-la.
LSN: Será que não existe um
apelo especial para que os pais católicos e cristãos eduquem seus filhos
para a modéstia e a decência? Isso desapareceu completamente em muitos
lugares.
CB: Sim, é bem verdade que sim. Parte do
Evangelho da Vida é ensinar às crianças no lar e nas escolas as virtudes
fundamentais que demonstram respeito pela nossa própria vida e pela
vida de outras pessoas, assim como por nossos próprios corpos, ou seja, a
modéstia, a pureza e a castidade, formando os jovens dessa maneira
desde cedo. Mas isso também encontra-se em grande perigo, simplesmente,
porque a catequese na Igreja tem sido muito fraca e, em alguns casos,
confusa e errônea. Tem havido uma desintegração tão grande na vida
familiar, que as crianças estão sujeitas a uma educação que as deixa
despreparadas para viver a verdade sobre o matrimônio, a verdade sobre
seus próprios corpos e a verdade sobre suas próprias vidas.
LSN: O que deveríamos fazer com mais urgência para evitar a desordem do divórcio e de todas as uniões inaceitáveis?
CB: Creio realmente que isso começa na
família. Precisamos fortalecer as famílias, formar marido e esposa em
primeiro lugar para viver a verdade do matrimônio em seu próprio lar,
que então se torna não somente a fonte de salvação para eles, mas também
uma luz no mundo. Um matrimônio vivido na verdade é tão atraente e tão
belo que leva à conversão de outras almas. Precisamos formar as crianças
dessa maneira e, especialmente em nossos dias, as crianças precisam ser
educadas de maneira que possam opor-se à cultura dominante. Elas não
podem, por exemplo, aceitar essa teoria de gênero que está infectando
nossa sociedade; elas têm que ser criadas para rejeitar essas falsidades
e viver a verdade.
LSN: Entendo que existe um
vínculo entre contracepção e divórcio: 30% a 50% dos casais que praticam
contracepção irão se divorciar, ao passo que menos de 5% das pessoas
que não a praticam, sejam elas cristãs ou não, ou que praticam o
planejamento familiar natural, irão se divorciar. O senhor concorda que
uma linguagem clara e um envolvimento pastoral maior por parte da Igreja
no sentido de promover a Humanae Vitae são fundamentais para lograr mais uniões estáveis?
CB: Sim, sem dúvida. E o bem-aventurado Papa Paulo VI deixou isso bem claro em sua Carta Encíclica Humanae vitae,
afirmando que a prática da contracepção conduziria à desintegração da
vida familiar, à perda do respeito pelas mulheres. Precisamos
simplesmente refletir sobre o fato de que um casal que pratica a
contracepção já não se entrega totalmente um ao outro. A contracepção já
introduz um elemento de desagregação no matrimônio e se isso não for
corrigido e reparado poderá facilmente levar ao divórcio.
LSN: Quanto à questão do
tamanho da família e da liberdade dos pais, o senhor se preocupa de modo
especial com o movimento “ecológico” mundial e a promoção internacional
do planejamento familiar e do controle populacional?
CB: Sim, esses temas me preocupam
bastante porque as pessoas estão sendo conduzidas a um falso modo de
pensar, no sentido de que devem praticar alguma forma de controle da
natalidade para que sejam administradores responsáveis do planeta. Para
falar a verdade, a taxa de natalidade na maioria dos países está muito
aquém do necessário para substituir a população atual. Deixando tudo
isso de lado, a verdade é que se Deus chama um casal para o matrimônio,
então, Ele os está chamando também para serem generosos no acolhimento
do dom de uma nova vida humana. E, por isso, precisamos de muitas
famílias numerosas hoje em dia, e, graças a Deus, atualmente, percebo
entre alguns casais jovens uma notável generosidade no que diz respeito
às crianças. Outra coisa que raramente ouço ser mencionada hoje em dia,
mas que sempre era enfatizada quando eu era jovem, assim como na
tradição da Igreja, é que os pais devem ser generosos em ter filhos, de
modo que alguns de seus filhos possam receber um chamado ao sacerdócio
ou à vida consagrada e ao serviço da Igreja. E essa generosidade dos
pais certamente vai inspirar uma generosa resposta no filho que tiver
uma vocação.
LSN: Muitos dirão que o
matrimônio monogâmico para a vida inteira é muito bom para os católicos,
mas que a “dureza de coração” dos não católicos deve permitir o
divórcio e um novo casamento nas legislações civis. Por outro lado,
nações cristãs têm se empenhado muito para trazer estabilidade social e
dignidade ao matrimônio natural em muitos lugares do mundo. Será que a
vinda de Cristo mudou a situação de todos os homens e será que é certo
promover e até mesmo impor essa visão do matrimônio natural mesmo em
sociedades não católicas?
CB: Creio que é preciso salientar
exatamente que a doutrina de Cristo sobre o matrimônio é uma afirmação,
uma confirmação, da verdade sobre o matrimônio desde o início, usando
Suas próprias palavras, ou aquela verdade sobre o matrimônio inscrita no
coração de cada ser humano. E assim, quando a Igreja ensina sobre o
matrimônio monogâmico, fiel e duradouro, ela está ensinando a lei moral
natural e está certa em insistir sobre esse tema na sociedade em geral. O
Concílio Ecumênico Vaticano II referiu-se ao divórcio como uma praga em
nossa sociedade, e de fato é. A Igreja tem que ser cada vez mais forte
na luta contra a prática disseminada do divórcio.
LSN: O senhor acha que os
estudos sobre a situação e resultados melhores das crianças que vivem em
famílias monogâmicas estáveis devem desempenhar um papel maior na
preparação para o casamento?
CB: Penso que sim. É preciso enfatizar a
beleza do matrimônio, como ele é vivido por muitos casais hoje em dia,
de maneira fiel e generosa, assim como a experiência da vida familiar
pelas crianças que vivem em uma família amorosa… o que não significa que
não existam desafios. Isso não significa que não existem momentos
difíceis na família e no casamento, porém, com a ajuda da graça de Deus,
no final das contas, a resposta é sempre de amor, de sacrifício e de
aceitação de qualquer sofrimento necessário para ser fiel ao amor.
LSN: Mas a sociedade moderna não aceita o sofrimento, seja no final da vida, durante a gravidez ou no matrimônio…
CB: É claro, ela não compreende porque
não entende o sentido do amor. Cristo disse: “Se alguém quiser me
seguir, tome a sua cruz e siga-me”. Portanto, a essência da nossa vida é
sofrer por amor: o amor de Deus e do nosso próximo.
LSN: O senhor concorda, como
várias pessoas estão afirmando, que muitos matrimônios católicos hoje em
dia frequentemente são inválidos devido à falta de preparação ou à
ignorância acerca do sentido das promessas matrimoniais? Qual foi a sua
experiência específica sobre esse tema como Prefeito do Supremo Tribunal
da Assinatura Apostólica?
CB: Acho que não tem muito sentido fazer
declarações gerais sobre o número de casamentos válidos ou inválidos.
Cada matrimônio precisa ser analisado, e o fato de que talvez as pessoas
não tenham sido bem catequizadas, entre outras coisas, certamente
poderá enfraquecê-las para a vida matrimonial, mas isso não
necessariamente constituiria uma indicação de que elas dariam um
consentimento matrimonial inválido, porque a própria natureza nos ensina
acerca do matrimônio. Constatamos isso na Assinatura Apostólica: sim,
havia mais declarações de nulidade matrimonial, mas ao examinarmos esses
casos, havia muitos em que a nulidade matrimonial não estava
estabelecida, não se comprovando verdadeira.
LSN: O senhor demonstrou no
livro “Remaining in the Truth of Christ” [“Permanecendo na Verdade de
Cristo”] que a simplificação do processo não é a resposta.
CB: De maneira alguma, porque há
situações muito complexas, e elas exigem um processo cuidadosamente
articulado, a fim de chegarmos à verdade. Se não nos importarmos mais
sobre a verdade, então, qualquer processo será aceitável, mas, se nos
preocupamos com a verdade, então, o processo de nulidade matrimonial
terá que ser um processo como o que a Igreja atualmente utiliza.
LSN: E a Igreja tem feito muita coisa pelos processos judiciais no mundo civilizado …
CB: A Igreja tem sido admirada ao longo
dos anos como um espelho de justiça; sua própria maneira de administrar a
justiça serviu de modelo para outras jurisdições. Já houve uma
experiência na Igreja com um processo de nulidade matrimonial modificado
que ocorreu nos Estados Unidos de 1971 a 1983. Esse processo teve
efeitos desastrosos, e não sem razão as pessoas começaram a falar sobre
“divórcio católico”. Isso é um escândalo para aqueles que trabalham com a
justiça ou administram a justiça na ordem secular, porque quando eles
veem que a Igreja não pratica a justiça, passam a não se importar mais
com a verdade. Então, o que a lei e a justiça possivelmente significam?
LSN: Recentemente, um
exorcista italiano, o padre Sante Babolin, disse que durante um
exorcismo, o espírito mau que atormentava a esposa de um de seus amigos
disse-lhe: “Não posso suportar que eles se amem.” Será que isso não é
uma mensagem em que os casais devem meditar?
CB: Sim, sem dúvida. Não há força maior
contra o mal no mundo do que o amor de um homem e de uma mulher no
matrimônio. Depois da Sagrada Eucaristia, ele tem um poder além de
qualquer coisa que se possa imaginar. Eu não conhecia essa história, mas
não me surpreende e, certamente, é verdade que quando um casal celebra o
matrimônio com toda a sua mente e coração, o demônio entrará em ação
para tentar estragar o lar, porque o lar é um berço de graça, onde a
graça é recebida não somente para o casal, mas para os filhos e para
aqueles que conhecem a família.
LSN: Como os casais podem valorizar e proteger mais seu amor conjugal?
CB: Primeiramente, através de uma vida de
oração fiel e diária, bem como através da confissão regular, pois todos
nós precisamos de ajuda para vencer o pecado em nossas vidas, até mesmo
pequenos pecados, pecados veniais, mas também para nos defendermos
contra mais pecados graves. E, em seguida, é claro, a Eucaristia é o
centro de toda a vida cristã de um modo muito especial. Ela é o centro
da vida matrimonial porque é comunhão com Nosso Senhor Jesus Cristo,
para a vida desse amor que Ele tem pela Igreja, da qual o matrimônio é
sacramento: o matrimônio é o sinal de seu amor no mundo e, portanto, na
Eucaristia, o casal recebe a graça, a maioria de todos, sobretudo, para
viver a aliança de amor.
LSN: O senhor acha que existe
uma ligação entre a “morte do culto” – uma liturgia não adoradora e
antropocêntrica – e a cultura da morte?
CB: Estou muito convencido de que quando
os abusos entraram nas práticas litúrgicas da Igreja, abusos que
refletem uma direção muito antropocêntrica, em outras palavras, quando o
culto sagrado começou a ser apresentado como a atividade humana, em vez
da ação de Deus em nosso meio, as pessoas foram levadas claramente a
uma direção errada, e esses abusos têm exercido um impacto muito
negativo sobre a vida de cada um e, particularmente, sobre a vida
matrimonial. A beleza da vida é percebida de uma maneira muito
particular e confirmada no Sacrifício Eucarístico.
LSN: Como católicos, somos
obrigados a agir em sociedade e também a agir politicamente, a termos um
engajamento político. Porém, na França não existe um único partido que
esteja defendendo o matrimônio completamente e que esteja defendendo a
vida completamente. O que os católicos devem fazer: engajar-se em um
movimento, mesmo quando sabem que esse movimento é contra os princípios
inegociáveis ou será que devem tentar criar algo mais?
CB: Idealmente, os católicos devem tentar
construir uma força política na sociedade que apoie totalmente a
verdade e os bens inegociáveis no que diz respeito à vida humana e à
família. E eles devem deixar sua própria posição muito clara, insistindo
nela, com os partidos políticos existentes, para que constituam uma
força para a reforma dos partidos políticos. É óbvio que não podemos
participar de qualquer tipo de movimento que seja contrário à lei moral.
Por outro lado, se nesse partido político ou movimento houver sinais de
uma reforma, de uma adesão à lei moral, devemos apoiá-lo e
incentivá-lo.
LSN: Que santos deveríamos invocar para a família hoje?
CB: Primeiramente, a Sagrada Família de
Nazaré: a Virgem Maria, São José e Nosso Senhor Jesus. E, em seguida, há
grandes santos casados. Podemos pensar, por exemplo, nos pais de Santa
Teresinha, os Beatos Louis e Zélie Martin. Podemos pensar também em uma
grande santa, como Santa Gianna Molla, aqui na Itália, em um grande
santo que morreu mártir para a família, São Thomas More, que foi casado e
compreendeu plenamente a vocação matrimonial. Há também o casal Luigi e
Maria Beltrame Quattrocchi, que foram beatificados aqui na Itália.
Pensemos também em alguém como Santa Rita de Cássia, que foi uma mãe
muito dedicada: ela rezou bastante pela conversão de seu marido e também
pela conversão de seus dois filhos. Esses seriam apenas alguns
exemplos… existem muitos outros.
LSN: Qual é a melhor maneira de permanecermos fiéis à Igreja e ao Papa nesses tempos tão conturbados?
CB: Aderindo muito claramente a tudo que a
Igreja sempre ensinou e praticou; esta é a nossa âncora. Nossa fé não
reside em pessoas individuais, nossa fé está em Jesus Cristo. Só Ele é a
nossa salvação; Ele está vivo para nós na Igreja através de sua
doutrina, através de seus sacramentos e através da sua disciplina. Digo
às pessoas – porque muitas pessoas hoje em dia se comunicam comigo e
estão bastante confusas, elas estão preocupadas e aborrecidas – não, o
que temos que fazer é mantermos a calma, e precisamos nos manter
repletos de esperança, através de um apreço cada vez mais profundo pela
verdade da nossa fé, aderindo a ela. Ela é imutável e, por fim, ela será
vitoriosa. Cristo disse a São Pedro quando ele fez sua profissão de fé:
“As portas do inferno não prevalecerão contra a Igreja”. Sabemos que
isso é verdade e, nesse ínterim, temos que sofrer pela verdade, mas
temos que ter a certeza de que Nosso Senhor vai conquistar a vitória ao
final.
Nenhum comentário:
Postar um comentário