A Firmeza de um Frade Carmelita
“A Igreja, responde o
religioso, não reconhece autoridade senão na fidelidade a seus
Princípios. Se Ela combate a ideologia nazista, é em virtude dos
fundamentos de Sua doutrina e de Sua fé e, se Sua atitude põe em
perigo vossos projetos, cabe a vós a responsabilidade dessa
situação. É lamentável, na minha opinião, que as forças de
ocupação queiram propagar aqui suas heresias contra a vontade do
Clero e do povo holandês...
Nunca se procurou convencer
com argumentos falsos, responde tranquilamente o Pe. Tito.
Esperava-se apenas que o comissário do governo cedesse à
unanimidade da reação católica. Por outro lado, insisto no fato de
que a Igreja Católica ver-se-ia constrangida a repelir medidas que
se quisessem tomar contra a Sua doutrina; jamais as levaria ela em
conta. Informaram-me que eu permaneceria prisioneiro, enquanto
durasse essa resistência. Devo declarar que adoto como se minha
fosse a posição da Igreja holandesa…
O alto chefe de polícia,
Vogel, cheio de zelo, remete toda a documentação para Berlim, para
as secções III-I-4 e 7, acompanhada da seguinte anotação:
‘A detenção foi efetuada
no dia 19 de janeiro de 1942. Brandsma foi acusado de fazer pressão
sobe os Diretores de jornais. Como o próprio Brandsma relata, em seu
depoimento, o Arcebispo de Jong e ele sabotam, pela imprensa, no
esforço para unificar o povo holandês.
O veredito tombou dos lábios
do juiz Hardegen, decisivo e impiedoso: prisão até o final da
guerra. Nada mais resta ao acusado senão confiar em Deus.
Em sua cela, o prisioneiro
escreverá Aan Jezus, pequeno canto em cinco estrofes, o
último de seus poemas. A reclusão, aí diz ele, é apenas
aparente, é apenas uma forma de silêncio em que a alma se retira
para aspirar mais diretamente a Deus:
‘Quando Vos vejo
crucificado, sinto que me ides amar como um amigo íntimo… Se isto
me dá uma cruz a mais para suportar, todo sofrimento ser-me-á bom,
porque quero assemelhar-me mais a Vós…
Sou feliz em meus tormentos,
pois poder-se-á denominar tortura essa sorte que me vai unir a Vós?
Ó deixai-me só neste frio…
Não tenho mais necessidade de ninguém… A solidão já não me
causa medo… Pois que Vós estais junto a mim… E como eu Vos
encontrei tão bem… Ficai, ficai, Vós me consolais… Nada é
penoso junto de Vós’.
Se a mais amarga solidão se
abate sobre esse homem de ação, inspirando-lhe admiráveis
meditações de prisioneiro que um dia serão publicadas sob o título
de Mijn cel, é porque ela constituía também sua vocação.
Enquanto lhe preparam em Scheveningen, em Haia, em Berlim, uma longa
detenção, exclama como Jó: ‘Deus me deu belos dias; de Sua mão
aceitarei também os maus’”.
“Ruas,
praças públicas, grupos de juventude e colégios trazem o seu nome.
Recordações imperecíveis, comoventes ou trágicas, guardam vivo no
coração da Holanda o pequeno Carmelita de Nimegue, de Scheveningen,
de Amersfoort, de Dachau. Muitos cristãos já o escolhem como
intercessor, muitos pais lhe recomendam os filhos, corações
fervorosos confiam a ele os pecadores. E
quantos corações triturados recitam, ao pé de uma cruz, o último
poema do pequeno monge, escrito quando ele dava seus primeiros passos
para o calvário!”
(Cfr. ob. cit., p. 124).
Poema
Ó
Jesus, quando Te contemplo,
Eu
redescubro a sós contigo,
Que
Te amo e que Teu Coração
Me
ama como a um dileto amigo.
Ainda
que a descoberta exija
Coragem,
faz-me bem a dor:
Por
ela me assemelho a Ti,
Que
ela é o caminho
redentor.
Na
minha dor me rejubilo;
Já
não a julgo sofrimento,
Mas
sim predestinada escolha,
Que
me une a Ti neste momento.
Deixa-me,
pois, nesta quietude,
Malgrado
o frio que me alcança,
Presença
humana não permitas,
Que
a solidão já não me cansa.
Pois
de Ti sinto-me tão próximo
Como
jamais antes senti.
Doce
Jesus, fica comigo,
Que
tudo é bom junto de Ti.
(Beato
Tito Brandsma, Presbítero e Mártir da
Ordem
Carmelita)
_________________________
Fonte: Josse Alzin, O Crime de um Frade, Livro Quarto – Um pequeno monge luta contra o Inferno, Cap. Processo e Prisão, pp. 97-106; Editora do Mensageiro do Carmelo, Rio de Janeiro, 1956.
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