“Como
são felizes aquelas duas pessoas!”
Comentavam, não sem inveja, os habitantes de uma pequena cidade,
onde vivia um par de irmãos.
Ele
era o chefe de uma grande filial, e quase não dispunha de tempo
suficiente para as refeições. Chegasse, porém, à tarde, cansado e
exausto de fadiga, encontrava a casinha feito um brinco. A irmã
organizava tudo, com tanto asseio e carinho, que ele se sentia tão
bem, a ponto de esquecer os aborrecimentos dos negócios. Nenhum
sinal de poeira se encontrava sobre os móveis; ao contrário, ela
guarnecia com um ramalhete, e no extremo inverno, ao menos com uma
florzinha o aposento do irmão. Uma roupa agradável estava sempre
reservada para o repouso dele. Enfim, tudo o que se possa imaginar em
comodidade estava preparado.
Quando
se aproximava a hora da chegada, corria ela pressurosa da cozinha
para a janela, a fim de recebê-lo com o sorriso nos lábios e uma
palavra de saudação. O irmão de tal forma já se
tinha acostumado a tudo isso, que o recebia com uma indiferença sem
par. Nem sequer refletia que toda aquela atividade e gentileza da
irmã eram dirigidas, unicamente, a ele. Ignorava que a mana, que o
fazia viver como nobre, era miseravelmente pobre. Disposta a fazer
qualquer sacrifício pelo irmão, nada mais recebia dele do que a
moeda fria para as despesas da casa, e um ou outro presente, por
ocasião do aniversário dela ou do Natal. Seu coração só pulsava
para os negócios; que restava lá para uma irmã?
Não
notava que ela se tornava sempre mais pálida, não sentia como
depois de certo tempo, ela devia empregar todas as forças, para
comparecer sempre alegre como antes; não reparava como cambaleava
pelo quarto, amparando-se aqui e acolá.
E,
quando um dia, não pode mais abandonar o leito, ele não deixou de
externar um mal humor. O médico, que atestou ser bem sério o estado
da doente, ele o reputou, interiormente, por um idiota.
Entretanto,
quando depois de alguns dias, viu o cadáver pálido da irmã baixar
ao ataúde, ficou abatido e prosternado como um ébrio.
Os
dias seguintes mostraram-lhe, bem ao claro, que espírito bom tinha
deixado a casa. Só agora ele reconhecia o amor grande e infatigável
de sua irmã, amor que antes deixara despercebido e considerara-o tão
natural. Ah! Se ela lhe aparecesse uma única vez, para de joelhos,
dar-lhe os agradecimentos!
O
que acabo de narrar, meu amigo, não é uma novidade. Tu mesmo já
viveste este episódio. Ele se repete em todos os lugares, em todas
as cidades, em quase todas as famílias. Não é lamentável? Mas,
muito mais triste é o fato de não sentirmos aquele amor inflamado
que desde o nascimento nos embala, nos protege, e nos acompanha,
passo por passo, nesta vida; aquele amor, tão grande como Deus
mesmo: refiro-me ao Amor personificado em Deus, – o Espírito
Santo. É verdade que ainda pensamos Nele uma vez, na Festa
de Pentecostes; talvez um
lampejo de sua veneração nos inflamou, momentaneamente, ao
recebermos o santo Crisma. Depois disso, tudo caiu no esquecimento.
Até mesmo as orações que Lhe dirigimos não nos aquecem mais, nem
sequer evocam à consciência a lembrança daquele infinito Amor.
Como
aquele irmão “solícito”,
que habitualmente presenteava a irmã em determinadas ocasiões,
assim também nós, com os corações frios, de quando em vez jogamos
uma palavra ao Divino Espírito Santo. Entretanto, Ele nos ama muito
mais do que uma mãe nos pode amar. Pois, já nos amava desde toda a
eternidade. Foi Ele que formou o nosso ser e nos insuflou o sopro da
vida; é Ele a quem todos nós agradecemos os dotes do corpo e as
faculdades do espírito. Foi Ele que nos transformou em Templos de
Deus, e guarneceu esses Templos com admiráveis prerrogativas. Será
possível que só nos lembremos disto tudo, quando Ele se separar de
nós, e separar-se para sempre?
Não,
seria a perdição eterna!
Por
isso, esforcemo-nos por conhecer esse Divino Espírito, esse Espírito
misterioso, infinito, eterno, esse Paráclito, que nos foi enviado
por Jesus, a ser-nos Guia na encruzilhada desta vida.
A
esse fim nos devem conduzir as leituras seguintes.
Quando
o grande Apóstolo das Gentes na sua terceira viagem chegou à Éfeso,
procurou alguns habitantes, entre os quais supunha,
com grande perspectiva, encontrar compreensão para o seu Evangelho.
Encontrou,
então, doze homens, mais ou menos, que, mui possivelmente, em uma
viagem a Jerusalém, tinham conhecido São João Batista, ouvido suas
pregações sobre o Messias vindouro, e recebido o batismo de suas
mãos. Achou portanto, entre eles, um terreno favorável.
Interrogou-os, então: “Recebestes o Espírito Santo,
quando abraçastes a fé?”
Eles responderam admirados: “Nem sequer ouvimos dizer que
há um Espírito Santo”.
Não tinham, pois, percebido a advertência de São João Batista, de
que o futuro Messias havia de batizar em fogo e no Espírito Santo.
A
mesma coisa sucede, hoje, entre os católicos; a doutrina do Espírito
Santo e a sua voz nos corações de muitos são ouvidas sem atenção.
Mas
a principal solicitude de São Paulo foi, como atesta a sua pergunta
aos discípulos do Batista, ministrar-lhes o conhecimento da Terceira
Pessoa em Deus, toda sua força e superabundância.
E
nomeadamente foi Saõ Paulo o instrumento predileto do Espírito
Santo, que não se cansava de indigitar, sempre de novo, o Divino
Paráclito, correspondendo ao exemplo do Divino Mestre, que timbrava
em inclinar a atenção dos discípulos para o Espírito divino: O
Espírito Santo será sempre o Vosso Guia. Quando titubeardes na
Missão Divina de pregar, Ele inspirar-vos-á a palavra inflamada e
verdadeira.
Será
o Paráclito Divino que lhes esclarecerá, plenamente, os
ensinamentos de Nosso Senhor, e preserva-los-á do erro. Até mesmo
perante reis e príncipes não precisarão temer os pecadores
iletrados; pois a autoridade soberana, a Terceira Pessoa do Deus
Trino falará por eles.
“Não
sois vós que falais, mas o Espírito de Vosso Pai é que fala em
vós”.
Quando, em face das dificuldades apostólicas, o temor se acercar
deles, ser-lhes-á a força invencível. Em seu nome devem batizar os
convertidos, do mesmo modo que em nome do Pai e do Filho.
Tão
grande é o Espírito da verdade, que pecados contra Ele não podem
ser perdoados. “Quem proferir palavra contra o Filho do
Homem será perdoado; mas quem falar contra o Espírito Santo não
será perdoado nem neste mundo, nem no futuro”.
O Divino Salvador chega ao
ponto de reputar por um bem a Sua separação dos Apóstolos, porque,
por este meio se lhes possibilitará a chegada do Divino Consolador:
“É-vos conveniente que Eu vá; porque, se Eu não for,
não virá a vós o Consolador; mas, se Eu for, vo-lo enviarei”.
Quão
grande é a consideração em que o Divino Mestre tem o Espírito
Santo, expressando estas e muitas palavras; e como soube com isto,
acender nos corações dos Apóstolos uma grande ânsia pelo sublime
Hóspede! Toda a confiança do Homem-Deus sobre a atividade dos
Apóstolos e da Igreja repousa no Espírito Santo. E, realmente, foi
em virtude do Espírito Santo que os discípulos renovaram a face da
terra. Não é de admirar que São Paulo não se canse de mencioná-Lo
em suas pregações e Epístolas.
Ao
mesmo escopo devem servir as leituras que seguem. Enquanto os filhos
do século são dominados pelo espírito do mundo, queiramos conhecer
mais de perto a Terceira Pessoa misteriosa em Deus, e aprender a
amá-La. Ela não nos deve mais parecer como uma coisa secundária. A
palavra “Espírito Santo”
deve encontrar um eco profundo em nossa alma. A oração dirigida a
Ele deve tornar-se uma exigência do nosso coração. Sim, queiramos
esforçar-nos por fazê-Lo no Amigo inseparável e Companheiro na
travessia desta vida.
Quando
São Paulo chegou à Atenas, a cidade dos filósofos antigos,
encontrou altares, erigidos em honra das diversas divindades. Em um
deles deparou com a curiosa inscrição: “Ao Deus
desconhecido”. Os atenienses
pagãos receavam ter esquecido alguma deidade, e com isso queria
aplacar a sua cólera.
Para
muitos católicos o Espírito Santo é também um “Deus
desconhecido”. Ergamos-Lhe,
pois, um Altar em nosso coração. Sim, temos obrigação de fazê-lo,
pois somos “Templos do Espírito Santo”.
É possível que queiramos deixar este Templo completamente vazio?
Não, temos de edificar-Lhe um altar, conhecendo-O mais de perto, e
tributando-Lhe assim, um culto de maior veneração e amor. Não
queiramos unicamente ser portadores do nome de um templo, mas sê-lo
na realidade. Rezemos, pois, diariamente ao Espírito Consolador, e
pronunciemos o seu nome com muita devoção, para que possamos
compreender as leituras seguintes, para que Ele nos ilumine e nos
torne partícipes da Sua doutrina.
“Ó
Deus, que ilustrastes os corações dos Vossos fiéis com as luzes do
Espírito Santo, concedei-nos que, no mesmo Espírito compreendamos o
que é justo, e nos alegremos sempre com a Sua consolação”.
Nós vo-Lo pedimos por Cristo, Nosso Senhor. Amém.
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Fonte:
Rev.
Pe. Agostinho Kinscher, “Dem
Unbekannten Gott – Ao Deus Desconhecido”,
Cap. I, pp. 7-12. Editora Mensageiro da Fé Ltda. Salvador/BA, 1943.
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