Todos os Santos e as Santas de Deus |
6ª Parte
Segundo a sentença de Deuteronômio 22, 5: “A mulher não se vestirá de homem nem o homem se vestirá de mulher; porque aquele que tal faz é abominável diante de Deus”.1
O Doutor Angélico o confirma: “... em si mesmo, é pecaminoso uma mulher trazer trajes viris, ou inversamente…”.2
Mas, “o Mestre do bem pensar”3 em seguida, também ensinou: “Pode-se, porém, proceder desse modo e sem pecado, se o exigir a necessidade: quer para ocultar-se dos inimigos, quer por falta de outras roupagens, quer por outro motivo semelhante”.4
Seguindo os ensinamentos do “Doctor communis Ecclesiae”, houveram variados exemplos na História da Igreja, dos quais, publico os seguintes:
6º Exemplo
Santa Margarida, Virgem e Penitente.
“Margarida, dita Pelágio, virgem belíssima, rica e nobre, foi criada com a maior solicitude por seus pais, que a proveram de ótimos costumes, com tanto pudor que não se deixava ver por homem algum. Enfim, um rapaz de família nobre pediu-a em casamento e, com o consentimento dos pais, foram feitos com grandes gastos e agradável decoração todos os preparativos necessários para as bodas. No dia do casamento, rapazes, moças e toda a nobreza festejavam com alegria diante do leito nupcial já preparado, quando por inspiração de Deus, ao perceber como a tão danosa perda da virgindade era aplaudida, a virgem prosternou-se no chão e avaliou tanto em seu coração os inconvenientes do casamento, que logo desprezou todas as alegrias desta vida como se fossem estrume. Daí por que se absteve naquela noite de ter relações com seu marido, e à meia-noite, depois de ter se recomendado a Deus, cortou os cabelos e fugiu às escondidas, com roupas masculinas.
Chegando a um mosteiro distante e chamando-se de irmão Pelágio, foi recebida pelo abade e cuidadosamente instruída. Ela se comportou de maneira tão santa e tão devota, que com a morte do Provisor de um mosteiro feminino, o abade, aconselhado pelos anciãos, impôs a ela este cargo. Enquanto servia às virgens com determinação e inocência o alimento não apenas do corpo, mas também da alma, o invejoso Diabo colocou obstáculos ao bom curso das coisas, inspirando um crime. Ele incitou ao adultério a virgem que era mensageira do mosteiro, e quando seu ventre cresceu e já não podia ser escondido, todas as virgens e todos os monges ficaram consternados de vergonha e de dor, e sem julgamento e sem investigação condenaram Pelágio, que como Prepósito, era o único que tinha contato frequente com ela.
Por essa desonra, foi expulso do mosteiro e recluso em uma gruta aonde o mais severo dos monges levava-lhe muito pouco pão de cevada e água. Depois os monges se retiraram e deixaram Pelágio sozinho, que suportou tudo com paciência e não se deixou perturbar por nada, sempre agradecendo a Deus e continuamente se confortando pelos exemplos dos Santos. Enfim, quando soube que sua morte se aproximava, mandou uma carta ao abade e aos monges:
'Nascida de sangue nobre, fui chamada no mundo secular de Margarida, e para atravessar o mar das tentações atribuí-me o nome de Pelágio. Ao me passar por homem não menti, como mostram os fatos, pois do crime ganhei virtude, inocente fiz penitência, e como os homens ignoravam que sou mulher, deixem às santas irmãs o cuidado de me sepultar, e a visão de meu corpo morto será a expiação de minha vida, já que as mulheres reconhecerão como virgem aquela que os caluniadores julgaram ser uma adúltera'.
Quando os monges e monjas ouviram a leitura desta carta, correram para a caverna, as mulheres reconheceram que Pelágio era uma mulher e virgem intacta. Todos fizeram penitência e ela foi enterrada com honra no mosteiro das virgens”.5
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1. Bíblia Sagrada – Traduzida da Vulgata Sixto-Clementina e anotada pelo Pe. Matos Soares, p. 222. 9ª Edição, Ed. Paulinas, 1957.
2. São Tomás de Aquino, “Suma Teológica”, II-IIae. q. 169 a.2, ad 3.
3. São Paulo VI, Discurso pronunciado no Congresso Internacional Tomista, a 20 de abril de 1974.
4. São Tomás de Aquino, “Suma Teológica”, II-IIae. q. 169 a.2, ad 3.
5. Beato Jacopo de Varazze, Arcebispo de Gênova, “Legendae Sanctorum, vulgo Historia Lombardica dicta” – Legenda Áurea - Vidas de Santos, pp. 852-853. Tradução Portuguesa, Companhia das Letras, 2003.
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