Blog Católico, para os Católicos

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"Uma vez que, como todos os fiéis, são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, os leigos têm a OBRIGAÇÃO e o DIREITO, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra; esta obrigação é ainda mais presente se levarmos em conta que é somente através deles que os homens podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo. Nas comunidades eclesiais, a ação deles é tão necessária que, sem ela, o apostolado dos pastores não pode, o mais das vezes, obter seu pleno efeito" (S.S. o Papa Pio XII, Discurso de 20 de fevereiro de 1946: citado por João Paulo II, CL 9; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 900).

domingo, 15 de novembro de 2015

A Sempre Atual Alocução do Beato Paulo VI



Livrai-nos do Mal1
(Alocução de 15/11/1972)


Atualmente, quais são as maiores necessidades da Igreja?

Não deveis, considerar a nossa resposta simplista, ou até supersticiosa e irreal: uma das maiores necessidades é a defesa daquele mal, a que chamamos Demônio.

Antes de esclarecermos o nosso pensamento, convidamos o vosso a abrir-se à luz da fé sobre a visão da vida humana, visão que, deste observatório, se alarga imensamente e penetra em singulares profundidades. E, para dizer a verdade, o quadro que somos convidados a contemplar com realismo global é muito lindo. É o quadro da criação, a obra de Deus, que o próprio Deus, como espelho exterior da sua Sabedoria e do Seu poder, admirou na sua beleza substancial.2

Além disso, é muito interessante o quadro da história dramática da humanidade, da qual emerge a da Redenção, a de Cristo, da nossa salvação, com os seus magníficos tesouros de revelação, de profecia, de santidade, de vida elevada a nível sobrenatural, de promessas eternas.3 Se soubermos contemplar este quadro, não poderemos deixar de ficar encantados; tudo tem um sentido, tudo tem um fim, tudo tem uma ordem e tudo deixa entrever uma Presença-Transcendência, um Pensamento, uma Vida e, finalmente, um Amor, de tal modo que o universo, por aquilo que é e por aquilo que não é, se apresenta como uma preparação entusiasmante e inebriante para alguma coisa ainda mais bela e mais perfeita.4 A visão cristã do cosmo e da vida é, portanto, triunfalmente otimista; e esta visão justifica a nossa alegria e o nosso reconhecimento pela vida, motivo porque, celebrando a glória de Deus, cantamos a nossa felicidade.


O Ensinamento Bíblico

Esta visão, porém, é completa, é exata? Não nos importamos, porventura, com as deficiências que se encontram no mundo, com o comportamento anormal das coisas em relação à nossa existência, com a dor, com a morte, com a maldade, com a crueldade, com o pecado, numa palavra, como o mal? E não vemos quanto mal existe no mundo, especialmente quanto mal moral, ou seja, contra o homem e, simultaneamente, embora de modo diverso, contra Deus? Não constitui isto um triste espetáculo, um mistério inexplicável? E não somos nós, exatamente nós, cultores do Verbo, os cantores do Bem, nós, crentes, os mais sensíveis, os mais perturbados perante a observação e a prática do mal? Encontramo-lo no reino da natureza, onde muitas das suas manifestações, segundo nos parece, denunciam uma desordem. Depois, encontramo-lo no âmbito humano onde se manifestam a fraqueza, a fragilidade, a dor, a morte, e ainda coisas piores; observa-se uma dupla lei contrastante, que, por um lado, quereria o bem e, por outro, se inclina para o mal, tormento este que São Paulo põe em humilhante evidência para demonstrar a necessidade e a felicidade de uma graça salvadora, ou seja, da salvação trazida por Cristo;5 já o poeta pagão Ovídio, tinha denunciado este conflito interior no próprio coração do homem: “video meliora proboque, deteriora sequor”. Encontramos o pecado, perversão da liberdade humana e causa profunda da morte, porque é um afastamento de Deus, fonte da vida6 e, também, a ocasião e o efeito de uma intervenção, em nós e no nosso mundo, de um agente obscuro e inimigo, o Demônio. O mal já não é apenas uma deficiência, mas uma eficiência, um ser vivo, espiritual, pervertido e perversor. Trata-se de uma realidade terrível, misteriosa e medonha.

Sai do âmbito dos ensinamentos bíblicos e eclesiásticos quem se recusa a reconhecer a existência desta realidade; ou melhor, quem faz dela um princípio em si mesmo, como se não tivesse, como todas as criaturas, origem em Deus, ou a explica como uma pseudo-realidade, como uma personificação conceitual e fantástica das causas desconhecidas das nossas desgraças.

O problema do mal, visto na sua complexidade e na sua absurdidade em relação à nossa racionalidade, torna-se obsessionante. Constitui a maior dificuldade para a nossa compreensão religiosa do cosmo. Foi por isso, que Santo Agostinho penou durante vários anos: “Quaerebam unde malum, et non erat exitus”, procurava de onde vinha o mal e não encontrava explicação.

Vejamos, então, a importância que adquire a advertência do mal, para a nossa justa concepção cristã do mundo, da vida, da salvação. É o próprio Cristo quem nos faz sentir esta importância. Primeiro, no desenvolvimento da história haverá quem não recorde a página, tão densa de significado, da tríplice tentação? E, ainda, em muitos episódios evangélicos, nos quais o Demônio se encontra com o Senhor e aparece nos seus ensinamentos?7E como não haveríamos de recordar que Jesus Cristo, referindo-se três vezes ao Demônio, como seu adversário, o qualifica como “Príncipe deste mundo”?8 E a ameaça desta nociva presença é indicada em muitas passagens do Novo Testamento. São Paulo chama-lhe “deus deste mundo”9 e previne-nos contra as lutas ocultas, que nós cristãos, devemos travar não só com o Demônio, mas com a sua tremenda pluralidade: “Revesti-vos da armadura de Deus para que possais resistir às ciladas do Demônio. Porque nós não temos de lutar (só) contra a carne e o sangue, mas contra os Principados e Potestades, contra os Dominadores deste mundo tenebroso, contra os Espíritos malignos espalhados pelos ares”.10

Diversas passagens do Evangelho dizem-nos que não se trata de um só Demônio, mas de muitos11, um dos quais é o principal: Satanás, que significa o Adversário, o Inimigo; e, ao lado dele, estão muitos outros, todos, criaturas de Deus, mas decaídas, porque rebeldes e condenadas; constituem um mundo misterioso, transformado por um drama muito infeliz, do qual conhecemos pouco.

 
O Inimigo Oculto

Conhecemos, todavia, muitas coisas deste mundo diabólico, que dizem respeito à nossa vida e a toda a história humana. O Demônio é a origem da primeira desgraça da humanidade; foi o Tentador pérfido e fatal do primeiro pecado, o Pecado Original.12 Com aquela falta de Adão, o Demônio adquiriu um certo poder sobre o homem, do qual só a Redenção de Cristo nos pode libertar.

Trata-se de uma história que ainda hoje existe: recordemos os exorcismos do Batismo e as frequentes referências da Sagrada Escrituras e da Liturgia ao agressivo e opressivo “domínio das trevas”.13 Ele é o Inimigo número um, o Tentador por excelência. Sabemos, portanto, que este ser mesquinho e perturbador existe realmente e, que ainda atua com astúcia traiçoeira; é o Inimigo oculto que semeia erros e desgraças na história humana.

Deve-se recordar a significativa parábola evangélica do trigo e da cizânia, síntese e explicação do ilogismo que parece presidir às nossas contrastantes vicissitudes: “Inimicus homo hoc fecit”.14 É o “assassino desde o princípio… e pai da mentira”, como o define Cristo15; é o insidiador sofista do equilíbrio moral do homem. Ele é o pérfido e astuto encantador, que sabe insinuar-se em nós através dos sentidos, da fantasia, da concupiscência, da lógica utópica ou de desordenados contatos sociais na realização de nossa obra, para introduzir neles desvios, tão nocivos quanto, na aparência, conformes às nossas estruturas físicas ou psíquicas, ou às nossas profundas aspirações instintivas.

Este capítulo, relativo ao Demônio e ao influxo que ele pode exercer sobre cada pessoa, assim como sobre comunidades, sobre inteiras sociedades ou sobre acontecimentos, é um capítulo muito importante da doutrina católica, que deve ser estudado novamente, dado que hoje o é pouco. Algumas pessoas julgam encontrar nos estudos da psicanálise ou da psiquiatria, ou em práticas evangélicas, no princípio da sua vida pública: de espiritismo, hoje tão difundidas em alguns países, uma compensação suficiente. Receia-se cair em velhas teorias maniqueístas, ou em divagações fantásticas e supersticiosas. Hoje, algumas pessoas preferem mostrar-se fortes, livres de preconceitos, assumir ares de positivistas, mas, depois, dão crédito a muitas superstições de magia ou populares, ou, pior, abrem a própria alma – a própria alma batizada, visitada tantas vezes pela presença eucarística e habitada pelo Espírito Santo – às experiências licenciosas dos sentidos, às experiências deletérias dos estupefacientes, assim como às seduções ideológicas dos erros na moda, fendas estas por onde o Maligno pode facilmente penetrar e alterar a mentalidade humana.

Não quer dizer que todo o pecado seja devido diretamente à ação diabólica; mas também à verdade que aquele que não vigia, com um certo rigor moral, a si mesmo16, se expõe ao influxo do “mysterium iniquitatis”, ao qual São Paulo se refere17 e que torna problemática a alternativa da nossa salvação.

A nossa doutrina torna-se incerta, obscurecida como está pelas próprias trevas que circundam o Demônio. Mas a nossa curiosidade, excitada pela certeza da sua existência múltipla, torna-se legítima com duas perguntas: – Há sinais da presença da ação diabólica e quais são eles? – Quais são os meios de defesa contra um perigo tão traiçoeiro?


A Ação do Demônio

A resposta à primeira pergunta requer muito cuidado, embora os sinais do Maligno às vezes pareça tornar-se evidentes. Podemos admitir a sua atuação sinistra onde a negação de Deus se torna radical, sutil ou absurda; onde o engano revela hipócrita, contra a evidência da verdade: onde o amor é anulado por um egoísmo frio e cruel; onde o nome de Cristo é empregado com ódio consciente e rebelde18; onde o espírito do Evangelho é falsificado e desmentido; onde o desespero se manifesta como a última palavra, etc. Mas é um diagnóstico demasiado amplo e difícil, que agora não ousamos aprofundar nem autenticar; que não é desprovido de dramático interesse para todos, e ao qual até a literatura moderna dedicou páginas famosas. O problema do mal continua a ser um dos maiores e permanentes problemas para o espírito humano, até depois da resposta vitoriosa que Jesus Cristo dá a respeito dele.

Sabemosescreve o evangelista São João – que todo aquele que foi gerado por Deus, Deus guarda-o, e o Maligno não o toca”.19


A Defesa do Cristão

A outra pergunta, que defesa, que remédio, há para combater a ação do Demônio, a resposta é mais fácil de ser formulada, embora seja difícil pô-la em prática. Poderemos dizer que tudo aquilo que nos defende do pecado nos protege, por isso mesmo, contra o Inimigo invisível. A graça é a defesa decisiva. A inocência assume um aspecto de fortaleza. E, depois, todos devem recordar o que a pedagogia apostólica simbolizou na armadura de um soldado, ou seja, as virtudes que podem tornar o cristão invulnerável20. O cristão deve ser militante; deve ser vigilante e forte21; e, algumas vezes, deve recorrer a algum exercício ascético especial, para afastar determinadas invasões diabólicas; Jesus ensina-o, indicando o remédio “na oração, e no jejum”22. E o Apóstolo indica a linha mestra que se deve seguir: “Não te deixes vencer pelo mal; vence antes o mal com o bem”.23

Conscientes, portanto, das presentes adversidades em que hoje se encontram as almas, a Igreja e o mundo, procuraremos dar sentido e eficácia à usual invocação da nossa oração principal: “Pai nosso… livrai-nos do mal!”.

Contribua para isso também a nossa Bênção Apostólica.



1“Anjos e Demônios na Bíblia”, Revista de Cultura Bíblica – Órgão da Liga de Estudos Bíblicos (LEB), Ano 24 – Nova Fase, Vol. V, nn. 17 e 18, pp. 5-9; Coordenador J.E.M.Terra, S.J., Edições Loyola – LEB, S. Paulo, 1981.
2Cfr. Gên. 1, 10ss.
3Cfr. Ef. 1, 10.
4Cfr. 1 Cor. 2, 9; 13, 2; Rom. 8, 19-23.
5Cfr. Rom. 7.
6Cfr. Rom. 5, 12
7Cfr. Mat. 12, 43.
8Cfr. Jo. 12, 31; 14, 30; 16, 11.
9Cfr. 2 Cor. 4, 4.
10Cfr. Ef. 6, 11-12.
11Cfr. Luc. 11, 21; Marc. 5, 9.
12Cfr. Gên. 3; Sab. 1, 24.
13Cfr. Luc. 22, 53.
14Cfr. Mat. 13, 2.
15Cfr. Jo. 8, 44-45.
16Cfr. Mat. 12, 45; Ef. 6, 11.
17Cfr. 2 Tes. 2, 3-12.
18Cfr. 1 Cor. 16, 22; 12, 3.
19Cfr. 1 Jo. 5, 19.
20Cfr. Rom. 13, 13; Ef. 6, 11.14.17; 1 Tes. 5, 8.
21Cfr. 1 Ped. 5, 8.
22Cfr. Marc. 9, 29.
23Cfr. Rom. 12, 21; Mat. 13, 29.

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