Saudade
e Oração
Não
julguemos que lembrar nossos mortos é ter apenas deles uma saudade
que aos poucos vai decrescendo em intensidade, à medida que passam
os anos. Chorar nossos mortos e perpetuar-lhes a lembrança no
mármore, na tela, no livro é permitido, sim. Porém, não fiquemos
só nisto. Juntemos à saudade a oração. Não basta chorar,
precisamos orar. E nunca se precisa tanto de oração como depois da
morte. No Purgatório as pobres almas estão como o paralítico da
piscina que dizia a Jesus: – Hominem non habeo!
Senhor, eu não tenho um homem que me lance na piscina para ser
curado.
Dependem
aquelas almas santas de nossos sufrágios, de nossas orações e
sacrifícios. Deus as entregou à nossa caridade. Sempre é eficaz a
nossa oração pelas almas.
“É
infinitamente mais útil e eficaz a oração pela libertação dos
defuntos que padecem no Purgatório, que a oração pelos pecadores
da terra, cuja perversidade e más disposições paralisam os
esforços para os salvar. As santas almas não põem obstáculos
algum à eficácia das orações que por elas fazemos”.
Tal é a opinião do piedoso oratoriano Pe.
Faber.
Juntemos
à nossa imensa saudade dos mortos nossos queridos, a oração e
sempre a oração.
Escreveu
o Pe. Sertillanges:
“A lembrança dos mortos sem a oração, é uma lembrança
fria, um triste pensamento. É uma exploração do nada. Porém, com
a oração, é um vento que sopra em direção a Deus, é uma
ascensão nas asas da esperança”.
Oremos
pelas almas benditas que padecem no Purgatório! Demos-lhe a esmola
de nossas preces fervorosas e da riqueza das indulgências do tesouro
da Igreja.
Dizia
São Francisco de
Sales: “Vós que chorais inconsoláveis a perda de vossos
entes queridos, eu não vos proíbo de chorar, não! Chorai, mas
procurai adoçar vossas lágrimas com o suave bálsamo da oração
que muito mais do que todas as demonstrações exteriores de pesar,
pode concorrer para aliviar as almas que a morte vos arrebatou”.
Esta
é também a linguagem da Igreja, nossa Mãe. Não proíbe nossas
lágrimas. É tão humano chorar! Todavia não fiquemos tão só num
pranto nossas orações. Saudade e oração. Choremos nossos mortos
como cristãos verdadeiros.
Meio
Fácil
Sim,
é o mais fácil dos meios de socorrer os mortos, a oração. Alguns
podem achar difícil o jejum, ou a mortificação, podem se queixar
da pobreza que não lhes
permite dar esmolas, mas quem pode se escusar e desculpar-se de não
poder orar?
A
mais curta oração feita com as devidas disposições é um alívio
para os fiéis defuntos. Quem não pode bradar: dai-lhes,
Senhor, o descanso eterno!
Fez
Nosso Senhor tantas promessas à oração! “Pedi e
receberei, batei e se vos há de abrir. É preciso sempre orar”.
A oração de Marta e Maria leva Jesus a ressuscitar Lázaro. Nossas
preces pelos defuntos hão de tirar as pobres almas daquele estado de
morte em que se encontram.
As
lágrimas, as flores, os mausoléus pomposos nada aproveitam aos
mortos. É melhor rezar por eles. “Poupai vossas
lágrimas, dizia São João
Crisóstomo, pelos defuntos e dai-lhes mais orações”.
Escreve Santo Ambrósio numa das suas cartas a Faustino, que acabava
de perder a irmã: “É preciso assistí-la com orações
mais do que chorá-la, e convém recomendar a sua alma muito a Deus
na oração. Chora menos e reza mais”.
Repitamos
também esta recomendação a tantos que choram seus mortos sem se
lembrarem de uma prece, de uma Santa Missa, de uma obra de caridade
para sufragar-lhes as pobres almas. Quantas orações tão belas e
eficazes e poderosas para o sufrágio dos nossos mortos! O Padre
Nosso, a Ave Maria, o De
Profundis, o Ofício dos
mortos. A Igreja, nossa Mãe, nos dá exemplo de oração pelos
defuntos. Termina muitas vezes as suas preces litúrgicas como as
Horas canônicas pela súplica tocante: “Fidelium
animae per misericordiam Dei requiescant in pace”. E as almas dos
fiéis pela misericórdia de Deus descansem em paz!
Desde os tempos primitivos, e já nas catacumbas, a prece pelos
defuntos era conhecida e praticada na Igreja. Encontram-se nas pedras
inscrições como estas: Vitório,
que Deus refrigere o teu espírito! Antônia, doce alma, que Deus te
dê o refrigério! Que Cristo te ponha na paz! Que tua alma repouse
em Deus! Sempre as
súplicas a Deus pedindo refrigério,
luz e paz para os mortos.
É muito agradável a Deus a oração pelos mortos.
Um
dia, Santa Gertrudes rezava com fervor pelos defuntos, quando Nosso
Senhor lhe fez ouvir estas palavras: “Eu sinto um
prazer todo especial pela oração que Me fazem pelos fiéis
defuntos, principalmente quando vejo que à compaixão natural se
junta a boa vontade de a tornar mais meritória. A oração dos fiéis
desce a todo instante sobre as almas do Purgatório como um orvalho
refrigerante e benéfico, como um bálsamo salutar que adoça e
acalma suas dores e ainda as livra das suas prisões mais ou menos
rapidamente, conforme o fervor da devoção com que é feita”.
Noutra ocasião, disse Nosso Senhor a sua serva querida: “Muitíssimo
grata Me é a oração pelas almas do Purgatório, porque por ela
tenho ocasião de libertá-las das suas penas e introduzi-las na
glória eterna”.
Oremos
pelos fiéis defuntos!
Sim,
já que a oração é tão poderosa para socorrer os mortos, aliviar
as penas das pobres almas, vamos em socorro do Purgatório! “A
oração da alma fervorosa,
diz São Bernardo, sobe até o Céu e de lá não desce
sem ser ouvida. Se pede amor de Deus, vem dele cheia; se pede
humildade, esta logo a vem adornar; se pede a libertação das almas
do Purgatório, tem igualmente todo poder para alcançá-la”.
São
João Damasceno escreve: “Não vos poderia narrar
tantos testemunhos encontrados na vida dos Santos pelos quais se
provam claramente as vantagens da oração que se fazem pelos
defuntos! Não é em vão que se reza pelos mortos”.
Todas
as orações são úteis para as almas, mas algumas mais do que
outras. Por exemplo, as orações canônicas do Breviário ou Divino
Ofício são muito mais valiosas e eficazes. Que valor não terá uma
prece oficial da Igreja pelos mortos! Depois, aproveitemos o tesouro
da Via Sacra, acompanhando os Mistérios Dolorosos da Paixão do
Salvador e oferecendo o Preciosíssimo Sangue para refrigério do
Purgatório. Que dizer do Rosário? Que tesouro da Igreja padecente!
Apliquemos
todas as indulgências do Rosário pelas almas. Uma jovem libertada
do Purgatório pelo Rosário de São Domingos, apareceu a este servo
da Virgem e lhe disse: “Em nome das almas do
Purgatório eu vos conjuro, pregai por toda parte e fazei conhecer a
toda gente a devoção do Rosário. Que os fiéis apliquem às pobres
almas as indulgências e os outros favores espirituais desta devoção
tão santa. A Santíssima Virgem e os Anjos e Santos se alegram com o
Rosário, e as almas libertadas por ele rezam no Céu pelos seus
libertadores”.
Façamos
Novenas e orações em comum pelos mortos, principalmente logo depois
que deixarem eles este mundo.
Há o piedoso costume de se fazer uma Novena pelo falecido, começando
logo no dia seguinte ao da morte ou do enterro. Durante nove dias se
reúne a família em torno de um altarzinho para implorar a
misericórdia do Senhor pelo defunto. Multipliquemos fervorosas
preces pelos nossos mortos queridos e pelas almas mais abandonadas.
“Minha filha,
dizia certa vez Nosso Senhor a Santa Lutgarda, não
posso resistir às tuas súplicas. A alma pela qual pedes logo estará
livre dos seus sofrimentos”.
Ó, não será esta a resposta que nos dará Nosso Senhor também, se
orarmos com todo fervor de nossa alma, com toda caridade pelos
defuntos?
Um
santo Bispo, conta Rossingnolli em suas Maravilhas
do Purgatório, um santo
Bispo teve um sonho. Viu uma criança que com um anzol de ouro e uma
linha de prata retirava uma mulher de um profundo poço. Acordou,
abriu a janela e viu no cemitério, que lhe estava no fundo da casa e
vizinho, um menino tal como o que viu em sonho, ajoelhado junto a um
túmulo, em oração.
– Que
faz aí, menino? Perguntou-lhe o Bispo.
– Eu
rezo um Padre Nosso
e um De Profundis
pela alma de minha mãe, que aqui está sepultada.
Entendeu
logo o santo Prelado que a oração singela do pequenino era o anzol
de ouro e o Padre Nosso
e o De Profundis
o fio misterioso que vira em sonho. Tal é a nossa oração pelos
mortos.
EXEMPLO
Santa
Margarida de Cortona
e
as Almas do Purgatório
A
grande pecadora que foi Margarida de Cortona e que convertida veio a
ser a Madalena dos últimos tempos, pela admirável penitência e a
grande santidade a que chegou, era uma grande devota das santas almas
do Purgatório. Desde que se converteu dedicou-se, cheia de caridade,
a socorrer as almas sofredoras. Nosso Senhor lhe permitiu ver muitas
vezes a triste condição destas almas para lhe excitar a compaixão
e interceder por elas. Dois
negociantes foram assassinados, e por misericórdia de Maria
Santíssima, da qual eram fervorosos devotos, alcançaram uma
contrição perfeita na hora derradeira e se salvaram. Apareceram à
Santa e lhe disseram:
–
“Escapamos
da eterna condenação pela especial proteção de Maria Santíssima.
Mas teremos que padecer um horrível Purgatório para expiar nossas
injustiças e mentiras e pecados. Ó Serva de Deus, nós vos pedimos
que mandeis avisar nossos amigos e parentes que façam restituições
de nossos maus negócios e deem muitas esmolas aos pobres em paga de
nossas injustiças. Ajudai-nos, Margarida, com vossos sufrágios”.
A
Santa se empenhou muito com orações e penitências em socorrer
estas pobres almas. E assim fazia sempre que Nosso Senhor lhe
revelava a necessidade e as aflições de algumas almas do
Purgatório. Quando faleceu o pai da Santa penitente, ofereceu ela
por aquela alma querida muitas orações e toda sorte de sufrágios,
penitências e santas Comunhões.
Deus
Nosso Senhor lhe fez conhecer que as suas orações aliviaram as
almas do seu pai e da mãe, e que tiveram muito abreviados dias de
Purgatório.
Também
ao saber da morte de uma criada, Gillia, que durante muito tempo
ficou com ela, Margarida não cessou de recomendar esta alma da
pobrezinha a Nosso Senhor. Foi-lhe revelado que a criada ficaria no
Purgatório apenas até a festa da Purificação de Nossa Senhora e
logo seria levada ao Céu pelos Anjos.
Na
hora da morte, Santa Margarida de Cortona viu uma multidão de almas
com esplendor da glória do Céu que vinham ao encontro da sua
benfeitora, cheias de gratidão. Era a recompensa da sua dedicação
e devoção às Almas do Purgatório.
____________________
Fonte:
Mons.
Ascânio Brandão, “Tenhamos
Compaixão das Pobres Almas! – 30 Meditações e Exemplos Sobre o
Purgatório e as Almas”,
14 de Novembro, pp. 109-115. 2ª Edição, Editora Ave Maria Ltda,
São Paulo/SP, 1956.
Nenhum comentário:
Postar um comentário