A
Guarda de Honra do Sagrado Coração
Todos
os reis da terra têm sua guarda de honra, formada do que a nação
possui de mais nobre e devotado. O Reis dos reis, Jesus Cristo, quis
também ter Sua guarda de honra durante Sua vida mortal. Em Belém,
no Egito, em Nazaré, ela compunha-se de Maria e José; era pequena
pelo número, mas muito grande pela dignidade das personagens.
Durante Sua vida pública, o Salvador recebeu de Seu Pai, para O
acompanharem nos seus cursos e participarem de Seus trabalhos, os
doze Apóstolos e os setenta e dois discípulos. No Calvário, vemos
a corte do Redentor crucificado formada de Maria, Sua Mãe, algumas
santas mulheres, Maria Madalena e São João, aos quais podemos
ajuntar o Bom Ladrão. Estes últimos poderiam chamar-se, por título
especial, a Primeira Guarda de Honra do Sagrado Coração;
porque eles não foram somente as testemunhas constantes das chamas
de amor que Dele surgiram durante a Paixão, mas ainda tiveram o
grande privilégio de O ver aberto pela lança do soldado Longino, e
de contemplar a Chaga Dele, quando os membros frios de Jesus foram
depostos nos joelhos de Sua Mãe. Os olhos de amor puderam
então descobrir os Mistérios do Coração de Jesus pelas aberturas
feitas no Seu Corpo, diz São
Bernardo. Quem não teria querido participar da felicidade destas
almas fiéis? Mas que digo? É esta a linguagem da fé? Não temos na
Eucaristia este mesmo Corpo que foi pregado na
Cruz, este mesmo Sangue, que foi derramado no Calvário, este mesmo
Coração, que foi aberto para nos dar asilo?
Quereis
então, alma piedosa, fazer parte da Guarda de Honra do Sagrado
Coração? Ide muitas vezes visitá-Lo no Santo Tabernáculo. Oh!
Quantos são agradáveis ao Coração de Jesus aqueles que O visitam
muitas vezes, e fazem consistir suas delícias em Lhe fazer companhia
nas igrejas onde Ele reside em Seu Sacramento! Ele exigiu de Santa
Maria Madalena de Pazzi, que ela O fosse visitar trinta vezes por
dia. São Luís de Gonzaga sentia-se de tal modo arrebatado pelos
suaves atrativos do Salvador, que, ao separar-se do Tabernáculo, com
ternura comovente lhe dizia: Deixai-Me, Senhor.
O grande Apóstolo das Índias, São Francisco Xavier, ia
refocilar-se de seus grandes
trabalhos diante do Santíssimo Sacramento. São João Francisco
Regis fazia a mesma coisa; e quando achava a igreja fechada,
consolava-se ficando de joelhos diante da porta, exposto à chuva, ao
frio, para assim fazer corte, ao menos de longe, ao Divino
Consolador. Todos os Santos tiveram sempre esta devoção. Fiquemos
persuadidos de que a alma que se conserva diante do Santíssimo
Sacramento, por pouco recolhida que seja, recebe de Jesus Cristo mais
consolação do que o mundo poderia dar por todas as suas festas e
prazeres. Oh! Quão delicioso é estar com fé ao pé do altar!
Se
queres fazer parte da Guarda de Honra do Sagrado Coração de Jesus,
não deixeis passar dia algum sem assistir à Missa. O Senhor concede
em todo tempo Seus favores, quando Lhe são pedidos em Nome de Jesus:
mas durante a Missa Ele os concede com mais abundância; porque
nossas orações são então fortificadas e acompanhadas pelas do
Coração de Jesus, oferecendo-Se para nos obter as graças de Seu
Pai. Conforme o santo Concílio de Trento, o tempo da
celebração da Missa é justamente aquele em que o Senhor está
sobre Seu Trono de Graça. São
João Crisóstomo afirma que os Anjos esperam este momento
precioso, a fim de intercederem mais eficazmente por nós;
o mesmo Santo acrescenta que aquilo que não se alcança
durante a Missa, dificilmente se poderá alcançar em qualquer outro
tempo. Oh! Que tesouros de
graças podemos então obter para nós e para os outros! Não
esqueçamos que, ouvindo a Missa, nós a oferecemos com o celebrante:
não nos dispensemos, pois, Dela. O Venerável João de Ávila,
extenuado por uma longa viagem, dispunha-se a não celebrar naquele
dia; mas Jesus Cristo lhe apareceu e, descobrindo-lhe Seu peito,
fez-lhe ver Suas Chagas, principalmente a do Sagrado Lado: esta visão
animou o servo de Deus, e ele disse a Missa, não obstante a fraqueza
em que estava.
Se
queres fazer parte da Guarda de Honra do Sagrado Coração,
aproximai-vos o mais possível da Santa Mesa. Felizes aqueles que têm
fome do Pão dos Anjos!… Os teólogos concordam em dizer, que a
Comunhão nos procura mais graças do que todos os outros
Sacramentos, porque nela recebemos a Jesus Cristo, Autor mesmo da
Graça. Quando um príncipe faz por sua própria mão um dom a
alguém, este dom é sempre maior que o que ele concede por
intermediários. Eu não sou digno de comungar constantemente, dizeis
vós. Escutai o que dizia uma santa
alma: Por isso mesmo que eu conheço minha indignidade,
quisera comungar três vezes por dia; porque comungando mais vezes,
espero tornar-me menos indigna.
Quanto mais fracos nos sentimos, tanto mais devemos usar do remédio,
que nos é oferecido na Comunhão; quando um muro pende, põem-se-lhe
escoras, não para endireitá-lo, mas para impedir que ele caia. Não
é grande bem ser preservado, pela Comunhão, da queda no pecado
mortal? Comungai muitas vezes, Filotéia,
dizia São Francisco de Sales, comungai o mais
frequentemente que puderdes, com licença de vosso Pai Espiritual; e
crede-me, as lebres tornam-se brancas nas nossas montanhas, porque
comem só neve; à força de comerdes a pureza mesma, neste Divino
Sacramento, tornar-vos-eis inteiramente pura.
Mas muitas vezes uma pessoa foge da Comunhão, porque sabe, que a
Comunhão frequente não concorda com a vida de prazeres, amizades
mundanas, vaidades, estima própria, mesas regaladas; eis aí porque
evita comungar com frequência. Temem-se as repreensões interiores,
que Jesus Cristo faz cada vez que é recebido em Seu Sacramento de
amor; numa palavra, a razão porque muitos só raramente comungam, é
porque desejam viver com mais liberdade. Que dizeis a isto?
Prática
Todos
os dias irei fazer um momento de guarda diante de Jesus Cristo na
igreja; se não me é possível ter este favor, pedirei a meu bom
Anjo para que vá em meu lugar, e leve meu coração e todos os meus
afetos para meu bom Rei amadíssimo.
Afetos
e Súplicas
Querido
Salvador meu, Vós Sois o Senhor do Céu, o Rei dos reis, o Filho de
Deus: como Vos vejo nas igrejas, abandonado de todo o mundo? Junto de
Vós só percebo Anjos e algumas almas fervorosas. Ah! Quero
ajuntar-me a eles para Vos fazer companhia: não me recuseis esta
honra. Sim, a Vós irei, para conversar convosco a sós, ó Divino
Solitário, ó Único amor de minha alma! Insensato fui, eu Vos
abandonei, eu Vos deixei só, para ir mendigar junto das criaturas
alguns prazeres miseráveis e envenenados; mas agora, iluminado por
Vossa graça, não tenho mais outro desejo que viver solitário
convosco, que quereis viver solitário por amor de mim. Ah!
Quem me dará asas? E forças
para sair deste mundo, onde tantas vezes achei minha ruína, fugir e
morar sempre convosco, que Sois a alegria do Paraíso e o verdadeiro
Amigo de minha alma? Senhor, apegai-me ao Vosso Coração, a fim de
que não me separe mais de Vós, e ache minha felicidade em fazer-Vos
muitas vezes companhia nas igrejas. Por Vossa solidão no Santo
Tabernáculo, concedei-me contínuo recolhimento interior; fazei que
minha alma se converta em oratório solitário, onde só me ocupe
convosco, a quem submeto todos os meus pensamentos e todas as minhas
ações, e consagro todos os meus afeto, a fim de que Vos ame sempre,
suspirando sem cessar pelo momento em que sairei da prisão de meu
corpo, para ir Vos amar e Vos ver sem véu no Céu. Eu Vos amo,
Bondade infinita, e espero Vos amar sempre, no tempo e na eternidade.
Ó Maria, rogai a Jesus que me prenda a Seu Divino Coração por Seu
amor, e não permitais que me suceda ainda perder o grande tesouro
de Sua graça.
Oração
Jaculatória
Louvado
e agradecido seja a cada momento o Santíssimo e Diviníssimo
Sacramento!
Não
basta falar cristãmente, dizia Marceau, este grande amigo do Coração
de Jesus. Edifiquemo-nos com a devoção deste capitão de fragata
para com a adorável Eucaristia. Quando ele teve a felicidade de
converter sua mãe, recomendou-lhe instantemente a audição da Santa
missa, ainda quando isto lhe custasse muito, e a visita ao
Santíssimo Sacramento. “Jesus Cristo, dizia ele, está
presente sobre os altares; lá espera nossas orações, e nós O
deixaríamos?” E a fim de dar novo peso à sua recomendação,
contava-lhe que, se ele havia entrado tão facilmente no seio da
Igreja, era por ter, desde o começo, assistido fielmente à Missa
todas as manhãs, e visitado cada dia a Nosso Senhor na adorável
Eucaristia. Um dia, seus amigos lhe disseram: “Não sabemos como
fazes, Marceau; teus marinheiros estão sempre contentes, quaisquer
que sejam os serviços que lhes mandas: e os nossos se
queixam, clamam, ficam furiosos; não podemos domá-los”. –
“Senhores, disse Marceau, vou indicar-vos como procedo:
quando vejo que eles estão descontentes, vou passar uma hora ou duas
diante do Santíssimo Sacramento, por sua intenção, e então tudo
corre bem”. Alguém lhe mostrava num conflito entre os
oficiais: “Por que espantar-vos? Disse Marceau, eu
comunguei hoje!” Comandante da Arca d’aliança, ele
tinha estabelecido a bordo a mais bela ordem. Começava-se o dia pela
oblação do Santo Sacrifício. O capitão mesmo preparava os
ornamentos, depois reivindicava para si o privilégio de ajudar à
Missa. Ele ajudava cada dia três, e durante elas ficava como
aniquilado de joelhos. Tendo Marceau sabido que muitos marinheiros
murmuravam por ele comungar todos os dias, reuniu-os e disse-lhes:
“Em vez de vos escandalizardes e
murmurardes, deveis regozijar-vos. Se eu não comungasse todos os
dias, ao menor descontentamento que me désseis, meter-vos-ia todos no
mar”. Certo dia um amigo manifestava o temor que tinha de
comungar, porque faltava-lhe o fervor. “E eu, respondeu o
comandante, porque sou um miserável, é que comungo tantas vezes;
tenho necessidade de um remédio cotidiano para me sustentar”.
Em 1851, quando foi acometido da enfermidade de que morreu, ele quis
ir recomendar seus pios projetos ao Santuário bendito do Coração
de Jesus, Paray-le-Monial. A irmã que lhe prestou os derradeiros
serviços, dizia: “Nunca encontramos modelo mais perfeito em
todas as virtudes”. Quem poderá desesperar vendo Marceau,
livre pensador, tornar-se um santo! Nele se verificou a bela palavra
de São Francisco de Sales: “Uma só alma fervorosa dá mais
glória a Deus que mil cristãos negligentes e tíbios”.
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Fonte:
O
Sagrado Coração de Jesus, segundo Santo Afonso de Ligório, ou,
Meditações para o Mês do Sagrado Coração, a Hora Santa e a
Primeira Sexta-feira do Mês;
coligidas
das Obras do Santo Doutor pelo Padre Saint-Omer, C.Ss.R., “A
Primeira Sexta-feira do Mês
de Junho”, pp. 324-331.
5ª Edição Portuguesa, Tipografia de Frederico Pustet, Impressores
da Santa Sé. Ratisbona/Alemanha, 1926.
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